ADILSON SEVERINO DE SOUZA[1]
ALEXANDRE NEVES DE ALMEIDA[2]
JOSÉ MORGAN GOMES DE SOUZA[3]
(coautores)
Resumo: Trata-se de pesquisa de revisão bibliográfica sobre a temática dos novos direitos com intuito de rever a teoria e identificar possíveis vertentes dos novos direitos na contemporaneidade. Objetiva-se, pois, sem a pretensão de exaurimento, adquirir um novo olhar sobre as dimensões dos direitos fundamentais, não apenas sobre os novos direitos reconhecidos, mas também sobre os possíveis que possam surgir ante a complexidade social distinta no espaço e tempo específico.
Palavras chaves: Novos Direitos; Direitos Fundamentais; Gerações; Dimensões;
Abstract: This is a bibliographical review research on the topic of new rights with the aim of reviewing the theory and identifying possible aspects of new rights in contemporary times. The objective is, therefore, without the intention of exhaustion, to acquire a new perspective on the dimensions of fundamental rights, not only on the new rights recognized, but also on the possible ones that may arise in the face of different social complexity in specific space and time.
Keywords: New Rights; Fundamental Rights; Generations; Dimensions;
1.INTRODUÇÃO
Trata-se de pesquisa de revisão bibliográfica sobre a temática dos novos direitos com intuito de rever a teoria e identificar possíveis vertentes dos novos direitos na contemporaneidade. Neste sentido, após identificar-se o que são os novos direitos tentar-se-á estabelecer novas hipóteses de novos direitos em função dos conflitos e necessidades sociais da atualidade.
Objetiva-se, pois, sem a pretensão de exaurimento, adquirir um novo olhar sobre as dimensões dos direitos fundamentais, não apenas sobre os novos direitos reconhecidos, mas também sobre possíveis mutações – hermenêuticas dos direitos fundamentais já reconhecidos ou de possíveis inovações ante a complexidade social distinta no espaço e tempo específico. No mais, o reconhecimento e antecipação cognitiva de possíveis novos direitos é medida salutar à ciência e gera fontes para novas pesquisas e debates legislativos quando da regulamentação de referidas hipóteses.
Desta forma indaga-se: quais os novos direitos que pode-se identificar, bem quais as possíveis hipóteses de surgimento ante as hodiernas necessidades e valores sociais?
2.NOVOS DIREITOS E A CRÍTICA AO MODELO LINEAR DE DIMENSÕES
A história revela que espaço e tempo são relevantes às práticas jurídicas, a depender das necessidades humanas e relações sociais de cada momento histórico. Revela-se, também, principalmente na última década, que teorias jurídicas e estruturas normativas não se sustentam no tempo, ante ao retromencionado, bem como com o tempo se tornam ineficazes, não conseguindo, assim, acompanhar a evolução da globalização. É, pois, uma necessidade hodierna a busca por novas interpretações ou tipos de direitos que modernize a dogmática jurídica observada na contemporaneidade.
É o que revela Wolkmer:
[...] constata-se que o projeto da modernidade europeia está em crise: vive-se o deslocamento de modelos de fundamentação e a transição para novos paradigmas de conhecimento, de representação institucional e de representação social. Como assinalado em outro contexto, o arcabouço normativista da moderna teoria jurídica convencional é pouco eficaz e não consegue atender a extensão competitiva das atuais sociedades globalizadas " (...) que passam por distintas espécies de reprodução do capital, por acentuadas contradições sociais e por fluxos que refletem tanto crises de legitimidade quanto crises na efetivação da Justiça" (Wolkmer, 2013, p. 3).
E o autor ainda completa:
O estudo desses "novos" direitos relacionados às esferas individual, social, metaindividual, bioética, ecossistêmica e de realidade exige pensar e propor instrumentos jurídicos adequados para viabilizar sua materialização e para garantir sua tutela jurisdicional, seja por meio de um novo Direito Processual, seja por meio de uma Teoria Geral das Ações Constitucionais (Wolkmer, 2013, p. 124).
Neste sentido, surge a crítica à visão doutrinária de uma evolução linear e cumulativa de "gerações" sucessivas de direitos. Não se admite tal tese! Os valores e necessidades sociais de cada época são distintos. Exemplifica Wolkmer: “Os direitos civis, políticos e sociais que se constituem presentemente não possuem o mesmo conteúdo ou significado histórico de quando foram reconhecidos e positivados nos séculos XVIII, XIX e nas primeiras décadas do século XX” (Brandão, 1996 apud Wolkmer, 2013, p. 135-136).
