RESUMO: Este trabalho tem por objetivo sedimentar a inexistência de isenção de PIS e COFINS nas operações internas realizadas na Zona Franca de Manaus, almejando diferenciar estas em face dos negócios jurídicos entre empresas situadas fora da Zona de Livre Comércio e as lá situadas.
Palavras-chave: Isenção. PIS. COFINS. Zona. Franca. Manaus. Operações. Internas.
SUMÁRIO: Seção inicial – 2. Da isenção como causa de exclusão do crédito tributário – 3. Do benefício que equipara operações de vendas para a Zona Franca de Manaus e sua natureza – 4. Da disciplina do PIS e da COFINS na Zona Franca de Manaus – 5. Conclusão – Referências.
1. SEÇÃO INICIAL (INTRODUÇÃO)
O tema escolhido resume-se à inexistência de isenção de PIS e COFINS nas operações internas realizadas na Zona Franca de Manaus, diferentemente do que ocorre com a hipótese isentiva prevista no art. 4º do DL 288/67.
Sinteticamente, a isenção apenas pode ser concedida quando houver lei que a discipline, de maneira que não é possível a utilização de interpretação extensiva a fim de abarcar outra situação nela não elencada, mesmo que haja fundamentos econômicos para isto.
Almejou-se visualizar, como problemática, a controvérsia judicial atinente à extensão da isenção de operações realizadas entre diversos Estados e a Zona Franca de Manaus às ocorridas internamente.
Desta feita, resolveu-se estudar os aspectos doutrinários, legais e jurisprudenciais que envolvem a temática, tomando uma posição geral e única acerca da inexistência de isenção em operações internas ocorridas na Zona Franca de Manaus.
2 DA ISENÇÃO COMO CAUSA DE EXCLUSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO
O Código Tributário Nacional traz a isenção como causa de exclusão do crédito tributário em seu art. 175, I, in verbis:
Art. 175. Excluem o crédito tributário:
I – a isenção;
Para boa parte da doutrina, a isenção dispensa o sujeito passivo do tributo de seu respectivo pagamento, motivo por que o fato gerador e a obrigação tributária ocorreriam, sendo impossibilitada, contudo, a constituição do crédito.
É de se ressaltar também a lição de Alfredo Augusto Becker, para quem a isenção configura norma negativa da regra jurídica de incidência, razão pela qual não se deve falar em obrigação tributária quando de sua existência. Veja-se:
“Na verdade, não existe aquela anterior relação jurídica e a respectiva obrigação tributária que seriam desfeitas pela incidência da regra jurídica de isenção. Para que pudesse existir aquela anterior relação jurídica tributária, seria indispensável que, antes da incidência da regra jurídica de isenção, houvesse ocorrido a incidência da regra jurídica de tributação. Porém, esta nunca chegou a incidir porque faltou, ou excedeu, um dos elementos de composição de sua hipótese de incidência, sem o qual, ou com o qual, ela não se realiza. Ora, aquele elemento faltante, ou excedente, é justamente o elemento que, entrando na composição da regra jurídica de isenção, permitiu diferençá-la da regra jurídica de tributação, de modo que aquele elemento sempre realizará uma única hipótese de incidência: a de isenção, e desencadeará uma única incidência: a da regra jurídica de isenção, cujo efeito jurídico é negar existência de relação jurídica tributária. A regra jurídica de isenção incide para que a tributação não possa incidir.” (BECKER, Alfredo Augusto, 2013, p. 526⁄327).
O que todos concordam, entretanto, é que é necessária que a isenção seja concedida mediante lei, inclusive pelo fato de o § 6º do art. 150 da Constituição Federal assim exigir. Confira-se:
§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
No mesmo sentido, o art. 176 do Código Tributária Nacional determina que a isenção deve ser prevista em lei:
Art. 176. A isenção, ainda quando prevista em contrato, é sempre decorrente de lei que especifique as condições e requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo caso, o prazo de sua duração.
O último ponto importante para a compreensão do presente artigo diz respeito à interpretação da regra isentiva, a qual deve ser feita de modo literal, conforme o art. 111, II, do CTN.
