RESUMO: O presente artigo se utiliza do instrumento denominado ensaio teórico para apresentar e desmembrar a correlação estabelecida entre políticas públicas, governança e redes sociais. Para tanto, o método de estudo bibliográfico e de análise de conjunturas foi empregado visando esclarecer sobre o tema e as relações entre políticas públicas e atores sociais, concluindo assim que a complexidade dessa dinâmica fica a par dos conflitos e da necessidade de manutenção destes polos, porém, boas práticas de governança, para além de uma perspectiva conservadora, são um caminho para que se tenha frutos no desenvolvimento de políticas públicas.
Palavras-Chave: Governança, atores, relações.
ABSTRACT: This article uses the instrument presented theoretical essay to present and break down the open clarity between public policies, governance and social networks. To this end, the method of bibliographical study and situation analysis was developed specifically on the topic and the relationships between public policies and social actors, concluding that the complexity of this dynamic is on par with the conflicts and the need to maintain these poles, however , good governance practices, in addition to a conservative perspective, are a way to bear fruit in the development of public policies.
Keywords: Governance, actors, relationships.
1.INTRODUÇÃO
O presente ensaio teórico versa sobre as relações entre políticas públicas, governança e redes sociais.
Segundo Barros (2011), ensaio teórico é um instrumento de ensino e de linguagem utilizado de maneira especulativa e interpretativa para informar em um movimento de diálogo. O autor destaca que os ensaios devem ser lidos por pessoas que conseguem desligar-se do espírito formal, apresentando, distante dos conceitos fechados de um artigo, apenas uma sequência lógica de tópicos que demonstram a visão do autor sobre o tema.
Partindo desta premissa, este trabalho oferece ideias e críticas ao modelo de governança, políticas públicas e rede, assim como, demonstra suas apreensões ao longo da construção destes métodos dentro do Estado e do desenvolvimento das políticas.
Esclarecemos que em acordo com Schneider (2005), governança remete ao condutor (ky honnêtes) dos antigos navios, referindo-se ao controle do Estado e a outros termos como “go govern”, sendo na contemporaneidade referente não somente ao papel do Estado mas englobando também as conduções estatais, por meio da sociedade, através de instituições e atores sociais. Transcendendo o nível estatal e chegando a outros atores na coordenação e formulação das políticas públicas. Políticas Públicas referem-se aos mecanismos estatais para contenção das revoluções de classe, ou, como apresentam Delgado, Triana e Sayago (2013), decisões governamentais na busca de resolver, ainda que de forma paliativa, as demandas sociais.
Quanto às redes, essas são compreendidas de múltiplas formas. Para economia institucional, trata-se de uma rede tal qual a industrial, onde diversos atores contribuem para o produto final. Não sendo papel de apenas uma empresa desenvolve-lo. As redes de políticas públicas, tornam o processo de formulação de superação de problemas sociais assunto de todas esferas da sociedade, abrangendo a esfera pública e privada.
Para o desenvolvimento deste trabalho foram utilizadas leituras de bibliografias referentes ao tema, em análises de diferentes conjunturas, voltadas à compreensão das relações presentes dentro das políticas públicas e dos atores sociais.
Assentando nas concepções de autores como Delgado, Triana e Sayago (2013), Vallés (2002), Schneider (2005), Loiola e Moura (1997), Frey, Penna e Jr (2005), busca apresentar os conceitos de forma sucinta, de modo que seja compreendido pelos leitores de múltiplos campos de estudo.
Dividido em três partes, apresenta em sua composição introdução, referencial teórico e conclusão. O referencial teórico se divide em duas partes. Inicialmente apresenta o conceito de políticas públicas e governança, dando ênfase à visão dos autores e como estes dialogam entre si para a formulação e compreensão do papel desses mecanismos. Em seguida, trata da relação das redes sociais dentro do espaço formado por tais iniciativas estatais, apresentando o entendimento de cada autor, o papel das redes sociais na construção das políticas públicas e desenvolvendo a importância desta no mundo contemporâneo e nas iniciativas estatais. Por fim e de forma conclusiva, apresenta em suas considerações finais as apreensões obtidas pela autora ao longo da construção do pré-dito objeto, assim como, destaca tratar-se de um estudo em constante movimento, cabendo aos futuros pesquisadores da área somar as contribuições aqui dispostas.
