RODRIGO SONCINI DE OLIVEIRA GUENA
(Orientador)
RESUMO: O objetivo do trabalho é analisar o direito Sucessório na União Estável, a forma diferenciada de que é tratado pelo instituto da Sucessão no Código Civil de 2002, verificar se esta diferenciação fere o princípio da isonomia, abordando o aspecto da inconstitucionalidade do artigo 1790 do CC. Abrange os aspectos gerais da união estável institucionalizada como entidade familiar pela Constituição Federal de 1988. Procura evidenciar de forma sucinta os direitos sucessórios do companheiro sobrevivente.
Palavras-chave: União estável. Cônjuge. Companheiro. Direitos sucessórios. Inconstitucionalidade.
ABSTRACT: The purpose of this work is to analyze the succession law in the Stable Union, the differentiated form of which is dealt with by the Succession Institute in the Civil Code of 2002, to verify if this differentiation violates the principle of isonomy, addressing the unconstitutional aspect of art. CC. Covering the general aspects of the stable union institutionalized as a family entity by the Federal Constitution of 1988. It seeks to summarize the inheritance rights of the surviving companion.
Keywords: Stable union. Spouse. Life partner. Succession rights. Unconstitutionality.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 CONCEITO DE UNIÃO ESTÁVEL. 2 A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1790 C.C. 3 EFEITOS PATRIMONIAIS E PESSOAIS DA UNIÃO ESTÁVEL. 3.1 Formas de regime de bens na união estável. 4 SUCESSÃO. 5 SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. 5.1 Quais bens herdam os companheiros. 5.2 Regras quanto á participação do companheiro e do companheiro na sucessão.5.3 Correntes doutrinárias. 5.4 A sucessão em concorrência com ascendentes. 5.5 A sucessão em concorrência com herdeiros colaterais. 5.6 A sucessão em concorrência com o município. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa a analisar o direito sucessório na união estável do companheiro, a diferenciação que é tratada em relação ao companheiro sobrevivente em união estável e o cônjuge supérstite no casamento, no que tange à sua constitucionalidade e às normas que regem o instituto da Sucessão. A primeira indagação abordada na desenvoltura desse trabalho está relacionada ao tema União Estável e a Sucessão do Companheiro Sobrevivente, quanto ao direito sucessório do companheiro em concorrência com os demais herdeiros, considerando o disposto no Código Civil e estudos doutrinários, os quais no levam sempre a questão da inconstitucionalidade, ou necessidade de reforma do artigo 1790 Código Civil., se o referido artigo fere o princípio constitucional da isonomia.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 266, § 3º, reconheceu a existência da união estável como entidade familiar, garantindo-lhe a proteção do Estado e a facilitação de sua conversão em casamento. Regulamentando o texto constitucional, sobreveio a Lei 8.971/1994, que regula o direito dos companheiros a alimentos e sucessão e a Lei 9.278/1996, que regula o § 3º, do artigo 226 da CF/88, estabelecendo o regime de comunhão parcial de bens, além de conferir aos conviventes, entre outros direitos, a possibilidade de que participassem da sucessão um do outro.
O Código Civil de 2002 em relação ao direito a sucessão dos companheiros passou a ser regulado pelo art. 1.790. Já no caput do referido artigo se subtrai que o direito hereditário dos companheiros restringe-lhe aos bens comuns, adquiridos onerosamente durante a união estável. Não havendo parentes sucessíveis o companheiro sobrevivente receberá a totalidade da herança do de cujus, mas restritivamente quanto aos bens surgidos de forma onerosa durante a união estável. Tem-se que o artigo 1.829 Código Civil, inciso I, concede ao cônjuge supérstite participação, em concorrência com os filhos, apenas nos bens particulares do falecido, excluindo-o da herança nos bens comuns. Reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 1790, do Código Civil, segundo o STF, não existe elemento de discriminação que justifique o tratamento diferenciado entre cônjuge e companheiro estabelecido pelo Código Civil, independente da orientação sexual. Em função disso, quem vive em união estável inclusive decorrente de relação homoafetiva vai participar da sucessão do outro, com base nas mesmas regras aplicáveis aos cônjuges.
