RESUMO: A presente pesquisa tem por objetivo identificar os diversos elementos que fazem com que o sistema tributário brasileiro seja complexo em relação aos outros dos demais estados soberanos, bem como o elo que faz com que isso influencie as relações tributárias, com ênfase nos efeitos ao empreendedor, o que ocasiona na decisão do contribuinte empreendedor de, por livre arbítrio, não cumprir com as devidas obrigações tributárias. No entanto, a vontade do contribuinte é de cumprir com as obrigações, e este só não o faz porque corre o risco de prejudicar seu empreendimento de forma irreversível, visto que, a maioria dos empreendedores, dispõe de poucos recursos financeiros. Para que o resultado fosse alcançado, foi utilizado o método de levantamento bibliográfico para elaboração do artigo. A partir do mencionado levantamento bibliográfico, observa-se a complexidade do sistema tributário brasileiro e como essa complexidade prejudica do empreendedor na hora de cumprir as obrigações tributárias. Nesse contexto, o presente artigo tem por objetivo identificar as possíveis soluções para que a causa da inadimplência do empreendedor contribuinte deixe de ser o próprio Estado.
PALAVRAS-CHAVE: Compliance tributário. Empreendedor contribuinte. Marginalização. Obrigação tributária.
TAX COMPLIANCE IN BRAZIL: MARGINALIZATION OF THE CONTRIBUTING ENTREPRENEUR BY THE STATE
ABSTRACT: The present research aims to identify the various elements that make the Brazilian tax system complex in relation to other sovereign states, as well as the link that makes it influence tax relations, with emphasis on the effects on other sovereign states, which leads to the taxpayer's education that, by free will, he does not fulfill his tax obligations as he did. However, the taxpayer must comply with the will, and he just doesn't do it because he runs the risk of irreversibly harming his enterprise, most entrepreneurs, since they have few financial resources. In order to obtain the result obtained, the graphical method was used for the article. From the bibliographic survey, observe the complexity of the Brazilian tax system and how this complexity of the entrepreneur when fulfilling tax obligations. In this context, this article aims to identify possible solutions so that the cause of default by the entrepreneur taxpayer allows the State itself.
KEYWORDS: Tax Compliance. Contributing entrepreneur. Marginalization. Tax obligation.
1.INTRODUÇÃO
O Sistema tributário complexo do Brasil impõe dificuldades para a regularização tributária do empreendedor iniciante. O Brasil é conhecido por ter um sistema tributário complexo, mas nos últimos dois anos quando o mundo viveu uma pandemia e muitas pessoas perderam seus empregos, muitas destas tiveram que se reinventar para garantir o próprio sustento e resolveram empreender, uma vez que hoje esse mundo é mais acessível por conta da internet e outros meios eletrônicos, o que gerou um crescimento perto de 76% no país. Entrando no mundo do Direito Tributário, quantos desses empreendedores estão adimplentes com as obrigações tributárias? A resposta é simples: a maioria. Mas por que isso ocorre? Será que é da vontade dos empreendedores se manter nesse estado de regularidade? É obvio que não, isso ocorre pelo simples fato de que o sistema tributário brasileiro impõe dificuldades pelo fato dos diversos regimes tributários existentes e, uma vez que é feita a escolha pelo regime tributário incorreto, o fisco poderá cobrar mais do que o contribuinte possa pagar, o que gera o fenômeno da marginalização do contribuinte pelo fisco.
O problema tributário no Brasil é antigo, mas esse problema só está em evidência atualmente pelo fato do aumento exponencial de empreendedores, principalmente pelos meios digitais, o que gera a incidência do fato gerador de diversos tributos, mas ao mesmo tempo ofisco brasileiro não recebe o pagamento desses tributos pelo simples fato de que os empreendedores escondem sua atividade empresarial do estado, uma vez que a tributação excessiva pode levar à falência o empreendedor.
Nesse contexto, essa pesquisa se justifica por se tratar de um problema grave e atual. Pode-se afirmar, de forma preliminar, que o Estado brasileiro está deixando de arrecadar por culpa de si próprio, o que prejudica não só os cofres públicos, como também a economia e principalmente o contribuinte, que acaba sendo o maior prejudicado por ser posto em irregularidade tributária quase de forma compulsória.
Portanto, o tema a ser pesquisado é justificado pela grande contribuição acadêmica e social, uma vez que as análises que serão feitas de forma aprofundada poderão elevar o nível crítico de um problema grave em nosso sistema jurídico tributário e que vem passando quase que despercebido, dando a oportunidade para o acadêmico adquirir mais expertise nesse setor.