2.POLÍTICAS PÚBLICAS E GOVERNANÇA
Para Delgado, Triana e Sayago (2013) e Vallés (2002) as políticas públicas são resultado do conhecimento das necessidades de um espaço, baseadas nos conflitos e tensões sociais que o permeiam. Deste modo, nascem de decisões elaboradas por um conjunto de atores, a partir da pluralização das esferas públicas e privadas, no âmbito institucional. Atuam na busca da resolução das demandas presentes na sociedade.
Lindbom (1991) se utiliza de questões relacionadas ao desenvolvimento das políticas públicas para ilustrar como estas devem influir sobre a sociedade. Para este autor, é importante saber como torná-las efetivas sobre os problemas sociais, e, como elas podem contribuir enquanto respostas ao controle popular. Cabe aos atores na formulação das políticas públicas responder a tais questões e contribuírem efetivamente para o desenvolvimento social da sociedade.
A construção das políticas públicas para Dye (2005) parte do enfoque institucionalista. Este enfoque considera o comportamento individual e grupal da sociedade, ampliando o número de participantes e agregando legitimidade à participação de variadas instituições sociais, econômicas e políticas no que virá a ser uma política pública. Graças ao leque de contribuições e entraves, dados os interesses de cada grupo, tal projeto reúne maior número de realidades.
Na perspectiva cultural, Frey, Penna e Sayago (2005), as instituições incidem sobre sobre um cálculo estratégico do indivíduo, à medida que influenciam seus pensamentos, identidade, ação, etc. Para estes autores o modelo de institucionalismo histórico, diz respeito diretamente ao caráter de escolhas racionais, em um visão reducionista do comportamento individual ou corporativo, pois estes pertencem aos agentes. Então, para que se haja a coesão é necessária a presença estratégica de uma instituição sendo sua ação restrita, afinal, o ser humano, mesmo em situações políticas, age conforme seus desejos. Os autores consideram a visão institucionalista simplista perante o que representa a construção de políticas públicas, pois exprime melhor relação quando ligada a negociações.
Delgado, Triana e Sayago (2013) elucidam a importância das instituições para o desenvolvimento de uma sociedade, e como, a partir de suas especificidades, contribuem para o desenvolvimento político. São compreendidas, segundo nos demonstra Radcliffe e Brown (1993), enquanto um sistema estabelecido ou reconhecido, composto por normas ou pautas que se referem a determinados âmbitos sociais. Portanto, para contribuírem efetivamente no fortalecimento e desenvolvimento de políticas públicas, necessitam de uma afinidade e objetivos comuns aos atores. A compreensão da presença de múltiplos atores para além do Estado (público), em acordo com o que nos ensina Schneider (2005), contribui para a visão das redes de políticas públicas.
Sendo as redes portadoras de múltiplos conceitos, no campo das políticas públicas são entendidas enquanto um sistema, composto por fluxos e circulação onde elementos interagem entre si. Delgado, Triana e Sayago (2013), Musso (2004) e Loiola e Moura (1997) apresentam variados sentidos para o termo “rede”, concebendo-o como uma estrutura de interconexão instável e transitória, a partir da qual o funcionamento do sistema se exemplifica. A abordagem das redes sociais parte do pressuposto que o homem, enquanto ser social, socializa, desta forma, vincula-se e assim, forma redes.