O surgimento de “novos direitos”, destarte, tem por condicio sine qua non as necessidades, lacunas e ineficiências observadas em uma sociedade, no tempo e espaço historicamente específicos.
Revela-se, pois, que “os novos direitos objetivam assegurar a todos garantias antes não reconhecidas, dentro da indispensável convivência social, necessárias à sobrevivência da sociedade organizada” (Schwenck, 2015?, p. 1).
3.BREVE DESCRIÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE 1ª, 2ª e 3ª DIMENSÕES E OS NOVOS DIREITOS;
Os Direitos Fundamentais de 1ª dimensão são os direitos civis e políticos, surgidos ao longo dos séculos XVIII e XIX. São, pois, direitos individuais vinculados à liberdade, à igualdade, à propriedade, à segurança e à resistência às diversas formas de tirania. Tem por características os atributos da inalienabilidade; imprescritibilidade e são tidos por naturais. Genuinamente estabelecidos contra o Estado, são direitos negativos com função de defesa.
Contemporâneas às revoluções norte-americanas (1776) e francesa (1789) e a formação do constitucionalismo político clássico, é fruto das lutas burguesas que deram origens aos Estados Democráticos de Direito, que assim tonaram eminente a doutrina da universalidade dos direitos e garantias fundamentais.
Os Direitos Fundamentais de 1ª dimensão têm, por marcos, as Declarações de Direitos da Virginia-EUA (1776) e da França (1789) e as Constituições Norte Americana de 1787 e Francesas de 1791 e 1793.
Entende-se que diante da realidade fática atual tais direitos encontram dificuldades de interpretação e aplicação, precisando de remodelagem hermenêutica. À exemplo, podemos citar o confronto entre a Liberdade de Expressão e as Fakes News.
Já quanto aos de 2ª dimensão, identifica-se que são os direitos sociais, econômicos e culturais, surgidos num período de industrialização e conflitos socioeconômicos ocorridos entre a últimas décadas do século XIX e a primeira metade do século XX, e fundados nos princípios da igualdade – direitos positivos que obrigam o Estado a garantir a os cidadãos os direitos e garantias fundamentais.
Com referidos direitos surge o Estado do Bem-Estar Social aclamado após a crise do modelo liberal de Estado. Como marcos, podem-se citar a criação ou nascimento da Organização Internacional do Trabalho - OIT (1919); do Direito do Trabalho e do Direito Sindical; bem como o surgimento das Constituições Mexicana de 1917; Alemã de Weimar de 1919; Espanhola de 1931 e brasileira de 1934.
Como exemplo de novos direitos de 2ª dimensão podem-se citar a força de trabalho ante o avanço da Inteligência Artificial.
Por fim, os Direitos Fundamentais de 3ª dimensão caracterizam por manterem afinidade com os direitos metaindividuais, coletivos e difusos, bem como direitos de solidariedade, sendo, pois, indeterminados seus titulares (categorias ou grupos de pessoas – família, povo, nação.
Abrolham-se no período pós-Segunda Guerra Mundial (1945-1950) dando luz aos direitos de titularidade coletiva e difusa como os direitos ao desenvolvimento, à paz, à autodeterminação dos povos, ao meio ambiente, à qualidade de vida, ao direito de comunicação, direito do consumidor, etc.
Da mesma forma que os anteriores, os Direitos Fundamentais de 3ª dimensão também admitem nova abertura para integração de outros direitos surgidos em face de novas situações sociais emergidas no tempo e espaço, conforme infere Wolkmer no seguinte trecho de seu artigo:
As transformações sociais ocorridas nas últimas décadas, a amplitude dos sujeitos coletivos, as formas novas e especificas de objetividades e a diversidade na maneira de ser em sociedade têm projetado e intensificado outros direitos que podem ser inseridos na "terceira dimensão", como os direitos de gênero (dignidade da mulher, subjetividade feminina), os direitos da criança, os direitos do idoso (Terceira Idade), os direitos dos deficientes físico e mental, os direitos das minorias (étnicas, religiosas, sexuais) e os novos direitos da personalidade (a intimidade, a honra, a imagem). " (Wolkmer, 2013, p. 130-131);
Acrescentamos a tais exemplos os choques geopolíticos atuais entre países da Europa e Brasil onde tende a uma remodelagem da definição de Direito ao Meio Ambiente face a Soberania Nacional brasileira de titularidade do território da Amazônia.
