RODRIGO SONCINI DE OLIVEIRA GUENA
(orientador)
RESUMO: A liberdade de expressão é um dos pilares fundamentais de uma sociedade democrática, permitindo que indivíduos expressem suas opiniões, ideias e visões sem medo de censura ou repressão. No entanto, essa liberdade frequentemente coloca os Estados em uma posição delicada, onde devem equilibrar o direito à livre expressão com outros valores e interesses, como a segurança pública e a proteção contra discursos de ódio. A presente pesquisa explora a complexa relação entre o Estado e o direito de liberdade de expressão, analisando as várias posturas adotadas e as consequências resultantes. Ademais, também serão abordados no presente artigo, o conceito de liberdade de expressão, como ela é utilizada como direito fundamental e os limites de sua aplicação.
Palavras-chave: Liberdade de expressão. Sociedade Democrática. Segurança Pública.
ABSTRACT: Freedom of expression is one of the fundamental pillars of a democratic society, allowing individuals to express their opinions, ideas and views without fear of censorship or repression. However, this freedom often places States in a delicate position, where they must balance the right to free expression with other values and interests, such as public safety and protection from hate speech. This research explores the complex relationship between the State and the right to freedom of expression, analyzing the various positions adopted and the resulting consequences. In addition, this article will also address the concept of freedom of expression, how it is used as a fundamental right and the limits of its application.
Keywords: Freedom of expression. Democratic Society. Public security.
1 INTRODUÇÃO
A liberdade de expressão, como um pilar fundamental da democracia moderna, desempenha um papel relevante na garantia dos direitos individuais e na promoção do debate público.
No entanto, essa liberdade não é absoluta e encontra limites em situações que podem ameaçar a segurança, a integridade e os direitos de terceiros. O desafio está em tentar encontrar um equilíbrio entre a proteção da liberdade de expressão e a provenção dos discursos prejudiciais e negativos.
A definição dos limites da liberdade de expressão, como será tratado no artigo, muitas vezes se dá através da avaliação de contextos específicos. A incitação à violência, a disseminação dos discursos de ódio e a calúnia são exemplos de situações em que a liberdade de expressão encontra seus limites legais e éticos. Afinal, a sociedade reconhece que as palavras ditas podem trazer consequências reais e graves, influenciando atitudes e comportamentos.
No contexto político, a interseção entre a liberdade de expressão e o abuso de poder durante a eleição apresenta desafios únicos. A disseminação de informações falsas, a manipulação de discursos e a interferência externa podem distorcer a vontade popular e comprometer a integridade do processo democrático. Neste cenário, a liberdade de expressão deve ser examinada à luz do seu potencial para minar a capacidade dos cidadãos de tomar decisões controladas e livres.
O uso indevido da liberdade de expressão com fins eleitorais levanta questões importantes sobre a responsabilidade dos agentes públicos e provados. A redes sociais, por exemplo, se tornaram plataformas poderosas para a divulgação de informações, mas também podem ser exploradas para a influência de informação em larga escala. Regular ou não, a disseminação de informações enganosas pode prejudicar o processo democrático e o procedimento das eleições.
A promoção de uma esfera pública e saudável e bem controlada exige um esforço conjunto da sociedade. Mecanismos de verificação de fatos, educação midiática e transparência na divulgação de informações são ferramentas essenciais para combater o abuso da liberdade de expressão em períodos eleitorais. Além disso, a conscientização sobre a responsabilidade individual ao se comunicar de forma online, é fundamental para evitar a manifestação irresponsável de informações duvidosas.
Em última análise, a presente pesquisa mostra que a liberdade de expressão é um direito fundamental que deve ser protegido e preservado. No entanto, é recenhecer que essa liberdade não é só um passe livre para modificar, difamar ou manipular. Encontrar o equilíbrio entra a proteção da liberdade de expressão e a prevenção do abuso de poder é uma tarefa complexa e contínua, que exige um compromisso constante com os valores democráticos e a responsabilidade individual e coletiva.
2 DEFINIÇÃO DE ESTADO E CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
2.1 Definição de Estado
..Estado origina-se do latim status, que significa “estar firme”. De acordo com o entendimento de Fernando de Azevedo, a palavra também pode ser definida como “imóvel, regular, constante”, que pode ser utilizada para caracterizar uma condição generalizada de estado, de ser, como por exemplo o termo status libertatis, que tem como significado a liberdade de um indivíduo em face do Estado (em sentido estrito), bem como os seus direitos de defesa (em sentido amplo). (Azevedo, 1953).