No contexto das políticas públicas as redes são demarcadas enquanto objeto descentralizado e de múltiplas demandas da sociedade, agregando a elas um papel ativo frente a formulação das políticas públicas e em arranjos inovadores de governança, como expõe Delgado, Triana e Sayago (2013) e Borja (1997), refletindo a nova visão do Estado, do setor produtivo, setor público e terceiro setor.
Schneider (2005) apresenta o Estado como uma área institucional determinada, constituindo parte de um sistema funcional ou uma entidade independente da influência externa da sociedade. Produzindo, assim, importantes resultados de condução e coordenação para tal.
As abordagens tradicionais que buscam analisar as políticas públicas, segundo Frey, Penna e JR (2005), partem de “policies determine politics”, deste modo, tem o foco em compreender as políticas (policy), prejudicando a análise das instituições e a estrutura política (polity). Os autores explicam que deste modo as políticas se auto resumiram, e o fracasso ou êxito de seus programas estavam condicionados a elas mesmas. Ao citarem Couto (1998) destacam a fluidez institucional presente nos países em desenvolvimento, dado ao fato de que estes termos não pareciam convencer a estes países e suas instituições, já que as propostas programáticas frequentemente iam de encontro com suas limitações. As estratégias Institution Building e Institutional Development, surgidas entre 1960 e 1970, contribuíram para o alargamento dos aspectos de governabilidade e cooperação, a partir da “development administration” nos países subdesenvolvidos.
Os autores se utilizam desta historiologia para explicar o surgimento das redes. Segundo eles, no caso brasileiro, com a retomada da democracia, a ideia de governabilidade vai contribuir para a manutenção da coesão social diante de um novo Estado e dos interesses privados, afinal, a sociedade estava saindo de um longo período de abuso de poder estatal.
Diante disto, Frey, Penna e Jr (2005), debruçam-se sobre três dimensões políticas na busca da compreensão das redes. Policy (conteúdo de programas e planos), Politics (processo e estilo político) - Policy (instituições e ordem política) (p.6).
Schneider (2005), explicita a teoria dos anos 1960 e 1970 como uma reação ao déficit de perguntas acerca da presença e integração social dentro das instituições estatais. Para este autor, a forma de integração baseada e restrita a fatores culturais genéricos acaba por produzir pesquisa de cunho macro estrutural. Isso quer dizer que ao estudar as estruturas de governabilidade enquanto algo que pode ser aplicado em diferentes contextos, reduz-se o espaço social do país a apenas um único objeto, quando na realidade tratamos de uma gama de demandas, mazelas e populações.
Existem variadas teorias sobre a concepção de Estado (institucionalista tradicional, estrutural-funcionalista, dentre outras), porém, a perspectiva marxista, assentada na ideia de conflitos de classes no seio estatal tem destaque. Frey, Penna, Jr (2005) e Schneider (2005), demonstram que as correntes assentadas no pensamento institucionalista sempre buscaram reforçar a ideia da importância das instituições para a compreensão dos processos políticos. A busca pelo aperfeiçoamento das análises, levou os pesquisadores a adotarem novas formas de compreensão
[...], por exemplo, que quando se estudava as democracias mais novas com as latino-americanas, estas em geral eram dotados de todas as instituições necessárias a sua caracterização como países democráticos ou como poliárquicas, no entanto, o processo de institucionalização se revelou ‘incompleto’, cabendo às chamadas instituições informais como o clientelismo, o patrimonialismo e fisiologismo papel fundamental na intermediação de interesses políticos. Tais países, portanto, teriam “algumas semelhanças de família com as democracias solidamente estabelecidas, mas não dispõem de alguns dos atributos destas últimas, ou esses atributos só têm uma existência precária” (O’DONNELL, 1996, p. 5 apud FREY, PENNA, JR, 2005, p.7).
Então, em contrapartida ao que estudavam as abordagens institucionalistas tradicionais, buscando o estudo de macro-teorias políticas, outros pesquisadores notaram a necessidade de se ampliar tais estudos.
