SUMÁRIO: Introdução. 1. Suspensão do Contrato de Trabalho. 2. Interrupção Remunerada do Contrato de Trabalho. Considerações Finais. Bibliografia.
INTRODUÇÃO
A suspensão do contrato de trabalho e a interrupção da prestação de serviço são assuntos discutidos entre os doutrinadores e nos tribunais do trabalho. O tema demanda classificação dos tipos de suspensão e do que enfim caracteriza a interrupção da prestação de serviço.
Autores como Arnaldo Sussekind e Orlando Gomes abordam o tema, trazendo à baila a opinião de autores estrangeiros, bem como a jurisprudência nacional, fazendo sempre um paralelo com os textos contidos nos diplomas legais pátrios, sobretudo a CLT.
O princípio da continuidade do contrato de trabalho exige que as suspensões ou interrupções que ocorram, tenham amparo legal e possibilite ao empregado retornar às funções que antes exercia. Contudo, não obriga ao empregador manter sempre o empregado na empresa.
A lei expressa os casos de suspensão admitidos, que não ensejam o pagamento de salário ao empregado, mas a manutenção do emprego e o direito às vantagens atribuídas aos empregados em geral. O legislador também previu os casos de interrupção do contrato de trabalho (denominado na doutrina como interrupção da prestação de serviço), ocorrendo que neste caso o empregador não se exonera da obrigação de pagar os salários.
Conclui-se o presente trabalho, enfocando o esforço do direito do trabalho em proteger as relações de emprego, deixando ao empregado e ao empregador alternativas para as suspensões ou interrupções que se fizerem necessárias. Em considerações finais se falará sobre algumas alterações que estão sendo propostas para a flexibilização da CLT e suas implicações no assunto que ora se apresenta.
1. SUSPENSÃO DO CONTRTATO DE TRABALHO
Conforme ensina Arnaldo Sussekind, a suspensão do contrato de trabalho pode ser total ou parcial. Sendo total “quando empregador e empregado ficam desobrigados, transitoriamente, do cumprimento das obrigações pertinentes ao contrato”[1]. É parcial, a suspensão “quando o empregador deve remunerar o empregado sem que este lhe preste serviço”.[2] À primeira hipótese chamou-se de suspensão, enquanto que à segunda, o legislador conceituou como interrupção.
Neste tópico tratar-se-á da suspensão, que será analisada nos seus aspectos legais e doutrinários.
Consentâneo com a classificação de Sussekind, está Orlando Gomes ao afirmar que a suspensão total dá-se “quando as duas obrigações fundamentais, a de prestar serviço e a de pagar o salário, se tornam reciprocamente inexigíveis”.[3]
A suspensão não acarreta rescisão ou cessação do contrato de trabalho, mas uma paralisação temporária da execução do contrato, tendo na temporariedade sua característica principal. A suspensão não acarreta qualquer efeito sobre o contrato de trabalho, na opinião de Orlando Gomes, o período em que o empregado se afastou do serviço não se incorpora ao seu tempo de serviço, exceto se a lei estabelecer o contrário.
A suspensão do contrato de trabalho pode ocorrer por causas diversas, estabelecidas por força de lei; por fato alheio à vontade do empregado; por ato volitivo do empregado em comum acordo com o empregador ou por fato imputável ao empregado.
Tratando-se de fato alheio à vontade do empregado, tem-se a suspensão por ocasião da prestação do serviço militar obrigatório, o contrato de trabalho é suspenso, pois para Sussekind, “se o empregado não permanece à disposição do empregador, não executa qualquer das obrigações que decorrem do seu contrato, nem recebe, total ou parcialmente prestação de natureza salarial, é evidente que a relação jurídica de emprego está suspensa”.[4] Todavia, nesse caso, a lei estabelece que o período em que o empregado prestou serviço militar, deve ser computado para efeito de indenização e estabilidade. Essa é uma exceção à regra geral que prevê a não contagem do tempo de serviço nos casos de suspensão total do contrato de trabalho. Não se trata aqui do que dispõe o art. 472, §3º, da CLT, onde textualmente a lei diz não haver suspensão do contrato de trabalho, nos casos de convocação quando ocorrer motivo relevante de interesse para a segurança nacional. Aqui o empregador continuará pagando os salários do empregado.