2. DIFICULDADES DO EMPREENDEDOR DIANTE DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO
O sistema tributário utilizado no Brasil é conhecido mundo à fora por ser um dos mais complexos do mundo. diferente de muitos países desenvolvidos da Europa, onde os Estados arrecadam mediante único tributo sob o valor agregado, no Brasil temos a divisão por competências entre os municípios, estados-membros da federação e união, cada um com hipótese de incidência única, somando, ao todo, cerca de aproximadamente 92 tributos, o que faz com que o país tenha uma das maiores cargas tributárias do mundo. (Torres, Vitor, 2022)
Apesar de ter uma das economias mais importantes do cenário global, se engana quem pensa que empreender no Brasil é algo simples, uma vez que figura no país a cultura do não pagamento de tributos, sendo que grande parte desse problema é gerada não só pela carência de educação fiscal através de programas governamentais, mas como também pela falta de recursos do empreendedor, ainda mais os que estão iniciando seu próprio negócio. A verdade é que com essa carga tributária excessiva e complexa, o próprio Estado marginaliza o empreendedor, uma vez que estes escolhem não pagar os tributos para não prejudicar suas respectivas subsistências e até mesmo seus empreendimentos.
3. SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO
3.1 Histórico do sistema tributário do Brasil
Desde o período da chegada dos europeus ao território brasileiro, foram estabelecidos entre estes e os habitantes nativos relações de troca, ato que ficou historicamente conhecido como escambo, onde os nativos trocavam recursos naturais que interessavam aos europeus, como madeira, peles de animais, dentre outros, em troca de coisas simples como espelhos ou até mesmo pentes de cabelo.
Através da transcrição de Negreiros feita por Coelho, é possível identificar que enquanto o Brasil era colônia de Portugal, ou seja, antes da independência, não havia um sistema de recolhimento de tributos organizado:
A ausência de um sistema tributário, bem como os abusos na exigência de tributos em terras brasileiras por parte da Metrópole, pode ser observado no seguinte relato: [...] a recente presença portuguesa no Brasil não permitia um sistema organizado de arrecadação de impostos, mas apenas algumas indicações. Também não existia um sistema tributário sistematizado, como não havia preocupações de caráter orçamentário. Aliás, preocupação que não esteve na pauta dos colonizadores em nenhum momento; saber exatamente quando seriam arrecadados e como esses valores seriam gastos parece que só foi prática vigente a partir da emancipação política (AMED; NEGREIROS, 2000, p. 46). (COELHO, 2016, p.32)
Ocorre a utilização dos tributos tem por atividade típica custear a manutenção do território, ora colônia, proporcionando desenvolvimento local, bem como uma melhor qualidade de vida aos habitantes, no entanto, o interesse de Portugal era apenas de explorar os recursos. Todo o imposto que era recolhido nas pequenas colônias do Brasil Colonial era remetido à Portugal e usado e sequer era investido na colônia, o que acontecia era que a coroa portuguesa utilizava a colônia com o objetivo de enriquecer e aumentar o poder e influência da monarquia.
Em 1808, no auge da era napoleônica, a família real portuguesa se viu obrigada sair de Portugal para preservar sua própria segurança e integridade, uma vez que era iminente a invasão do imperador francês às terras lusitanas, ocorre a chegada da realeza ao Brasil, acarretou na mudança da natureza da colônia, que antes era predominantemente de exploração e passou a ser de colonização, o que acabou acelerando o desenvolvendo da terra colonial, bem como da economia local, o que gerou a necessidade de aumentar as arrecadações de impostos, uma vez que era necessário construir inúmeras estruturas para o conforto da realeza e, a forma mais simples, rápida e eficiente de conseguir tal feito, era cobrando mais impostos dos colonos. Esses impostos eram cobrados muitas vezes de forma arbitrária e desproporcional, era possível encontrar impostos até mesmo relacionados a fé cristã.
Obviamente, a moeda da época não era como a que conhecemos nos dias atuais, ou seja, não existia uma moeda de papel como conhecemos, muitas vezes o tributo era pago através de matéria prima, sendo a mais comum o ouro, que era extraído através da exploração desordenada das riquezas naturais (tributo conhecido como “quinto”), entretanto, o tributo da época já era nos moldes do conceito de tributo que é encontrado no art.3º do Código Tributário Nacional:
Art.3º: “Tributo é toda prestação pecuniária e compulsória em moeda, ou em cujo valor nela se possa exprimir.”