A partir dela, com a análise das “contradições sistêmicas" da luta de classes houve a contribuição para estudos que levaram à compreensão em nível micro-social das realidades. O institucionalismo Sociológico, trata as instituições como um conceito complexo. Os neo institucionalistas, defendem que não há forma de estudar as instituições sem pensar os aspectos culturais, rompendo com a dicotomia entre instituição e cultura. Para Schneider (2005), a análise em nível micro é fruto da compreensão do que a teoria marxista denomina contradições sistêmicas, sendo adotada por variados cientistas sociais. Diferente das teorias iniciais, esta teoria buscou analisar os fenômenos sociais a partir de seus atores coletivos e individuais.Delgado, Triana e Sayago (2013) destacam a relevância da perspectiva neoinstitucionalista para os estudos acerca das políticas públicas, principalmente com o alargamento dos interesses em jogo, onde a complexidade é cada vez maior.
Na atualidade, para as ciências políticas, estes dois conceitos têm tido destaque, "rede'' e ‘governança”. Schneider (2005), nos ensina que estes termos surgiram em 1970, ligados à sociologia e foram adotados por outras áreas de estudo durante os anos de 1990 e 1980. Ambos conceitos questionam a formação estatal, afinal, trabalham sob a perspectiva democrática e participativa da sociedade.
Diante das aceleradas mudanças na atual conjuntura mundial, Frey, Penna e Jr (2005), destacam a crescente urbanização mundial, concomitante ao advento tecnológico, notando um salto rumo à ampliação da vida urbana. Neste contexto os aspectos de governança são definidos. Para Frey, Penna, Jr (2005) “governança é um conceito plural” (p.2), ao passo que para Schneider (2005) refere-se a um conjunto de mecanismos de condução. Delgado, Triana e Sayago (2013), compreendem esse termo enquanto um conceito amplo, nascido da necessidade de responder às novas demandas complexas dos governos, onde os aspectos tradicionais não obtêm resultados efetivos no atendimento da variedade de preferências dos amplos grupos sociais.
Seria a governança, em acordo com os autores supracitados, uma maneira de alinhar horizontalmente todos atores envolvidos na construção das políticas públicas, fortalecendo o caráter democratico do Estado.
A governança demanda de certas condições para seu desenvolvimento: poder distribuído na sociedade, que depende do caráter democratico do Estado e não implica o enfraquecimento do seu poder; disponibilidade e utilização transparente dos recursos para lograr mudanças desejadas pela sociedade; existência de uma sociedade civil forte, comprometida e organizada; elevado compromisso cívico e considerável nível educacional. (DELGADO, TRIANA E SAYAGO. 2013. p. 10).
A adoção de processos participativos por parte do Estado, busca estimular a população e suas organizações a fazerem-se presentes nos espaços deliberativos. O enfoque da governança, em um contexto de redes sociais, o qual trabalharemos mais adiante, é utilizado para flexibilizar as formas de governo, na busca de romper com os modelos tradicionais. Bonzel (1995) destaca que esse processo contribui para uma ação colaborativa entre agentes distintos e individuais. Assim, as redes de políticas configuram uma nova roupagem a governança, descentralizada e baseada em preceitos de independência e confiança.
A população, em acordo com Frey, Penna e Jr (2005), com a descentralização das políticas por meio do entendimento da heterogenia das demandas, deixa de ser mera receptora e passa a compor um importante instrumento de informações, sendo também atriz em favor da consolidação das políticas públicas voltadas a ela.
Loiola e Moura (1997), destacam que o reconhecimento popular enquanto ator das políticas públicas, trouxe ao Estado a necessidade de uma “rede”, a qual irá amparar toda a comunidade, assim como, os equipamentos do Estado. Constituindo um novo desafio na busca da construção de uma gestão participativa e democrática.
