SUMÁRIO: Introdução, 1.0 Dignidade da Pessoa Humana e a Visão Constitucional do Direito de Família, 2.0 Instituto da Curatela, 2.1 A Dificuldade Doutrinária de Conceituação do Instituto da Curatela, 3.0 Aplicação Supletiva à Curatela das Disposições Legais do Instituto da Tutela, 4.0 Casos de Não Sujeição à Curatela, 5.0 Espécies e Classificação de Curatela, 6.0 Da Legitimação Para Requerimento de Interdição, 7.0 Processo de Interdição: Procedimentos, 8.0 Curatela do Enfermo e de Deficiente Físico, 8.1 Curatela do Artigo 1.780 do Cc-2002 Como Forma de Efetivar o Respeito à Dignidade da Pessoa Humana, Conclusão, Referência Bibliográfica
INTRUDUÇÃO
A presente pesquisa tem por objetivo específico abordar o artigo 1.780 do Código Civil de 2002 através de uma interpretação constitucional, onde o artigo será tido como concretizador do respeito à dignidade da pessoa humana, fundamento da Republica Federativa do Brasil (art.3, III, CRFB).
Contudo, anteriormente as disposições gerais sobre a curatela prevista pelo artigo 1.780 do CC-2002 será explicado o que é dignidade da pessoa humana, em título próprio. Lembrando sempre da dificuldade que se é conceituar dignidade, em razão de ter natureza principiológica.
Será analisado também a orientação que se tem atualmente do Direito de Família. Este ramo do Direito deve ter uma visão Civil-Constitucional, tendo em vista que a Carta Magna de 1988 é um texto político hierarquicamente superior a qualquer norma existente no ordenamento jurídico brasileiro. Além de que seus princípios devem ser sempre aplicados e obedecidos.
Como versa o artigo 1.780 do CC-2008 uma modalidade de curatela, será necessário passar por alguns títulos que demonstraram basicamente: conceituação, classificação e espécies de curatela, casos de não sujeição à curatela, legitimação para promover interdição, e por fim, procedimentos da curatela.
Todos estes pontos serão abordados graças à orientação legal e principalmente doutrinária.
Por fim, a presente pesquisa abordará sobre a aplicação do artigo 1.780 do CC-2002 como elemento que efetivará o respeito à dignidade da pessoa humana dos enfermos e deficientes físicos. Será, portanto, este tópico visualizado esta modalidade de curatela sob uma perspectiva eminentemente constitucional.
1.0 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A VISÃO CONSTITUCIONAL DO DIREITO DE FAMÍLIA
É certo que toda matéria de Direito Civil atualmente possui uma visão eminentemente constitucional. Não ocorreu diferente com o Direito de Família, tanto é que se fala em uma visão Civil-Constitucional da Família.
Neste sentido, afirma romanticamente Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, a saber:
“com a Lex Fudamentallis de 1988 determinando uma nova navegação aos juristas, observando que a bússola norteadora das viagens jurídicas tem de ser a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), a solidariedade social e a erradicação da pobreza (art. 3º) e a igualdade substancial (art.3º e 5º), o Direito de Família ganhou novos ares, possibilitando viagens em mares revoltos, agora em “céu de brigadeiro”. A família do novo milênio, ancora na segurança constitucional, é igualitária, democrática e plural” (FARIAS, ROSENVALD, p. 9, 2008)
Quer se estabelecer, portanto, que o Direito de Família, não carrega mais consigo definições com cargas históricas e culturais. Atualmente, respeitam-se veementemente todos os princípios constitucionais que se aplicam ao Direito de Família.
Vale dizer que a família é instrumento de promoção e desenvolvimento da pessoa humana. A proteção que se tem e atribui hoje à família é em razão dos seres humanos que a compõem. Em outras palavras,
“a preocupação central do ordenamento é com “a pessoa humana, o desenvolvimento de sua personalidade o elemento finalístico da proteção estatal, pra cuja realização devem convergir todas as normas de direito positivo” (TEPEDINO, citado por FARIAS, ROSENVALD, p. 9, 2008
Portanto, não há dúvida que a Carta Magna de 1988 é superior hierarquicamente a qualquer outra norma jurídica, incluí-se o Código Civil de 2002. Vale aqui dizer que o artigo 1.780 do Código Civil deverá ser aplicado em obediência aos princípios constitucionais atinentes à matéria. Tal posicionamento será tratado em título especifico.
