SUMÁRIO: RESUMO; ABSTRACT; INTRODUÇÃO; 1. DA RESPONSABILIDADE CIVIL; 1.1 Do conceito de Responsabilidade Civil ; 1.2 Contexto Histórico ; 1.3 Espécie de Responsabilidade Civil ; 1.3.1 Responsabilidade Civil Subjetiva; 1.3.2 Responsabilidade Civil Objetiva ; 2. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO ; 2.1 Noções Iniciais ; 2.2 Culpa Médica ; 2.2.1 Culpa strictu sensu; 3. O DANO MÉDICO; 3.1 O Dano causado pelo erro médico ; 3.2 A responsabilidade civil do médico ; 3.3 Responsabilidade penal do médico ; 3.4 Responsabilidade moral e ética; CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
RESUMO
O tema Responsabilidade Civil por Erro Médico é de grande importância por tratar de bens jurídicos de elevado valor tutelados pelo Estado, a vida, a integridade física, moral e o respeito às convicções religiosas. O médico está sujeito a erros, caso os cometa será obrigado a reparar os danos que causar ao paciente, sejam estes físicos, materiais ou morais. A obrigação de indenizar ou ressarcir o prejuízo causado se origina da natureza contratual da relação entre médico e paciente. O dever de indenizar pressupõe sempre a prova do nexo de causalidade entre o dano e o ato que o originou. Quando, para a configuração da responsabilidade do médico é necessária apenas a prova desse nexo, sendo prescindível comprovação de elemento subjetivo temos responsabilidade objetiva, que, no Brasil, vigora para os danos causados pelo Estado através de seus agentes. Já nos casos em que se exige também a configuração de um elemento subjetivo ,que decorrerá do dolo ou culpa, teremos a chamada responsabilidade civil subjetiva.
Palavras-chave: responsabilidade civil, médico, dano.
ABSTRACT
The theme Civil Liability for Medical Error is of great importance for dealing with legal goods with high value protected by the state, life, physical integrity, morality and respect for religious beliefs. The doctor is subject to errors, if the comet will be required to repair the damage they cause to patients, be they physical, material or moral. The obligation to indemnify or reimburse the injury is originated from the contractual nature of the relationship between doctor and patient. The duty to indemnify always requires proof of a causal link between the act and that the damage caused. When, for setting the responsibility of the physician is required only to prove that link, and expendable evidence of subjective element we have liability, which, in Brazil, applies to the damage caused by the state through its agents. In cases where it also requires the setting of a subjective element, which will run from fraud or negligence, we will have to call liability subjective.
Keywords: liability, medical, damage.
INTRODUÇÃO
O ato ilícito constitui desrespeito à lei ou contrato, é ato material (ato ou omissão), portanto, delito civil ou criminal. O Código Civil Brasileiro define ato ilícito como ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência que viola direito ou causa prejuízo a outrem. Deste ato antijurídico decorre a responsabilidade do agente que o praticou, ou seja, a responsabilidade é uma conseqüência da prática do ato ilícito. Esta pode ser legal caso o ato jurídico seja decorrente de violação da lei, ou contratual (aquiliana), quando decorrente de desrespeito à convenção entre as partes.
Responsabilidade é a obrigação de dar, fazer ou não fazer alguma coisa, de ressarcir ou reparar danos, de suportar sanções penais, exprimindo sempre a obrigação de responder por alguma coisa. Portanto, a responsabilidade é o dever contraído pelo causador da ameaça de dano (dano consubstanciado), de assumir perante a esfera pública, seja judicial ou extrajudicialmente, o prejuízo decorrente de seus atos. Responsabilidade civil é a obrigação que o agente tem de ressarcir e reparar os danos ou prejuízos causados injustamente a outrem.