A presença de atores dotados de inteligência e atuando enquanto sensores, tanto no que diz respeito à formulação e quanto às demandas das políticas, problematizando e participando das definições de suas contradições, agrega a estes indivíduos também o caráter deliberativo sobre as questões ligadas às “percepções e decisões de seus recursos. Como essas funções são resolvidas em sistemas políticos modernos depende de padrões de diferenciação concretos”. (SCHNEIDER, 2005. p. 35). Contribuindo para o encargo de diferentes soluções de forma democrática, onde certos atores vão ter maior capacidade de atuar sobre um problema político, enquanto outros de demonstrar a necessidade daquela solução, resultando em decisões gerais correspondentes.
A compreensão das redes carece do entendimento da dicotomia presente entre os que buscam a mudança societária a partir da mobilização e, entre aqueles que visam a mudança estatal e gerencial das políticas públicas. Fleury (2005), evidencia que a primeira vertente trata da força dos movimentos sociais e das organizações da sociedade civil, na busca de construir de aspectos que agregam a todos.
Nessa perspectiva, os próprios movimentos sociais das sociedades complexas são vistos como redes submersas de grupos, circuitos de solidariedade, que diferem profundamente da imagem de ator politicamente organizado. (p.80)
Porquanto, na perspectiva que busca mudanças estatais, privilegia-se as questões intergovernamentais e interorganizacionais, a partir da compreensão de que o sistema governamental é complexo e carece de relações externas, englobando outros níveis sociais e de governos, alterando a forma de gerir as políticas públicas.
As redes intergovernamentais e interorganizacionais são vistas como “estruturas de interdependência envolvendo múltiplas organizações ou partes, em que uma unidade não é meramente o subordinado formal da outra em um amplo arranjo hierárquico” (O’TOOLE, 1997, p. 45), não importando se essas estruturas de colaboração envolvem organizações não lucrativas ou vínculos com empresas lucrativas. (FLEURY, 2005. p.80)
Matos (2009) destaca que a presença de um capital social vinculado aos aspectos de governança pode influir de forma negativa (capital social de vínculo), afinal, estes atores possuem lealdade entre si, podendo gerar rivalidade entre os grupos. O capital social de ponte, por sua vez, remeteria à relação entre atores de grupos variados, fortalecendo o acesso de novas ideias, múltiplos pontos de vista e dos limites orçamentários que necessitam de pensamentos coletivos. Em contrapartida, Bodin e Crona (2009) vão dizer que a presença de ambos capitais gera equilíbrio na governança, fortalecendo este processo. A partir da descentralização causada pelas características apresentadas pelo capital de vínculo e pelo capital de ponte, é possível trabalhar sobre as mazelas que se apresentem no desenvolvimento das políticas públicas e criar uma gestão descentralizada ou centralizada.
Essas relações ao serem estabelecidas e vinculadas a uma rede social, guiarão a forma de relacionar-se dos atores, gerando uma rede particular. A forma que será desenvolvido o processo de rede, será determinante para os recursos disponíveis e determinará a mobilidade através da mesma, direcionando, como nos ensina Delgado, Traina e Sayago (2013), os resultados obtidos.
2.1. REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS EM SISTEMA DE GOVERNANÇA
Com o alargamento dos processos de democratização e descentralização, culminando no fortalecimento dos poderes locais, houve o aumento dos processos de governança, resultado da dinamização no processo de informação devido ao uso crescente de Tecnologias da informação e comunicação (TIC’s) em diversos setores sociais e governamentais. Frey, Penna, Jr (2005) e Schneider (2005) concordam quanto à forma que a democratização da formulação e dos atores das políticas públicas neste contexto, criam um papel fortalecedor para as demandas e deliberações destes indivíduos frente ao Estado e o capital.
Para uma análise válida das redes sociais, os autores demonstram a necessidade de modelos e métodos para que seja fiel ao objeto. Referindo-se à avaliação de processos sociais e como é adotado o conceito de rede. Sendo resultado do desenvolvimento de pesquisas sociais e teorias, onde a forma de relacionar-se pode ser colocada em evidência, não sendo uma teoria fechada, formal e unitária como nos ensinam os autores aqui estudados.