Dessa forma, serão expostos diferentes posicionamentos doutrinários a fim de demonstrar o entendimento da maioria da doutrina em relação ao que o legislador submeteu o companheiro, muitas vezes o colocando em uma posição de extrema inferioridade no momento da aplicação do direito sucessório se comparado ao atual direito sucessório do cônjuge.
1 CONCEITO DE UNIÃO ESTÁVEL
Segundo o artigo 1.723 do Código Civil de 2002, é reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e a mulher, configurada na convivência pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Para a configuração da união estável o aplicador do direito deve observar alguns requisitos trazidos pelo Código Civil, tais como a convivência pública, não clandestina e duradoura, sem que haja interrupções, com o intuito de constituir família (animus familiae) com ou sem filhos.
A união entre homem e mulher sem casamento, existiu desde sempre, e como sabemos na antiguidade era algo reprovável e condenável.
Porém é verdade que em um momento anterior do nosso ordenamento jurídico, durante a égide do Código Civil de 1916, com o propósito de proteger a família constituída pelos sagrados laços do matrimônio, omitiu-se em regular as relações extra matrimoniais, vedando quaisquer direitos às relações nominadas de adulterinas ou concubinárias.
A união estável neste momento histórico era identificada com o nome de concubinato, mas felizmente com advento da Carta Magna de 1988, ao dispor sobre as uniões de fato, mantidas pelo homem e a mulher, sem a chancela da lei, ao invés da expressão concubinato, preferiu usar a denominação união estável, erigindo-a como entidade familiar.
Desta forma, tutelou-se o antigo concubinato puro, protegido, agora, em sede constitucional e submetido a uma nova terminologia, abandonando a nomenclatura estigmatizada e preconceituosa.
E não parou por aí, a sociedade em sua constante transformação e modificações de valores se deparou novamente com situações que clamava por solução por parte dos legisladores, que são as uniões de fato existentes entre pessoas do mesmo sexo, as quais sempre existiram e apesar de terem uma vida a dois, com todos os requisitos da união estável presentes, embora a existência das uniões homoafetivas fossem públicas e notórias, elas não eram alcançadas pelos direitos oriundos da união estável, então depois de inúmeras ações buscando esses direitos, e de inúmeras decisões nesse sentido, a união estável passa a alcançar também as relações entre pessoas do mesmo sexo e não só mais a homens e mulheres como antes fora instituído.
2 A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 CÓDIGO CIVIL.
Diante do todo exposto, percebe se que a justificativa para o intenso debate a respeito da inconstitucionalidade do artigo 1.790 Código Civil, se configura pelo fato do texto da lei não ser suficiente para a compreensão das regras sucessórias referentes ao companheiro, fazendo com que os Tribunais recorram à doutrina, para a aplicação do direito, pois o direito não se confunde com a lei. Quando a lei não se enquadra ao sistema, cabe à doutrina e à jurisprudência ajustá-la, com a finalidade de garantir um Estado de direito.
A tese que sustenta a inconstitucionalidade do artigo 1.790 Código Civil se baseia no artigo 226 da Constituição Federal: “art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado, §3º para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”
A inconstitucionalidade do artigo acima citado, é defendida por alguns grandes sucessionistas, como é a tese defendida por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, que defende que o Código Civil no tocante ao artigo 1.790, merece urgente reforma a respeito ao direito sucessório do companheiro, para a garantia daqueles viveram em união estável permitindo assim um lugar adequado na ordem da vocação hereditária, não tendo seus direitos constitucionais suprimidos.