4.QUARTA GERAÇÃO DE DIREITOS – BIOÉTICA E PATRIMÔNIO GENÉTICO
A quarta geração de direitos tem como uma das suas características a pesquisa biológica e cientifica, a defesa do patrimônio genético, o avanço tecnológico, o direito a democracia, a informação e ao pluralismo.
Sabe-se que a tecnologia avança de forma muito rápida em todas as suas áreas, como, por exemplo: medicina, informática, robótica, entre tantas outras. As gerações anteriores do direito já não dão conta de oferecer respostas a essas novas descobertas. E o direito precisa evoluir também para se adequar a esse processo de rápido avanço tecnológico.
Destacam-se, na quarta geração, as seguintes questões:
4.1 Bioética
A Bioética, por exemplo, é uma disciplina que trata de questões morais relacionadas à vida humana, animal e ambiental, entre outras. É um ramo de estudo interdisciplinar que utiliza o conceito de vida da Biologia, o Direito e os campos da investigação ética, religiosa para problematizar questões relacionadas à conduta dos seres humanos em relação a outros seres humanos e a outras formas de vida. As questões que a bioética trata são numerosas e complexas, como, por exemplo: aborto, clonagem, eutanásia, ética médica, transgênicos, células tronco, direitos dos animais entre outros.
Com a Pandemia, no Brasil, veio à tona a questão sobre as vacinas: tomar ou não tomar? Questões que se discutem bastante nas faculdades, nos Tribunais e nas casas legislativas de Brasília, bem como no STF. A autora Tereza Rodrigues escreveu o livro Bioética e direito, e nele ela defende que a lei deve assegurar o princípio da primazia da pessoa aliando-se as exigências legitimas do progresso de conhecimento cientifico e da proteção da saúde pública. Diz ela que o Juiz deve se basear em princípios gerais para determinar os limites, no caso de não haver Lei especifica. A ciência não pode ser vista como uma ameaça a vida humana, por isso a bioética deve buscar meios de proteger os seres humanos e sua dignidade.
Para tanto a bioética utiliza-se de quatro princípios:
Princípio da não maleficência: consiste na proibição, por princípio, de causar qualquer dano intencional ao paciente (ou à cobaia de testes científicos). A sua mais antiga formulação pode ser encontrada no juramento de Hipócrates.
Princípio da beneficência: afirma-se que o médico deve visar ao benefício do paciente. Tanto médicos quanto cientistas que utilizem cobaias devem basear-se no princípio da utilidade visando a provocar o maior benefício para o maior número possível de pessoas.
Princípio da autonomia: Trata-se do respeito à autonomia do indivíduo, pois esse é o responsável por si, e é ele que decide se quer ser tratado ou se quer participar de um estudo científico ou de um procedimento médico.
Observa-se, como exemplo de referido princípio, o caso das testemunhas de Jeová, que são quase nove milhões no mundo, e se situam como um segmento religioso que não aceita fazer transfusão de sangue. Surge para eles, neste caso, a angustiante – por motivos religiosos – dúvida de fazer ou não fazer a transfusão? Em casos como este, o médico vive um dilema que envolve o risco de ser processado ao tratar pacientes testemunhas de Jeová. É como se em qualquer cenário o profissional de saúde corresse o risco de processo: pelo paciente, se sua vontade for violada ao receber uma transfusão de sangue; ou pelo Ministério Público, familiares ou Conselho de Medicina, por deixar de transfundir e ocorrer a morte. A prática médica deve estar acompanhada de uma atuação eticamente responsável.
A jurisprudência do Conselho Federal de Medicina (CFM) já apreciou[4] em três ocasiões casos de médicos que não fizeram a transfusão de sangue em respeito à posição de pacientes testemunhas de Jeová. Nos três casos, o Conselho reconheceu que não há infração ética quando o médico respeita a autonomia do paciente. Por outro lado, a Justiça paulista autorizou[5] o Hospital Unimed de Piracicaba a realizar uma transfusão de sangue em uma paciente que se recusava a receber o tratamento por convicções religiosas. Diante da recusa, o hospital recorreu à Justiça alegando que a paciente corria risco de morte iminente por estar em choque hemorrágico.