Essa obrigação quase sempre acarreta um ônus ao agente do dano, mediante indenização, podendo recair sobre o sujeito passivo da relação originária ou sobre algum terceiro. Quando a responsabilidade decorre de ato próprio, há a chamada responsabilidade direta; já a indireta é aquela que decorre de ato ou fato alheio à sua vontade, mas de algum modo sob sua proteção e vigilância. Pode-se, então, dizer que responsabilidade civil é a obrigação de compor o prejuízo ou dano, originado por ato do próprio agente (direta) ou ato ou fato sob o qual tutelava (indireta), e ainda que sua obrigação deva ser assumida diante do Poder Judiciário.
O estudo da responsabilidade civil do profissional da Medicina ganhou os debates forenses, nos últimos anos, provocando uma constante imputação de erro médico. Muitos médicos são levados às discussões jurídicas sem o menor conhecimento das condições que o Direito impõe para a responsabilização civil.
Quando se debate o tema da responsabilidade do médico, deve-se buscar no Código de Hamurabi os primórdios da responsabilidade legal do médico na forma normativa, estabelecendo pena para a conduta errônea diante do paciente e do escravo.
1 DA RESPONSABILIDADE CIVIL
1.1 Do conceito de responsabilidade civil
Toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade. A palavra "responsabilidade" origina-se do latim, "respondere", que consiste na idéia de segurança ou garantia da restituição ou compensação. Diz-se, assim, que responsabilidade e todos os seus vocábulos cognatos exprimem idéia de equivalência de contra-prestação, de correspondência.
A Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de um ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal. (DINIZ, 2007, p.35).
A ação é um ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro ou o fato de animal ou coisa inanimada que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado. Os pressupostos da responsabilidade civil são a culpa, o dano, o nexo causal e a reparação. MARIA HELENA DINIZ afirma que:
"poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato de próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva) ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva)".
Para Savatier, culpa é a inexecução de um dever que o agente podia conhecer. Pressupõe, portanto, um dever violado e a imputabilidade do agente.
A responsabilidade do médico é contratual, por haver entre o médico e seu paciente um contrato que se apresenta como uma obrigação de meio, por não comportar o dever de curar o paciente, mas de prestar-lhe cuidados conscienciosos e atentos conforme os avanços da medicina. Todavia, há casos em que se supõe a obrigação de resultado, com sentido de cláusula de incolumidade, nas cirurgias estéticas e nos contratos de acidentes.
Excepcionalmente, a responsabilidade do médico terá natureza delitual se ele cometer um ilícito penal ou violar normas regulamentares da profissão.
Assim, se o médico operador for experiente e tiver usado os meios técnicos indicados, não se explicando a origem da eventual seqüela, não haverá obrigação por risco profissional, pois os serviços médicos, em regra , são de meio e não de resultado.
Se nenhuma modalidade de culpa – negligência, imprudência ou imperícia – ficar demonstrada, como não há risco profissional, independente de culpa, deixará de haver base para fixação de responsabilidade civil, pois as correlações orgânicas ainda são pouco conhecidas e surgem às vezes resultados inesperados, desconhecidos.
1.2 Contexto Histórico
O erro médico é um assunto polêmico, que tem despertado interesse desde tempos remotos até os dias atuais. O primeiro registro normativo da história a abordá-lo foi o Código de Hamurábi, há mais de dois mil anos antes de Cristo, no qual se previam punições corporais para os médicos que porventura obtivessem maus resultados.
Com o tempo, as várias sociedades deram diversos tratamentos aos médicos infratores, desde punições severas, incluindo a pena de morte, até a impunidade pelos atos ou a punição apenas por erros grosseiros. A Responsabilidade Civil, como hoje é conhecida, recebeu grande influência do Direito Romano. Foi em Roma que se solidificou a idéia de que a vingança privada não deveria ter lugar na vida em sociedade, cabendo ao Estado o poder e o dever de tutelar as relações interpessoais, disciplinando a indenização devida pelos danos causados por um particular a outrem.