Ou seja, uma cobrança compulsória, através do recolhimento de elementos diversos onde era possível extrair algum valor, uma vez que a coroa não se importava na possibilidade de pagamento do colono, a única preocupação era arrecadar para custear o conforto da realeza. Coelho descreve um pouco sobre como a vinda da família real portuguesa aqueceu a economia e influenciou no aumento da tributação:
O contribuinte brasileiro do começo de século XIX não podia dizer que andava ligeiramente taxado, e não era por certa culpa dele se a receita do Estado não chegava para as despesas. Além do dízimo tradicional de todos os produtos agrícolas, pescarias e gado, que pertencia ao monarca como grão-mestre da Ordem de Cristo; dos direitos aduaneiros de exportação sobre todos os gêneros; dos direitos de importação sobre quaisquer mercadorias segundo a pauta já conhecida, tinha aquele contribuinte que entrar para o Erário com uma porção de impostos especiais […] (LIMA, 2006, p. 475- 476 apud GODOY, 2008, p. 145). (COELHO, 2016, p.34)
Com a chegada da República, começou-se a pensar sobre soluções para conter a desorganização fiscal, uma vez que a experiência obtida no império fora catastrófica, um período marcado pela cobrança excessiva de tributos, bem como por guerras fiscais.
A falha no recolhimento de tributos no Brasil bem como a ausência de legislações tributárias pode ser observada no seguinte relato: [...] a recente presença portuguesa no Brasil não permitia um sistema organizado de arrecadação de impostos, mas apenas algumas indicações. Também não existia um sistema tributário sistematizado, como não havia preocupações de caráter orçamentário. Aliás, preocupação que não esteve na pauta dos colonizadores em nenhum momento; saber exatamente quando seriam arrecadados e como esses valores seriam gastos parece que só foi prática vigente a partir da emancipação política (AMED; NEGREIROS, 2000, p. 46). (COELHO, 2016, p.32)
Ou seja, é uma falha que sempre esteve presente no Brasil, desde o período da colonização.
A divisão atual do recolhimento dos tributos por competências divididas entre os entes federativos (União, estados, distrito federal e municípios), não foi algo que aconteceu ao acaso, ocorre que essa divisão teve motivação nas guerras fiscais que ocorriam na época do império, onde com o aquecimento da economia, toda unidade de atuação da administração pública precisava arrumar formas de custear seus custos, visto que grande parte da receita tributária era destinada a fins atípicos. Pois bem, era comum ocorrer bitributação, na tentativa de arrecadar mais, então, a divisão competência para recolher tributos veio com o propósito basilar de trazer segurança jurídica para as operações de recolhimento de tributos.
Os impostos de consumo específicos a que se refere o texto transcrito acima são cobrados desde os primeiros anos do Brasil Colônia até os dias atuais. Durante a década de 1960 transformou-se no conhecido imposto sobre produtos industrializados, de competência da União. Sobre esse imposto observa Baleeiro: Na primeira década de sua expansão, entre 1891 e 1900, esse imposto atingia, realmente, apenas artigos classificáveis como de consumo, p. ex., bebidas, alimentos acondicionados em latas, fósforos, vestuário, calçados, velas etc. [...] Mais tarde, o Fisco foi alcançando mercadorias duráveis como certos implementos de edifícios, objetos de adorno, automóveis etc. e, por fim, bens de produção, como máquinas ou coisas de duração indefinida, como joias, objetos de arte etc. que foram incluídos no conceito legal de consumo (BALEEIRO, 2007, p. 336). (COELHO, 2016, p.38)
A primeira observação relevante sobre a evolução do sistema tributário brasileiro, segundo Carreza, é observada duração da Constituição de 1937:
Neste período diversas leis de Direito Tributário foram efetivadas, destacando-se: o processo executivo fiscal e a outorga à União da competência privativa para tributar certos impostos. Com a mudança no ambiente político, que influencia a organização da sociedade com o fim da II guerra mundial em 46, observamos neste mesmo ano a necessária promulgação de uma nova constituição nacional, que restabelecia o regime democrático e trazia outra discriminação para as rendas tributárias de modo mais rígido. O novo sistema tributário organizado nesta nova carta magna fundamentava-se em três premissas: coexistência de um sistema tributário autônomo para cada unidade da federação (União, Estados e Municípios), adoção de uma classificação jurídica dos impostos e a autonomia para as entidades da federação através de impostos privativos, complementada pela emenda constitucional nº5 que defendia a receita dos municípios com a discriminação de rendas em favor desta. Os Estados, porém, continuaram sobrecarregados de despesas não cobertas pelos impostos de sua competência e como única saída desta situação precária como sempre foi a majoração dos impostos, neste caso o de vendas e consignações e a criação de taxas exorbitantes. 