A procura por subsídios e assistência mútua, são marcos históricos da sobrevivência humana. Como principal sinal civilizatório, conforme a antropóloga norte americana Margaret Mead, foi a constatação de um fêmur curado; o mais longo e importante osso da constituição anatômica humana, ligando o quadril ao joelho, equivale a um período de convalescência de em média seis meses.
A garantia de cuidados médicos e alimentares dependia do senso humanitário em auxiliar aquele, temporariamente debilitado; na ausência de compaixão, restava-se a própria sorte. A constância dos núcleos familiares tornou-se a garantia tanto da continuidade da espécie, quanto da manutenção social; recebendo especial atenção do compêndio jurídico civilizatório, a proteção social a família como uma garantia do Estado.
Com o aumento populacional ocasionado pela institucionalização familiar, foram necessários núcleos de apoio externo para garantir a proteção social: As instituições religiosas e mutualistas. As casas de caridade financiadas pelos próprios adeptos religiosos, supriam quase prioritariamente, as necessidades básicas de sobrevivência: alimentação e vestimenta. As instituições mutualistas, constituem um sistema particular de financiamento emergencial; com colaboradores ilimitados, forneciam assistência aos moradores locais.
O Estado como patrocinador oficial da assistência social, fora o marco final desta trajetória, modelo adotado a nível internacional com adaptações legislativas conforme costumes e necessidades locais, todavia, com igual intento: Bem estar social.
Pode-se considerar como um marco para as políticas de seguridade e assistência social, a lei promulgada na Inglaterra durante o reinado da rainha Elizabeth I em 1601 a Poor Law’s (Lei dos pobres). Esta lei fora uma forma de combate a “mendicância e vagabundagem” caráter mais protetivo e positivado do Estado do que assistencial; apesar das Paróquias já terem autorização para a coleta de donativos dirigidos aos cuidados dos mais necessitados desde o ano de 1563; a lei manteve as instituições religiosas como agente ativo e institucionalizou as doações como imposto de caridade direcionado às classes média e alta.
O critério de divisão política legislativa, categorizava os necessitados em três classes distintas: incapazes de trabalhar, eram destinados a asilos (almshouses); capacitados ao trabalho, ficavam em casas de trabalho forçado (workhouses); aqueles negavam a compulsoriedade do trabalho e temperamento inadequado, eram enviados para as prisões ou casas de correção. O sistema Poor Law’s subsistiu até a concepção do Estado de bem-estar; pós 2ª guerra mundial, caindo em desuso no século XX. O caráter correcional da lei foi observado e evitado, disponibilizou-se novas fontes de renda de caráter assistencial (sociedades filantrópicas e sindicatos). A política do Estado mínimo e reformas sociais graduadas foi adotado como meio de garantir a assistência social até a contemporaneidade, Winston S. Churchill e Magareth Thatcher são os principais exemplos políticos de aplicação desta concepção governamental.
O plano de seguridade social inglesa, projeto desenvolvido pelo Barão Sir Willian Henry Beveridge; durante o período da segunda guerra (1942) o Relatório Beveridge (Report on Social Insurance and Allied) se baseou no modelo alemão, com pontuais adaptações. O princípio da universalização e proteção consistia na garantia do nível de vida mínimo a todos os indivíduos indistintamente. Semelhante ao sistema contributivo atual, reservada parcela do salário vigente de todo trabalhador era destinada ao subsídio de doentes, desempregados, reformados e viúvas; o sistema de contribuição substituiu o pensionato estadual. Dois grandes sistemas de seguridade social são mundialmente reconhecidos como programas assistenciais de proteção social: O sistema inglês “beveridgiano” e o sistema alemão “bismarckiano”; enquanto a universalização caracteriza o sistema previdenciário inglês, o critério protetivo do mercado de trabalho, qualifica o sistema alemão.
O sistema bismarckiano foi o modelo difundido para a instituição previdenciária de todo o mundo, México (1917) Alemanha (1919) Estados Unidos (1935) sobretudo Reino Unido (1942). O modelo inglês (beveridgiano) adequou a previdência conforme as necessidades, além de ampliar seu alcance aos não contribuintes com a instituição dos benefícios; deve-se a amplitude previdenciária ao estado de escassez e miserabilidade instalados, decorrente do findar da segunda guerra mundial; o princípio de universalização e bem estar social passam a ser os novos parâmetros internacionais de diretrizes globais.