No entanto, não se excluiu de todo a punição retributiva. A diferença passou a ser a permissão ou não do Estado para que pudesse ser aplicada. Posteriormente, em todas as grandes culturas, se produziu um amplo desenvolvimento da medicina, que reverte igualmente ao tema aqui tratado. Na Grécia aparecem novos elementos que se sobrepõem ao conceito vingativo da Lei de Talião.
Lá foram desenvolvidos estudos que dotaram a medicina de um caráter mais científico, em detrimento de outros elementos não racionais e empíricos até então predominantes. Estes estudos, datados do século V a.C., viriam a constituir o Corpus Hippocraticum, cuja síntese mais conhecida é o juramento ainda hoje repetido por profissionais médicos ao redor do planeta.
A efervescência cultural produzida da junção entre filosofia e ciência atingiu seu apogeu na Grécia, permitindo o intercâmbio entre disciplinas antes afastadas, tais como a filosofia e a anatomia, possibilitando que os métodos de análise, diagnóstico e cura pudessem ser exercidos de forma mais racional e lógica. A medicina se transformava cada vez mais em ciência, e na medida em que sua importância crescia, as atenções do Estado para ela se voltavam, cujo efeito era sentido através das diversas regulamentações que davam forma a sua natureza.
Esta mudança de pensamento permitiu alterações significativas no que tange à apuração das responsabilidades médicas. Antes culpado pelo insucesso de suas interferências sob qualquer condição, o profissional da medicina – sob a égide dos ensinamentos de Platão e Aristóteles – passou a ser responsabilizado não mais pelo resultado em si, mas por sua conduta profissional, por sua atitude de acordo com cada caso concreto.
A culpa médica, para ser atestada, deveria ser objeto da análise de outros profissionais que, em colegiado, emitiriam seu parecer. A culpa, portanto, só seria declarada se houvesse desatenção aos preceitos ou descumprimento das práticas e procedimentos médico-sanitários, usualmente, aceitos à época.
Concretamente, em Atenas foi criada a Lei Geral de Reparação, que não tratava igualmente a todos os homens, e distinguia o dano involuntário (culposo), ao qual correspondia uma indenização determinada, e o dano voluntário (doloso), com uma indenização equivalente ao dobro daquela devida pelo dano involuntário.
Nos tempos modernos, seria o Código Civil francês, de 1804, a primeira codificação a recepcionar as idéias desenvolvidas pelo espírito romano, acrescentando, entretanto, contribuições que enriqueceriam e consolidariam para sempre a idéia de responsabilidade civil conhecida atualmente. A inédita tentativa de apreciação por parte do legislador de prejuízo não material, superando a Lei Aquília, limitada apenas ao dano que se exteriorizasse em prejuízo material, faz nascer o dano moral, que goza de merecido destaque ao lado da responsabilidade civil apurada materialmente.
A experiência legislativa, doutrinária e a jurisprudencial francesa, ao lado da escola alemã, ambas em destaque à partir de meados do século XIX, representam o pilar de apoio para tudo que restou construído neste século.
A história ancestral da responsabilidade civil – ou obrigação de reparação de danos – no Brasil tem seu marco inicial nas Ordenações do Reino. Nelas se mantinha forte a influência do Direito Romano, que era expressamente mencionado como fonte subsidiária de direito positivo .
Até então, a responsabilidade civil estava atrelada à responsabilidade penal, havendo menção, no Código Criminal de 1830, ao dever de satisfação, ou seja, de ressarcimento pelo ofensor à vítima, em razão do dano causado. A doutrina brasileira desenvolveu-se no sentido de considerar passível de responsabilização civil a violação de duas fontes de obrigação; a inobservância de textos legais e o descumprimento da norma
contratual.
Posteriormente, com o estabelecimento da indenização por dano moral alçado a elemento constitucional, através do advento da Constituição Federal de 1988, e com a responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor, de 1990, nova era de direitos veio a se estabelecer no país, no tocante à responsabilidade civil.
