Hans Kelsen foi um renomado jurista judeu alemão perseguido pelo nazismo, foi professor na Universidade de Viena, imigrante nos EUA e posteriormente professor na Universidade da Califórnia- Berkeley, tendo sido perseguido pelas ideologias fascistas, e comunistas. Escreveu mais de 400 obras, não somente no campo jurídico, mas também na política, sociologia e religião, e especialmente sobre a democracia. Foi o máximo representante da jusfilosofia positivista.
Kelsen, procurando lançar as bases para uma ciéncia do Direito, propondo retirar do direito linguagens sociológicas e axiológicas (que representam os valores), por meio de uma linguagem precisa e lógica, abstraindo do conceito do Direito a ideia de justiça, porque a justiça estaria sempre e invariavelmente influenciada pelos valores variáveis adotados por aquele que a invoca, não cabendo, portanto, pela imprecisão de significado, num conceito de Direito universalmente válido. Entendia o direito de forma monista, e definiu a norma hipotética fundamental (grundnorm), a que subordinaria as demais como basicamente oriunda do direito internacional, que teria primazia sobre os direitos nacionais (os pactos devem ser cumpridos). Colaborou grandemente para a sistematização do direito como ciência autônoma através dessa postulação de axioma propondo essa teoria formal do direito.
Ele critica as teorias que procuram a distinção do direito com relação à moral a partir dos critérios de interioridade e exterioridade. Sua crítica se apoia principalmente no fato de que o direito algumas vezes regula condutas internas e outras vezes regula condutas externas, assim como ocorre com a moral. Este critério seria, portanto, insuficiente para resolver o problema. Kelsen faz uma opção positivista ao desenvolver sua epistemologia. A norma jurídica positiva se apresenta como um esquema de interpretação e como um sentido de dever ser.
Se o direito for definido exclusivamente a partir das idéias de normatividade e validade, então seu campo não se sobrepõe ao da Ética. Essa visão metodológica acabou por provocar profunda fissura no entendimento dos juristas do séc. XX. Se as normas jurídicas são estudadas pela Ciência do Direito, as normas morais são objeto de estudo da Ética. Kelsen afirma que da norma decorre o valor, e valor não implica uma relação entre realidade e norma, entre ser e dever ser. O raciocínio jurídico, então, não deverá versar sobre o que é certo ou errado, sobre o que é virtuoso ou vicioso, sobre o que é bom ou mau, mas sim sobre o lícito e o ilícito, sobre o legal (constitucional) ou ilegal (inconstitucional), sobre o válido e o inválido. Logo, é válida a ordem jurídica ainda que contrarie os alicerces morais, uma posição um tanto quanto controversa.
Assim, um direito positivo sempre pode contrariar algum mandamento de justiça, e nem por isso deixa de ser válido. Então, o direito positivo é o direito posto pela autoridade do legislador, dotado de validade, por obedecer a condições formais para tanto, pertencente a um determinado sistema jurídico. O direito não precisaria respeitar um mínimo moral para ser definido e aceito como tal, pois a natureza do direito, para ser garantida em sua construção, não requer nada além do valor jurídico.
O jurista Kelsen preocupou-se em discutir a guarda da constituição com seu rival Karl Scmidt, sendo que sua teoria de controle por uma corte constitucional somente triunfou no pós-guerra. Karl Scmidt vislumbrava o controle constitucional pelo presidente do Reich, uma função política, que se tornou afeita a Adolf Hitler. Já Kelsen idealizava essa função como jurídica, embora não a diferenciasse da função política, pois para a solução de grandes interesses sociais controversos elas se equivaleriam. Kelsen, entre outos feitos, estudou a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, que foi uma teoria incorporada pela Lei Constitucional-Federal Austríaca de 1920. Tal teoria é adotada também em vários outros países do mundo, através de Constituições, Leis, ou mesmo apenas por interpretação judicial.
Uma outra teoria que Hans Kelsen criou, que também é uma importante herança, foi a da pirâmide jurídica, usada para explicar o sistema constitucional, Kelsen acaba por concluir que o ordenamento jurídico é um sistema de normas e estas encontram-se em ordem hierárquica, seguindo normas da Constituição do país, que se encontra no topo da pirâmide. Acima da Constituição há a norma fundamental, que está presente em todos os sistemas jurídicos do mundo e de onde emana todo o direito. Esse sistema hierárquico é que permite o controle de constitucionalidade das normas. Criou também outras teorias como a do Direito concentrado e do direito Difuso. Outros juristas posteriormente extraíram e formularam daí o conceito de rigidez constitucional.
Dentre outras contribuições do jurista para o mundo do Direito, pode ser citada a Constituição Áustríaca de 1920 (chamada de "oktoberverfassung"), redigida sob sua inspiração. Sob a influência do pensamento de Kelsen, a Carta Magna Austríaca inovou frente às anteriores, introduzindo no Direito Positivo o conceito de controle concentrado da constitucionalidade das leis e atos normativos como função jurisdicional aos cuidados de um Tribunal Constitucional, incumbido da função exclusiva de guarda da integridade da Constituição.
Desde então, a jurisdição constitucional passou a ser subdividida em duas vertentes: a jurisdição constitucional concentrada (controle concentrado da constitucionalidade) e a jurisdição constitucional difusa (controle difuso da constitucionalidade). Este modo de guarda da Constituição (difuso) já era praticado nos Estados Unidos da América (como consequencia do notório caso Marbury x Madison, do ano de 1803).
Com a Constituição da República Austro-alemã, Hans Kelsen inaugurava a sistemática do controle concentrado de constitucionalidade com a criação de um órgão específico para o seu exercício.
Em sua obra ‘Teoria Pura do Direito”, Kelsen diz: "Se a Constituição conferisse a toda e qualquer pessoa competência para decidir esta questão, dificilmente poderia surgir uma lei que vinculasse os súditos do Direito e os órgãos jurídicos. Devendo evitar-se essa situação, a Constituição apenas pode conferir competência para tal a um determinado órgão jurídico." O controle concentrado de constitucionalidade é um dos maiores legados que deixou. O ordenamento jurídico brasileiro passou a adotá-lo em 1965, com a emenda constitucional nº 16, que atribuiu ao Supremo Tribunal Federal competência para processar e julgar originariamente a representação de inconstitucionalidade de lei.
No Brasil, sob o escopo da Constituição Federal de 1988, a jurisdição constitucional é praticada de duas maneiras: o controle concentrado, por meio de ações próprias da competência do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Justiça Estaduais (exame da compatibilidade das leis e atos normativos estaduais e municipais com a Constituição Estadual), e o controle difuso, executado nos autos de quaisquer ações (e dos recursos a estas inerentes) da competência de qualquer órgão jurisdicional (quais sejam, juizes e tribunais).
Bibliografia:
KELSEN, Hans. O Problema de Justiça; trad. João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
KELSEN, Hans – Teoria geral do direito – Ed. Martins Fontes – São Paulo, 1998.
revistavisaojuridica.uol.com.br/.../paginas-da-historia-hans-kelsen-158859-1.asp
www.justitia.com.br/artigos/5w45cd.pdf, acessado em 04/12/2010.
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