1964 a situação financeira do país era novamente grave e as mudanças tributárias mais uma vez se faziam indispensáveis e urgentes. Em 1965 mais uma constituição se estabelece com o propósito de constituir um governo legalista, que buscava assegurar meios indispensáveis a reconstrução econômica, financeira, política e moral para o nosso país. A fim de atingir tais objetivos, outorgou-se mais poderes ao Presidente, que passou a poder remeter ao Congresso projetos de emenda à constituição para apreciação em 30 dias, propor projetos de lei e a decretar o estado de sítio. Também foram suspensas as garantias constitucionais ou legais. No cerne fiscal destacam-se mudanças significativas com a reforma e a reestruturação do sistema com duas características: estruturação sob um programa de ação econômica com um planejamento global e obediência a três objetivos fundamentais (financeiro, social e econômico). O déficit de caixa, porém, requeria solução urgente, assim, sabendo que a reforma tributária necessária não poderia ser implementada de uma única vez, o governo dividiu seu plano de ação em três etapas: na primeira etapa de trabalho foram adotadas medidas de emergência como a instituição de correção monetária de débitos tributários e definição do crime de sonegação fiscal, também a captação de recursos para a cobertura do déficit existente e a recuperação do prestígio da dívida pública. Em uma segunda etapa buscou-se uma melhoria na arrecadação. E por fim, na terceira, foi implantada, com a portaria GB30, a criação de uma comissão especial para elaborar uma nova discriminação de rendas e promover a reforma tributária em si. O trabalho da dita comissão se arrastou pelo ano de 1965 até a apresentação do anteprojeto que trazia a propositura de duas emendas a constituição chamadas de “A” que dispunha sobre normas legislativas e “B” que modificava o próprio sistema tributário nacional. Estas emendas foram aprovadas sob o nome de emenda constitucional número 18 e ofereceu ao país a tão esperada nova discriminação de rendas tributárias, a discriminação de competências e adotou uma classificação de imposto baseada em nomenclatura econômica. (CARREZA, 2004, p.)
A verdade é que o desenvolvimento do sistema tributário brasileiro foi se desenvolvendo de acordo com o crescimento da economia da época.
Há que se observar que a codificação da legislação tributária é um projeto antigo, que remonta a meados da década de 1950. Com efeito, em 1953, o Prof. Rubens Gomes de Souza redigiu um anteprojeto de Código Tributário, com o apoio do então Ministro da Fazenda, Osvaldo Aranha. Entretanto, foi somente em 1965 que aquele anteprojeto, juntamente com novas diretrizes governamentais para um plano de reestruturação do sistema tributário nacional, transformou-se na Emenda Constitucional nº 18, de 1965, convertendo-se na Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, o Código Tributário Nacional (CTN)3 (BALEEIRO, 2007, p. 9). (COELHO, 2016, p.43)
Vindo para o campo tributário atual, é possível extrair um raciocínio na mesma natureza, onde o sujeito passivo, ora contribuinte, estabelece uma relação de troca com o sujeito ativo, ora estado, que é semelhante ao que acontecia com os escambos na época do Brasil colonial, onde o contribuinte paga tributos em troca de receber condições mínimas de subsistência como, qualidade de vida, infraestrutura ou qualquer outro tipo de retorno por parte do estado. No entanto, a complexidade do sistema tributário brasileiro atual vem do uso do mesmo modelo de tributação que basicamente parou no tempo, especificamente desde 1966 com o advento do Código Tributário Nacional, através do Decreto Lei de nº 82 daquele ano. Ocorre que em 1966 o Brasil estava vivendo uma realidade completamente diferente do cenário atual. hoje com o advento da era digital, torna-se muito mais confuso tributar diversas questões que sequer foram imaginadas em 1966 e, somado a isso, a internet se tornou o lugar mais acessível para empreender atualmente, uma vez que através da internet, pode-se economizar despesas que antigamente eram fixas, como por exemplo o aluguel de locais físicos. É muito mais fácil, econômico e prático criar uma landing page na internet e empreender sem sair de casa.
