A estabilidade provisória garantida à gestante pela Constituição da República tem por finalidade proteger o nascituro, mediante a manutenção da segurança econômica e psicológica da mãe, bem como a prevenção da discriminação da trabalhadora no ambiente laboral. Atualmente, tal garantia configura-se como uma das mais relevantes proteções previstas pelo ordenamento jurídico brasileiro, visando assegurar a saúde e a segurança da mãe e do bebê durante a gestação e após o parto.
Reconhecida pela Constituição Federal de 1988, a garantia de estabilidade no emprego para a trabalhadora grávida está prevista no artigo 10, inciso II, alínea "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da CF/88. Conforme se sabe, a Carta Magna estipulou que “fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa (...) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto”.
Já na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 392, caput, dispõe que:
Art. 392. A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário. (Redação dada pela Lei nº 10.421, 15.4.2002) (Vide Lei nº 13.985, de 2020)
É relevante ressaltar que a licença-maternidade tem duração mínima de 120 dias e pode ser iniciada até 28 dias antes do parto. Portanto, uma funcionária gestante que inicie sua licença-maternidade no dia do parto terá direito a apenas um mês de estabilidade provisória ao retomar suas atividades.
Nesse contexto, ensina o doutrinador Mauricio Godinho Delgado:
Em conformidade com a jurisprudência, tal garantia é objetiva, desde a confirmação da gestação — isto é, desde a concepção —, independentemente da ciência do fato pelo empregador e até mesmo pela própria trabalhadora. É irrelevante, ademais, a data de realização do exame laboratorial acerca da gravidez, já que se entende por confirmação a específica concepção, ou seja, a circunstância objetiva que confirma a gravidez. Nesta linha a Súmula 244, I, do TST.
Já a Súmula 244, I, do TST dispõe:
GESTANTE.ESTABILIDADE PROVISÓRIA
I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT). II. A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. III. A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.
Esse entendimento encontra-se em conformidade com aquele contido na Orientação Jurisprudencial 30 da SDC do TST:
ESTABILIDADE DA GESTANTE. RENÚNCIA OU TRANSAÇÃO DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. (republicada em decorrência de erro material) - DEJT divulgado em 19, 20 e 21.09.2011
Nos termos do art. 10, II, "b", do ADCT, a proteção à maternidade foi erigida à hierarquia constitucional, pois retirou do âmbito do direito potestativo do empregador a possibilidade de despedir arbitrariamente a empregada em estado gravídico. Portanto, a teor do artigo 9º, da CLT, torna-se nula de pleno direito a cláusula que estabelece a possibilidade de renúncia ou transação, pela gestante, das garantias referentes à manutenção do emprego e salário.
Neste contexto, destaca-se que a estabilidade provisória é um direito destinado a proteger a trabalhadora contra a dispensa sem justa causa, assegurando-lhe a manutenção do emprego por um período específico. Tal garantia transcende o interesse individual da empregada gestante, pois visa atender a objetivos de saúde e assistência social, abrangendo não apenas a proteção da mãe trabalhadora, mas também a preservação dos direitos relacionados à sua gestação e ao bem-estar do recém-nascido.
Além disso, essa garantia evidencia a ampliação da efetividade dos direitos humanos e sociais trabalhistas, considerando que a jurisprudência contemporânea tem interpretado que a estabilidade provisória pode ser estendida também a contratos de trabalho por tempo determinado.
Explica-se: anteriormente, as disposições relacionadas à estabilidade provisória eram aplicáveis exclusivamente a contratos de trabalho por tempo indeterminado. No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) vêm flexibilizando tal premissa. Em outubro de 2023, foi estabelecido entendimento pacificado, aplicável a todos os casos pertinentes, segundo o qual a gestante com contrato de trabalho temporário tem direito à licença-maternidade e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.