Foi reservado este tópico para afirmar sobre a importância do principio da dignidade da pessoa humana, já que a família atualmente é vislumbrada como instrumento que promove o desenvolvimento pessoal do ser humano.
Já foi afirmado que definir, dignidade, “não é tarefa fácil, pois o termo possui para o Direito natureza principiológica” (PINTO, p. 53, 2009), mas ainda sim a doutrina consegue brilhantemente fazer a conceituação de tal principio constitucional. A dignidade da pessoa humana pode ser entendida como sendo:
“referência unificadora dos direitos fundamentais à espécie humana, ou seja, daqueles direitos que visam garantir o conforto existencial das pessoas, protegendo-as de sofrimentos evitáveis na esfera social” (CHUIMENTI; CAPZ; ROSA; SANTOS, p. 34,2007)
Unificadora porque o conceito de dignidade humano é base para todo o ordenamento jurídico e para os direitos fundamentais, sejam eles sociais, políticos e civis.
Neste sentido, Kildare Gonçalves Carvalho, afirma que dignidade da pessoa humana “significa não só um reconhecimento do valor do homem em sua dimensão de liberdade, como também de que o próprio Estado se constrói com base nesse princípio” (CARVALHO, p. 654, 2008).
Por fim, uma ultima tentativa de conceituação de dignidade da pessoa humana é verificada na obra de Gagliano e Pamplona, citado por Davi Souza de Paula Pinto, a saber:
“(...) traduz um valor fundamental de respeito à existência humana, segunda as suas possibilidades e expectativas patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua realização pessoal e à busca da felicidade” (GAGLIANO; PAMPLONA, citado por PINTO, p. 53, 2009)
Conforme dito, em capítulo próprio veremos como se amolda o princípio da dignidade da pessoa humana quanto à aplicação do artigo 1.780 do CC-2002. Mas, primeiramente é importante saber sobre curatela, sua classificação e procedimentos.
2.0 INSTITUTO DA CURATELA
2.1 A Dificuldade Doutrinária de Conceituação do Instituto da Curatela
Já é sabido que a maioridade se completa aos 18 anos, sendo presumido que a pessoa é capaz de exercer os atos da vida civil. Neste sentido, afirma Washington Monteiro de Barros que em princípio “todo indivíduo deve por si mesmo reger sua pessoa e administrar seus bens. A capacidade sempre se presume.” (MONTEIRO, p. 400, 2006).
Ocorre que “por motivos diversos, há quem, em razão de doença ou deficiência mental, se acha impossibilitado de cuidar dos seus próprios interesses” (DIAS, p. 483, 2006). Daí a necessidade de proteção, e é por meio da curatela que os interesses pessoais e materiais serão resguardados, por pessoa responsável.
A curatela é um instituto protetivo e assistencial aos “maiores de idade, mas incapazes, isto é sem condições de zelar por seus próprios interesses, reger sua vida e administrar seus patrimônios” (DIAS, p. 483, 2006).
Outra conceituação bastante plausível para o entendimento do instituto da curatela é atribuída pelo prof. Roberto Senise Lisboa. O autor, afirma que a curatela pode ser tida como um instrumento que suplementa o poder familiar “cujo objetivo é o exercício de atividade assecuratória dos interesses pessoais e econômicos do incapaz, por motivos diversos da idade cronológica” (LISBOA, p.329, 2006).
É bastante importante entender que a fundamentação da curatela não se dá pela razão da incapacidade cronológica, ou seja, o menor de 16 anos que deverá ser representado, e o maior de 16 e menor de 18 anos, que deverá ser assistido, e sim, por outros motivos previstos em lei que gera incapacidade a determinadas pessoas.
Apesar de maior parte da doutrina afirmar que a curatela será aplicada aos maiores de idade, com algumas circunstâncias que o definem como incapazes para exercer alguns atos ou negócios jurídicos, são sujeitos também à curatela “os nascituros, os ausentes, os enfermos e os deficientes físicos” (DIAS, p. 483, 2006).
Por este motivo, podemos colacionar a melhor definição da doutrina, quanto à curatela, onde há afirmação de que esta “destina-se, via de regra, a sujeitos maiores de idade aplicando-se, por exceção aos nascituros e aos menores” (LISBOA, p. 329, 2006).