Segundo Orlando Gomes, verifica-se uma suspensão dos efeitos do contrato de trabalho no afastamento em virtude das exigências do serviço militar obrigatório, suspendendo-se as obrigações recíprocas.
O empregado também pode ter suspenso o seu contrato de trabalho para exercício de encargo público ou função equiparada, desde que o empregador não esteja obrigado a pagar-lhe os salários, como era no desempenho das funções de juiz classista na Justiça do Trabalho[5], membro de conselhos previdenciários e titular de mandato eletivo de senador, deputado federal, deputado estadual ou vereador.
Para o exercício de mandato sindical a execução do contrato de trabalho é também suspensa, equiparando-se à licença não remunerada, segundo preleciona Sussekind. Todavia, caracteriza-se como interrupção, se o empregador estiver obrigado ao pagamento dos salários.
No uso do poder disciplinar o empregador também pode suspender o contrato de trabalho do empregado que houver praticado ato faltoso. Essa suspensão disciplinar não pode exceder a 30 (trinta) dias, sob pena de transformar-se em rescisão do contrato de trabalho.
A greve também suspende o contrato de trabalho, conforme estabelece o artigo 7.°, caput, da Lei 7.783/89. Dessa forma, o empregado não presta serviço e o empregador não está obrigado a pagar-lhe os salários. Mantém-se o vínculo contratual (ver tópico sobre interrupção do contrato de trabalho).
A suspensão do contrato de trabalho também pode se dar por motivo de saúde, nos casos em que o empregado necessitar afastar-se do serviço por mais de quinze dias, os efeitos do seu contrato de trabalho são suspensos. O empregado, durante esse período em que estiver afastado do serviço, receberá um auxílio-doença da previdência social. Conforme afirma Sussekind, “enquanto durar o benefício previdenciário, perdurará a inexecução contratual”.[6]
Outra causa de suspensão do contrato de trabalho é a aposentadoria por invalidez (art. 475, CLT). Todavia, a lei 8.213/91 estabelece que tal suspensão persistirá até que o empregado complete 5 (cinco) anos recebendo o respectivo benefício, após esse prazo o empregado é aposentado definitivamente, caso tenha alcançado a idade ou ainda existam os motivos que ensejaram a aposentadoria por invalidez. Caso contrário, voltará, ele, a ativa, sem contudo, Ter as garantias advindas da suspensão do contrato de trabalho, pois o contrato se extingue, seja com a aposentadoria definitiva, seja após o lapso de cinco anos da aposentadoria por invalidez.
Na hipótese de acidente no trabalho o empregado é afastado de suas funções, quando os efeitos do acidente assim o exijam. Fica, ainda assim, o empregador obrigado a pagar-lhe os primeiros quinze dias de afastamento, após esse período, o empregado passará a receber o benefício previdenciário, operando-se, a partir do recebimento deste, a suspensão do contrato de trabalho.
A Medida Provisória 1.716, de 1998, suas reedições e alterações, estabeleceram o que os doutrinadores passaram a chamar: “suspensão bilateral do contrato de trabalho” (Sussekind) ou “Suspensão negociada do contrato individual” (Orlando Gomes – atualizador).
