RESUMO: O presente artigo aborda o direito ao meio ambiente de trabalho sadio e equilibrado, como um direito humano de terceira dimensão. O estudo revisa a literatura recente sobre a teoria dos direitos humanos, seu histórico e dimensões. O artigo também discute sobre os tratados internacionais sobre meio ambiente, motivados pela preocupação das nações com os impactos ambientais globais, como a mudança climática e a destruição de ecossistemas. Destaca, ainda, a importância das Convenções e Recomendações da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre meio ambiente de trabalho, especialmente após a inclusão do meio ambiente de trabalho sadio no rol de Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho defendidos pela OIT. Elenca as principais Convenções e Recomendações da OIT sobre meio ambiente de trabalho. Por fim, conclui-se que a implementação das Convenções e Recomendações da OIT pelos países promove um meio ambiente de trabalho sadio e equilibrado, com a prevenção de acidentes do trabalho e doenças decorrentes do trabalho.
Palavras-chave: Meio Ambiente de Trabalho, Direitos Humanos, Organização Internacional do Trabalho.
Sumário: Resumo; Introdução; 1. Histórico dos Direitos Humanos; 2. As Dimensões dos Direitos Humanos; 3. Os Tratados e Convenções Internacionais sobre Meio Ambiente; 4. As Convenções e Recomendações da OIT sobre Meio Ambiente de Trabalho; Conclusão; Bibliografia.
INTRODUÇÃO
O direito humano ao meio ambiente de trabalho equilibrado está previsto em diversos instrumentos internacionais de Direitos Humanos. Neste sentido, a Organização Internacional do Trabalho aprovou uma resolução para adicionar o princípio de um ambiente de trabalho seguro e saudável aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Com isso, a Convenção sobre Segurança e Saúde dos Trabalhadores, 1981 (Nº 155) e a Convenção do Quadro Promocional para a Segurança e Saúde Ocupacional, 2006 (Nº 187) se tornaram convenções fundamentais da OIT se observância obrigatória por todos os países membros da Organização.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 assegura a todos os trabalhadores o direito fundamental de redução dos riscos inerentes ao trabalho através de norma de higiene e segurança do trabalho (art. 7º, XXII). Temos assim um duplo dever do Estado Brasileiro de produzir essas normas de segurança e assegura que sejam cumpridas pelos particulares.
O meio ambiente do trabalho é a resultante da interação sistêmica de fatores naturais, técnicos e psicológicos ligados às condições de trabalho, à organização do trabalho e às relações interpessoais que condiciona a segurança e a saúde física e mental do ser humano exposto a qualquer contexto jurídico-laborativo (MARANHÃO, 2016).
O meio ambiente do trabalho só poderá ser considerado como equilibrado quando acomodar condições de trabalho seguras, organizações de trabalho sadias e relações interpessoais respeitosas, com a adoção de uma visão protetiva holística do ser humano (saúde física e mental).
Por outro lado, a definição de saúde pela Organização Mundial da Saúde (OMS), estabelecida em 1947, é considerada uma das mais amplas e influentes até hoje. Ela define saúde como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade” (OMS, 1946). Essa definição transcende a visão tradicional de saúde, que a associava apenas à ausência de doenças, e incorpora um conceito holístico que abrange as dimensões psicológicas e sociais do indivíduo.
A ideia de saúde como bem-estar completo sublinha a importância de fatores emocionais, psicológicos e sociais no cuidado e na promoção da saúde, e ainda serve de base para várias políticas públicas e práticas de saúde ao redor do mundo.
1.HISTÓRICO DOS DIREITOS HUMANOS
Os Direitos Humanos são princípios fundamentais destinados a garantir a dignidade e o bem-estar de todos os indivíduos, independentemente de raça, gênero, religião ou nacionalidade. Ao longo da história, esses direitos evoluíram, passando de privilégios de certos grupos para normas universais.
Na Antiguidade, civilizações como a Babilônia e a Grécia Antiga já possuíam princípios que se aproximavam da noção de direitos. O Código de Hamurábi, criado na Babilônia, é um dos primeiros documentos que buscou estabelecer regras de justiça e punições proporcionais aos crimes cometidos (HOBHOUSE, 1922). Embora limitado e restrito a grupos específicos, este código influenciou a concepção de justiça como princípio orientador.