1.3 Espécies de responsabilidade civil
A Responsabilidade Civil, ou seja, a obrigação de indenizar o dano causado pode surgir do inadimplemento de uma obrigação negocial, é o que se chama de responsabilidade contratual. Esta decorre de dois fatores: a formação de um contrato e sua obrigatoriedade. Portanto, quem contrata, utilizando-se de sua autonomia de vontade, obriga-se aos termos do contrato, vinculando sua conduta às regras ali determinadas.
Já a responsabilidade extracontratual é também chamada de aquiliana, pois originou-se na Lei de Aquília e baseia-se no dever de indenizar os danos causados decorrente da prática de um ato ilícito propriamente dito, consubstanciado em uma conduta humana positiva ou negativa de uma norma violadora do dever de cuidado (culpa no sentido lato).
Segundo Orlando Gomes (1991, p.338): “nas duas (referindo-se a contratual e a extracontratual), a lei impõe ao autor do Dano uma obrigação seja que tem por objeto a prestação da indenização. Embora tal obrigação seja a mesma, diferem as duas espécies de responsabilidade, notadamente quando ao fundamento, à razão de ser e ao ônus da prova”.
Quanto à matéria de prova, a responsabilidade extracontratual exige a comprovação de todos os elementos necessários para a responsabilização. É preciso a prova da existência da violação de uma norma de comportamento, enquanto que, na contratual, o contrato é a norma preestabelecida e a conduta de qualquer das partes gera a responsabilidade civil de reparar o dano.
No que diz respeito à fonte geradora da responsabilidade, a distinção é que a responsabilidade contratual origina-se no contrato de vontades no qual surgiram as obrigações contraídas que serão descumpridas por um dos contratantes, enquanto a responsabilidade aquiliana, tem sua fonte na lei, como exemplo tem-se o artigo 186 do Código Civil de 2002.
1.3.1 Responsabilidade Civil Subjetiva
Legalmente a responsabilidade médica está fundamentada nas normas jurídicas civis e penais que consubstanciam os anseios comportamentais da época. Baseia-se, entretanto, nos critérios de avaliação da culpabilidade do agente a partir de duas teorias distintas: a teoria da responsabilidade subjetiva ou teoria da culpa e a teoria da responsabilidade objetiva ou teoria do risco. A responsabilidade subjetiva, que se aplica aos médicos enquanto profissionais liberais, diz que existe o dever de indenizar se a vítima ou paciente demonstrar, em juízo, que existiu culpa por parte do profissional contratado para a realização do serviço médico, dentro dos fatores de culpa que nascem a partir da negligência, imprudência ou imperícia.
Diz-se subjetiva a responsabilidade quando se baseia na culpa do agente, que deve ser comprovada para gerar a obrigação indenizatória. A responsabilidade do causador do dano, pois, somente se configura se ele agiu com dolo ou culpa. Trata-se da teoria clássica, também chamada teoria da culpa ou subjetiva, segundo a qual a prova da culpa lato sensu (abrangendo o dolo) ou stricto sensu se constitui num pressuposto do dano indenizável.
O ordenamento jurídico brasileiro trabalha como regra geral com a Responsabilidade Civil Subjetiva, devendo ser comprovada a existência de culpa para que possa surgir a necessidade de qualquer ressarcimento, sendo que tal preceito surge expresso no novo Código Civil no seu artigo 186.
Percebe-se que a ação do agente deve ser voluntária, negligente ou imprudente, portanto necessária a comprovação da culpa. A Responsabilidade Civil Subjetiva possui como elementos basilares a sua caracterização, a ação ou omissão do sujeito ativo, a vítima como sujeito passivo, a existência de um Dano sofrido por essa vítima, bem como o Nexo de Causalidade entre o causador do Dano e a vítima, desde que verificado culpa ou dolo do agente.
Nas hipóteses de Responsabilidade Civil Subjetiva há presunção de culpa do agente, desde que haja lei que expressamente a estabeleça, e nestes casos cabe ao imputado a demonstração de que não agiu culposa ou dolosamente.