No Brasil, apesar da garantia de amparo aos necessitados constar desde nossa primeira Constituição (Título 8º, inciso XXXI da Carta de 1824) esta assistência operou de maneira descentralizada durante longo período. Pela característica de Estado confessional, sistema monárquico e plutocracia; havia a concepção jurídica de seguridade social, mas sua efetividade dependia de organismos externos a jurisdição; sendo de responsabilidade exclusiva religiosa por 65 anos.
O Decreto Legislativo 4.862/1923, redigido pelo deputado Eloy Marcondes de Miranda Chaves, atuando em favor da classe ferroviária, consolidou a base do sistema previdenciário brasileiro, considerada marco inicial legislativo, considera-se o dia 24 de janeiro, dia nacional da previdência nacional, em referência a data de promulgação da referida lei. A partir de 1926, a lei foi estendida as demais categorias profissionais, como portuários e marítimos, telegráficos e radiotelegráficos. A incumbência de custeio, progressivamente fora transferida ao Estado por intermédios dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs) organizados conforme o ramo de atividade e categoria profissional; a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (1930) tanto possibilitou a substituição quanto as inovações.
O processo de uniformização da legislação previdenciária teve início com a Lei Orgânica da Previdência Social (Lei nº 3.807/1960) assim, os Institutos de Pensões passam a ser unificados sob a denominação Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). A Lei nº 6.036/1974 instituiu o Ministério da Previdência e Assistência Social, entidade responsável pela administração dos direitos do seguro social do contribuinte, bem como, a transferência de renda da previdência social; por fim, o Sistema Nacional de Previdência Social foi instituído pela lei nº 6.439/77 (SINPAS) sendo o primeiro sistema de seguridade social brasileira, coordenado pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, consolidou o conceito de seguridade em três esferas: Saúde, Assistência e Previdência.
O sistema de proteção social forma o tripé da seguridade social, sob o conceito do mínimo necessário à sobrevivência. O objetivo fundamental é atuar como instrumento de bem estar e justiça social, reduzindo desigualdades sob atuação conjunta dos Poderes Públicos (executivo, legislativo e judiciário) e Sociedade.
É perceptível nesta longa trajetória que a Previdência Social não fora instituída como primado Estatal, não obstante, o reconhecimento do necessário amparo legislativo se deu por longo processo histórico tendo fortalecido seu escopo na atual Constituição (título VIII Da Ordem Social, Artigo 194) sob o conceito de seguridade social; bem como seus principados, amparado sob a primado do trabalho objetivando o bem estar, equidade e justiça social. É inegável o vínculo entre a relação trabalhista e previdenciária durante o processo de globalização, bem como a necessária mão de obra por intermédio da formalização do trabalho para efetivar as relações sociais e comerciais. A garantia do reconhecimento pós laboral e segurança durante sua efetividade, constituem o primado da Previdência Social, a efetivação da segurança jurídica a nível nacional e internacional.
A preocupação com o futuro é uma realidade desde os primórdios da humanidade, guardar mantimentos para resguardo durante o inverno, alçar as construções contra as intemperanças climáticas; além destas inquietações já solucionadas (em parte) pelo mundo moderno, há a preocupação monetária para a conservação destas necessidades; o problema da sobrevivência humana, não é uma questão passível de solução definitiva, mas gradativa.
Destarte nossa pretensa evolução de caçador coletor para empreendedor acumulador, a Previdência Social fora a formalização legislativa deste consterno, bem como critério garantidor da eterna questão humana: A sobrevivência.
Advogada. Autora de artigos jurídicos.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FALKOWSKI, Camila. Uma questão de sobrevivência. A historicidade da Previdência Social até os dias atuais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 nov 2024, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/3767/uma-questo-de-sobrevivncia-a-historicidade-da-previdncia-social-at-os-dias-atuais. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: Alexandre S. Triches
Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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