O hospital tem o dever de preservar a vida da paciente, afirmou o juiz no processo. Em petição apresentada à Justiça, a paciente afirmou considerar ter sido torturada e que encara o ato médico como um estupro. A ideia de sedar um cidadão adulto e capaz para submete-lo a tratamento médico invasivo soa totalmente descabida, inaceitável e irracional, disseram seus advogados à Justiça.
Por outro lado, a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo já manteve sentença de primeiro grau que autorizou médicos à realizarem transfusão de sangue em uma paciente contrária ao procedimento por motivos religiosos. Em tal caso o referido tribunal proferiu o seguinte entendimento:
O relator, desembargador Marrey Uint, afirmou que o direito à vida e à liberdade religiosa estão expressos na Constituição Federal, mas a vida deve prevalecer e estar acima de qualquer outro direito. “Em que pesem as referidas convicções religiosas da apelante que, não obstante lhe são asseguradas constitucionalmente, a verdade é que a vida deve prevalecer acima de qualquer liberdade de crença religiosa”, disse (Uint apud Viapiana, 2019).
Por fim, temos o princípio da justiça: esse princípio visa criar um mecanismo regulador da relação entre paciente e médico – que não deve mais ficar submetida apenas à autoridade médica. Tal autoridade, que é conferida ao profissional devido ao seu conhecimento e pelo juramento de conduta ética e profissional, deve submeter-se à justiça, que agirá em caso de conflito de interesses ou de dano ao paciente.
4.2 Direito ao patrimônio genético
De acordo com a lei, o Patrimônio Genético Nacional é o conjunto de informações genéticas contidas em plantas, animais, micro-organismos e outras espécies presentes no território nacional. Isso inclui desde as partes dos organismos, como raízes, penas e cascas, até as substâncias que produzem, como látex e veneno. Além disso, a definição inclui as informações de origem genética dessas espécies, bem como o conhecimento tradicional associado a elas.
O objetivo é proteger e garantir o uso sustentável desse material genético, permitindo que a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico sejam realizados de forma responsável e equilibrada, preservando a biodiversidade e os recursos naturais.
Com o passar do tempo, as descobertas científicas proporcionaram, dentre muitos avanços, o aumento na expectativa de vida humana. Sendo assim, a proteção à vida e ao patrimônio genético foi incluída na categoria dos direitos de quarta dimensão.
A base está na Constituição Federal e a Lei Infraconstitucional nº. 11.105 de 24 de março de 2005 (denominada de Lei de Biossegurança). O patrimônio genético passou a usufruir de tratamento jurídico, sendo que a visão atualmente adotada buscou salientar a necessidade de preservar não apenas a diversidade e a integridade do supramencionado patrimônio. Assim, houve a necessidade de se estabelecer meios de fiscalização as entidades voltadas à manipulação do material genético, cabendo ao Poder Público seu estabelecimento.
Em 2015, o Congresso Nacional aprovou a Lei 13.123 que trata da proteção e do acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado. Essa Lei também aborda a repartição de benefícios para conservação e o uso sustentável da biodiversidade, contudo, a norma não se aplica ao patrimônio genético humano.
Winckler (2010, p. 6.825 apud Pessanha e Rangel 2017, p. 157), destarte, diz que:
O direito à preservação do patrimônio genético e a imposição do poder público de fiscalizar empresas que o manipulam e pesquisam tornam-se constitucionalmente consagrados que não podem ser abolidos, de sorte que é o direito de todo ser humano de não sofrer interferências artificiais contrárias à própria natureza humana.
Em consequência de tal constatação, a lei de biossegurança institui sanções de caráter criminal, civil e administrativa pela prática de algumas condutas, podendo ser consideradas lesivas ao patrimônio genético da pessoa humana. Saliente-se, contudo, que a aplicação da lei de biossegurança não se restringe ao patrimônio genético humano, sendo aplicada também a origem genética inclusa em espécies vegetais, fúngicas, microbianas ou animais em forma de moléculas e substâncias que compõem esses organismos, sejam vivos ou mortos.
A razão de proteger o patrimônio genético é a biopirataria que consiste no ato de transferir recursos genéticos e/ou conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade, sem a expressa autorização do Estado onde fora extraído o recurso, ou da comunidade tradicional que desenvolveu e manteve determinado conhecimento ao longo dos tempos. Desta forma, a biopirataria ou biogrilagem, versão mais atual do termo, pode ser descrita basicamente como a exploração ilegal dos recursos naturais e apropriação indevida de conhecimentos tradicionais.