O foco no relacionamento é a característica principal para o estudo das redes. Os autores se utilizam de Emirbayer e Goodwin (1994) a partir do conceito de “imperativo anti categorial”, que determina que os fenômenos ligados à política e sociologia devem ser analisados à luz das relações e seus padrões e não sobre as qualidades atribuídas aos atores, quebrando com a ideia de análise ser apenas o indivíduo. Por outro lado, a análise quantitativa pode servir de aparato para a apreensão de dados acerca de parâmetros relacionais que dão característica às redes sociais.
Delgado, Triana e Sayago (2013), demonstram que a análise das redes sociais vão além de identificar e analisar novos arranjos de governança, contribuem também para identificação de práticas e configurações da mescla entre padrões tradicionais e padrões inovadores. Para estes autores, as críticas e as diferentes abordagens de estudo contribuem para o desenvolvimento do diálogo crítico. Ressaltam que a centralidade dos agentes na governança e nas redes, não necessariamente os tornam deliberativos e decisórios frente às políticas públicas.
As redes sociais são resultado da adoção pelas ciências sociais do termo “rede”. Referem-se, amplamente, ao que Frey, Penna e Jr (2005) descrevem como uma abordagem coletiva, que coloca em evidência os processos interativos entre os indivíduos" (p.4). Estes autores se utilizam de variadas fontes teóricas para expor que as relações no interior das redes, pleiteadas pelo capital social e as comunidades virtuais, estão relacionadas diretamente, através da coesão, aos aspectos de governança.
Rovere (1998) apud Fleury (2005) trata a concepção de rede a partir da psicologia social, neste campo, rede é compreendida enquanto uma rede de pessoas. Ou seja, rede é entendida como sinônimo de vínculo.
Freeman (2004) apresenta a teoria das redes sociais enquanto um sistema onde indivíduos e atores interagem de forma coletiva sob o auxílio de toda informação, sendo o comportamento destes guiados pelas relações ali desenvolvidas.
Ao integrarem as redes, os atores adquirem potencial de se conectar a outros variados atores, em diferentes níveis e categorias, formando uma dinâmica diversificada ao capital social e suas funções. Ainda que permitam a desterritorialização dos mercados e das políticas econômicas, as redes têm amplo aspecto ligado à localidade, mesmo em um sistema globalizado e de processos para além do país.
Schneider (2013) nos ensina que as redes incorporam muitos atores, que são divididos em subsetores sociais e políticos.
Redes de políticas públicas são mecanismos que mobilizam recursos políticos em situações em que a capacidade de tomada de decisão, de formulação e implementação de programas é amplamente distribuída ou dispersa entre atores públicos e privados. (KENIS E SCHNEIDER, 1991. p.41. apud SCHNEIDER, 2005. p. 40
Deste modo, para melhor elaboração de seus preceitos, o Estado passa a contar com atores sociais e recursos variados, carecendo de uma divisão do trabalho. Assim, ocorrem frequentemente arranjos entre público e privado, não havendo confusões hierárquicas entre estes atores, criando um ambiente de cooperação, confiança e negociação. As redes ao transcender o papel de mero instrumento gerencial, como nos ensina Fleury (2005), passam a permitir a geração de relações de confiança (capital social) e dos processos de cunho horizontal anteriormente citados.
Frey, Penna e Jr (2005) se utilizam do conceito de “policy networks”, que define a relação entre múltiplas instâncias da sociedade na formação e implementação de determinada “policy”. Reforçando o que apresenta Schneider (2005), estas relações, aplicadas a redes sociais, tratam-se de interações menos formais mas ainda portadoras de regularidade, capazes de contribuir para o surgimento de confiança e valores comuns entre seus integrantes.