O problema da definição de curatela é que por haver várias espécies de curatela no ordenamento jurídico brasileiro os autores ora pecam pela especificidade de suas definições, ora pecam pela abstração. Por este motivo, para evitar qualquer equívoco é necessário observar todas as modalidades de tentativa de conceituação, contudo, fazendo as devidas observações, por se tratar de pesquisa cientifica.
Sob orientação deste raciocínio outra definição de curatela deve ser objeto de estudo. Esta, conforme se verá é estabelecida em razão do artigo 1767 do CC-2002, a saber:
“a curatela advém da necessidade de representação ou assistência de uma pessoa que possui algum distúrbio biopsíquico (art.1767, I a V, do CC) que impede o pleno discernimento para a prática de atos e negócios jurídicos” (LISBOA, p. 329, 2006)
A conceituação acima foi abordada pelo autor em local inapropriado em sua obra, tendo em vista que a definição encontra-se em título que retrata sobre a importância do tema, fato este, que pode confundir o entendimento dos leitores e limitar a amplitude que tem o instituto.
Por esta razão, não se pode compreender a curatela somente como pressuposto de distúrbios biopsíquicos, mas incluí-se qualquer outra “circunstância que imponha a representação a alguém” (LÔBO, p. 384, 2008). Nesta definição incluí-se também a assistência, tendo em vista que a decisão judicial estabelecerá os limites à curatela. Em outras palavras, a decisão judicial fundamentada estabelecerá se a incapacidade do curatelado será absoluta ou relativa, e por conseqüência os limites da função do curador.
Neste sentido, afirma a doutrina que a curatela “somente pode ser estabelecida por meio de decisão judicial” (LISBOA, p. 330, 2006).
Na prática forense e inclusive por determinação legal o curador protege os bens do curatelado, desta forma a doutrina vem sustentando que o principal aspecto da curatela é o patrimonial ”pois o curador protege essencialmente os bens do interdito, auxiliando em sua manutenção e impedindo que sejam dissipados” (VENOSA, p.422, 2007), o que não é verdade. O curador possui outras obrigações que não infere somente no âmbito patrimonial do curatelado, a saber:
“a)a apresentação do inventário de bens pertencentes ao curatelado, para os fins de fixação do seu patrimônio pessoal;
b) a prestação de contas, por meio do fornecimento do balanço anual e bienal das contas e das atividades inerentes à curatela, conforme deliberado pelo juiz;
c) a administração dos bens do curatelado;
d) a defesa dos interesses morais e patrimoniais do curatelado;
e) a representação ou assistência do curatelado na prática de atos e negócios jurídicos, conforme ele seja absolutamente ou relativamente incapaz” (LISBOA, p. 332/333, 2006) (grifo nosso)
Para se compreender melhor a curatela é preciso observar os sujeitos que compõem este instituto criado pelo ordenamento jurídico: curador, curatelado.
Epistemologicamente “curador” é uma palavra de origem latina, “curare, que significa cuidar: quem exerce a curatela cuida dos interesses do incapaz” (VENOSA, p. 422, 2007), portanto, podemos observar que o instituto da curatela está presente no Direito Pátrio, por óbvio, que com características e modos peculiares ao tempo de sua aplicação.
Atualmente, a definição atribuída ao termo “curador” foi aprimorada pelo Direito. Curador, portanto, é aquela pessoa tida como “representante ou assistente legal que vela pelos interesses do que é judicialmente reconhecido como incapaz por causa diversa da idade cronológica” (LISBOA, p 332, 2006).
O curatelado é incapaz (definido assim por sentença judicial) que recebe os cuidados que melhor protege seus interesses, é “em geral, (...) pessoa maior com debilidade ou insuficiência mental para realizar os atos da vida civil, dependente de decisão judicial de interdição” (LÔBO, p.385, 2008). Importante fazer apenas uma pequena ressalva, quanto àquelas figuras já trabalhadas. Ex.: nascituro, enfermo, deficiente físico, ausentes, etc., que devem ser incluídas no rol dos curatelados.
Visto que há a presença do curador e curatelado, importante entender também que a curatela é tida como um serviço público, prestado “por particulares em caráter compulsório. Têm natureza de múnus, como acontece com o poder familiar dos pais em relação aos filhos” (LÔBO, p. 385,2008). Portanto, o curador possui um cargo que só pode ser recusado em circunstancias definidas pela lei.
Neste leque dispõe Washington de Barros Monteiro, que a curatela é um “encargo deferido por lei a alguém para reger uma pessoa e administrar seus bens, quando esta não pode fazê-lo por si mesma.” (MONTEIRO, p. 400, 2006).