A Floresta Amazônica é o principal alvo no Brasil, especialmente indústrias farmacêuticas e de cosméticos. Um dos exemplos mais famosos dessa prática no país ocorreu com a fruta de nome cupuaçu. Empresas japonesas patentearam o fruto e registraram um chocolate feito com o caroço de cupuaçu, chamado de “cupulate”.
Diante disso, o Brasil não podia exportar o produto utilizando o nome cupuaçu e cupulate sem o pagamento de royalties. Entretanto, esse produto já havia sido criado pela Embrapa e uma grande mobilização foi feita para quebrar a patente. Felizmente, a patente japonesa foi quebrada em 2004.
Outro exemplo de biopirataria aconteceu com a seringueira, árvore nativa da Floresta Amazônica da qual se extrai o látex com o qual é feita a borracha. O Brasil já foi líder na produção de borracha, mas, em 1876, um explorador inglês contrabandeou cerca de 70 mil sementes, que foram plantadas na Malásia. Em pouco tempo, a Malásia se tornou o principal exportador da borracha.
Tal prática gera prejuízos econômicos, ambientais e culturais para o país, através da perda de lucro na comercialização dos recursos naturais, sua exploração intensiva, e da comercialização nociva de culturas tradicionais em que há exploração do conhecimento sem repartição dos benefícios, respectivamente. O tráfico de animais é um evento comum na biopirataria, e expõe estes indivíduos à maus-tratos e condições insalubres, podendo afetar também a comunidade nativa nas regiões onde espécies estas exóticas são introduzidas, causando severos impactos à biodiversidade.
5.O DIREITO A INFORMAÇÃO SOB A ÓTICA DE PAULO BONAVIDES
O direito à informação é um tema fundamental para a compreensão e o fortalecimento das democracias das democracias. Neste diapasão, Paulo Bonavides, renomado jurista e professor de direito constitucional, destaca-se por suas contribuições significativas para a discussão sobre esse direito fundamental. Seu trabalho ajuda a elucidar como o acesso à informação é crucial para o exercício pleno da cidadania e para o combate à opacidade e ao abuso de poder no âmbito público.
No que tange aos direitos de quarta geração, leciona o jurista que:
A globalização política neoliberal caminha silenciosa, sem nenhuma referência de valores. (...) Há, contudo, outra globalização política, que ora se desenvolve, sobre a qual não tem jurisdição a ideologia neoliberal. Radica-se na teoria dos direitos fundamentais. A única verdadeiramente que interessa aos povos da periferia. Globalizar direitos fundamentais equivale a universalizá-los no campo institucional. (...) A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social. É direito de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência. (...) os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia (Bonavides, 2006).
Um dos principais apontamentos apresentados por Bonavides sobre o direito à informação é sua visão de que a informação é um pilar essencial para o funcionamento saudável de uma sociedade democrática. Em suas obras, ele destaca que o cidadão bem informado é capaz de tomar decisões informadas e participar de maneira ativa na tomada de decisões políticas, fortalecendo, assim, a governança democrática
Além disso, Bonavides enfatiza a importância da transparência governamental como um elemento crucial para a efetivação do direito à informação. Ele argumenta que governos transparentes e abertos à prestação de contas permitem aos cidadãos o acesso a informações relevantes e, por consequência, tornam possível a fiscalização dos atos e políticas governamentais. Essa transparência é essencial para garantir a responsabilização dos agentes públicos e para combater a corrupção
Entretanto, é importante ressaltar que, mesmo com suas contribuições notáveis, a abordagem de Bonavides pode gerar debates acerca de alguns pontos. Por exemplo, a questão da privacidade e do equilíbrio entre o direito à informação e outros direitos individuais merece destaque. Em um mundo cada vez mais conectado e com uma quantidade imensa de informações disponíveis, é necessário encontrar mecanismos que respeitem a privacidade das pessoas sem comprometer a transparência das instituições.
Outro ponto crítico que pode ser abordado é a própria efetividade do direito à informação na prática. Mesmo com a existência de leis que garantam esse direito, é comum encontrar obstáculos burocráticos e culturais que dificultam o acesso à informação pública. É essencial, portanto, não apenas defender o direito à informação em teoria, mas também buscar meios eficientes para que esse direito seja exercido na prática, com procedimentos claros e acessíveis para os cidadãos.
O trabalho de Paulo Bonavides sobre o direito à informação é de extrema relevância para o entendimento da importância desse direito para a consolidação das democracias modernas. Suas reflexões sobre transparência governamental, cidadania informada e a necessidade de um equilíbrio entre direitos individuais e coletivos são valiosas e pertinentes.