Com efeito, a interpretação literal resguarda a incidência tributária, uma vez que, sendo a isenção a exceção, não se deve dar contornos mais alargados ao dito pelo legislador, conforme se percebe nas palavras de Luís Eduardo Schoueri:
“A isenção própria é vista pelo Código Tributário Nacional como uma exceção. A regra é que, da incidência, surja o dever de pagar o tributo. Em matéria jurídica, vale o princípio de que toda regra excepcional se interpreta restritivamente. É por isso que o art. 177 do Código Tributário Nacional esclarece que a isenção não se estende, salvo disposição em contrário, às taxas e às contribuições de melhoria e aos tributos instituídos posteriormente à sua concessão.
Coaduna-se o dispositivo com o art. 111 do Código Tributário Nacional, segundo a qual as normas relativas à isenção se interpretam literalmente: não caberia pressupor que o legislador tenha dado um tratamento excepcional: ao contrário, a diferenciação deve defluir inequivocamente da lei.” (SCHOUERI, Luís Eduardo, 2017, p. 723)
A interpretação literal, então, deve se ater à gramática utilizada pelo legislador, uma vez que representa exceção ao ordenamento jurídico-tributário, o qual prevê a manifestação de riqueza como regra para a tributação.
Sobre a interpretação literal, de grande relevância se mostra os dizeres de Hugo de Brito Machado:
“Interpretação literal significa interpretação segundo o significado gramatical ou, melhor, etimológico das palavras que integram o texto. Quer o Código que se atribua prevalência ao elemento gramatical das leis pertinentes à matéria tratada no art. 111, que é matéria excepcional. Realmente, a suspensão, como a exclusão do crédito tributário, e a dispensa do cumprimento de obrigações acessórias constituem exceções. A regra é o pagamento do tributo nos prazos legalmente fixados. A suspensão do crédito, ou, mais exatamente, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, constitui exceção. Também é a regra que todos paguem tributos segundo a capacidade contributiva de cada um. A isenção geralmente constitui exceção a essa regra. Finalmente, a regra é que todos cumpram suas obrigações tributárias acessórias.
O direito excepcional deve ser interpretado literalmente, este princípio de hermenêutica justifica a regra do art. 111 do CTN, impondo a interpretação literal. (…)” (MACHADO, Hugo de Brito, 2014, p. 116).
Portanto, além de apenas ser criada por lei, a isenção ou qualquer outro benefício fiscal deve ser interpretada de maneira literal, sem que o intérprete utilize de conveniências políticas ou econômicas.
3 DO BENEFÍCIO QUE EQUIPARA OPERAÇÕES DE VENDAS PARA A ZONA FRANCA DE MANAUS E SUA NATUREZA
Em seu início, como área de porto livre, a Zona Franca de Manaus detinha isenção de tributação apenas para o armazenamento ou depósito, a guarda, conservação e o beneficiamento de mercadorias, artigos e produtos de qualquer natureza nas suas dependências, ocorrendo incidência tributária no momento da incorporação dos bens à circulação nacional. Acompanhe-se os arts. 1º, 5º e 8 da Lei 3.173/57, já revogada:
Art. 1º – É criada em Manaus, capital do Estado do Amazonas, uma zona franca para armazenamento ou depósito, guarda, conservação beneficiamento e retirada de mercadorias, artigos e produtos de qualquer natureza, provenientes do estrangeiro e destinados ao consumo interno da Amazônia, como dos países interessados, limítrofes do Brasil ou que sejam banhados por águas tributárias do rio Amazonas.
Art. 5º – As mercadorias de procedência estrangeira, quando desembarcadas diretamente na área da zona franca de Manaus, e enquanto permanecerem dentro da mesma, não estarão sujeitas ao pagamento de direitos alfandegários ou quaisquer outros impostos federais, estaduais ou municipais que venham gravá-las, sendo facultado o seu beneficiamento e depósito na própria zona de sua conservação.
Art. 8º – As mercadorias estocada ou beneficiadas na área da zona franca poderão ser incorporadas à circulação nacional, mediante despacho regular e pagamento dos direitos alfandegários correspondentes e mais impostos em que incidam por êsse motivo.
Por sua vez, a Zona Franca de Manaus passou a ser área de livre comércio de importação e exportação e de incentivos fiscais especiais a partir da publicação do DL 288/67, o qual teve o objetivo de promover o desenvolvimento regional através da criação de um centro industrial, comercial e agropecuário dotado de condições econômicas que permitam seu desenvolvimento, em face de fatores locais e da grande distância de que se encontram os consumidores de seus produtos, de acordo com o estabelecido em seu art. 1º.