1.3.2 Responsabilidade Civil Objetiva
O Código Civil em vigor, em seus artigos 186 e 927, caput, conservou a regra geral da responsabilidade civil subjetiva, fundada na teoria da culpa.
Entretanto, o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil estabelece uma verdadeira cláusula geral ou aberta da responsabilidade objetiva. Inova no sentido de acolher a teoria do risco criado, ou seja, a obrigação de indenizar ainda que a conduta não seja culposa.
De acordo com o referido dispositivo, “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para o direito de outrem.”
É a teoria dita objetiva ou do risco, que prescinde de comprovação da culpa para a ocorrência do dano indenizável. Basta haver o dano e o nexo de causalidade para justificar a responsabilidade civil do agente. Em alguns casos presume-se a culpa (responsabilidade objetiva imprópria), noutros a prova da culpa é totalmente prescindível (responsabilidade civil objetiva propriamente dita).
A teoria objetiva não exige a prova de culpa do agente, uma vez que esta passa a ser presumida pela lei ou se dispensa a sua comprovação por quem quer que seja. Simplesmente não ocorre a necessidade de se provar a culpa do agente para estabelecer o nexo causal entre sua conduta e o dano causado, bastando apenas que o agente responsável por um ato lesivo coloque em risco algum bem jurídico de outrem por meio de seu ato.
Neste sentido a responsabilidade incide nos casos em que a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para o direito de outrem.
No Brasil, a responsabilidade objetiva vigora para os danos causados pelo Estado através de seus agentes, e também, em certos casos, para danos causados em razão de atividades de risco, em que o causador do dano é considerado responsável pela indenização causada por sua própria atividade, independentemente de culpa ou dolo, porque essa responsabilidade é tida como risco de sua atividade econômica.
2 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO
2.1 Noções iniciais
Sendo a natureza da obrigação médica de caráter negocial, é importante determinar o momento do nascimento deste contrato. De acordo com Maria Helena Diniz: "O médico que atende a um chamado determina desde logo o nascimento de um contrato com o doente ou com a pessoa que o chamou em benefício do enfermo". O contrato médico, segundo a mesma autora,poderá abranger ainda, um contrato de assistência médico-hospitalar, que inclui a internação em casa de saúde ou clínica, e ainda, o fornecimento de alimentos.
Do contrato médico advêm certos deveres implícitos a serem observados, quais sejam: a) o dever de zelo, cuja inobservância importa em abandono, negligência, principalmente em relação àqueles que se encontram em estado que não lhes possibilite agir livremente. Tal dever encontra-se presente nos arts. 2°, 57 e 61 do Código de Ética Médica; b) o de informar e aconselhar o paciente quanto às precauções sobre o seu estado, bem como indicar o tratamento adequado e dar ciência direta ao paciente dos riscos que corre, salvo quando tais informações possam causar-lhe dano, hipótese em que as informações devem ser levadas ao conhecimento do representante legal ou da família (art. 59 do Código de Ética Médica); c) o dever de abstenção de atos que impliquem em abuso ou desvio de poder (arts. 49, 53, 67, 68 e 70 do Código de Ética Médica).
Além destes, muito comentados na doutrina, acrescentem-se ainda estes: o dever de moralidade na atividade médica (arts. 63 e 65); dever de moderação no diagnóstico ou prognóstico (art. 60) e dever de abstenção de delegação de atribuições exclusivas da medicina a outros profissionais (art.30), todos presentes no Código de Ética Médica.
Quando se considera a responsabilidade dos profissionais como contratual, deve-se analisar se a obrigação que daí decorre é de meio ou de resultado, porque destes conceitos advêm conseqüências diversas num eventual litígio judicial. Sendo obrigação de meio, o profissional deve empenhar-se de todas as maneiras, segundo seus conhecimentos técnicos ao seu alcance para atingir um resultado, sem no entanto, ficar vinculado à sua obtenção. Já a obrigação de resultado requer do profissional o alcance de um fim, sem o qual ter-se-á o descumprimento contratual. Assim, percebe-se facilmente que a atividade do médico cirurgião enquadra-se na primeira categoria, enquanto que a atividade do cirurgião plástico/estético é exemplo da segunda.