O Supremo Tribunal Federal vem por fim a guerra travada entre a legislação e a doutrina, tendo esta última prevalecido o seu entendimento a respeito da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil. O STF julgou no último dia 10 de maio de 2017 O RE 878694 que tratava de união de casal heteroafetivo e o RE 646721 abordava sucessão em uma relação homoafetiva. O Tribunal depois de muitos julgados em sentido oposto chegou à conclusão de que não existe fator de discriminação que justifique o tratamento diferenciado entre companheiro e cônjuge como impõe o Código Civil, nem mesmo o fator sexual.
Ficou demonstrado que o artigo 1.790 Código Civil viola princípios como a proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.
Com a decisão do tribunal as demais decisões de outros tribunais deverão seguir a mesma linha, pois a decisão é em caráter repetitivo, o que levará os demais julgadores a aplicação do artigo 1.829 do CC. equiparando assim o companheiro ao cônjuge, a menos que em decisão contrária justifique e fundamente o motivo de tal decisão.
O ministro lembrou que a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil pelo Supremo é vinculante. E que, portanto, deve ser respeitada, tanto no judicial como no extrajudicial.
3 EFEITOS PATRIMONIAIS E PESSOAIS DA UNIÃO ESTÁVEL
Com o reconhecimento da união estável, como entidade familiar surgem então os efeitos pessoais e patrimoniais dessa relação para os companheiros. O Código Civil trás em seu artigo 1.724, deveres decorrentes da união estável impostos aos companheiros ou conviventes, tais como: dever de lealdade, respeito, assistência, guarda ao outro companheiro ou convivente, sustento e educação dos filhos. Observa-se que a lei estabelece os mesmos deveres contidos no matrimônio, mas, no entanto a lei não estabelece que devam necessariamente residir sobre o mesmo teto.
3.1 FORMAS DE REGIME DE BENS NA UNIÃO ESTÁVEL
O artigo 1.725 do Código Civil regula a relação patrimonial entre os conviventes, ou seja, o regime deverá ser o da comunhão parcial de bens, salvo nos casos em que existir contrato dispondo sobre o regime de bens a ser adotado pelos conviventes.
O contrato entre os conviventes serve apenas para estabelecer o regime de bens a ser adotado pelos conviventes durante a união estável, não sendo dessa maneira possível dispor de matéria de ordem pública, em que haja disposição dos bens quando da morte de um dos conviventes, sendo nesses casos obrigatório fazer por disposição de vontades em testamento.
Para que o contrato de união estável produza efeitos entre as partes, basta que tenha sido feito por instrumento particular. Para sua eficácia perante terceiros poderá ser elaborado uma escritura pública de união estável junto ao Tabelionato de Notas, sendo posteriormente levado à registro no Registro Civil das Pessoas Naturais, o qual poderá ser registrado no Registro de Imóveis no livro Auxiliar “3” e ainda averbado a margem das eventuais matrículas de imóveis de propriedade dos mesmos.
A união estável pode ainda ser configurada nos casos em que os nubentes celebrem pacto antenupcial por escritura pública no Tabelionato de Notas, e ainda assim o casamento por qualquer motivo deixa de ser realizado, e posteriormente os nubentes passam a conviver como se casados fosse, o pacto antenupcial vale e gera efeitos como se fosse um contrato de convivência.
Durante a união estável há presunção de comunhão de aquestos, sendo assim desnecessária a comprovação do esforço comum para a aquisição do patrimônio adquirido a título oneroso.
O grande impasse está relacionado quanto a sucessão, onde temos várias posições doutrinarias relacionada tanto aos bens comuns quanto aos bens particulares. Pois o legislador tratou o convivente de maneira diferente ao conjugue, causando em muitos casos uma celeuma no momento da partilha.
4 SUCESSÃO
A palavra “sucessão”, em sentido lato, consiste em toda e qualquer espécie de transmissão de bens, direitos ou obrigações, de origem latina, que tem o significado de suceder, vir após, entrar no lugar de outrem, dando a ideia de substituir uma pessoa certa em algum cargo ou função, troca de titulares, verifica-se que a palavra sucessão tem uma pluralidade de significados, para o ramo do direito, já que qualquer forma de transmissão importa em sucessão.