Delgado, Triana e Sayago (2013), apresentam o termo policy network assentado em duas escolas de pensamentos para sua compreensão, sendo elas “a escola de intermediação” e a “escola da governança”, a qual nós utilizamos neste trabalho. A primeira diz respeito a um modelo onde se trabalha a rede enquanto um espaço para além do pluralista e cooperativista. A segunda compreende rede enquanto uma forma de articulação, onde há a interação entre atores públicos e privados.
Schneider (2005) nos ensina que dentro do campo das políticas públicas e, principalmente, no que diz respeito às redes, há dois eixos que vão dividir sua produção: a“forma de coordenação” e “status social” dos atores envolvidos.
O eixo forma de coordenação e condução contém, por um lado, o ponto extremo de uma configuração, na qual uma política específica é determinada por um único ator (principal) e formulado e convertido em relações de autoridade (hierarquia). De outro lado, encontra-se o ponto extremo em que a política se forma a partir da ação espontânea, não-planejada e inconsciente de muitos atores persistentes e dispersos (mercado). [...] A dimensão do status social refere-se ao eixo entre privado e público, que pode se referir tanto ao controle da ação quanto à produção de cada um dos atores corporativos. Controle público de uma organização significa que a ação da organização é controlada por meio de um mecanismo de decisão, no qual todos direta ou indiretamente participam e ninguém está excluído. Análogo a isso é que a produção pública de uma organização é caracterizada pelo fato de que (em princípio) ninguém está excluído do seu uso ou consumo.(SCHNEIDER, 2005. p. 40)
As redes se colocam entre estes dois pontos extremos, gerando uma interação, onde há visibilidade ao número de atores envolvidos em uma política, nas demandas de cada ator e de como chegaram a um consenso que agregue a todos, neste espaço surgem também as alianças de longa duração.
Frey, Penna e Jr (2005), tratam dessa relação de atores e status a partir da concepção das teorias de elite e marxista. Os autores demonstram que no contexto de policy network há uma tensão quanto à essas teorias, principalmente por tratar-se de relações complexas entre agentes coletivos, institucionais e inter-relacionais. Instigam que se faça uma releitura das formas de conceber políticas públicas a partir da nova formação das redes sociais, uma vez que as teorias supracitadas possam tomar novas formas na contemporaneidade, uma vez que estamos vivendo uma sociedade cada vez mais complexa.
As redes sociais enquanto local que engloba múltiplos atores se tornam palco para essas relações entre classe dominante e dominada. E esta relação se vê permeada pela complexidade presente nas relações sociopolíticas atuais, pelos preceitos de um novo paradigma de rede sombreado pelas tecnologias de informação.
Delgado, Triana e Sayago (2013), destacam que as redes sociais representam um local de atividade da sociedade ante as políticas públicas, portanto, abarca a descentralização e a multiplicação das demandas sociais, contribuindo para a execução das políticas no bojo das novas relações de governança. Concluem que o termo policy network contribui ativamente para os estudos nessa área, pois trabalha sobre as questões complexas das relações presentes nas redes e os vínculos entre os atores.
Para Fleury (2005) a democracia traz condições para que se una os atores sociais aos políticos, uma vez que permite a aproximação dos cidadãos da cena política. Este autor destaca que a presença das redes na formulação das políticas públicas é fruto da incapacidade dos atores governamentais e não-governamentais.
Frey, Penna e Jr (2005), Schneider (2005), Delgado, Triana e Sayago (2013), tratam das perspectivas de policy network enquanto uma experiência a ser analisada. Compreende-se que as experiências de políticas públicas e as práticas de governança estão ainda em construção, coletando, em suas múltiplas facetas e através dos estudos de teoria política de variadas áreas acadêmicas, abordagens que virão a contribuir para um desenvolvimento a longo prazo e que acompanhe as dimensões temporais e os ciclos das políticas públicas
A descentralização, em acordo com o que nos ensina Fleury (2005), ao transferir o poder aos atores sociais e às autoridades locais, não garante a eficácia dessas políticas. De acordo com o autor, alguns fatores podem influir sobre esse déficit, como a subordinação das políticas sociais às políticas econômicas; o caráter setorial das políticas, onde deveria haver um caráter integral e a garantia de universalidade e equidade; dentre outros.