No período clássico, o pensamento filosófico de Sócrates, Platão e Aristóteles explorou temas como a justiça e a igualdade, porém o conceito de direitos individuais ainda era restrito. Durante a Idade Média, a filosofia cristã trouxe a ideia de dignidade humana, mas com forte influência da moral religiosa e dos direitos limitados a certos grupos (NOVAIS, 2003).
O Iluminismo foi essencial para a evolução dos direitos humanos, com filósofos como John Locke, Montesquieu e Rousseau defendendo os direitos naturais do homem e a necessidade de limitar o poder do Estado. Segundo Locke (1690), os direitos naturais à vida, liberdade e propriedade deveriam ser garantidos por um contrato social entre governantes e governados.
O pensamento iluminista inspirou as Revoluções Americana e Francesa, culminando na Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776) e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), na França. Estas declarações formalizaram a ideia de que todos os cidadãos possuíam direitos inalienáveis, representando um avanço no reconhecimento dos direitos humanos, embora ainda limitados a homens proprietários (HUNT, 2007).
No século XX, a devastação das Guerras Mundiais evidenciou a necessidade de um sistema internacional para proteger os direitos humanos. Em 1945, a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) reforçou esse compromisso e levou à elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que estabeleceu 30 artigos com direitos fundamentais para todos os seres humanos (ONU, 1948).
A Declaração Universal, elaborada por figuras como Eleanor Roosevelt e René Cassin, representa um marco na proteção internacional dos direitos humanos, pois introduziu um conjunto de normas universais que influenciou legislações e tratados globais subsequentes (GLENDON, 2001).
Nas décadas seguintes, diversos tratados e convenções foram desenvolvidos para reforçar a proteção de grupos vulneráveis, como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979) e a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989). Organizações não governamentais e movimentos civis também foram fundamentais para expandir e exigir o cumprimento desses direitos, destacando-se a luta contra o racismo, a discriminação de gênero e os direitos LGBTQIA+ (FREEMAN, 2011).
2.AS DIMENSÕES DOS DIREITOS HUMANOS
Os direitos humanos se constituem em normas fundamentais para garantir dignidade e justiça a todos os indivíduos. Desde sua origem, os direitos humanos foram entendidos e aplicados em diferentes esferas e contextos históricos, o que permitiu o desenvolvimento de suas diversas dimensões. A teoria das “gerações” ou “dimensões” dos direitos humanos foi popularizada por Karel Vasak, que organizou os direitos humanos em três grandes grupos (VASAK, 1977).
A primeira dimensão dos direitos humanos é composta pelos direitos civis e políticos, também conhecidos como direitos de liberdade. Esses direitos surgem a partir das Revoluções Americana e Francesa, no final do século XVIII, fundamentados nas ideias iluministas e liberais. Estes direitos incluem o direito à vida, à liberdade de expressão, ao voto, à igualdade perante a lei e à segurança, que são essenciais para a proteção da autonomia individual (BOBBIO, 1992).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966) foram marcos na consolidação dessa primeira dimensão. Esses documentos garantem, entre outros, o direito ao devido processo legal, à liberdade de opinião e ao direito de participar da vida política. No entanto, essa dimensão tem uma limitação: exige a proteção do Estado, mas não necessariamente a provisão de condições sociais e econômicas adequadas (BENEVIDES, 2000).
A segunda dimensão dos direitos humanos corresponde aos direitos econômicos, sociais e culturais, conhecidos como direitos de igualdade. Esta dimensão reflete a necessidade de igualdade material e visa garantir condições dignas de vida para todos, incluindo direitos ao trabalho, à saúde, à educação, à moradia e à seguridade social. Estes direitos se popularizaram no século XX, com o avanço dos movimentos sociais e das lutas por justiça social (PIOVESAN, 2005).
O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) reforçou esses direitos no plano internacional, reconhecendo a importância do desenvolvimento socioeconômico e cultural para a dignidade humana. Embora esses direitos exijam ação positiva do Estado, como políticas de distribuição e acesso, eles são interdependentes dos direitos civis e políticos. Sem condições econômicas adequadas, o pleno exercício dos direitos civis é comprometido (DWORKIN, 1984).