Existem dois tipos de sucessão: a sucessão inter vivos, ou seja, decorrentes de acordos entre as partes por meio de negócio jurídico, e a sucessão forçada por morte, ou seja, causa mortis. Adiante iremos estudar a sucessão em razão da morte e os efeitos a seus sucessores.
A sucessão considera-se aberta no instante real ou presumida da morte de alguém, fazendo nascer o direito hereditário e operando a substituição do falecido por sucessores a título universal nas relações jurídicas em que aquele figurava.
Pelo princípio da Saísine, a lei considera que, no momento da morte, o autor da herança transmite seu patrimônio, de forma íntegra, a seus herdeiros.
O Código Civil trouxe dois tipos de sucessões causa mortis: a legítima que é tratada em seu artigo 1.829 e a testamentária, conforme disposto no artigo 1.786, ambos do Código Civil.
A sucessão legítima tem essa denominação devido ao fato dos bens do falecido seguir uma ordem hereditária previamente determinada em lei. A sucessão sempre será denominada legítima quando não existir disposição de vontade do falecido, ou se sobre esta ocorrer qualquer fato que a torne nula, ou se sobrevier à caducidade, ou se ainda o testamento deixado pelo de cujus, não abarcar todo o seu patrimônio.
Já a sucessão testamentária, depende de última disposição de vontade do falecido em relação à distribuição de seus bens. O testamento tem natureza de negócio jurídico, podendo dessa maneira apresentar vícios que o invalide, ou ainda poderá o testamento não dispor de todo o patrimônio do de cujus, diante dessas situações a sucessão se dará nos termos do artigo 1.829 e não do artigo 1.788, ambos do Código Civil.
5 A SUCESSÃO DO COMPANHEIRO
O legislador ao tratar da sucessão do companheiro no novo Código Civil, abordou os aspectos processuais e patrimoniais, deixando para o direito das sucessões o efeito patrimonial sucessório, mais precisamente no artigo 1.790, Código Civil.
A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Observa-se que o referido artigo do novo Código Civil, não faz nenhuma referência ao direito real de habitação em favor do companheiro sobrevivente, previsto no parágrafo único do artigo 7º da Lei 9.278/96, onde a lei determina que quando dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, o direito de habitação de que trata a lei diz respeito ao imóvel destinado à residência da família.
De conformidade com o posicionamento de Carlos Roberto Gonçalves, o não reconhecimento do direito de habitação ao companheiro sobrevivo, tem sido alvo de críticas, por sujeitá-la a uma eventual desocupação compulsória do imóvel onde vivia com finado parceiro, na hipótese de não ter este adquirido durante a convivência, ou por ter adquirido só a título gratuito. Nesses casos, conforme o autor carece o companheiro do direito à meação e tampouco concorre na herança, que poderá ser atribuída a herdeiros que nem sempre aceitarão repartir com ele o uso do imóvel residencial.
Neste sentido, o Enunciado 117 do Conselho da Justiça Federal, aprovada na l Jornada de Direito Civil, realizada em Brasília em setembro de 2002 estabelece que: “O direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, pelo fato de não ter sido revogada a previsão da Lei 9.278/96, ou ainda em razão da interpretação análoga do art.1.831 CC, confirmado pelo art.6º, caput, da CF/88”. (GONÇALVES, 2011, p. 189).
A doutrina trás inúmeras críticas em relação à sucessão do companheiro na união estável, sendo elas:
a) por limitar à sucessão aos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento;
b) por repetir, no caso de concorrência com os descendentes, a indébita distinção entre descendentes exclusivos, só do autor da herança, e descendentes comuns, havidos na união estável entre o autor da herança e o companheiro;
c) por estabelecer a concorrência com os colaterais.