3.0 APLICAÇÃO SUPLETIVA À CURATELA DAS DISPOSIÇÕES LEGAIS DO INSTITUTO DA TUTELA
É bom afirmar de logo que curatela não se confunde com tutela, ainda que ambos os institutos tenham função protetiva e assistencial em favor do incapaz. Vários são os pontos que distinguem a curatela da tutela, contudo, não cabe aqui fazer as contraposições destes institutos.
Importante neste capítulo somente a verificação de que à curatela será aplicado “no que for cabível, o regime da tutela” (LISBOA, p. 330, 2006), por força do art. 1.774 do CC-2002.
Portanto, resumidamente, somente no que couber, ou seja, no que a lei não estabelecer aplicação própria para a curatela, os curadores deveram:
“se ater aos atos de administração, alguns subordinados a autorização judicial (...) prestação de contas. O mesmo sistema de escusas da tutela se aplica. O mesmo (...) acerca das garantias da tutela, remoção e dispensa do tutor, também se amolda à curatela” (VENOSA, p. 424, 2007)
a) responsabilidade sobre a administração dos bens, motivo pelo qual o curador deverá proceder ao pagamento das despesas necessárias para a conservação e a melhoria dos bens do seu respectivo pupilo, aplicando valores mobiliários e efetuando ainda, o pagamento das dívidas pessoais do interdito e recebendo, como representante ou assistente legal, os créditos devidos ao curatelado (...), b) a prestação de contas, que pode ser determinada judicialmente a qualquer tempo, sem prejuízo de sua prestação ordinária a cada biênio (...), c) a apresentação do balanço, d) especificação da hipoteca legal, para os fins de garantia de prejuízo patrimonial do curatelado que tenha sido causado pelo curador, sem prejuízo de eventual garantia real ou de garantia fidejussória complementar, proferindo-se caução, quando ela se tornar possível (...), e) a remoção do curador (...) f) a responsabilidade do juiz de direito (...) direta e pessoalmente quando não proceder a nomeação do curador, ou assim não tiver feito oportunamente” (LISBOA, p. 337/338, 2006) (grifo nosso)
O que se pode perceber, portanto, é que o legislador, por economia legislativa, inclusive textual, se valeu de tal técnica afirmando no artigo, 1.174 do Código Civil, que haverá aplicação à curatela as disposições concernentes à tutela, no que couber.
4.0 CASOS DE NÃO SUJEIÇÃO À CURATELA
A presente pesquisa já mencionou os casos e as pessoas que possam ser sujeitos à curatela. Todos os sujeitos estão dispostos nos artigos 1.767, 1.779 e art. 1.780 do Código Civil de 2002.
Ocorre que insistentemente o Poder Judiciário recebe demandas judiciais, no sentido de que determinados grupos de pessoas possam ser sujeitos à curatela. A título de exemplo, o artigo 1.780 da referida lei estabelece sobre pessoas com enfermidade e pessoas com deficiência física. Contudo, qual o grau e que tipos de enfermidades são plausíveis de ser concedida ao enfermo à curatela?
Já é sabido também, que por deficiência física, não podem ser entendidos como deficientes físicos aquelas pessoas que apresentam alguma necessidade física visível. Em outras palavras, o termo “deficiência física” é abrangente.
E mais, a deficiência e a doença deve ser motivo de gerar certo grau de incapacidade a pessoa. Contudo, conforme se verá em título próprio existem posicionamentos que a curadoria do artigo 1.780 do Código Civil, não se destina tipicamente a um incapaz, e sim a pessoas que não possuem condições físicas ou materiais para satisfação de seus interesses.
Portanto, a doutrina, e de certa forma posicionamentos jurisprudenciais, na tentativa de limitar o rol de sujeitos à curatela afirmam que determinadas deficiências e doenças por si só não se justifica, vejamos os posicionamentos de alguns doutrinadores de Direito de Família:
“Nem o cego nem o surdo estão sujeitos à curatela. O analfabetismo também não constitui motivo bastante para a interdição. Igualmente, a simples, idade avançada não a justifica. Mero enfraquecimento psíquico é expressão de normalidade própria da idade e não configura alteração mental” (DIAS, p. 485, 2006)
“(...) Não há outras pessoas sujeitas à curatela: velhice, cegueira, analfabetismo etc, não permitem, por si só, a interdição. Há a necessidade que ao interdito falte o devido discernimento” (VENOSA, p. 423, 2007)
“Não há outras pessoas sujeitas à curatela; analfabetismo, idade provecta, por si sós, não constituem motivo bastante para interdição. A velhice acarreta, sem duvidas, diversos males, verdadeiro cortejo de transtornos, mas só quando assume caráter psicopático, com estado de involução senil em desenvolvimento e tendência a se agravar, pode sujeitar o paciente a curatela; enquanto não importe em deficiência, não reclama intervenção legal. ” (MONTEIRO, p. 404, 2006).
