O espanhol Carlos Saura, produtor do filme “Cria corvos, e eles te arrancarão os olhos”, protagoniza um pouco dessa metamorfose em, que está submetido 15 milhões de trabalhadores e empregadores, reféns da justiça especializada, onde a lentidão, leniência e violação as regras mais elementares de direito e nas de relações com a sociedade, são uma constante. O enredo tem como personagem, (...) Ana, com apenas nove anos, vê os pais morrerem no espaço de um ano a mãe, sofrendo intensas dores, agoniza diante de Ana, com o que se supõe seja uma hemorragia uterina, após longa doença; o pai morre algum tempo depois, no leito do casal, numa relação sexual com a mulher de seu melhor amigo. O filme foi lançado no ano da morte do General Francisco Franco e mostra uma Espanha ainda soturna, vivendo sob a sombra da ditadura – formada por militares, Igreja Católica e outros expoentes de direita – que dominou o país por 40 anos. É a velha Espanha e a Espanha que está nascendo, representada por Ana, cheia de culpas e, assim como a Espanha pós Franco, buscando um futuro nobre, mas aprisionada pelo passado.
Não discutimos aqui a questão da lei, da jurisprudência e da necessidade da entrega da mais valia e de sua forma forçosa na execução, matéria que cabe aos próprios jurisdicionados analisar e debater em fóruns apropriados. Questionamos o modelo de justiça, que subtrai a ideologia trabalhista para uma atividade de domínio e controle judicializado, sem comprovado resultado benéfico ao trabalhador. Se por um lado temos registro de que existem 93 milhões de ações em andamento no judiciário brasileiro, isso em decorrência das anomalias nas questões das relações de negócios, crimes contra o consumidor, descumprimento das regras trabalhistas e outros, por outro, podemos dizer que mais da metade está engessada por culpa da judicialização, e na justiça do trabalho, especialmente, esse instituto é o responsável pelo atrofiamento dos processos.
A Constituição Federal de 1988, em seu Art. 196 prevê a saúde como direito de todos e dever do Estado. O Estado, como forma de concretizar este direito atua através do Sistema Único de Saúde (SUS), que buscar se integral e universal. Como dito anteriormente, no entanto, o direito à saúde, como outros direitos enumerados na Constituição de 1988, foi criado tendo em mente a sua concretização futura. Já a CLT foi criada para garantir ao trabalhador a sua mais valia, e isso o Estado delegou ao manejo de juízes, o que deriva para uma situação em que ele resolve dar ganho de causa, mas não consegue entregar o produto da sua decisão.
O universo do direito e seus juristas atentam que o Poder Judiciário foi concebido como politicamente neutro. Isso é decorrente do princípio da legalidade, ou seja, os tribunais existem para aplicar o direito, as leis que são produzidas essencialmente pelo Poder Legislativo. Além disso, têm a sua atuação condicionada à procura de quem a necessita. Cappelletti e Dworki proclamam que o sistema judicial é baseado em uma perspectiva pragmática onde o foco está nos sistemas legais e nas suas condições de imposição no Ocidente moderno. Para eles a reestruturação do papel do Judiciário e a invasão do direito em áreas onde antes sua presença não era notada são nada mais que uma extensão da tradição democrática a setores pouco integrados a sua ordem. Assim, valoriza-se o ativismo judicial considerando os magistrados como guardiões dos princípios e valores fundamentais. Mas, eu particularmente, permissa venia, entendo isso não os autoriza a ponto de prejudicar que a ação se resolva de forma célere.
A introdução ilustrativa no topo da matéria assegura que estou, expondo uma situação gravíssima, invisível ao leigo, todavia de forte impacto no processo. Serve, na concepção desse jornalista, como paradigma para os que defendem a todo custo à ampliação da justiça do trabalho, (e outras justiças) com mais varas, serventuários e juízes, como se essa fosse à única ou a melhor solução, quando na verdade estamos aqui criando nossos corvos, que por analogia do filme de Saura, “arrancarão nossos olhos”, causando dano irreparável, com efeito, e consequência da morosidade deste judiciário. È importante frisar que nos dias de hoje, diante dos novos eventos nas relações de trabalho, é necessário o uso de técnicas de julgamento mais apuradas, enxutas, objetivas e de praticidade com resultado.
São temas que se tornam um desafio ao operador do direito que ainda não dispõe de ferramentas especializadas ou de códigos que possam subsidiar seus argumentos e decisões. Um desses exemplos nas relações de trabalho é a questão dos sites sociais, onde um grupo de juristas defende que não deve ocorrer o bloqueio total do acesso a sites alheios ao interesse da empresa, deixando a critério do próprio trabalhador, para que não tenha queda de produtividade e comprometimento onde suas tarefas, enquanto os técnicos de RH indicam que seja o ponto de incorrer em desídia no desempenho de suas funções, causa de demissão por justa causa, conforme previsão do art. 482, e da CLT.
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