3.1.1 Advento da Constituição de 1988 e a organização do Código Tributário Nacional
Após alguns anos do Decreto Lei nº 82 de 1966 (Código Tributário Nacional), entrou em vigência a Constituição Federal de 1988, o que foi um marco não só no contexto democrático brasileiro, mas como também na forma de como o sistema tributário passou a funcionar. O CTN (Código Tributário Nacional) foi recepcionado pela nova Constituição com status de Lei Complementar, apesar de ser, em tese, uma Lei Ordinária.
A verdade é que é possível observar uma preocupação do constituinte com a segurança jurídica no sistema tributário nacional, apesar de já existir um diploma legal com o objetivo de organizar e sistematizar o recolhimento de tributos, ainda existiam diversas falhar que ainda causavam certa instabilidade e vulnerabilidade, ainda mais quando o assunto era guerras fiscais entre os estados membros da federação, por exemplo.
Cabe mencionar que a estrutura tributária criada pela Constituição Federal de 1988 beneficiou os estados e os municípios em detrimento da União, principalmente no que se refere à repartição de receitas, como destaca Oliveira: [...] a União perderia os impostos únicos (incidentes sobre a energia elétrica, os combustíveis e os minerais) e especiais (transportes rodoviários e serviços de comunicação), que seriam integrados ao novo imposto estadual – o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – e veria ampliada, consideravelmente, a fatia do produto da arrecadação do Imposto de Renda e do IPI transferida para os estados e municípios (de 33% para 47% no caso do IR e de 33% para 57% no do IPI). Em contrapartida, ganharia apenas o Imposto sobre Grandes Fortunas, que nunca foi regulamentado, e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), de inexpressiva arrecadação, que ainda deveria partilhar com os municípios (OLIVEIRA, 2010, pp. 39/40). (COELHO, 2016, p.45-46)
Entretanto, a nova Constituição Federal trouxe um avanço importantíssimo no qual praticamente veda qualquer confusão de competências, como também trouxe em seus dispositivos princípios importantes que tratam da vedação da bitributação, obviamente que há algumas exceções, além de um capítulo específico para tratar de matéria tributária, qual seja o capítulo VI (Da tributação e do orçamento).
Em 2022, basicamente é impossível ocorrer uma guerra fiscal entre os estados membros da federação como ocorria antigamente, o que protege o empreendedor iniciante. Se pegarmos o exemplo do ICMS, tributo de competência estatual e que é um dos principais pagos pela maioria dos empreendedores, existe um convênio chamado CONFAZ onde cada estado somente pode alterar a alíquota desse tributo mediante aprovação em assembleia com representantes de todos os outros estados, ou seja, já não é mais possível um estado-membro baixar a alíquota desse tributo para competir de forma desleal com outros estados.
3.2 Dificuldades do empreendedor diante do sistema tributário brasileiro
No relatório “Doing Business” do Banco Mundial de 2020 é possível extrair das estatisticas algumas informações interessantes que comprovam o quão complexo é o sistema tributário brasileiro para empreendedores em fase inicial, são necessários aproximadamente 62 dias ou 1.501 horas para que os empresários regularizem os todas as obrigações tributárias. Vale ressaltar, que o cálculo é baseado na declaração do IRPJ (imposto de renda de pessoa jurídica), bem como outros tributos comuns nas relações empresariais. Dos países da América do Sul avaliados, o Brasil lidera com folga, a Bolívia ocupa a segunda colcocação com cerca dde 1.025 horas anuais, sendo uma diferença considerável.
Na pesquisa GEM 2017 é possível obervar alguns fatores que impossibilitam o empreendedor de empreender, a análise dos resultados foi subdividida em dois grupos: “fatores limitadores” e “fatores favoráveis” ao surgimento e manutenção de novos empreendimentos no Brasil. Dentre os fatores limitadores destacam-se: as políticas e programas governamentais; os especialistas enfatizaram que são necessárias iniciativas mais acuradas para promoção da ação empreendedora. Foi apontada, por exemplo, a necessidade de melhoria em áreas como a tributária e de desburocratização; apoio financeiro. A maioria dos especialistas consideram que as dificuldades associadas à disponibilização e acesso a recursos financeiros para o fomento das atividades empreendedoras ainda se constituem como fatores relevantes a serem melhorados; o contexto político e o clima econômico. Nos anos recentes é a primeira vez que esse fator aparece com destaque, não obstante as explicações são óbvias e decorrentes da crise política que se asseverou em 2016 e 2017 com evidentes consequências para o animus empreendedor do brasileiro. Dentre os fatores favoráveis destacam-se: aspectos relacionados às características da população brasileira, sua capacidade de realização e superação de desafios. Este item também faz referência à diversidade étnica e cultural que, para os especialistas, é motivo de inspiração e esperança para quem decide realizar uma atividade empreendedora; poucas barreiras para a abertura de novos negócios, situação que favorece, também, o acesso aos mercados consumidores. Alguns programas governamentais de incentivo a abertura de pequenos negócios, como o MEI (Microempreendedor Individual) e a participação das Micro e Pequenas Empresas nas Compras Públicas. (CORSINO, 2019, p. 114)
Existem alguns regimes tributários onde o empreendedor pode escolher para sua empresa, alguns mais vantajosos e outros menos, dependento do faturamento médio inicial.