Deste modo, se torna evidente que, ainda que fundamental ao desenvolvimento de políticas públicas, a rede necessita de adaptações e de um estudo que englobe as subjetividades dos locais onde se coloca.
CONCLUSÃO
Assentado sobre a concepção de políticas públicas, enquanto reconhecimento das necessidades de determinado local, reconhecendo a variedade de concepções que o termo possui, agregando características que os autores Delgado, Triana e Sayago (2013), Vallés (2002), Lindbom (1991) e Dye (2005) consideram essenciais para o estudo, compreendemos que políticas públicas são o resultado da decisão de variados atores na busca de contenção social e resolução das demandas da sociedade.
O entendimento da presença de variados atores nesta construção contribui para a conclusão do que vem a ser a rede de políticas públicas. Estas redes são formadas por atores sociais de múltiplos campos, principalmente, estatal e privado. Estes atores, inicialmente vistos enquanto seres genéricos e portadores de demandas pareadas. A partir do desenvolvimento dos estudos acerca da influência destes indivíduos e das redes, passaram a serem vistos enquanto seres individuais mas que dividem a mesma cultura e demandas em um espaço social.
Com o desenvolvimento dos aspectos de governança, tais redes passam a ocupar um papel de destaque na formulação de políticas públicas, afinal, através delas os atores passam a contribuir efetivamente, mas não necessariamente de forma decisória, para o desenvolvimento destas políticas, sob aspectos ligados diretamente a necessidade destes indivíduos e da sociedade.
No bojo da construção das redes sociais e sua multifacetada estrutura, formam-se diferentes formas de cumplicidade, principalmente, entre grupos que buscam os mesmos direitos. Ao identificar-se entre si, contribuem para a compreensão das demandas presentes entre eles, sendo fruto do reconhecimento de classe e do desenvolvimento de instituições. Este fato contribui para além do objetivo institucional, seja atendido as demandas reais da população do Estado.
Quanto à governança e a presença de um capital social e de ponte em seu interior, gera equilíbrio. Temos o desenvolvimento da necessidade do Estado de ouvir seus componentes, principalmente a partir do movimento de informação aplicado pelos avanços tecnológicos.
As redes sociais, integradas a governança, constituem um espaço deliberativo e palco para o encontro entre classe dominante e dominada, ambos na busca da manutenção, seja do domínio sobre a classe pauperizada, seja de sua sobrevivência mínima.
Deste modo, ainda que recente os estudos sobre governança, políticas públicas e redes sociais é possível compreender a importância deste movimento ao capital e a classe trabalhadora, havendo a integração por parte do Estado, para que se trabalhe as demandas de ambos. Partindo das análises neofuncionalistas e das características a serem adaptadas frente a contemporaneidade é possível desenvolver estudos que levam a compreensão das formulações e da influência destes agentes na política atual. A complexidade dessa dinâmica fica a par dos conflitos e da necessidade de manutenção destes pólos, porém, boas práticas de governança, para além de uma perspectiva conservadora, são um caminho para que se tenha frutos deste desenvolvimento.
Este ensaio teórico buscou reunir diferentes autores tratando da perspectiva de redes sociais. Esclarecemos não ser um trabalho fechado e deixamos aos futuros pesquisadores desta área nossa contribuição. Ressaltamos a complexidade deste campo, ainda mais em um contexto de ampliação das características neoliberais sobre as políticas públicas como no Brasil.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Denise Alves da. Políticas públicas, governança e redes sociais: um ensaio teórico. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 set 2023, 04:54. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/63208/polticas-pblicas-governana-e-redes-sociais-um-ensaio-terico. Acesso em: 23 dez 2024.
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