Segundo Orlando Gomes (atualizador) o que a referida Medida Provisória “autoriza é um ajuste de vontades, no sentido de paralisar, por espaço determinado de tempo, a execução do contrato individual de emprego, proporcionando ao empregado, em troca, a participação em curso ou programa de qualificação profissional de responsabilidade do empregador”.[7]
Sussekind anota que tal medida possibilita a “suspensão provisória do contrato de trabalho que vier a ser prevista em convenção ou acordo coletivo, mediante aquiescência formal do empregado”.[8]
A Medida Provisória citada prevê a possibilidade de suspensão do contrato para a capacitação do empregado, valendo ainda observar que o período de suspensão variará de dois a cinco meses e durante o mesmo, o empregado poderá receber uma ajuda financeira do empregador, o que na opinião de Sussekind não tem natureza salarial.
2. INTERRUPÇÃO REMUNERADA DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
A interrupção da prestação do serviço não extingue o contrato de trabalho, da mesma forma que a suspensão também não o faz.
O contrato de trabalho é interrompido nos casos previstos em lei e mantém para o empregador suas obrigações como se o empregado em serviço estivesse. Todavia, exonera o empregado, durante a interrupção, de prestar serviços.
Na interrupção o empregado, além de receber sua remuneração, tem direito às vantagens de sua categoria, tem garantido o seu retorno ao trabalho e também o período da interrupção contado como tempo de serviço.[9]
Orlando Gomes observa que as interrupções “são referidas pela necessidade de assegurar ao empregado a percepção do salário e evitar, por outro lado, a aplicação da pena disciplinar, dado que a assiduidade é um de seus deveres elementares”.
Mesmo não prestando serviço, o empregado, conserva o direito de receber salário, com essa mesma nomenclatura, porque a interrupção não opoera mudança da natureza jurídica do valor recebido pelo empregado.[10]
A Consolidação das Leis do Trabalho, no art. 473, prescreve as hipóteses em que o empregado poderá faltar ao serviço, a saber: dois dias, no caso de falecimento de cônjuge, ascendente, irmão ou pessoa que viva sob sua dependência[11]; até três dias consecutivos, em virtude de casamento; por cinco dias, para o pai, no caso de nascimento de filho[12]; um dia em cada doze meses de trabalho, para doação voluntária de sangue, devidamente comprovada; até dois dias para alistamento eleitoral; no período de tempo em que tiver que cumprir as exigências do serviço militar referidas no art. 65, c, da lei 4.375/64[13]; nos dias em que estiver prestando vestibular; pelo tempo que se fizer necessário, quando tiver de comparecer em juízo.
As interrupções também ocorrem nos casos em que houver convocação do empregado para manobras militares, dada a ocorrência de motivo relevante de interesse para a segurança nacional; para o exercício de encargo público em que o empregador continue obrigado a pagar os salários (ex.: serviço eleitoral, serviços à justiça); quando o empregado exercer mandato sindical e o empregador estiver obrigado a remunerar-lhe; nos casos de greve, quando por acordo coletivo, sentença arbitral ou decisão normativa da justiça do trabalho determinar o pagamento total ou parcial dos salários ou recuperação total ou parcial das horas perdidas e cômputo do período como tempo de serviço.[14]
É também considerado interrupção da prestação de serviço, os primeiros quinze dias em que o empregador está obrigado a pagar, nos casos de doença do empregado ou afastamento por acidente do trabalho.
Na opinião de Sussekind, o repouso semanal remunerado, os feriados, as férias e a licença à gestante, configuram simples interrupções da prestação de serviço.[15] Todavia, para Orlando Gomes, as “férias efetivamente gozadas pelo empregado” (...) “como se trata de um afastamento normal a que tem direito todo e qualquer empregado, pode ser excluído do quadro da suspensão”[16]. Opinião da qual, data venia, preferimos seguir em direção diferente, pois as férias, sendo “afastamento normal” ou não, configuram uma interrupção de fato da prestação de serviço, e, nesse período não se verifica tal prestação pelo empregado, por esse viés assiste razão ao primeiro Autor citado, quando inclui as férias como interrupção.