5.0 ESPÉCIES E CLASSIFICAÇÃO DE CURATELA
Antes de justificarmos que a aplicação do artigo 1.780 efetiva o respeito à dignidade da pessoa humana, princípio constitucional estabelecido como Fundamento da República federativa do Brasil, é necessário conhecer a existência de uma classificação e espécies de curatelas, visto que a curatela do enfermo e do deficiente físico é objeto desta classificação.
Conforme se verifica no Código Civil de 2002 e é apontado pela doutrina, existem sete espécies de curatela sendo: “cinco enunciadas no art. 1767, a curatela do nascituro (art. 1.779) e a curatela do enfermo e portador de deficiência física (art. 1780)” (VENOSA, p. 422, 2007).
Há autores, como Roberto Senise Lisboa, classificam as espécies de curatela em: ordinária e extraordinária; curatela legal, voluntária ou judicial; curatela parcial ou total.
Curatela ordinária é aquela “conferida para a representação ou assistência de pessoas que, apesar de terem atingido a maioridade, encontra-se impossibilitadas de pratica alguns ou todos os atos da vida civil” (LISBOA, p. 334,2006), caso previsto no artigo 1.767 do CC.
Curatela extraordinária “é aquela conferida por motivos que não são inerentes à sua natureza” (LISBOA p. 335, 2006), é o caso do nascituro, do ausente, do menor, do enfermo ou do deficiente físico e, por fim, a curatela específica.
Importa lembrar que a curatela ordinária e a extraordinária, dependendo do caso poderá ser legal, voluntária ou judicial, parcial ou total.
Curatela legal “é aquela que decorre de expressa disposição da lei” (LISBOA, p.336, 2006). É a lei, portanto, que dirá as circunstâncias e a necessidade de aplicação do instituto da curatela, e por conseqüência a abertura dos procedimentos de interdição.
Já a curatela voluntária é aquela “que decorre de declaração constante do testamento ou documento autêntico equivalente a de quem se encontra no exercício do poder familiar” (LISBOA, p. 336, 2006). Portanto, neste caso, é indispensável a ocorrência de uma declaração por escrito, e que o declarante esteja na condição detentora do poder familiar.
A curatela judicial decorre de uma decisão de juízo competente, esta decisão do juiz estabelecerá, conforme o caso, a aplicação do instituto da curatela, bem como os limites da curatela.
Conforme já apontado, a curatela pode ser total ou parcial. Total é aquela que impede que o curatelado pratique “ato ou negócio jurídico, senão por meio de representante ou acompanhado de seu assistente legal, conforme o caso” (LISBOA, p. 336, 2006). Parcial conforme expressão impede o curatelado, somente para a pratica de determinados atos ou negócios jurídicos.
6.0 DA LEGITIMAÇÃO PARA REQUERIMENTO DE INTERDIÇÃO
Quanto ao que concerne no processo de interdição a curatela, São legitimados para promover a interdição os sujeitos descritos no artigo 1.768 do Código Civil, a saber
“Art. 1.768 – A interdição deve ser promovida;
I – pelos pais ou tutores;
II – pelo cônjuge, ou por qualquer parente;
III – pelo Ministério Público. (Art. 1.768, CC-2002)
Apenas uma ressalva deve ser posta no artigo acima transcrito. O companheiro também possui legitimidade para promover interdição, esta possibilidade se dá em razão do projeto de nº.: 6.960.
Outro fato bastante importante de mencionar é que o Ministério Público atua somente nas circunstâncias que prever o artigo 1.769 do Código Civil, e obedecido o disposto no artigo 1.770 da mesma lei, tendo em vista que “a ampla defesa por parte do indigitado incapaz é importantíssima” (VENOSA, p. 432, 2007).