Assim, se o médico cirurgião empenhou-se, aplicando corretamente a intervenção ao caso segundo a técnica médica e não conseguiu a cura do paciente, não se lhe pode imputar a culpa pela morte do paciente. A conseqüência do reconhecimento de obrigação de meio aos médicos cirurgiões é que sobre si não há presunção de culpa, cabendo o ônus da prova ao prejudicado. Já no caso de obrigação de resultado, a vítima da lesão terá a seu favor uma presunção de que o profissional é culpado, cabendo a este fazer a prova de que não agiu com imperícia, imprudência ou negligência.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, parágrafo 6º, bem como o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 14, destacaram a responsabilidade objetiva para as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos, assim como para os prestadores de serviços em geral.
Os dispositivos mencionados enquadram hospitais, clínicas, casas de saúde, laboratórios, dentre outros, como responsáveis, independentemente da comprovação de culpa, pelos danos alegados por aqueles que usaram seus serviços. Para isso é necessário que o paciente ou vítima comprove que fez uso do serviço oferecido pela empresa, e que sofreu um dano por conseqüência desse serviço.
Não importa se houve culpa por parte daquele que prestou o serviço na configuração do dano à vítima, pois reza da Carta Magna e o Código de Defesa do Consumidor de que existe o dever de indenizar e, caso seja de interessante da perda prejudicada, o posterior ingresso em juízo contra o causador direto do dano.
2.2 Culpa médica
O princípio da responsabilidade é uma determinação natural das sociedades humanas organizadas. Todo homem mentalmente são e capaz é considerado responsável. E sobre o médico recai a obrigação de sofrer as conseqüências de certas faltas que comete no exercício de sua arte e que lhe podem acarretar ação civil ou penal.
2.2.1 Culpa strictu sensu
A negligência, a imprudência e a imperícia são os fatores mais comuns que levam ao erro médico e à posterior propositura de ações indenizatórias na Justiça e na abertura de processos ético-profissionais nos Conselhos Regionais de Medicina contra os médicos.
A negligência deriva do Latim negligentia, e significa um descuido, desleixo, uma falta de diligência, incúria, preguiça, com uma falta de desatenção e um profundo menosprezo. Ela se configura quando o profissional deixa de observar os deveres impostos à execução de qualquer ato. Pode ocorrer quando o doente é abandonado à própria sorte ou em mãos inexperientes, assim como quando sofre a omissão de socorro, a violação do dever de diligência e a impontualidade do médico.
A imprudência se caracteriza pelo risco tomado pelo profissional no exercício de seu dever, optando por uma atuação de caráter perigoso e esquecendo-se dos cuidados necessários para alcançar o fim colimado: a saúde do paciente. Muitos médicos praticam determinados atos sem disporem dos recursos necessários para se chegar ao sucesso do empreendimento, podendo ser estes recursos materiais ou humanos.
A imperícia deriva do Latim imperitia de imperitus (ignorante, inábil, inexperiente), e entende-se como falta de prática ou ausência de conhecimento, que se mostram necessários ao exercício de uma profissão ou de uma arte qualquer. Ela nada mais é que a execução de algum ato por parte do médico sobre o qual o profissional não possui o domínio ou a aptidão necessários para tal. Na prática existem médicos despreparados para determinado trabalho. Muitos prescrevem medicamentos errôneos, falham na prática de uma técnica cirúrgica etc., por isso, apesar de um médico estar técnica e legalmente habilitado para o exercício de sua profissão, não está livre da prática de atos que revelem sua falta de aptidão para esta ou aquela
técnica.