6.OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE QUINTA GERAÇÃO OU DIMENSÃO
O desenvolvimento e as mudanças sociais estão diretamente ligados com o surgimento, a ampliação e a universalização dos chamados novos direitos. Como a sociedade passa por transformações constantes, há uma necessidade natural de que novos direitos devem surgir para absorver as novas demandas que nascem com essas transformações.
Com o avanço da tecnologia, novas demandas vão surgindo e a necessidade do acompanhamento pelo direito se faz extremamente necessária, trazendo segurança para as novas relações que vão surgindo e que envolvem pessoas físicas e jurídicas no universo da era digital.
Há divergência entre doutrinadores quanto a classificação dos direitos de quinta geração. Segundo Paulo Bonavides (2018) nessa classificação se encontra o direito à paz, direito este que foi trasladado da terceira para a quinta geração de direitos fundamentais.
Já para Antônio Carlos Wolkmer, José Alcebíades de Oliveira Júnior e César Luiz Pasold são os novos direitos advindos da sociedade e das tecnologias da informação (internet), do ciberespaço e da realidade virtual em geral que compõem os direitos fundamentais de quina geração.
Afirma Antônio Carlos Wolkmer (2016):
É inegável a relevância de que se reveste, hoje, na cultura jurídica do País, o estudo sobre a teoria e a prática, sobre a legitimidade e a institucionalização jurisdicional desses “novos” direitos referentes às esferas individuais, sociais, metaindividuais, bioéticas e digitais.
Aponta ainda o autor ser fundamental definir uma legislação que regulamente as questões relativas ao avanço tecnológico:
Diante da continua e progressiva evolução da tecnologia da informação, fundamentalmente da utilização da internet, torna-se fundamental definir uma legislação que venha regulamentar, controlar, proteger, os provedores e os usuários dos meios de comunicação eletrônica de massas. [...] As fontes legislativas sobre o tema são escassas, destacando-se a existência de inúmeros projetos de lei tramitando no congresso nacional.
Assim, tomando por base o desenvolvimento da teoria dos direitos fundamentais, levando-se em consideração o impacto causado pelo desenvolvimento da tecnologia, seja na área cibernética, das redes de computadores, do comércio eletrônico, da inteligência artificial e ampla difusão da internet, entende-se que é possível se falar em um direito fundamental à tecnologia e à inclusão digital.
6.1. Direito fundamental à tecnologia
O início do novo milênio trouxe uma grande mudança na sociedade, uma transição da era industrial para a era digital/virtual. Essa transformação acarretou um grande impacto nas áreas da tecnologia e de forma avassaladora na difusão da internet. No campo do direito surgiram demandas em massa, confirmando que vivemos uma nova era, a era digital, como observa Luís Carlos Cancellier de Olivo (2000):
Esta é, então, a época do computador, do celular, do conhecimento, da informação, da realidade virtual, do ciberespaço, do silício, dos chips e microchips, da inteligência artificial, das conexões via cabo, satélite ou radio, da Internet e da intranet, enfim, da arquitetura em rede.
Com essa massiva e progressiva evolução tecnológica, principalmente na utilização da internet, se faz fundamental que nova legislação venha a regulamentar formas de controle e proteção aos usuários e empresas que atuam nesse universo digital.
Essa rápida expansão tecnológica traz para o direito a perspectiva do surgimento, inclusive, de novos direitos concentrados, como aborda Daniela Beppler (1998):
Um Direito Civil da Informática e um Direito Penal da Informática. O primeiro englobaria relações privadas e que envolvem a utilização da informática, como, por exemplo, programas, sistemas, direitos autorais, transações comerciais, entre outros. O segundo, o Direito Penal da Informática (...) diz respeito as formas preventivas e repressivas, destinadas ao bom e regular uso da informática no cotidiano.
Como direito fundamental que integra a quinta geração, se faz necessário garantir a toda sociedade o acesso a essas novas tecnologias. Em nossa legislação, vimos surgir algumas alterações e a elaboração de leis que buscam garantir esse direito, principalmente para as classes menos favorecidas.