A terceira dimensão dos direitos humanos é composta por direitos de solidariedade, também chamados de direitos de terceira geração, que incluem direitos coletivos e difusos, como o direito ao meio ambiente saudável, à paz e ao desenvolvimento. Esses direitos se originam das demandas da sociedade global, principalmente a partir da década de 1970, quando o mundo passou a enfrentar problemas globais que requerem a cooperação internacional (VASAK, 1977).
Esse grupo reflete a conscientização de que a proteção e o desenvolvimento dos direitos individuais e sociais dependem de um ambiente coletivo saudável e sustentável. Documentos como a Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano (1972) e a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento (1986) evidenciam o papel desses direitos para as futuras gerações. Os direitos de terceira dimensão destacam a interdependência global, enfatizando que questões como desenvolvimento sustentável e paz mundial necessitam de um esforço conjunto dos países (PIOVESAN, 2005).
Embora organizados em diferentes dimensões, os direitos humanos são interdependentes e indivisíveis. O pleno exercício de um direito depende do respeito e da efetivação dos demais. Por exemplo, o direito à liberdade de expressão é limitado sem a educação, um direito de segunda dimensão, e o direito ao desenvolvimento, da terceira dimensão, é inviável sem condições econômicas e sociais adequadas. Essa interdependência é reconhecida pela ONU, que promove um sistema internacional de proteção dos direitos humanos baseado na indivisibilidade desses direitos (GLENDON, 2001).
3.OS TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS SOBRE MEIO AMBIENTE
A crescente preocupação com os impactos ambientais globais levou à elaboração de tratados e convenções internacionais que buscam proteger o meio ambiente e promover o desenvolvimento sustentável. Essas iniciativas foram motivadas pelo reconhecimento de que questões ambientais, como a mudança climática e a destruição de ecossistemas, ultrapassam fronteiras e exigem cooperação global. Este artigo revisa os principais tratados e convenções internacionais, abordando seu contexto histórico, seus objetivos e o impacto na governança ambiental.
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em 1972, é considerada um marco inicial para a governança ambiental internacional. A Declaração de Estocolmo estabeleceu 26 princípios fundamentais para a proteção do meio ambiente, reconhecendo a importância da sustentabilidade e introduzindo o conceito de que o desenvolvimento econômico deve ser compatível com a conservação ambiental (STRONG, 1992).
A Conferência de Estocolmo resultou na criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), com o objetivo de coordenar as atividades ambientais e promover o desenvolvimento sustentável em nível global (UNEP, 1972). Esse evento foi fundamental para a inclusão das questões ambientais na agenda internacional e lançou as bases para futuros tratados.
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC) foi adotada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Rio-92 ou Eco-92. Este tratado internacional busca estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera, de modo a prevenir interferências perigosas no sistema climático (UNFCCC, 1992). A UNFCCC reafirmou o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, que orienta a cooperação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Em 1997, o Protocolo de Kyoto foi introduzido como uma extensão da UNFCCC, estabelecendo metas vinculantes para a redução de emissões de gases de efeito estufa para os países industrializados. Embora o Protocolo tenha sido um avanço significativo, sua eficácia foi limitada pela ausência de alguns dos maiores emissores, como os Estados Unidos, e por dificuldades na implementação (BODANSKY, 2001).
A Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB), também criada na Rio-92, é um tratado internacional que visa a conservação da biodiversidade, o uso sustentável dos recursos biológicos e a partilha justa dos benefícios derivados da utilização de recursos genéticos (CBD, 1992). A CDB reconhece o papel das comunidades locais na conservação e estabeleceu protocolos como o Protocolo de Nagoya (2010), que regulamenta o acesso aos recursos genéticos e a repartição dos benefícios.
A CDB é significativa porque reconhece a biodiversidade como patrimônio comum da humanidade e incentiva práticas sustentáveis de uso dos recursos naturais. No entanto, os desafios permanecem, pois a perda de biodiversidade continua em ritmo alarmante, principalmente devido à exploração insustentável e à degradação ambiental (CHAPE et al., 2005).