Ademais, Alexandre Groppali (1962, p. 264-265), conceitua Estado da seguinte forma:
O Estado, inegavelmente, significa o domínio dos mais fortes e organiza os serviços públicos, mas seria revelar um conceito unilateral da realidade, o de não se admitir que é no interesse da coletividade também que esse domínio é exercido e que o Estado, além dos serviços públicos, deve visar outros fins mais altos, de natureza ética e social, que perduram no tempo, se não quer transformar-se, degradando-se, em um mero órgão técnico de administração.
A definição de Estado está relacionada com a organização político-administrativa de um território. É o conjunto de ordenamentos jurídicos que gerencia a população e sua principal função é administrar um território através de ações governamentais.
Os pilares que sustentam as origens do Estado, na prática, sempre lhe conferiram um caráter conservador, contratual, sinônimo de submissão e obediência. Alguns pensadores, definiram o que o Estado é simplesmente a vontade da sociedade, não a mera vontade individual, mas uma vontade racional, indefectível, completa, acabada e perfeita. É preciso dizer que desde as primeiras questões racionais sobre o Estado Liberal, este sempre desempenhou um papel conservador.
Mostesquieu estabeleceu, como condição para o estado de direito, a separação dos poderes executivo, legislativo e judiciário. A ideia de equivalência é que essas três funções devem ser dotadas de igual poder. Trata-se, nessa ordem, de assegurar a existência de um poder capaz de se opor a outro poder.
A efetividade da Revolução Francesa não representou necessariamente a redução das crises sociais, assim como a Revolução Industrial associada à organização política e econômica liberal. A omissão do Estado liberal direcionou as reivindicações de uma nova forma de organização política, o Estado Social. Surgiu a instalação de um Estado fatalmente intervencionista, produzindo igualdade real.
Como colônia portuguesa, a legislação vigente no Brasil era a de Portugal. Após a Independência do Brasil, foi necessário criar um poder judiciário próprio, além de promulgar a Constituição que regeria o país. No total foram sete Constituições, sendo a de 1988 a que ainda se encontra em vigor. Em 1827, foram fundadas as primeiras escolas de direito do Brasil: as Academias de Direito e de Ciências Sociais de São Paulo e Olinda.
Existem alguns elementos indispensáveis para a formação de um Estado, são eles: território, governo, população e soberania. Não existe um Estado sem um território, sem um espaço para que ele seja efetivamente formado, para que assim possa estabelecer suas relações de poder governamental de forma central. Em seguida, é necessário um governo, que administra o Estado. A população, sendo outro elemento importante, é o conjunto de pessoas que se vinculam ao poder do Estado e seguem a sua administração. E por fim, a soberania, que é primordial para que o governo estatal se torne independente, e tenha o controle do território de forma unificada e pacífica.
O Estado, como é visto nos dias atuais, é uma formação política recente e que ainda passa por constantes mudanças. Pinto Ferreira sumariza cinco fases de mudanças socioculturais sofridas pelo Estado: o Estado latente, com foco na organização tribal; o Estado primitivo de conquistadores; o Estado feudal; o Estado absoluto e o Estado democrático e constitucional. (Ferreira, 1975, p. 174).
2.2 Características dos Direitos Fundamentais
Os direitos fundamentais são aplicados a todos os seres humanos, e reconhecidos pelo Estado, ou seja, são positivados no ordenamento jurídico brasileiro e protegidos pela Constituição da República Federativa de 1988.
Destarte, os Direitos Fundamentais, tem como objetivo proteger a dignidade da pessoa humana, fazendo com que os direitos básicos de toda pessoa sejam resguardados e respeitados.