Vejamos o que afirma o professor Rodrigo da Cunha Pereira, em sua obra "Concubinato e União Estável": “não há dúvida que este artigo apresenta um grande retrocesso para a união estável, vez que colocou o companheiro em posição muito inferior ao cônjuge”.
Ao que parece, retomou-se a mentalidade de que a união estável é uma família de segunda classe e não outra espécie de família, nem melhor nem pior do que o casamento, apenas diferente. Para outros autores “tal limitação não tem razão nem lógica, e quebra todo o sistema, podendo gerar consequências extremamente injustas: a uma companheira de muitos anos de um homem rico” (VELOSO, 2002, p. 288). Evidencia-se, contudo, que o diploma civil esqueceu-lhe que a Constituição Federal em seu artigo 226, protege a entidade familiar, diz respeito muito mais de perto à relação homem e mulher, ascendentes e descendentes.
5.1 QUAIS BENS HERDAM OS COMPANHEIROS
Segundo o STF, não existe elemento de discriminação que justifique o tratamento diferenciado entre cônjuge e companheiro estabelecido pelo Código Civil, independente da orientação sexual. Em função disso, quem vive em união estável inclusive decorrente de relação homoafetiva vai participar da sucessão do outro, com base nas mesmas regras aplicáveis aos cônjuges.
A sucessão, inclusive em relação homoafetiva, se dará conforme as mesmas regras previstas no art. 1.829 do Código Civil, para a sucessão legítima, isto é, primeiramente aos descendentes, em concorrência com o cônjuge ou companheiro (a) - a depender do regime de bens do casamento ou união, em segundo lugar aos ascendentes em concorrência com o cônjuge ou companheiro (a), em terceiro lugar exclusivamente ao cônjuge ou companheiro (a) - se não existirem nem ascendentes nem descendentes. Não existindo nenhum destes (nem descendentes, nem ascendentes, nem cônjuge, companheiro ou companheira), a sucessão legítima se defere aos colaterais.
5.2 REGRAS QUANTO À PARTICIPAÇÃO DO COMPANHEIRO E DO COMPANHEIRO NA SUCESSÃO
O Código Civil trouxe uma diferenciação entre os direitos sucessórios dos cônjuges e companheiros, ou seja, observa-se uma relação de inferioridade onde o cônjuge é considerado herdeiro necessário, possuindo propriedade plena, concorrendo com os descendentes e os ascendentes, adquirindo a totalidade da herança do de cujus na ausência de tais parentes, conforme dispõe artigo 1.829 e incisos do Código Civil.
Como se verifica, o cônjuge participa da ordem de vocação hereditária em terceiro lugar, possuindo garantia legítima por ser herdeiro necessário, eis que na falta de qualquer dos descendentes e ascendentes, recebe a herança por direito próprio.
Quando o cônjuge é chamado a suceder, assume a condição de herdeiro, independentemente do regime de bens do casamento, pois a lei nada se refere ao conferir-lhe a qualidade de herdeiro necessário.
O Código Civil garante ao cônjuge sobrevivente o direito real de habitação independente do regime de bens do casamento, como prevê o artigo 1.831 Código Civil. sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, tal direito refere-se ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
Em contra partida o Código Civil não promoveu ao companheiro supérstite à condição de herdeiro necessário. O companheiro da união estável, não goza do mesmo privilégio, pois é considerado como herdeiro legítimo e não herdeiro necessário, conforme termos do artigo 1.790 do Código Civil.
Assim, o legislador confunde herança de meação, ao assegurar o direito sucessório ao companheiro, no que tange a metade dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável. O companheiro é colocado em último lugar na ordem de vocação hereditária, concorre com os colaterais e só tem direito a integridade da herança do de cujus, caso este não tenha parente a suceder.