O regime especial elenca as situações em que haverá concessão de benefícios fiscais, quais sejam a importação, a exportação e relações de compra e venda de bens nacionais com outras partes do território brasileiro.
Especificamente no que atine ao caso discutido neste artigo, o art. 4º do DL 288/67 preceitua que se equiparam à exportação, para todos os efeitos fiscais, as operações de venda de mercadorias de origem nacional para consumo ou industrialização na Zona Franca de Manaus ou reexportação para o estrangeiro. Confira-se:
Art 4º A exportação de mercadorias de origem nacional para consumo ou industrialização na Zona Franca de Manaus, ou reexportação para o estrangeiro, será para todos os efeitos fiscais, constantes da legislação em vigor, equivalente a uma exportação brasileira para o estrangeiro.
A norma acima isenta a saída de produtos de um Estado-Membro para a Zona Franca de Manaus, o que não ocorre para as operações internas, em que o bem produzido e comercializado no seu território já está incorporado às relações econômicas e jurídicas do local.
Ressalte-se que o art. 40 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal prescreve que: “É mantida a Zona Franca de Manaus, com suas características de área livre de comércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazo de vinte e cinco anos, a partir da promulgação da Constituição.”. O prazo acima foi acrescido por mais 10 (dez) anos, conforme o art. 92 do ADCT da CF.
Por seu turno, o parágrafo único do art. 40 supracitado afirma que somente por lei federal podem ser modificados os critérios que disciplinam ou venham disciplinar a aprovação dos projetos na Zona Franca de Manaus.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a alteração dos benefícios concedidos às pessoas jurídicas sediadas na Zona Franca de Manaus apenas pode ser efetuada por lei, de acordo com o art. 40, parágrafo único, do ADCT da CF, conforme reconhecido na ADI-MC nº 2.348.
Portanto, conforme o exposto acima quando falamos da isenção, a Constituição Federal sedimentou a necessidade de lei para a disciplina de benefícios fiscais, não sendo possível a extensão ou alteração destes sem previsão legislativa.
Saliente-se ainda que, embora tenha se trazido para a Constituição Federal a manutenção dos benefícios fiscais estabelecidos por legislação infraconstitucional, este autor entende que não há imunidade no caso, mas isenção.
Isso porque a natureza dos benefícios é infralegal e a Constituição Federal admite expressamente a alteração das referidas normas por lei e, como se sabe, as normas imunizantes apenas se revogam por normas constitucionais. Analise-se a lição de Regina Helena Costa:
“1) a imunidade é, por natureza, norma constitucional, enquanto a isenção é normal legal, com ou sem suporte expresso em preceito constitucional; 2) a norma imunizante situa-se no plano da definição da competência tributária, alocando-se a isenção, por seu turno, no plano do exercício da competência tributária; 3) ainda que a isenção tenha suporte em preceito constitucional específico, a norma constitucional que a contém possui eficácia limitada, enquanto a imunidade abriga-se em norma constitucional de eficácia plena ou contida; e 4) a eliminação da norma imunizatória somente pode ser efetuada mediante o exercício do Poder Constituinte Originário, porquanto as imunidades são cláusulas pétreas, desde que não seja o caso da imunidade ontológica; uma vez eliminada a isenção, por lei, restabelece-se a eficácia da lei instituidora do tributo, observados os princípios pertinentes.” (COSTA, Regina Helena, 2006, p. 109)
Assim, o benefício do art. 4º do DL 288/67 não pode ser estendido para abarcar outras situações não previstas em seu texto.
4 DA DISCIPLINA DO PIS E DA COFINS NA ZONA FRANCA DE MANAUS
Na entrada de bens estrangeiros na ZFM, o PIS e a COFINS – Importação têm o benefício de suspensão da incidência quanto a bens novos destinados à incorporação ao ativo imobilizado da pessoa jurídica, sendo convertida em alíquota zero após decorridos 18 meses de incorporação do bem a este; e em relação à aquisição de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem para emprego em processo de industrialização – art. 14, § 1º, da Lei 10.637/2002, 14-A da Lei 10.865/2004 e 50 da Lei 11.196/2005.