Os direitos e garantias fundamentais encontram-se fundamentados nos artigos 5º a 17 da CRFB/88 e, podem ser divididas em direitos de primeira, segunda, terceira, quarta e quinta geração. Em se tratando de direitos de primeira geração, temos: direito à vida, à liberdade, à propriedade, à liberdade de expressão, à participação política e religiosa, à inviolabilidade de domicílio, entre outros. Quanto aos direitos de segunda geração, tratam-se dos direitos sociais, econômicos e culturais, e precisam da intervenção do Estado para que sejam garantidos de forma efetiva. Os direitos de terceira geração, estão relacionados a fraternidade ou solidariedade, vinculados ao desenvolvimento, ao meio ambiente, entre outros. Os direitos de quarta geração são os direitos à democracia, à informação e ao pluralismo, relacionando-se ao futuro dos cidadãos e a proteção à vida. E por fim, os direitos de quinta geração, que consistem no direito à paz.
As características dos direitos fundamentais podem ser vistas como princípios norteadores, pois precedem qualquer ordenamento jurídico. Desse modo têm-se as seguintes características: universalidade, imprescritibilidade, historicidade, irrenunciabilidade, inalienabilidade, inexauribilidade, concorrência, aplicabilidade, constitucionalização, vedação ao retrocesso e relatividade (Equipe LFG, online, 2022):
a) Universalidade: os direitos e garantias fundamentais são direcionados a todos os seres humanos, sem diferenciar entre cor, raça, crença, nacionalidade, sem quaisquer restrições.
b) Imprescritibilidade: não estão submetidos à prescrição, sendo assim, não se perdem com o passar do tempo. No entanto, não cabe a todo direito, como por exemplo, o direito a propriedade, que pode ser atingido através da usucapião, quando não é exercido.
c) Historicidade: os direitos fundamentais fazem parte de uma ordem histórica, ou seja, foram criados devido a várias revoluções.
d) Irrenunciabilidade: são irrenunciáveis pelo seu titular.
e) Inalienabilidade: são intransferíveis, indisponíveis.
f) Inexauribilidade: os direitos fundamentais não excluem outros direitos decorrentes do regime e dos princípios adotados pela Constituição Federal, ou por Tratados Internacionais.
g) Concorrência: os direitos fundamentais são de mútua dependência, uma vez que se vinculam uns aos outros, ou precisam ser complementados por outros direitos.
h) Aplicabilidade: têm aplicabilidade de forma imediata, sendo vedada em qualquer hipótese a postergação.
i) Constitucionalização: são positivados pela Constituição Federal.
j) Vedação ao retrocesso: não podem ser tomados de volta.
k) Relatividade: os direitos fundamentais são absolutos, ou seja, tem natureza relativa e limitada.
3. DOUTRINA DOS LIMITES
O ordenamento jurídico germânico criou a doutrina dos limites da prescrição sob o nome de Schranken-Schranmken, a qual estabeleceu que é vedado proibir o exercício dos direitos fundamentais além do necessário. Consequentemente, a limitação dos direitos fundamentais é limitada.
Canotillo salienta que a avaliação da amplitude das restrições representa um terceiro paradigma de procedimento restritivo. (Canotillo, 2002). Corrobora essa alegação ao categorizar a determinação da extensão da salvaguarda e a busca pela existência de uma restrição efetiva por meio de legislação como a primeira fase, e, como a segunda fase, a verificação de que a legislação restritiva está em conformidade com os requisitos constitucionais.
Inicialmente, é pertinente ressaltar que a aplicabilidade da doutrina dos limites só se manifesta a partir da conjectura externa das limitações sobre os direitos fundamentais, uma vez que a conjectura interna sustenta que os limites são “inerentes ao processo de fundamentalização” dos respectivos conteúdos, sendo, portanto, particulares. Isso implica que não há limitações suscetíveis de serem restringidas, visto que o escopo de salvaguarda está protegido. Ademais, destaca-se que a restrição dos direitos fundamentais deve ser compatível, tanto formal quando materialmente, com a Constituição.
Em termos de compatibilidade formal, faz referência ao fato de que as disposições da lei fundamental encapsulam os atos de autoconstituição democrático-fundamental devido à prevalência e precedência da constituição no sistema jurídico.
Relativamente à congruência material, implica que embora a constituição não estabeleça restrições explícitas a uma ampla gama de prerrogativas, ela estabelece um conjunto de princípios substanciais, constituídos pelos valores inerentes à dignidade humana e a proteção dos direitos fundamentais, que demandam a busca de um equilíbrio entre as delimitações. Além disso, existe uma supervisão formal e substantiva da constitucionalidade. A análise formal procura investigar a competência, o procedimento e a configuração do processo.