O Acordo de Paris, adotado durante a 21ª Conferência das Partes (COP21) da UNFCCC, é um marco na cooperação internacional para a mitigação das mudanças climáticas. Este acordo substituiu o Protocolo de Kyoto e estabeleceu o objetivo de limitar o aumento da temperatura global a menos de 2°C acima dos níveis pré-industriais, com esforços para manter esse aumento em até 1,5°C (UNFCCC, 2015).
Ao contrário do Protocolo de Kyoto, o Acordo de Paris inclui compromissos para todos os países, considerando suas responsabilidades e capacidades. O acordo introduziu o conceito de “Contribuições Nacionalmente Determinadas” (NDCs), onde cada país define suas metas de redução de emissões e adaptação. Apesar de amplamente celebrado, o Acordo de Paris enfrenta desafios em sua implementação, pois depende da cooperação voluntária dos Estados e de esforços constantes para reduzir emissões globais (STERN, 2016).
A Convenção de Estocolmo, adotada em 2001, visa proteger a saúde humana e o meio ambiente contra poluentes orgânicos persistentes (POPs), que incluem substâncias químicas tóxicas capazes de se acumular em organismos vivos e se espalhar globalmente (CONVENÇÃO DE ESTOCOLMO, 2001). Esse tratado é importante por ser um dos primeiros a estabelecer medidas de proibição e controle de substâncias químicas perigosas em escala global, evidenciando o impacto das atividades humanas na saúde ambiental.
Por fim, a Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) consolidam a integração das questões ambientais com o desenvolvimento social e econômico. Em 2023, a Declaração Política reafirmou esses compromissos, destacando a urgência de ações transformadoras para enfrentar crises interligadas, como mudanças climáticas, desigualdades sociais e perda de biodiversidade.
OS Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são os seguintes:
- Objetivo 1. Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares;
- Objetivo 2. Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável;
- Objetivo 3. Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades;
- Objetivo 4. Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos;
- Objetivo 5. Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas;
- Objetivo 6. Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos;
- Objetivo 7. Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos;
- Objetivo 8. Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos;
- Objetivo 9. Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação;
- Objetivo 10. Reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles;
- Objetivo 11. Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis;
- Objetivo 12. Assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis;
- Objetivo 13. Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos;
- Objetivo 14. Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável;
- Objetivo 15. Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade;
- Objetivo 16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis;
- Objetivo 17. Fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.
4.AS CONVENÇÕES E RECOMENDAÇÕES DA OIT SOBRE MEIO AMBIENTE DE TRABALHO
A OIT, criada em 1919 e vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), busca a proteção e a promoção dos direitos dos trabalhadores em âmbito global, sendo a única agência tripartite, composta por representantes de governos, empregadores e trabalhadores. Suas convenções e recomendações formam a base do sistema internacional de normas trabalhistas e são adotadas por seus Estados-membros em esforços para estabelecer padrões mínimos em várias áreas, como saúde e segurança no trabalho, igualdade de oportunidades, condições de trabalho e proteção social.
As convenções da OIT são tratados internacionais que, uma vez ratificados pelos Estados-membros, possuem caráter vinculativo. Estes tratados estabelecem normas mínimas que os países signatários se comprometem a implementar em sua legislação e práticas nacionais. Cada convenção aborda um tema específico, como jornada de trabalho, trabalho infantil, discriminação e direito à sindicalização.
As recomendações da OIT, ao contrário das convenções, não têm caráter vinculativo. Elas são diretrizes que complementam as convenções ou abordam temas ainda não tratados em convenções. Embora não exijam ratificação, as recomendações representam padrões que os Estados-membros são incentivados a seguir para aprimorar suas legislações e práticas trabalhistas.
Em 1998, a Assembleia Geral da OIT aprovou a “Declaração Relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho”, reafirmando os princípios essenciais para a promoção da dignidade humana, da justiça social e da paz mundial: Liberdade Sindical e Reconhecimento Efetivo do Direito à Negociação Coletiva; Eliminação de Todas as Formas de Trabalho Forçado ou Obrigatório; Abolição do Trabalho Infantil; e Eliminação da Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação.