Nos casos de paralisação temporária por fato atribuível à empresa ou mesmo por força maior, a mesma deve assumir os riscos, conforme estabelece o art. 2.° da CLT. Dessa forma, configurada está a interrupção da prestação de serviços, pois enquanto o empregado estiver à disposição da empresa, ele fará jus ao salário[17].
Quando ocorre paralisação dos serviços em virtude da soberania estatal (factum principis), é o Estado quem se responsabilizará pelo pagamento dos salários e não o empregador (Art. 486, CLT).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A suspensão do contrato de trabalho e a interrupção da prestação de serviço configuram meios para garantir o emprego. As causas estabelecidas em lei constituem um mínimo que se permite, seja feito, estando livre o empregador para abonar as faltas do empregado quando assim entender deva fazer. Ambos também podem negociar sobre um afastamento que julgue necessário, desde que observem as garantias legais.
A tendência é que a suspensão e a interrupção sejam cada vez mais passíveis de negociações entre empregados e empregadores, através dos respectivos sindicatos ou mesmo de um determinado sindicato dos empregados diretamente com uma empresa.
Essa tendência vem se mostrando, sobretudo, quando tramita no Congresso Nacional, projeto de lei que propõe a flexibilização da CLT, conferindo aos acordos e convenções coletivas status superior ao da própria legislação ordinária, vedando somente que aqueles contrariem a Constituição Federal.
Uma vez aprovada, essa lei atribuiria aos sindicatos um papel de “legislar” sobre algumas garantias dos empregados que hoje estão engessadas nos textos legais. Essa atribuição aos sindicatos de realizar acordos ou convenções com força superior ao da própria lei será positiva para o direito do trabalho, cuja função é proteger o empregado, à medida que se busque aumentar as garantias do empregado, evitando que este, além da condição de inferioridade econômica em que se encontra, tenha suas garantias reduzidas ou seja cerceado delas.
A interferência da flexibilização da CLT na suspensão do contrato de trabalho e na interrupção da prestação de serviço estaria no fato de ampliá-las ou reduzi-las, conforme o poder de negociação dos sindicatos.
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Lei 8.213/91. CLT, 2001.
BRASIL. Consolidação das leis do trabalho. CLT, 2001.
GOMES, Orlando & GOTTSCHALK, Elson. Direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
SUSSEKIND, Arnaldo. et al. Instituições de direito do trabalho.vol. 1. São Paulo: LTr, 2001.
[1] SUSSEKIND, Arnaldo, p. 493.
[2] idem
[3] GOMES, Orlando, p. 327
[4] SUSSEKIND, Arnaldo, p. 499
[5] Função extinta pela Emenda Constitucional n.° 24, de 09/12/1999.
[6] SUSSEKIND, Arnaldo, p. 507.
[7] GOMES, Orlando, p. 339.
[8] SUSSEKIND, Arnaldo, p. 514.
[9] SUSSEKIND, Arnaldo, p. 516.
[10] Cf. SUSSEKIND, p. 516.
[11] A lei exige, no mesmo artigo, que tal situação de dependência econômica tenha sido declarada na Carteira de Trabalho.
[12] Constituição Federal, Art. 10, §1º, Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
[13] Exercícios ou manobras, para apresentação das reservas ou cerimônia cívica do Dia do Reservista (elenco ampliado pelo Decreto-Lei 715/69)
[14] Cf. SUSSEKIND, p. 506.
[15] Cf. SUSSEKIND, p. 521.
[16] GOMES, Orlando, p. 333.
[17] SUSSEKIND, Arnaldo, p. 527.
Mestre em Direito. Especialista em Direito Público e Eleitoral. Bacharel em Direito - UESC. Professor da Universidade do Estado da Bahia
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CRUZ, João Hélio Reale da. Suspensão do contrato de trabalho e interrupção da prestação de serviço Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 maio 2012, 07:52. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/29169/suspensao-do-contrato-de-trabalho-e-interrupcao-da-prestacao-de-servico. Acesso em: 23 dez 2024.
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