Em contrapartida, tais conteúdos têm como objetivo resguardar o cerne dos direitos, de acordo com os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, bem como a proibição de apelo àquilo que a doutrina da limitação define como: várias são as razões que conferem à educação o status de direito fundamental.
O exercício dos direitos fundamentais pode trazer alguns embates entre os direitos constitucionais, fazendo com que seja preciso definir um âmbito de proteção desses direitos. Ato contínuo, a determinação desse âmbito indaga a identificação de dos bens jurídicos que são abrangidos dentro dessa proteção.
Ademais, conforme entendimento de Gilmar Ferreira Mendes, ainda é possível a intervenção legislativa nos direitos fundamentais quanto aos direitos que não possuem um limite pré-estabelecido em seu âmbito de proteção. Conforme a doutrina do direito comparado, nem tudo que está no âmbito de proteção possui de fato a proteção dos direitos fundamentais. (Mendes, 2002, p. 240).
No entanto, em relação à teoria dos limites, existem algumas dificuldades de estabelecer a existência de um mínimo essencial, ou seja, o que será definido em cada caso concreto, através da proporcionalidade. A respeito disso, Bodo Pieroth e Bernhard Schlink entendem:
[...] o conteúdo essencial tem de ser determinado em separado não só em relação a casa direito fundamental em concreto, mas até mesmo a cada caso per se. Apenas o pesar e o ponderar os bens e interesses públicos e provados envolvidos no caso concreto permitem verificar se o conteúdo essencial foi afetado ou não. (Pieroth; Schlink, 2012, p. 90).
Neste sentido, os direitos fundamentais, embora tendo todas as suas características já mencionadas, podem ser limitados através de disposição constitucional ou por lei ordinária com fundamento na CRFB/88. Existem duas formas de restrição: a reserva legal simples, a qual se baseia na autorização constitucional expressa, pelo legislador, para restringir um direito, sem que seja necessária uma exigência complementar; e por fim, a reserva legal qualificada, a qual se refere a restrição constitucional que determina limites ao desempenho legislativo.
4 CONCEITO DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A LIBERDADE E O ABUSO DE PODER SOBRE A ELEIÇÃO
4.1 Conceito de Liberdade de Expressão
No Brasil, a liberdade de expressão foi mencionada nas Constituições de 1824, 1891 e 1934. Contudo, no ano de 1937, deu-se início a censura advinda da Era Vargas, que teve seu fim em 1946, com a promulgação de uma nova Constituição, que previu novamente os direitos de liberdade individual aos cidadãos. (Carvalho, 2021).
Tal liberdade pode ser conceituada como o direito que permite que as pessoas possam se manifestar sem aversão de ser represado. Ademais, corrobora que as informações sejam recepcionadas de maneira independente por diferentes meios e sem censura e, é garantida pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo 19 e pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º:
Art. 19. Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, este direito implica a liberdade de manter as suas próprias opiniões sem interferência e de procurar, receber e difundir informações e ideias por qualquer meio de expressão independentemente das fronteiras. (ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. 1948).
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
(...)
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
(...)
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; [...] (Brasil. 1988).
Ainda sobre o seu conceito, José Afonso da Silva (2006, P. 241 e 243), menciona que a liberdade de expressão envolve a liberdade de pensamento, de opinião e de comunicação, conceituando a liberdade de pensamento como o direito de exteriorizar o que pensa. Já a liberdade de opinião:
[...] se resume como a própria liberdade de pensamento em suas várias formas de expressão. Por isso é que a doutrina a chama de liberdade primária e ponto de partida das outras. Trata-se da liberdade de o indivíduo adotar a atitude intelectual de sua escolha: quer um pensamento íntimo, quer seja a tomada de posição pública ou a liberdade de pensar e dizer o que se crê verdadeiro. (SILVA, 2006, p. 241).
Quanto à liberdade de comunicação, Silva entende que:
As formas de comunicação regem-se pelos seguintes princípios básicos: (a) observado o disposto na Constituição, não sofrerão qualquer restrição qualquer que seja o processo ou veículo porque se exprimam; (b) nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística; (c) é vedada toda e qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística; (d) a publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade; (e) os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens dependem de autorização, concessão ou permissão do Poder Executivo Federal, sob controle sucessivo do Congresso Nacional, a quem cabe apreciar o ato, no prazo art. 64, §§ 2º e 4º (45 dias, que não correm durante o recesso parlamentar); (f) os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio. (Silva, 2006, p. 243).