Recentemente, em junho de 2022, durante a 110ª Conferência Internacional do Trabalho, a OIT incluiu o ambiente de trabalho seguro e saudável no quadro de princípios e direitos fundamentais da OIT (ILC.110/Resolução I). Por meio dessa resolução, reconheceu-se a fundamentalidade das Convenções nºs 155 e 187, que aglutinam o "trabalho seguro e saudável" como a quinta categoria dos princípios e direitos fundamentais no trabalho.
A seguir comentaremos as principais Convenções e Recomendações da OIT voltadas para o meio ambiente de trabalho:
A Convenção n.º 155 - Segurança e Saúde dos Trabalhadores e Meio Ambiente de Trabalho (1981) é uma das convenções mais abrangentes da OIT sobre segurança e saúde no trabalho. Trata-se de uma das 10 (dez) Convenções Fundamentais da OIT, sendo de observância obrigatória por todos os países membros, independentemente de a terem ratificado. Ela estabelece diretrizes para o desenvolvimento de políticas nacionais de segurança e saúde ocupacional, e para o ambiente de trabalho, abordando: a obrigação dos governos de formular, implementar e revisar periodicamente políticas de segurança e saúde ocupacional; a necessidade de empregadores e trabalhadores cooperarem para garantir um ambiente de trabalho seguro; a implementação de medidas preventivas para minimizar os riscos no trabalho. A convenção incentiva a criação de um ambiente seguro e saudável, reforçando a importância de monitorar e supervisionar as condições de trabalho.
A Convenção n.º 161 - Serviços de Saúde do Trabalho (1985) trata especificamente da organização de serviços de saúde ocupacional dentro das empresas, visando proteger e promover a saúde dos trabalhadores e prevenir doenças relacionadas ao trabalho. Ela estabelece a criação de serviços de saúde no trabalho que realizem vigilância ambiental e monitorem a saúde dos trabalhadores e a obrigatoriedade de que esses serviços tenham uma abordagem preventiva, visando reduzir e controlar os riscos ocupacionais. Essa convenção é fundamental para assegurar que a saúde dos trabalhadores seja monitorada continuamente e que o ambiente de trabalho seja adaptado para reduzir possíveis riscos à saúde.
A Convenção n.º 187 - Estrutura Promocional para a Segurança e Saúde no Trabalho (2006) visa promover a segurança e saúde no trabalho por meio de uma estrutura organizacional nacional que fomente a melhoria contínua das condições de trabalho e a prevenção de acidentes e doenças ocupacionais. Assim como a Convenção nº 155, a Convenção nº 187 é uma das 10 (dez) Convenções Fundamentais da OIT, sendo de observância obrigatória por todos os países membros, independentemente de a terem ratificado. Ela inclui a criação de uma cultura de segurança e saúde, incentivando a adesão de governos, empregadores e trabalhadores; o fortalecimento das normas e dos sistemas de gestão de segurança e saúde; e a implementação de programas de prevenção e de políticas que promovam ambientes de trabalho seguros e saudáveis. Essa convenção tem o objetivo de estruturar políticas e práticas que fomentem a segurança de forma abrangente e contínua.
A Convenção n.º 184 - Segurança e Saúde na Agricultura (2001), embora focada na agricultura, trata de vários aspectos relevantes para a segurança e a saúde em ambientes de trabalho, abordando práticas seguras em um setor frequentemente exposto a riscos físicos, químicos e biológicos. A Convenção n.º 184 inclui a implementação de medidas de segurança para proteger os trabalhadores contra produtos químicos, uso de máquinas e condições de trabalho adversas; a responsabilidade dos empregadores de fornecer informações e treinamentos sobre práticas seguras de trabalho; e a proteção específica para trabalhadores vulneráveis, incluindo jovens trabalhadores e trabalhadores temporários.
A Convenção n.º 170 - Segurança na Utilização de Produtos Químicos no Trabalho (1990) trata da segurança no uso de produtos químicos, que representam um risco significativo em vários setores. Ela estabelece obrigações para governos e empregadores em relação ao manuseio, rotulagem e transporte de produtos químicos. Entre suas diretrizes estão a implementação de políticas nacionais para o controle e monitoramento do uso de produtos químicos; a exigência de que os produtos químicos sejam identificados e rotulados adequadamente para prevenir acidentes; e a obrigação dos empregadores de garantir que os trabalhadores estejam informados e treinados sobre os riscos associados aos produtos químicos.