Na venda de mercadorias nacionais ou nacionalizadas à Zona Franca de Manaus a pessoas jurídicas, há redução da alíquota das contribuições a zero quando destinadas ao consumo e à industrialização – arts. 2º da Lei 10.996/2004 e 65, § 8º, da Lei 11.196/2005.
A alíquota zero também é prevista para os casos em que há venda a estabelecimentos situados na própria ZFM, os quais possuam projetos aprovados pelo Conselho de Administração da Superintendência da Zona Franca de Manaus – CAS, de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem produzidos na ZFM, desde que sejam empregados na industrialização – art. 5º-A da Lei 10.637/2002.
Há redução de alíquota do PIS e da COFINS na receita de venda de bens produzidos na ZFM por empresas industriais com projeto aprovado pela SUFRAMA no caso de venda efetuada a pessoa jurídica: a) estabelecida na ZFM ou, quando fora desta, apure as contribuições no regime não cumulativo (0,65% e 3%); b) estabelecida fora da ZFM, que: b.1) seja optante do SIMPLES; b.2) apure imposto de renda com base no lucro presumido; ou b.3) no lucro real, quando a receita for excluída do regime não cumulativo parcial ou totalmente (1,3% e 6%); e c) nas vendas a órgãos da administração federal, estadual, distrital e municipal (1,3% e 6%) - art. 2º, § 5º, I e II, da Lei 10.637/2002 e art. 2º, § 5º, I e II, da Lei 10.833/2003.
Com efeito, nas operações internas as contribuições incidem da seguinte forma: 1) alíquota zero – comercialização de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem produzidos na ZFM para emprego na industrialização; 2) redução de alíquota – venda de produção própria de pessoa jurídica industrial estabelecida na Zona Franca de Manaus, consoante projeto aprovado pelo SUFRAMA; 3) incidência conforme a lei – outras situações.
Como se nota, as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 determinam a incidência das contribuições nas operações internas, observada a redução de alíquota dos arts. 2º, § 4º, I, a, e art. 2º, § 5º, I, a, respectivamente, e a alíquota zero prevista no art. 5º-A da primeira lei, já analisadas acima.
Ressalte-se que quando o legislador quis desonerar as operações internas, assim o fez, como se viu acerca da alíquota zero do PIS e da COFINS na comercialização de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem produzidos na ZFM para emprego na industrialização.
Assim, não há isenção de PIS e COFINS nas operações internas ocorridas na Zona Franca de Manaus.
4 CONCLUSÃO
Por meio desse artigo se abordou a inexistência de isenção de PIS e COFINS em operações internas realizadas na Zona Franca de Manaus, sem que haja a possibilidade de aplicação do art. 4º do DL 288/67.
De fato, não há fundamento jurídico para que se aplique o disposto no art. 4º do DL 288/67 nas operações internas, tendo em vista que este apenas equipara à exportação a saída de produtos de um Estado-Membro para a Zona Franca de Manaus e que nas operações internas o bem produzido e comercializado no seu território já está incorporado às relações econômicas e jurídicas do local.
De acordo com o art. 111, I e II, do CTN, os benefícios fiscais devem ser interpretados literalmente, uma vez que o pagamento de tributo é regra, ou seja, a manifestação de riqueza em conformidade com as hipóteses de incidência estabelecidas na lei tributária é fato comum à ocorrência do fato gerador, o qual é suficiente à constituição do crédito tributário na medida da capacidade contributiva do sujeito passivo.
Sendo assim, assim a regra matriz de incidência do PIS e da COFINS tem aplicação nas operações internas ocorridas na Zona Franca de Manaus.
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Procurador da Fazenda Nacional. Ex-Analista do Ministério Público da União/Apoio Jurídico/Direito. Ex-Assistente Nível III em Gabinete de Subprocuradora-Geral da República. Especialista em Direito Tributário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAGAS, Erick Joseph Rabelo. Da inexistência de isenção de Pis e Cofins nas vendas realizadas em operações internas na zona franca de manaus Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jun 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/50338/da-inexistencia-de-isencao-de-pis-e-cofins-nas-vendas-realizadas-em-operacoes-internas-na-zona-franca-de-manaus. Acesso em: 08 nov 2024.
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