5.3 CORRENTES DOUTRINÁRIAS
A doutrina se divide em diversas correntes quanto à quota-parte que o companheiro supérstite deverá receber quando concorrer com filhos híbridos.
A primeira corrente é defendida por doutrinadores como Silvio de Salvo Venosa, José Fernando Simão entre outros, em que se afirmam que o companheiro deverá receber uma cota-parte a que couber à cada filho, a segunda corrente defende que o companheiro supérstite deverá receber meia quota-parte, aplicando nesse casso o inciso II, do artigo 1.790 Código Civil., visando aqui uma maior proteção aos descendentes. Esse entendimento é defendido por doutrinadores como Flávio Tartuce, tal entendimento está firmado com o argumento de que dessa maneira se atenderia o princípio da igualdade jurídica entre todos os filhos; terceira corrente tem o entendimento de que a herança deveria ser divida em dois blocos, e a partilha deveria ser feita proporcional aos filhos comuns e exclusivos, ou seja, o companheiro deverá receber uma cota-parte correspondente aos dos filhos comuns e meia cota-parte aos filhos exclusivos, somando se assim as quotas partes e por fim temos uma quarta corrente que é um pouco mais ousada, busca através de uma fórmula matemática uma maior igualdade quanto à quota parte atribuída a cada filho comum e exclusivo em relação ao companheiro sobrevivo, devendo encontrar um coeficiente proporcional, levando em consideração o número de filhos comuns e exclusivos deixados pelo falecido.
5.4 A SUCESSÃO EM CONCORRÊNCIA COM ASCENDENTES
De conformidade com o artigo 1.790 do Código Civil, inciso III, a situação em que o companheiro falecido não deixar descentes, os ascendentes serão chamados à sucessão em concorrência com o companheiro sobrevivo. Sendo os bens particulares atribuídos integralmente aos ascendentes e os bens comuns, adquiridos a título oneroso durante a constância da união estável serão partilhados de forma que caberá metade (meação) ao companheiro supérstite e a metade (herança) na proporção de 1/3 ao companheiro e os outros 2/3 aos descentes.
5.5 A SUCESSÃO EM CONCORRENCIA COM HERDEIROS COLATERIAS
Os parentes colaterais de até 4º grau serão chamados a sucessão quando o falecido não tiver deixado descendentes e nem ascendentes, os quais irão concorrer com o companheiro sobrevivo nos moldes do inciso III, do artigo 1.790 Código Civil, e a partilha se dará na forma de 1/3 da herança ao companheiro e 2/3 aos demais herdeiros colaterais.
O polêmico inciso III faz surgir muitas discussões a em razão da injustiça em relação ao companheiro, uma vez que teria que dividir a herança com parentes distantes, acarretando ao companheiro, inúmeros problemas e insegurança, ferindo os direitos constitucionais do companheiro sobrevivo.
5.6 A SUCESSÃO EM CONCORRÊNCIA COM O MUNICÍPIO
O companheiro de depara ainda com outro problema em relação ao patrimônio deixado pelo falecido, considerando que no caput do artigo 1.790 Código Civil, trata do direito sucessório do companheiro quanto aos bens comuns adquiridos a título oneroso na constância da união estável. Pois bem de acordo com o inciso IV, “não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança”, percebe-se que o dispositivo trata apenas da herança, ou seja, os bens comuns.
Surgindo aqui uma dúvida quanto aos bens particulares, se fizermos a interpretação à luz do disposto no caput do referido artigo, logo os bens particulares deixados pelo falecido seria considerada herança jacente?
Pelo princípio da razoabilidade na situação acima exposta a interpretação deveria ser feita de forma que não tendo o falecido deixado descendentes, ascendentes e nem parentes de até 4º grau, a totalidade da herança deveria ser atribuída ao companheiro sobrevivente.