A conexão entre os meios de comunicação e a liberdade de expressão é essencial, visto que os meios englobam as ferramentas que ampliam as oportunidades das mais diversas formas de expressão, como a escrita e a representação visual.
Ato contínuo, o exercício do direito de se expressar não implica ausência de restrições éticas e morais. Consequentemente, a difamação não é tolerada, assim como atos de ultraje, pois desta forma existem direitos que deixariam de ser resguardados.
Quanto à garantia do direito a liberdade de expressão, deve ser mantida em todos os canais de comunicação bem como a internet, uma vez que com o avanço da tecnologia, se tornou o principal meio de comunicação dentre todos os existentes.
A proteção integral à liberdade de expressão é vista como essencial para a promoção de um debate público saudável, desenvolvimento intelectual e progresso social, onde o Estado desempenha o papel de guardião desse direito, assegurando que as vozes dissidentes e minoritárias tenham espaço para se expressar, mesmo que suas opiniões sejam impopulares.
No entanto, esse compromisso com a liberdade de expressão também pode enfrentar dilemas éticos quando discursos podem incitar violência ou prejudicar grupos marginalizados.
Por essa razão, surgem questionamentos, como por exemplo: até onde vai o direito a liberdade de expressão? Desse modo, pode-se concluir que não se trata de um direito absoluto, e deve ser exercido dentro dos limites impostos pela lei, caso contrário, poderá ser definido como abuso de direito.
A respeito disso, Cauê Bouzon Ribeiro (2023), a liberdade de expressão abrange a liberdade de crítica, mas, desde que de forma respeitosa, sem que haja mentiras ou palavras de baixo calão. O defensor público ainda complementa:
É interessante que a gente tenha discordância. A gente mora em um país democrático, a discordância é o coração da democracia. Mas a partir do momento em que a discordância vira discurso de ódio, a gente tem que combater. O limite do direito de liberdade de expressão se dá quando, sob essa pretensa liberdade, atinge-se a honra, a dignidade ou mesmo a democracia. Inclusive existem crimes, previstos no Código Penal, que definem a limitação da chamada liberdade de Expressão, como os crimes de injúria, difamação e calúnia.
A liberdade de expressão é usada por muitas pessoas como respaldo para justificar suas ações, mas, compreende-se que essa liberdade possui limites. Esses limites estão ligados, principalmente quando essa manifestação prejudica outros direitos fundamentais estabelecidos na CRFB/88.
Não se deve utilizar a liberdade de expressão como prerrogativa para difamar, injuriar e caluniar, causando prejuízos de natureza material ou moral a terceiros.
4.2 Liberdade e o abuso de poder sobre a eleição
Quando um candidato decide entrar na corrida por um posto eletivo, sua vida passa por uma investigação minuciosa e está sujeito a uma série de estimativas e rótulos, inclusive em relação a alegações de atividades ilícitas que possam ser (ou não) verdadeiras.
A atuação da Justiça Eleitoral deve ser restrita e focalizada, limitando-se a casos em que o uso excessivo da liberdade de expressão for evidente. A imputação de condutas criminosas faz parte do embate eleitoral, não no sentido técnico de cada delito, mas em um sentido figurativo, como por exemplo, o uso dos termos “ladrão” e “corrupto” em debates púbicos entre candidatos.
A respeito da liberdade de manifestação, automaticamente considera-se a liberdade de verbalizar, de sustentar pontos de vista e de apresentar ideias. E, de fato, esse é um aspecto do livre diálogo.
No entanto, existe ainda a liberdade informativa. A respeito disso, as pessoas se instruem por meio de relações, da mídia, plataformas de mídia social, programas televisivos, entre outros. A liberdade de expressão subsiste não apenas para permitir que as pessoas se comuniquem, mas principalmente para possibilitar que escutem e se informem. Constitui a dimensão social e coletiva da liberdade de expressão.