A Convenção n.º 174 - Prevenção de Acidentes Industriais Maiores (1993) é voltada para a prevenção de acidentes industriais graves, especialmente aqueles que envolvem substâncias perigosas. Ela exige que os governos implementem políticas para prevenir e minimizar os efeitos de acidentes de grande magnitude. As principais medidas incluem a necessidade de os empregadores identificarem e controlarem os riscos de acidentes industriais; a implementação de sistemas de emergência para responder a acidentes e minimizar seus impactos; e a obrigação dos Estados de cooperar em nível internacional para prevenir acidentes que possam ter efeitos além das fronteiras nacionais.
A Recomendação n.º 164 - Segurança e Saúde dos Trabalhadores (1981) complementa a Convenção n.º 155 sobre segurança e saúde no trabalho. Ela fornece diretrizes detalhadas sobre a implementação de sistemas de gestão de segurança e saúde no trabalho, com foco na criação de políticas nacionais e locais para promover a saúde dos trabalhadores e um ambiente de trabalho seguro. A recomendação enfatiza a necessidade de identificar e avaliar todos os riscos potenciais presentes no ambiente de trabalho, incentiva a participação ativa dos trabalhadores na identificação de riscos e na implementação de medidas preventivas e recomenda programas de formação contínua para empregadores e trabalhadores sobre saúde e segurança.
A Recomendação n.º 171 - Segurança no Trabalho e Saúde no Setor da Construção (1988) aborda especificamente os desafios do setor da construção, que é particularmente vulnerável a acidentes e problemas de saúde. Ela destaca as melhores práticas para garantir um ambiente de trabalho seguro nesse setor, incluindo o manuseio de materiais perigosos, a utilização de equipamentos pesados e as condições de trabalho em altura; medidas de segurança relacionadas a práticas de construção, equipamentos e condições de trabalho em locais temporários e de difícil acesso; e enfatiza a importância de formar os trabalhadores para as especificidades do setor, promovendo a segurança.
A Recomendação n.º 187 - Estrutura Promocional para a Segurança e Saúde no Trabalho (2006) oferece diretrizes práticas sobre como os governos podem criar uma estrutura institucional para promover e melhorar as condições de saúde e segurança no trabalho. Ela sugere a criação de comissões nacionais e sistemas de monitoramento para garantir a implementação efetiva das políticas de segurança e saúde. As principais orientações incluem: a criação de políticas públicas para promover a cultura de segurança e saúde no trabalho; incentivo a programas contínuos de treinamento para melhorar a conscientização e a formação em segurança; e a recomendação sugere que os governos, empregadores e trabalhadores se envolvam ativamente na formulação e implementação de políticas de segurança.
A Recomendação n.º 203 - Trabalho Decente nas Cadeias de Suprimentos (2016), embora não trate exclusivamente do meio ambiente de trabalho no sentido tradicional (como segurança física), essa recomendação aborda a questão da responsabilidade social das empresas e a criação de condições de trabalho dignas ao longo das cadeias de suprimentos globais. A recomendação sugere que as empresas adotem práticas responsáveis em relação aos seus trabalhadores, promovendo ambientes de trabalho seguros e saudáveis, não apenas em suas instalações, mas também nas de seus fornecedores. A recomendação também promove o diálogo entre empregadores, trabalhadores e governos (diálogo social) para garantir condições de trabalho justas e seguras, tanto em nível local quanto global.
A Recomendação n.º 201 - Trabalho e Meio Ambiente: Transição Justa (2015) trata da interseção entre os direitos dos trabalhadores e as questões ambientais, enfatizando a transição justa para uma economia verde. Embora tenha um enfoque mais amplo, a recomendação propõe medidas para garantir que as mudanças para práticas mais sustentáveis no trabalho não resultem em perda de empregos ou em ambientes de trabalho inseguros. A recomendação enfatiza a necessidade de programas de requalificação para trabalhadores que possam ser impactados pelas transições para setores mais verdes e sustentáveis.