A Emenda Constitucional nº 85, de 26 de fevereiro de 2015, trouxe importantes e significativas mudanças/contribuições de implementação de medidas governamentais para a promoção e o incentivo ao desenvolvimento tecnológico, possibilitando assim o acesso da população as novas tecnologias. Vejamos:
Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação. (Redação alterada)
Art. 219-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão firmar instrumentos de cooperação com órgãos e entidades públicos e com entidades privadas, inclusive para o compartilhamento de recursos humanos especializados e capacidade instalada, para a execução de projetos de pesquisa, de desenvolvimento científico e tecnológico e de inovação, mediante contrapartida financeira ou não financeira assumida pelo ente beneficiário, na forma da lei. (Incluído)
Art. 219-B. O Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) será organizado em regime de colaboração entre entes, tanto públicos quanto privados, com vistas a promover o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação. (Incluído)
Temos ainda o Plano de Inclusão Digital do Governo Federal, este previsto no Plano Plurianual de 2004, e o Decreto nº 9.612, de 17 de dezembro de 2018, que dispõe sobre as políticas públicas de telecomunicações, que tem como objetivo:
Art. 2º São objetivos gerais das políticas públicas de telecomunicações:
I - promover:
a) o acesso às telecomunicações em condições econômicas que viabilizem o uso e a fruição dos serviços, especialmente para:
1. a expansão do acesso à internet em banda larga fixa e móvel, com qualidade e velocidade adequadas; e
2. a ampliação do acesso à internet em banda larga em áreas onde a oferta seja inadequada, tais como áreas urbanas desatendidas, rurais ou remotas;
b) a inclusão digital, para garantir à população o acesso às redes de telecomunicações, sistemas e serviços baseados em tecnologias da informação e comunicação - TIC, observadas as desigualdades sociais e regionais; e
c) um mercado de competição ampla, livre e justa;
II - proporcionar um ambiente favorável à expansão das redes de telecomunicações e à continuidade e à melhoria dos serviços prestados;
III - garantir os direitos dos usuários dos serviços de telecomunicações;
IV - estimular:
a) a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico e produtivo; e
b) as medidas que promovam a integridade da infraestrutura de telecomunicações e a segurança dos serviços que nela se apoiam; e
V - incentivar a atualização tecnológica constante dos serviços de telecomunicações”.
O acesso da população a essas novas tecnologias ultrapassou o conceito de necessidade supérflua, tornando-se indispensável para suprir as necessidades do novo cotidiano, facilitando a busca por novas oportunidades e facilitando a inclusão em programas sociais oferecidos pelo Governo.
6.2. Inclusão digital como forma de acesso a direitos
Como vimos, os direitos fundamentais de quinta geração, conforme o entendimento de vários doutrinadores, são compostos por aqueles advindos da sociedade e das tecnologias da informação (internet), do ciberespaço e da realidade virtual em geral.
A inclusão digital pode ser vista como consequência da garantia do acesso da população as novas tecnologias. A facilitação do acesso à internet promove a inclusão social e, consequentemente, influencia no desenvolvimento da sociedade, evitando assim o surgimento de uma classe definida como “info-excluídos”, conforme leciona Castells (1999):
A universalização dos serviços de informação e comunicação é condição fundamental, ainda que não exclusiva, para a inserção dos indivíduos como cidadãos, para se construir uma sociedade da informação para todos. É urgente trabalhar no sentido da busca de soluções efetivas para que as pessoas dos diferentes segmentos sociais e regiões tenham amplo acesso à internet, evitando assim que se crie uma classe de “info-excluídos”.
A inclusão digital como direito fundamental é objeto do Projeto de Emenda Constitucional nº 47/2021, que tem por objetivo incluir o inciso LXXIX no artigo 5º da Constituição Federal, com a seguinte redação:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]
LXXIX – é assegurado a todos o direito à inclusão digital, devendo o poder público promover políticas que visem ampliar o acesso à internet em todo território nacional, na forma da lei.
Essa alteração constitucional é de fundamental importância para impulsionar a disseminação do acesso à internet no Brasil, possibilitando um aumento significativo das pessoas a melhor educação, acesso aos sistemas de saúde, benefícios sociais e outros programas do governo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Depreende-se, pois, que o direito moderno não vem conseguindo atender as novas demandas que surgem com as transformações ocorridas em vários setores da sociedade, principalmente as demandas referentes aos avanços tecnológicos que carecem de novos instrumentos jurídicos mais flexíveis, ágeis e abrangentes, que possam regular situações mais complexas e novos fenômenos que surgem em grande número e velocidade.