Portanto, as pessoas acima mencionadas estão aptas e legitimadas pela lei para promover a interdição daqueles que podem ser sujeitos à curatela. Importante lembrar que não há uma ordem de preferência e que a propositura da ação “não é prerrogativa de uma única pessoa. Mais de um legitimado pode requerer a curatela, formando-se um litisconsórcio facultativo” (DIAS, p. 486, 2006).
O artigo 1.775 e §§ dispõe também sobre as pessoas legitimadas a serem curadores que deve ser observado.
7.0 PROCESSO DE INTERDIÇÃO: PROCEDIMENTOS
Quanto ao processo de interdição além das prerrogativas encontradas no Código Civil, o procedimento é regulado pelos artigos 1.177 a 1.186 do CPC.
Por força do artigo 1.771 do CC, o juiz antes de manifestar sobre a interdição “examinará pessoalmente o indigitado incapaz, para seu convencimento” (LÔBO, p. 396,2008). Na maioria dos casos o juiz, além de examinar pessoalmente o indigitado incapaz, se valerá de especialistas da área correspondente ao caso. O laudo, portanto, “permitirá o juiz definir os limites da curatela” (LÔBO, p. 396, 2008), conforme o exposto no artigo 1.772 do Código Civil.
Cabe ressaltar que o interditando poderá constituir advogado “para contestar a ação no prazo de cinco dias” (DIAS, p. 489, 2006), justamente para garantir a ampla defesa, um direito consagrado constitucionalmente.
Quanto à sentença de interdição deve se ater o curador a regulamentação do artigo 1.184 do Código de Processo Civil, e ao art. 1.773 do Código Civil. No mesmo sentido das disposições legais mencionadas, estabelece resumidamente Paulo Lobo, senão vejamos:
“A sentença de interdição não está sujeita ao trânsito em julgado. Produz efeitos de imediato, independentemente de haver recursos pendentes. Será imediatamente registrada no registro civil do interditado e publicada na imprensa para conhecimento do público” (LÒBO, p. 396, 2008)
A sentença que declara a interdição, também nomeara o curador para o interdito. A controvérsia na doutrina quanto à sentença, refere-se à validade dos atos praticados pelo interditado antes da desta. Se a sentença é tida como declaratória possuirá efeito ex tunc, e se for tida como constitutiva possuirá efeito ex nunc.
O problema se resolve na doutrina de Sílvio de Salvo Venosa, senão vejamos
“O Código Processual deu evidente cunho declaratório à sentença de interdição que, antologicamente, tem conteúdo constitutivo. Não pode a incapacidade firmada na sentença retroagir a período anterior. Os atos praticados pelo interdito são nulos ex nunc. Para os atos praticados anteriormente a sentença, deve ser proposta ação de nulidade dos negócios jurídicos praticados pelo agente incapacitado. Nessa situação, em prol dos contratantes de boa-fé, somente é de se anular o ato quando a anomalia mental ressalta evidente, saltando aos olhos do homem médio, sob pena de trazer insegurança às relações jurídicas. (...) Assim, nem para o momento da propositura da ação pode ser admitida retroação da incapacidade” (VENOSA, p. 434/435, 2007)
Apesar de ser tida como declaratória e ainda possuir força de sentença constitutiva, para a doutrina, não pode ser concebível anulação de todos os atos praticados pelo incapacitado anteriormente a sentença. Todavia, para anular os atos por este praticado é possível somente em processo de nulidade, somente em determinados casos.
8.0 CURATELA DO ENFERMO E PORTADOR DE DEFICIÊNCIA
8.1 Curatela do Artigo 1.780 do CC-2002 como Forma de Efetivar o Respeito à Dignidade da Pessoa Humana.
A curatela prevista pelo artigo 1.780 do CC-2002 é considerada como curatela “de menor extensão, até porque não se destina a um incapaz. O requerente é que definirá o âmbito de abrangência da curatela” (DIAS, p. 488, 2006). Conforme se observa esta curatela é especifica a pessoas enfermas ou com deficiência física. A afirmação de que esta modalidade de curatela é de menor extensão, é justamente porque, trata de pessoa que “não possui plenas condições físicas ou materiais para exercer seu papel negocial e cuidar de seus próprios interesses” (VENOSA, p. 431, 2007), e não de incapacidade propriamente dita.
A previsão do artigo 1.780, da referida lei, dispõe sobre a possibilidade do próprio curatelado, requerer a curatela, neste caso “é ele mesmo quem definirá o âmbito pretendido para a sua curatela” (VENOSA, p. 431, 2007).