Para empreendedores iniciantes, quase sempre o faturamento é baixo, muitas vezes até com faturamento negativo, que é o que occorre geralmente com microempresas ou empresas de pequeno porte, então para esse caso é mais vantajoso optar pelo simples nacional, uma vez que este é um regime tributário “compartilhado” de arrecadação de tributos, o que, basicamente, unifica os tributos e acaba por simplificar o adimplemento das obrigações fiscais. Esse regime tributário foi trazido pela Lei Complementar nº 123 de 2006 e engloba todos os entes federativos, ou seja, tanto a União, estados e municípios. Apesar do simples nacional ser o regime tributário mais comum entre o empreendedor iniciante, existem também outros regismes tributários como o lucro real e lucro presumido.
Pedroso et al. (2009) apontam que a maior dificuldade do brasileiro ao empreender são as políticas governamentais, além da excessiva burocracia, as legislações são complexas e astaxas tributárias muito altas para abrir e manter o próprio negócio. Em seguida há uma grande dificuldade de apoio financeiro, acesso ao crédito e empréstimos para quem abre um novo negócio. Outra queixa 7 presente entre os empreendedores é a dificuldade de capacitação adequada, pois apesar de existirem cursos e treinamentos voltados ao empreendedorismo e gerenciamento de negócios nem sempre eles têm a qualidade equiparada às necessidades desse público. Em pesquisa realizada por Verdugo (2018) a nível internacional, os resultados indicam que a maior barreira para novos empreendedores é a falta de financiamento, evidenciando que as dificuldades para o empreendedor brasileiro estão em consonância com o restante do mundo. (HEUSI, 2019, p. 48).
Apesar de existir o simples nacional para facilitar tanto o adimplemento quanto o compliance tributário, é exponencial o número de empreendedores que não resistem que acabam vendo seus empreendimentos falirem, o que comprova que os sistemas existentes ainda não são suficientes e que também aponta para outras lacunas fora do sistema tributário habitual, como, por exemplo, a educação fiscal.
É inegável que o brasileiro tem facilidade em empreender, não é raro ver brasileiros figurando como co-fundadores de diversos aplicativos que explodem na internet, como o instagram ou facebook, no campo nacional temos exemplos como o 99pop, Urbano Norte, academias de artes marciais, empresas especializadas em cozinha, dentre outros. Vindo para uma realidade social mais comum, o que mais tem por ai são jovens que preferem criar o próprio emprego ao invés de trabalhar para terceiros, ou seja, está cada vez mais dificil encontrar um emprego que pague um bom salário no Brasil, então as pessoas acabaram encontrando outras formas para se sustentarem e até mesmo sustentarem sua família. A verdade é que o brasileiro entendeu melhor do que ninguém que empreender é a melhor alternativa para conseguir uma boa qualidade de vida e não ser mais um escravo da mão de obra, um exemplo extremamente comum são lojas de roupas ou lojas de suplementos, onde não é preciso ter um espaço físico, basta deixar o estoque em casa e vender a partir de um perfil nas redes sociais, ou seja, me parece que o brasileiro entendeu muito bem como empreender e isso é excelente tanto para economia do Brasil como para a saúde fiscal e, consequentemente, compliance tributário do jovem empreendedor.