Apesar dos esforços, os instrumentos jurídicos que vem sendo criados não conseguem acompanhar a rapidez da evolução das novas tecnologias que surgem quase que diariamente, deixando assim uma lacuna importante e perigosa em setor de suma importância para o desenvolvimento do país.
Necessita-se, pois, novos e grandes esforços aos estudiosos das Ciências Jurídicas, operadores do direito e qualquer protagonista da atuação jurídica, no sentido de buscarem novas interpretações ou tipos de direitos que modernizem a dogmática jurídica observada na contemporaneidade. Atingindo, pois, os "novos" direitos relacionados às esferas individual, social, metaindividual, bioética, ecossistêmica e da realidade, ante o indubitável fato jurídica da não linearidade da evolução dos direitos.
REFERÊNCIAS
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BEPPLER, D. (2000). Internet e informatização: implicações no universo jurídico. In: ROVER, Aires José (org.). Direito, sociedade e informática: limites e perspectivas da vida digital. Florianópolis: Boiteux, 2000.
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. – [Reimpr.] – Rio de Janeiro: LTC, 2020.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª Edição, São Paulo: Editora Malheiros, 2006.
BONAVIDES, Paulo. A quinta geração de direitos fundamentais. Revista Brasileira de Direitos fundamentais & Justiça. Volume 2, número 3, abril a junho de 2018, PUCRS, P. 82-93. Disponível em: https://dfj.emnuvens.com.br/dfj/issue/view/36. Acesso em: 22 mai. 2023.
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[1] Mestrando em Ciências Jurídicas pela Veni Creator Christian University - VCCU; Pós-graduado em Direito Público pela ESMAPE-UNINASSAU; Graduado em Direito pela Faculdade Salesiana do Nordeste - FASNE. E-mail: [email protected]
[2] Mestrando em Ciências Jurídicas pela Veni Creator Christian University - VCCU; Pós-graduado em Direito Constitucional pela Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais – FEAD; Graduado em Direito pela Faculdade Integrada de Patos - FIP. É Técnico Judiciário do TJPE. E-mail: [email protected]
[3] Mestrando em Ciências Jurídicas pela Veni Creator Christian University - VCCU; Pós-graduado em Ciências Criminais pela Faculdade Integrada de Patos - FIP; Graduado em Direito pela Faculdade Integrada de Patos - FIP. E-mail: [email protected]
[4] Valadares (2017) cita o seguinte Acórdão do CFM: “PROTOCOLO. RECURSO DE ARQUIVAMENTO. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE INFRAÇÃO ÉTICA. MANUTENÇÃO DO ARQUIVAMENTO. I – Não se vislumbra indícios de infração ética quando o médico deixa de instituir procedimentos diagnósticos ou terapêuticos necessários ao tratamento do seu paciente, quando impedido por recusa consciente do paciente e de seus familiares, decorrente de motivos de ordem religiosa. II Apelação conhecida e improvida (…) Sem dúvida é um direito individual de todo cidadão professar o credo ou a religião que lhe aprouver. A própria Constituição Federal garante esse direito individual. Porém, a responsabilidade dos atos decorrentes da obediência aos dogmas de credos e religiões professados, mesmos os que coloquem em risco à própria vida, não podem, e não devem ser transferidos a outras pessoas (CFM – Número: 5793/1998 – Origem: CRM-SP – Pub. 22/10/2001) ”.
[5] Noticiado por diversos meios de comunicação, dentre eles por Krusty (2021).
Mestre em Ciências Jurídicas pela Veni Creator Christian University - VENIUNI; É especialista em Execução de Ordens Judiciais pelo Centro Universitário Mário Pontes Jucá - UMJ; em Direito Processual Civil pela UNINASSAU, em parceria com a ESA-PE/OAB-PE; em Direito Público e em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera-Uniderp; em Direito Ambiental pela Faculdade Venda Nova do Imigrante - FAVENI; e em Perícia Judicial e Extrajudicial, Perícias de Avaliação Patrimonial de Bens e Direitos e Perícia Econômica e Financeira, pela FACUMINAS. Graduando em Licenciatura em História pela UFRPE. Bacharel em Direito pela Associação Caruaruense de Ensino Superior - ASCES. É Oficial de Justiça do TJPE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Wellington Santos de. Novos direitos e as gerações dos direitos fundamentais: mutação não linear Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 set 2024, 04:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/66417/novos-direitos-e-as-geraes-dos-direitos-fundamentais-mutao-no-linear. Acesso em: 04 out 2024.
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