A decisão foi proferida no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 842.844, no qual o Ministro Luiz Fux destacou a importância das necessidades da mulher no período pós-parto, bem como a relevância do cuidado com a criança, especialmente no que se refere à amamentação durante os primeiros meses de vida.
No que se refere à estabilidade provisória, a argumentação é de que esse benefício visa primordialmente proteger o nascituro, proporcionando condições materiais adequadas que, por conseguinte, também beneficiam a gestante. Assim, a conclusão da tese foi de que "a trabalhadora gestante tem direito ao gozo de licença maternidade e à estabilidade provisória, independentemente do regime jurídico aplicado, se contratual ou administrativo, ainda que ocupe cargo em comissão ou seja contratada por tempo determinado".
É importante salientar que o entendimento recente deve ser observado em todos os processos em instâncias inferiores que tratem da questão, uma vez que o recurso foi julgado sob a sistemática da repercussão geral (Tema 542).
Portanto, mesmo nos contratos de trabalho temporário (por tempo determinado), é certo que diversos direitos trabalhistas são preservados, em razão do evidente interesse público na proteção da mãe trabalhadora, da gestação, do parto e do período inicial da maternidade, um interesse que também se estende ao nascituro.Parte superior do formulário
Ademais, decisões recentes dos Tribunais Regionais do Trabalho têm seguido o entendimento anteriormente mencionado. Vejamos o julgado do TRT-10, de julho de 2024:
GESTANTE. GARANTIA CONSTITUCIONAL À ESTABILIDADE PROVISÓRIA. A estabilidade provisória garantida à gestante pela Constituição da República visa a proteção ao nascituro mediante a manutenção da segurança econômica e psicológica da mãe, bem como a não-discriminação da trabalhadora no ambiente laboral. O bem constitucionalmente assegurado não se restringe ao emprego em sentido estrito, mas alcança também a expectativa da mulher grávida de não ser imotivadamente dispensada em virtude de sua condição. O col. TST firmou entendimento de que, ainda que se trata de contrato com prazo determinado, é assegurado à empregada gestante a estabilidade, nos termos da Súmula nº 244, item III, do col. TST: “III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado” 2. Recurso ordinário conhecido e não provido. (TRT da 10ª Região; Processo: 0000681- 18.2023.5.10.0015; Data de assinatura: 04-07-2024; Órgão Julgador: Desembargador Brasilino Santos Ramos - 3ª Turma; Relator(a): BRASILINO SANTOS RAMOS). (Destaco)
Embora a matéria esteja pacificada e a legislação seja clara, persistem desafios na sua aplicação prática tendo em vista que muitos empregadores ainda questionam os impactos econômicos da estabilidade provisória, e algumas trabalhadoras encontram dificuldades para comprovar a gravidez ou acessar os direitos assegurados. A discussão sobre possíveis reformas legislativas e aprimoramentos nas políticas de apoio à maternidade continua sendo um tema relevante e constante.
Em síntese, a garantia constitucional da estabilidade provisória para gestantes representa um avanço significativo na proteção dos direitos das mulheres trabalhadoras, especialmente à luz das recentes decisões judiciais. É essencial que empregadores e empregados estejam plenamente informados sobre esses direitos e as obrigações correspondentes, a fim de promover um ambiente de trabalho justo e seguro.
Referências
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho: aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Senado Federal: Centro Gráfico, 1988
DELGADO. Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 16ª edição. São Paulo. LTr, 2017.
NARDELLI. Ernane de Oliveira. Gestante com contrato temporário tem estabilidade, decide STF. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/397861/gestante-com-contrato-temporario-tem-estabilidade-decide-stf. Acesso em: 29 de jul. 2024.
Advogada. Graduada em Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UNICEUB. Pós-graduada em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Faculdade Legale Educacional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, DESIREE EVANGELISTA DA. Garantia Constitucional à Estabilidade Provisória para Gestantes Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 out 2024, 04:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/3749/garantia-constitucional-estabilidade-provisria-para-gestantes. Acesso em: 26 dez 2024.
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