Quando faltar possibilidade o enfermo ou o portador de necessidade física, terceiros legitimados poderão ingressar “com o pedido da curatela, o magistrado deve ter o cuidado de examinar os motivos do requerimento e a sua utilidade” (VENOSA, p. 431, 2007), e se possível deve ainda, ter a concordância do interditando.
Além das pessoas legitimadas pelo artigo 1.768 do CC, o companheiro também “deve ter essa legitimidade, com lembra o projeto nº 6.960” (VENOSA, p. 431, 2007).
Outra observação, importante a ser feita é que o Ministério Público, na prática é muito difícil de propor esta modalidade de curatela, tendo em vista ao próprio caráter apregoado pelo artigo 1.780 do CC. .
Por ser de menor extensão, denominado de curatela administrativa, alguns autores se demonstram céticos para este instituto afirmando que o contrato de mandato pode substituir a curatela administrativa. Contundo Venosa, afirma que este tipo de curatela é de suma importância para determinados casos, imaginando a seguinte situação: “o tetraplégico, para quem todo em qualquer ato é de sofrimento; daquele que tem moléstia progressiva incurável etc” (VENOSA, p. 431, 2007).
O presente tipo de curatela, sem sombra de dúvida, promove a dignidade da pessoa humana, tendo em vista que deve se encarar a curatela como um dever de solidariedade, por parte do Estado, da sociedade e de parentes, pelas razões abaixo:
“Ao Estado, para que regule as perspectivas garantias e assegure a proteção jurisdicional. À sociedade, pois qualquer pessoa que preencha os requisitos legais poderá ser investida pelo Judiciário deste múnus. Aos parentes, porque são os primeiros a serem convocados, salvo se legalmente dispensados” (LÔBO, p. 384, 2008)
Portanto, deve prevalecer à aplicação do artigo 1.780 do CC-2002, como elemento capaz de fazer com que o Estado preserve todos os direitos e garantias ao curatelado; que a sociedade e/ou parentes ao prestar o múnus público exerça de forma a garantir o melhor interesse do curatelado, respeitando assim a sua dignidade.
Conforme já foi visto, toda a matéria de Direito Civil, mergulha sobre as garantias constitucionais firmadas pelo Constituição de 1988. Deve, portanto, o artigo 1.780 do CC ser utilizado como instrumento de promoção e desenvolvimento humano, obedecendo todos os princípios constitucionais atinentes à matéria.
Neste sentido, pode-se afirmar que a o referido artigo, respeita a existência humana, buscando ao máximo, quando da aplicação da curatela, aliviar sofrimentos de enfermos ou deficientes físicos, dentro daquilo que foi estabelecido por sentença judicial.
Por ser base o princípio da dignidade da pessoa humana para todos os princípios existentes no ordenamento jurídico, pode-se dizer que o artigo 1.780, além de reconhecer a existência humana, reconhece também às pessoas sujeitas a esta modalidade de curatela a sua liberdade.
Foi intenção do legislador, além de respeitar a existência humana, fazer com que o enfermo ou o deficiente físico pudesse se realizar pessoalmente, tanto nos aspectos patrimoniais como nos afetivos, buscando assim sua felicidade, que afinal, é intenção de todo individuo.
Portanto, o que sê vê é grande preocupação com os enfermos, e com os deficientes em geral (físico ou mental) que justamente por “recomendação constitucional, vêm recebendo cada vez mais, maior atenção” (CF 23 II, 30 II, 227 §§ 1º e 2º, e 224). (DIAS, p. 483, 2006).
Além disso, é importante ressaltar que está ocorrendo grandes mudanças no comportamento da sociedade, no sentido solidariedade aos enfermos e respeito aos deficientes. O que vale dizer é que atualmente luta-se ao máximo possível por integralização erradicando qualquer forma de discriminação. Luta-se pela liberdade, igualdade e dignidade de todos. E é através da aplicação de normas constitucionais e de normas infra-constitucionais, contudo constitucionalizadas, é que será possível promover a dignidade humana.
CONCLUSÃO
Já é tratado pela doutrina que toda matéria de Direito Civil deve ser revista sob um enfoque constitucional, desta maneira ocorre com o Direito de Família. Em outras palavras, deve ser atribuído a toda e qualquer norma infra-constitucional interpretação constitucional.
É sob este foco que deverá sempre prevalecer os princípios constitucionais, tais como: da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da erradicação da pobreza, da liberdade, etc.