CONCLUSÃO
As convenções da OIT sobre segurança e meio ambiente de trabalho formam uma estrutura normativa essencial para garantir a proteção dos trabalhadores e a prevenção de acidentes e doenças ocupacionais. Elas visam criar ambientes de trabalho equilibrados e saudáveis, proteger a saúde dos trabalhadores e assegurar que as empresas e os governos adotem práticas responsáveis e preventivas. Essas normas são de grande relevância em um contexto de crescente complexidade nas relações de trabalho e nas práticas industriais, refletindo a importância de se garantir que os avanços econômicos e tecnológicos estejam alinhados com a proteção da saúde e do bem-estar dos trabalhadores.
As Recomendações da OIT sobre o meio ambiente de trabalho, por sua vez, têm um papel crucial no fornecimento de diretrizes práticas e detalhadas que complementam as convenções vinculativas. Elas orientam os países na implementação de políticas públicas eficazes para garantir que as condições de trabalho sejam seguras, saudáveis e sustentáveis, levando em consideração as necessidades e os direitos dos trabalhadores em diferentes setores. Essas recomendações reforçam o compromisso da OIT com a promoção de um ambiente de trabalho equilibrado, saudável e digno para todos os trabalhadores, independentemente de sua profissão ou local de trabalho.
A ratificação e implementação das convenções da OIT por países membros resultam na criação de marcos legais nacionais que estabelecem obrigações para empregadores e trabalhadores, bem como para o governo, em relação à segurança e saúde no trabalho. Essas obrigações incluem a criação de políticas públicas, regulamentos, fiscalização e a implementação de programas de segurança no trabalho.
As convenções da OIT, como a Convenção nº 187 sobre Estrutura Promocional para a Segurança e Saúde no Trabalho (2006), incentivam a criação de uma cultura de segurança nas empresas e em toda a sociedade. Isso envolve a adoção de práticas preventivas que buscam eliminar ou reduzir riscos antes que eles se materializem em acidentes. Empresas que adotam uma cultura de segurança baseada em políticas e práticas preventivas, como a avaliação de riscos e a formação de trabalhadores, têm menores taxas de acidentes.
A redução de doenças ocupacionais é um outro impacto importante das convenções e recomendações da OIT. A exposição prolongada a condições de trabalho insalubres pode levar a doenças como problemas respiratórios, doenças cardiovasculares, câncer e distúrbios musculoesqueléticos. A OIT recomenda práticas que previnem tais doenças, incluindo a melhoria das condições de ventilação, o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e a eliminação de substâncias tóxicas do ambiente de trabalho.
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Atua como Auditor-Fiscal do Trabalho desde 2007 na área de Segurança e Saúde do Trabalho. Foi Diretor do Departamento de Segurança e Saúde do Trabalho do Ministério do Trabalho (DSST) e Coordenador da Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP) de 2018 e 2019. Atualmente é Chefe da Seção de Fiscalização de Segurança e Saúde do Trabalho da Superintendencia Regional do Trabalho de Mato Grosso do Sul. Possui a seguinte formação: Bacharel em Ciências Militares, AMAN/1997. Engenheiro Aeronáutico, ITA/2004. Engenheiro de Segurança do Trabalho, Logatti, 2008. Bacharel em Direito, UNIARA, 2012. Especialista em Direito e Processo do Trabalho, UNIARA, 2014. Especialista em Processo Civil, DOM ALBERTO, 2020. Especialista em Direitos Humanos Internacionais, FACUMINAS, 2024. Especialista em Direitos Difusos e Coletivos, FACUMINAS, 2024. Especialista em Direito Ambiental, FACUMINAS, 2024.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E. O direito ao meio ambiente de trabalho sadio e equilibrado como um direito humano de terceira dimensão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 fev 2025, 04:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigo/67806/o-direito-ao-meio-ambiente-de-trabalho-sadio-e-equilibrado-como-um-direito-humano-de-terceira-dimenso. Acesso em: 19 fev 2025.
Por: DAYVISSON CRISTIANO MOREIRA
Por: KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E SILVA
Por: KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E SILVA
Por: KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E SILVA
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