Resguardar a liberdade informativa contra discursos enganosos, tendenciosos, fora de contextos tem sido a principal preocupação da Justiça Eleitoral com o processo eleitoral. A disseminação de informações incorretas prejudica as discussões públicas, uma vez que o eleitorado pode moldar as opiniões não com base no que de fato é real, mas sim com base em estratégias para iludir e influenciar o discernimento das pessoas, levando-as a agir de acordo com as emoções e não a lógica.
Uma das principais táticas de desinformação consiste na utilização de discursos que empregam temas como a proteção da família, da infância e da fé, quer para suscitar sentimentos de apreensão, raiva e indignação, quer para explorar predisposições inerentes à natureza humana.
Em entrevista para o programa Eleições 2022, na TV Senado, o Professor de Gestão de Políticas Públicas, formado pela USP, Pablo Ortellado, mencionou que a liberdade de expressão pode ser pensada de várias maneiras e, que no Brasil este direito é pleno e livre, mas encontra limites nos direitos humanos, ou seja, sempre que a liberdade de expressão gerar um conflito com os direitos humanos, este exercício será limitado.
Em um caso concreto, muitos candidatos querem ter o direito de ter a liberdade de expressão, mas muitas vezes o oponente, quando o assunto não é agradável para si, não quer que o outro tenha a mesma liberdade que lhe é disposta. A respeito disso, Ortellado menciona:
O exercício da liberdade de expressão as vezes é muito incômodo. Precisam-se separar as coisas que afetam que incomodam pessoalmente, de não gostar de ser criticado, de não gostar de ser acusado de certas coisas, das coisas que violam direitos. Então, mesmo o direito de imagem e de honra que são mais pessoais, dentre outros direitos, como por exemplo, quando se trata de racismo, e discriminação de gênero, quando começam a entrar na seara dos direitos, é aí que a liberdade de expressão encontra limites e a lei brasileira tem os mecanismos para reparar essa violação de direitos. (Ortellado, 2022, entrevista concedida em 16/09/2022).
Quanto ao abuso do direito de voto, é previsto pelo artigo 14, §9º da Constituição Federal:
Art. 14 [...] §9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (CRFB, 1988).
José Jairo Gomes vê o poder como “domínio e controle sobre situações, recursos ou meios que permitem alcançar ou transformar algo”. Dessa forma, manifesta-se como força, resistência, o potencial para alcançar algo. A respeito das origens do abuso de poder, Gomes explana conforme ensinamentos de Mazzilli (2008, p. 238):
Nota-se, todavia, que o interesse público nem sempre coincide com o do Estado, como pessoa jurídica. Embora essas duas categorias possam aparecer reunidas em muitos casos, é preciso separá-las, sobretudo porque às vezes entram em conflito. Conforme sublinha Mazzilli (2002:42), nem sempre os governantes fazem o melhor para a coletividade: políticas econômicas ruinosas, guerras, desastres fiscais, decisões equivocadas, malbaratamento de recursos públicos e outras tantas ações daninhas não raro contrapõem governantes e governados, Estado, sociedade e indivíduos. (Gomes, 2008, p. 238).
Com efeito, este mesmo poder por ser utilizado de forma abusiva. O abuso de poder não possui definição explícita no ordenamento jurídico, no entanto, pode ser entendido como o uso excessivo de um direito que se possui, com a finalidade de satisfazer interesses diferentes dos previstos pelo texto legal, atribuindo-lhe um desvio de finalidade. Ato contínuo, para constituir o abuso de poder, é necessário o excesso e o mau uso, excesso e o desvio, que resultam da ultrapassagem de um limite ou padrão de comportamento imposto pela lei.
A respeito do excesso de poder, José dos Santos Carvalho Filho diz;
É a forma de abuso própria da atuação do agente fora dos limites de sua competência administrativa. Nesse caso, ou o agente invade atribuições cometidas a outro agente, ou se arroga o exercício de atividades que a lei não lhe conferiu. (Carvalho Filho, 2008, p. 40).
Ademais, o abuso de poder político é caracterizado quando o agente público usa de seu poder ou de seu cargo em benefício próprio ou de terceiro, para obter vantagens em meio ao processo eletivo, violando os princípios constitucionais previsto na legislação.