De acordo com a opinião de Schumpeter, o empresário inovador (empreendedor) possui um papel central na dinâmica capitalista, considerando que empreender significa a “criação de novas combinações”, o empreendedor é quem irá implementar essas novas combinações (Heertje, 2008, p. 321 cit. in. Paiva et al., 2018). McClelland (1968 cit. in. Alves & Bornia, 2011) também compreendia que a necessidade de realização pessoal de um povo era o que movimentava o desenvolvimento das nações. Maslow (2001 cit. in. Alves & Bornia, 2011) fala ainda sobre as sociedades boas e as sociedades em regressão, explicando que essas diferem devido às oportunidades empreendedoras e sujeitos empreendedores que cada uma possui. A atividade empreendedora, além de impulsionar o crescimento económico, também acaba por ser fonte de geração de empregos em muitos casos (Ovaska & Sobel, 2005; Zacharakis, Shepherd, & Bygrave, 2000 cit. in. Verdugo, 2018). Assim, vem crescendo exponencialmente a consciência da importância que os empreendedores têm para o desenvolvimento da economia, pois os empreendedores geram empregos, inovações, competitividade de mercado, refletindo em um ritmo mais acelerado de crescimento económico (Acs, 2007; Acs, Desai e Hessels, 2008 cit. in. Alves & Bornia, 2011). (HEUSI, 2019, p. 28).
O grande problema é que, apesar da cultura empreendedora que figura atualmente em nosso país, o empreendedor inciante não tem a mínima ideia do que são sistemas tributários, qual escolher, da importância de um bom planejamento tributário, dentre outros fatores fiscais importantes. Tudo isso caminha para um enorme susto, uma vez que é muito complexo para qualquer empreendedor entender todas peculiariades logo de início, ressaltanto que todo o empreendimento é centralizado na figura de apenas uma pessoa, sem o auxilio de escritórios de contabilidade e qualquer outro “luxo”.
Verificou-se que, do total de entrevistados, 28% não têm idéia de quanto destina para os tributos, 22% acreditam que até 10% da receita é destinada para esse fim, enquanto 11% acreditam que o tributo onere a empresa entre 15 e 20% de sua receita. Ainda, 17% consideram que de 21 a 25% do faturamento global vai para os tributos, 6% estimam que o impacto dos tributos fique entre 26 e 30%, 11% atribuem que de 31 a 40% de sua receita é destinada aos tributos e outros 11% que, de 41 a 45%, seja o impacto percentual dos tributos na sua empresa. Observou-se que, como a maioria dos empreendedores deixa o controle tributário a cargo do contador, eles consideram, muitas vezes, apenas a alíquota do Simples como o tributo que impacta a receita bruta da empresa. Em dado momento, alguns respondentes se fixaram apenas nos impostos, sem levar em conta as taxas e contribuições incidentes em suas atividades. Isso reforça a idéia de que os empreendedores não sentem a necessidade de conhecer mais profundamente a tributação de sua empresa, fato que pode ser determinante para o encerramento de suas atividades. No que tange à busca de informações e atualização sobre o tema tributação, percebe-se que a principal fonte de atualização é o próprio contador, com incidência de respostas de 78%, seguido pela seção econômica / tributária dos jornais, televisão, portais da Receita Federal, Estadual ou Municipal, internet e contatos com pessoas ligadas à administração do negócio. Nenhum dos respondentes recorre a periódicos ou cursos especializados a fim de se atualizarem quanto às alterações na legislação que impactam a tributação da sua empresa. Com relação ao tema planejamento tributário, mais uma vez a figura do contador aparece como responsável principal por esse tipo de controle, em que 71% dos entrevistados afirmaram que deixam tudo a cargo do contador, pelo fato dele se atualizar frequentemente. Dos empreendedores que já buscaram alguma forma de planejamento tributário, 17% afirmaram que o fizeram através de participação em seminário, palestra ou curso no ramo, e 6% buscaram informações na internet. Do total de entrevistados, apenas 6% mencionaram que nunca buscaram nenhum tipo de informação sobre esse tema. (MACHADO e col., 2007, p. 14-15)
Portanto, apesar das tentativas de facilitar a vida do empreendedor iniciante, o sistema tributário brasileiro continua extremamente complexo e, em razão disso, cada vez mais pessoas que tentam empreender são vítimas dessa complexidade, ora por falta de conhecimento tributário, ora por falta de recursos para adimplir com as obrigações fiscais, o que faz com que continue aumentando o número de empreendedores indo à falência ou inadimplência tributária, o que prejudica as arrecadações fiscais, economia, bem como o compliance tributário.
4.CONCLUSÃO
O presente artigo teve como objetivo analisar as dificuldades do empreendedor iniciante diante da complexidade do sistema tributário brasileiro, com foco no contexto histórico constitucional tributário, bem como na forma de como essas dificuldades inviabilizam o compliance tributário, buscando gerar profundas reflexões.