A presente pesquisa propôs um ponto de partida atribuindo melhor conceituação do princípio da dignidade da pessoa humana, já que este é de suma importância, sendo até mesmo considerado como fundamento para todos os outros princípios constitucionais, inclusive fundamento do próprio Estado.
Portanto, concluímos que o princípio da dignidade humana visa garantir o respeito à pessoa humana. Além de respeitar direitos e garantias da pessoa, o referido princípio almeja promover a realização pessoal e fazer com que se evite sofrimentos, buscando se assim a plena felicidade de todos.
Definir o instituto da curatela, apesar de pacífica a doutrina, não é tarefa fácil, tendo em vista às várias modalidades de curatelas existentes. Concluímos que a doutrina ora peca pela espeficidade, ora peca pela abstração. Por tal motivo, foi analisado criticamente todas as possíveis tentativas de conceituação pelas doutrinas pesquisadas.
Curatela é um instituto com caráter protetivo e assistencial, que em geral se aplica aos maiores, contudo, incapazes de gerir sua própria vida e bens, devido à distúrbios biopsíquicos, deficiência e/ou enfermidade. Diga-se de passagem, que não depende a curatela somente de aspectos cronológicos, tendo em vista que há outras circunstancias que definem determinadas pessoas como sendo incapazes.
Concluímos que o legislador sabiamente normatizou sobre a aplicação supletiva à curatela das disposições legais do instituto da tutela, no que for cabível, havendo assim, uma economia legislativa e textual do Código Civil de 2002.
Quanto aos casos de sujeição à curatela, espécies e classificação de curatela. É de se concluir que a doutrina se mostra pacífica, portanto, sem muitas observações a fazer.
Agora quanto ao critério de legitimação para o requerimento de interdição e propriamente o processo de interdição deve ser observado os preceitos legais, tanto do Código Civil, como do Código de Processo Civil, sob pena de nulidade do processo. Somente determinadas categorias de pessoas são legitimadas por lei para promover a interdição do indigito incapaz, e estas deveram se atentar para todos os requisitos processuais que envolvem o processo e interdição.
A curatela prevista pelo artigo 1.780 do CC-2002 é considerada como curatela de menor extensão, por tratar de pessoa que não possui condições plenas, sejam elas físicas ou matérias, para exercer alguns ou todos os atos e negócios jurídicos. As pessoas sujeitas à curatela deste artigo são os enfermos ou os deficientes físicos.
Concluímos que é de suma importância este artigo, nenhum contrato de mantato substitui ou supre tal modalidade de curatela, há casos de deficiência física, e enfermidade que causam intenso sofrimento, impedindo o paciente ou o deficiente a praticar determinados atos da vida civil. Portanto, o art. 1780, deve atender todos os princípios constitucionais promovendo a dignidade da pessoa humana.
Concluímos que a aplicação do artigo 1.780 do CC-2002 deve fazer com que o Estado promova a prestação jurisdicional preservando todos os direitos e garantias do interdito, bem como os curatelados devem exercer a curatela respeitando a dignidade humana do mesmo.
O artigo 1.780 do CC deve a todo momento de sua aplicação pelo Poder Judiciário, respeitar a existência humana, aliviando o sofrimento das pessoas sujeitas a esta curatela (que inclusive em determinados casos são elas mesmo que requerem) atingindo assim seus melhores interesses, sejam eles econômicos ou pessoais.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
CC- 2002
CRFB-1988
Código de Processo Civil
Projeto nº.: 6.960.
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Estudante de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - Betim, Estagiário de Direito do Escritório Dr. Edison Mansur e Advogados Associados, Colaborador de vários sites jurídicos e revistas jurídicas: Revista jurídica Prolegis, Revista Jurídica Netlegis, Revista Jurídica Areópago da Faculdade Unifaimi, Revista Jurídica âmbito-jurídico, Revista jurídica Jusvigilantibus (jusvi), Portal Jurídico Investidura, Portal Jurídico Clubjus, Boletim Jurídico Clubjus, DireitoNet, Viajus, Portal Jurídico Direito Positivo, Universo Jurídico, Lemos & Cruz Livraria e Editora, dentre outros.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINTO, Davi Souza de Paula. Artigo 1.780 do CC-2002 como elemento concretizador do respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 nov 2009, 08:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/18869/artigo-1-780-do-cc-2002-como-elemento-concretizador-do-respeito-ao-principio-da-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 23 dez 2024.
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