A despeito das “fake news" e da desinformação, são fatores que podem gerar problemas nas eleições. Como já mencionado, a disseminação deliberada de informações falsas através das redes sociais, pode influenciar o pensamento dos eleitores, levando a decisões baseadas em dados incorretos. Isso faz com que a capacidade dos cidadãos de tomarem certas decisões seja prejudicada, colocando em risco a legitimidade do resultado eleitoral e acarretando prejuízos a democracia.
Além disso, o abuso de poder sobre a eleição não se limita apenas à disseminação de informações falsas. Pode envolver também a manipulação do debate público, a polarização extrema e o uso indevido de recursos financeiros para promover candidatos específicos ou prejudicar adversários.
Com efeito, os cidadãos têm a responsabilidade de serem críticos quanto às informações que consomem e compartilham. Verificar fontes, consultar várias perspectivas e promover um debate respeitoso são elementos essenciais para fortalecer a esfera pública e reduzir a influência do abuso do poder nas eleições.
Por fim, as autoridades governamentais também têm um papel importante em assegurar que as leis existentes sejam aplicadas de maneira eficaz para prevenir a disseminação de desinformação e combater o uso indevido da liberdade de expressão para fins eleitorais. No entanto, é crucial que essas ações sejam conduzidas de forma transparente e respeitando os princípios democráticos, para evitar práticas autoritárias que possam prejudicar ainda mais a liberdade de expressão.
5.CONCLUSÃO
Em uma sociedade democrática, a liberdade de expressão é indiscutivelmente um dos direitos fundamentais mais preciosos. Ela representa a capacidade de indivíduos expressarem seus pensamentos, ideias e opiniões sem temor, fomentando um debate saudável e uma pluralidade de perspectivas.
No entanto, como qualquer direito, a liberdade de expressão não é absoluta e incondicional. A compreensão dos limites dessa liberdade é crucial para evitar abusos e preservar a integridade do sistema democrático.
Os limites da liberdade de expressão são estabelecidos quando o uso desse direito incita a violência, difamação, calúnia, discriminação ou quando representa uma ameaça direta à segurança nacional. O desafio reside na definição desses limites sem comprometer os princípios democráticos, uma vez que restrições excessivas podem facilmente ser exploradas para silenciar vozes dissidentes e prejudicar o direito fundamental em si.
No contexto das eleições, a liberdade de expressão ganha uma dimensão ainda mais crítica. As eleições são o meio pelo qual os cidadãos exercem a democracia, e a liberdade de expressão desempenha um papel crucial na formação da opinião pública e na tomada de decisões informadas pelos eleitores. Contudo, como exposto no artigo, a manipulação dessa liberdade para fins de abuso de poder pode distorcer o processo eleitoral e democrático e prejudicar a legitimidade.
O abuso de poder sobre as eleições acontece quando a liberdade de expressão é explorada para disseminar desinformação, espalhar fake News, criar divisões extremas ou promover candidatos através de meios ilícitos. Isso ressalta a necessidade de uma abordagem proativa por parte das plataformas de mídias sociais, dos órgãos reguladores e da sociedade para combater a propagação de informações falsas e garantir um ambiente informado e equilibrado durante os períodos eleitorais.
Ademais, o abuso de poder nas propagandas eleitorais, demonstra de forma clara a necessidade de limitação dos direitos fundamentais uma vez que, neste caso, a alegação do simples exercício da liberdade de expressão perde a sua validade. Assim, quando a igualdade de condições entre os candidatos é quebrada e exerce influência sobre a vontade dos votantes, os votos permanecem falhos e, considerando que a soberania popular se manifesta com o direito ao voto, o vício deste direito impacta a soberania popular.
A soberania popular por sua vez, é um elemento importante que constitui a definição do Estado democrático de direito, o que leva a entender que o abuso do poder na propaganda eleitoral, por ir contra as normas e princípios fundadores da democracia, é uma afronta à ordem democrática que deve ser contida.
Em conclusão, a liberdade de expressão e seu potencial abuso em relação às eleições exigem um delicado equilíbrio entre proteção dos direitos individuais e a proteção dos valores democráticos.
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graduando em Direito pelo Centro Universitário de Jales - UNIJALES
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOREIRA, Marcello Magnani. O direito e a liberdade de expressão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 nov 2023, 04:34. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/63744/o-direito-e-a-liberdade-de-expresso. Acesso em: 22 nov 2024.
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