Em resposta ao problema ora formulado, fora concluído que a complexidade do sistema tributário decorre do próprio sistema tributário, ou seja, do meio de como é feita a arrecadação, através da forma autônoma de como cada ente federativo arrecada os tributos de sua competência, o que somado ao fator cultural, qual seja a falta de consciência fiscal do brasileiro, acarreta no pensamento do sujeito passivo de enxergar o pagamento do tributo como medida punitiva, algo prejudicial, que deva-se enviar ao máximo, o que gera o menor compliance tributário possível, uma vez toda a burocracia imposta pelo estado faz o que o empreendedor escolha não adimplir com suas obrigações tributárias para preservar seu empreendimento ou até mesmo o seu próprio sustento, tendo em vista o caráter desproporcional para negócios em estágio inicial, o que torna o próprio estado um mecanismo de marginalização do empreendedor contribuinte.
Para resolver tal problema, é necessário, preliminarmente, de uma completa reforma no sistema tributário brasileiro, mudando a forma de como os tributos são arrecadados, bem como na formação um sistema pensado para a era digital e demais peculiaridades que sequer eram imaginadas no Código tributário Nacional de 1966, fazendo com que seja diminuída a complexidade na arrecadação dos tributos, tornando mais tangível para que o empreendedor contribuinte possa adimplir com suas obrigações tributárias, o que, consequentemente, irá geral um maior compliance tributário e substancial diminuição da sonegação fiscal.
Todavia, é importante destacar que o Brasil é carente em políticas públicas de educação fiscal, a grande maioria das pessoas não sabem para que servem os tributos e não entendem como funciona o sistema tributário, o que gera prejuízo na arrecadação pecuniária, fazendo com que o Estado deixe de arrecadar valores substanciais. É necessário que ocorra uma mobilização do estado para a elaboração de campanhas para educação fiscal, e isso não deve ser feito apenas para resolver o problema da baixa geração de compliance tributário, mas para amadurecer a sociedade brasileira, bem como combater a desinformação. Apesar do foco da presente pesquisa ser no compliance tributário do empreendedor iniciante, é inegável que esse problema é muito mais amplo e atinge a sociedade brasileira em quase sua totalidade, uma vez que fatores como a alta desigualdade social, fazem com que a desinformação fiscal seja abundante no meio de pessoas menos favorecidas socialmente.
4.REFERÊNCIAS
CARREZA, Roque Antônio, Curso de Direito Constitucional Tributário. 19ª edição, São Paulo, Ed.Malheiros, 2004.
COELHO, Alvaro Luiz. Um Histórico sobre a Tributação no Brasil. Revista da RFBV3, Brasília, V. 3, p. 29-49. jan. /dez., 2016.
CORSINO, Michelle Oliveirado Espírito Santo et al. Ambiente institucional e empreendedorismo no brasil: inter-relações no século xxi. E&G Economia e Gestão, Belo Horizonte, v. 19, n. 53. maio/ago., 2019.
HEUSI, Fábio Alexandre. A (des)construção do empreendedor brasileiro no século xxi. 2019. 73f. Gestão do Desporto - Universidade de Lisboa, Lisboa, 2019.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. DE A. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Atlas, 2014.
MACHADO, D. G.; AZEVEDO, T. P.; SILVA, R. P. O impacto gerado pela tributação no empreendedorismo. V. 7. Porto Alegre: ConTexto, 2007.
MELO, Felipe Luiz Neves Bezerra de et al. Corrupção Burocrática e Empreendedorismo: Uma Análise Empírica dos Estados Brasileiros Corrupção Burocrática e Empreendedorismo: Uma Análise Empírica dos Estados Brasileiros. RAC, Rio de Janeiro, v. 19, n. 3, art. 5, pp. 374-397. Maio/Jun, 2015.
UPPERTOOLS. A importância da gestão tributária para sua empresa. Uppertools. Disponível em: < https://www.uppertools.com.br/blog/importanciada-gestao- tributaria-para-sua-empresa/>. Acesso em: 30, Outubro e 2020.
Advogado (OAB/AM 17.874). E-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINHAIS, VITOR DE ANDRADE LIMA. Compliance tributário no Brasil: marginalização do empreendedor contribuinte pelo Estado Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 jan 2023, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/60856/compliance-tributrio-no-brasil-marginalizao-do-empreendedor-contribuinte-pelo-estado. Acesso em: 26 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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