Em conseqüência, para qualquer dos três casos, há de se observar a ocorrência da conduta contrária ao dever e que leve ao resultado de dano ou perigo a fim de se ver caracterizado o crime culposo. Sem isso, o ato inicial voluntário não constitui, por si mesmo, fato punível, ao menos como imprudência, negligência ou imperícia.
3 O DANO MÉDICO
3.1 O dano causado pelo erro médico
Nas últimas décadas do século atual, tem-se observado um grande aumento no número de demandas contra médicos. No Brasil, até pouco tempo atrás, eram raros os processos contra médicos. Vigorava, então, a figura do médico de família contra o qual dificilmente se iria reclamar judicialmente por um mau resultado.
Com a Medicina moderna, o médico de família foi perdendo seu espaço, dando lugar ao médico especialista, em geral com um profundo domínio sobre pequena parcela do conhecimento médico, mas impessoal e limitado na visão do paciente como um todo.
Este enfraquecimento da relação médico-paciente, aliado a um maior grau de conscientização dos cidadãos no que tange aos seus direitos, fez com que uma parcela dos usuários dos serviços médicos ficassem mais exigentes em relação ao atendimento e aos resultados obtidos, procurando prontamente as vias judiciais e/ou administrativas nas vezes em que se sintam prejudicados.
Este aumento do número de demandas contra médicos tem sido alvo de atenção da mídia, com grande repercussão tanto na classe médica, proporcionando o desenvolvimento da “medicina defensiva” e a discussão sobre a implantação ou não de seguro de responsabilidade civil; quanto na sociedade em geral, que fica com sua confiança abalada nos médicos.
Juridicamente, erro médico é o dano provocado pelo médico em decorrência do exercício profissional, mediante ação ou omissão, cometido por imperícia, negligência ou imprudência. É o erro culposo.
No âmbito administrativo, considera-se não só o erro médico culposo, mas também o descumprimento de quaisquer dos preceitos contidos no Código de Ética Médica.
3.2 A responsabilidade civil do médico
O princípio da responsabilidade é uma determinação natural das sociedades humanas organizadas. Todo homem mentalmente são e mentalmente desenvolvido é considerado responsável. E sobre o médico recai a obrigação de sofrer as conseqüências de certas faltas que comete no exercício de sua arte e que lhe podem acarretar ação civil ou penal.
A responsabilidade civil do médico tem sua primeira aparição com a Lei das XII Tábuas, onde se permitiu uma transação entre a vítima e o autor, convertendo uma pena em uma indenização.
Já no Direito Brasileiro, a matéria está contida no artigo 159 do Código Civil: "aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar
o dano".
Por combinação legal, soma-se a este dispositivo o artigo 1.545 do mesmo Código:
Art. 1.545 -"Os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas são obrigados a satisfazer o dano, sempre que da imperícia, em atos profissionais, resultar morte, inabilitação de servir, ou ferimento ".
Assim, para que ocorra a responsabilidade civil médica, é necessária a caracterização dos seguintes pressupostos: ação ou omissão lesiva do médico; dano injusto, de conteúdo pessoal, moral ou patrimonial; nexo causal, a relação de causa (ação), e efeito (dano).
Quanto à responsabilidade civil do médico, Delton Croce e Delton Croce Júnior têm a esclarecer o seguinte:
"Há um salutar princípio jurídico geral que, objetivando resguardar os interesses, os direitos e as obrigações do homem no seio da sociedade, estabelece a todo indivíduo mentalmente sadio e capaz a obrigação de responder por prejuízos cometidos a outrem, por meio do dolo ou da atuação negligente, imperita ou imprudente, obrigação esta que será calculada, sob a perspectiva civilista, exclusivamente sobre a extensão do dano e não pelo grau de culpa, seja ela grave, seja leve ou mesmo levíssima”.
O nexo de causal e efeito é a relação causal entre o médico e o dano. A causa de um dano resultaria do somatório dos fenômenos sucessivos, alcançando um determinado efeito prejudicial aos patrimônios pessoal e real do indivíduo. Além disso, toda doutrina sobre o assunto é unânime em afirmar que a responsabilidade civil do médico é contratual, ou seja, a obrigação é configurada por meio de contrato escrito ou verbal entre o paciente e seu médico.
Em síntese, a responsabilidade civil nasce sempre que houver, por parte de um agente, seja pessoa física ou jurídica, violação de um dever jurídico preexistente, e dessa violação resultar um certo dano a outrem.
3.3 Responsabilidade penal do médico
Esta é a responsabilidade mais antiga do médico. Na época de Hamurabi (Babilônia 2.500 a.C.), o médico respondia com a amputação das mãos pelo dano que viesse a causar. A Lex Aquília (Roma, 572 d.C.) obrigava o médico a indenizar, aos senhores, os danos causados aos seus escravos e aplicava-lhe a pena máxima no caso de morte de um cidadão romano, mas também obrigava o médico a indenizar a morte de um escravo sob seus cuidados e aquele que agisse com negligência, imprudência ou imperícia poderia ser exilado, vendido ou deportado.
No Egito, as regras da arte de curar estavam contidas nos livros sagrados e, quando os médicos se desviavam do cumprimento destas regras, estavam sujeitos a inúmeras penas, inclusive a de morte. E a matéria foi se desenvolvendo passo a passo com a evolução gradativa das sociedades humanas.
Nos dias de hoje, a lei penal brasileira prevê diversas hipóteses da responsabilidade penal do médico. No Código Penal vigente desde 1940, estabelece-se:
Art. 15 - Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
II - culposo, quando o agente deu causa ao “resultado por imprudência, negligência ou imperícia.
Em ambas as questões, enquadram-se outros dois dispositivos penais: homicídio, descrito pelo artigo 121 do mesmo Código Penal e as lesões corporais, no artigo 129.
Em qualquer fase de uma atuação médica: diagnóstico, prognóstico e tratamento, pode haver erros que se caracterizam como culpa.
3.4 Responsabilidade moral e ética
A ética é necessária para formar verdadeiro conceito das coisas e saber dar-lhe estimação que cada um merece: saber distinguir a virtude do vício, reprovando este e estimando aquela.
Através dos tempos sempre houve a necessidade primaz de estruturar eticamente a vida social e de organizar, também eticamente, as profissões, porque fora da lei moral e dos bons costumes não pode haver disciplina, trabalho organizado, confiança mútua e entendimento entre os homens.
A ética profissional médica tem entre nós sua legislação específica e sua competente jurisdição especial: os Conselhos de Medicina e o Código de Ética. E todos estão obrigados a seguir este código de conduta moral no exercício de sua profissão, o qual, em seus 87 artigos, ocupa-se dos deveres morais dos médicos no exercício do seu ministério. A simples consciência moral do médico como guia para o seu comportamento não é suficiente. Há, pois, uma lei expressa a observar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, um dos temas mais discutidos e de maior relevância dentro do direito civil é a responsabilidade civil, tendo em vista que a idéia de ressarcimento por um dano causado há muito está enraizada em nossa sociedade.
A responsabilidade civil é um ramo do Direito Civil que teve sua gênese no primeiro momento em que o homem realizou um ato, um fato ou um negócio danoso.
Seja com o escopo punitivo, visando um equilíbrio patrimonial ou moral que fora violado, inclusive trazendo consigo a imagem de braço forte do estado em não permitir que um ato indenizável saia impune, ou seja, com fins preventivos, buscando alcançar mais prudência, eficiência, dependendo do caso, na realização de seus trabalhos.
É nesse aspecto que se funda a responsabilidade civil médico- hospitalar, tendo em vista que as relações médico-paciente sofreram ao longo do tempo grandes transformações, saindo da figura de Hipocrates que era visto como um grande amigo da família para ser, hoje, um mero prestador de serviços e; portanto responsável cível e criminalmente.
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