CONCLUSÃO
Buscou-se com o presente trabalho monográfico analisar o direito sucessório do companheiro com o advento do Código Civil de 2002 e consequentemente fazer um estudo sobre a trajetória percorrida desde a égide do Código Civil de 2002 até a presente data, a busca incansável pela inconstitucionalidade do artigo 1790 do mesmo diploma, a luz do princípio da isonomia. O Legislador ordinário ao elevar a união estável ao status de entidade familiar, determinando a sua facilitação da conversão em casamento, abarcou a proteção Estatal, demonstrou claramente a diferença entre ambos os institutos, uma vez que o simples reconhecimento da união estável não teria o condão de equipá-la-á ao matrimônio, se não produzisse os mesmos efeitos.
Com efeito, a união estável e o casamento são institutos distintos e assim são tratados, cada qual com suas peculiaridades. Assim, o próprio legislador estabeleceu tratamento diversificado para os cônjuges e os conviventes, principalmente ao tratar da sucessão do companheiro sobrevivente, mais especificamente no art. 1.790 e incisos do Código Civil, que trata dentro das disposições gerais, deixando o companheiro sobrevivente fora da ordem de vocação hereditária, ao contrário o que ocorria na lei 8.271/94 que inseriu o companheiro sobrevivente na 3ª ordem de vocação hereditária especial, ocorrendo retrocesso dos direitos dos companheiros.
Houve por parte do legislador também a restrição quanto ao direito sucessório do companheiro estabelecida no artigo 1.790 do Código Civil, visto que este só irá concorrer com bens comuns adquiridos onerosamente na constância da união estável, não fazendo jus aos bens particulares, cabendo à concorrência destes aos descendentes, ascendentes e parentes sucessíveis do companheiro falecido.
Em relação ao direito real de habitação o legislador silenciou sobre a questão, não sendo assegurado ao companheiro tal direito ao contrário do que ocorreu com o cônjuge, que teve seus direitos resguardados conforme o dispositivo do artigo 1.831 do Código Civil, o que é totalmente incoerente com o preceito constitucional tipificado no art. 226 § 3º da Constituição Federal que afirma que o Estado deve proteger tanto o casamento, a família monoparental e a União Estável. Em relação à moradia destinada à família deve-se continuar tal benefício conferido ao companheiro, aplicando de forma extensiva ou analógica o artigo 1.183 do Código Civil de 2002.
Além do mais, verifica-se também o fato de ter sido atribuído ao cônjuge como herdeiro necessário, não se foi estendido o benefício ao companheiro.
O polêmico art. 1.790 do Código Civil apresenta discrepâncias entre os direitos previstos ao cônjuge no art. 1.829 Código Civil no tocante a ordem da vocação hereditária, em relação ao companheiro, de forma que contrariou os princípios norteadores da Constituição Federal, sendo esse o motivo da busca incansável da maioria da doutrina por mudanças pleiteando do legislador reformada em tal dispositivo.
Por fim, conclui-se que apesar da Constituição Federal em seu artigo 226, §3º, reconhecer e dar proteção jurídica as uniões formadas pelos laços de afeto e da convivência duradoura, sem o formalismo legal, atendido os requisitos legais, torna-se realmente lamentável a posição anteriormente adotada pelo ordenamento jurídico, em relação à diferenciação no plano sucessório entre as duas espécies de família, ou seja, a surgida a partir do casamento e a originada da união estável, o que acarreta lamentável afronta ao princípio constitucional da isonomia.
Contudo com o novo entendimento do STF em relação à inconstitucionalidade do artigo 1.790 Código Civil, se espera que os aplicadores do direito possam atuar com justiça respeitando a igualdade, paridade como prega os princípios norteadores da Constituição Federal, surgindo no mundo jurídico uma nova era para o direito das sucessões que vem se moldando as necessidades da sociedade moderna.
REFERÊNCIAS
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COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2011.
DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Morrer e suceder: passado e presente da transmissão sucessória concorrente. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. 5. ed. São Paulo: TARTUCE, Flávio. Direito Civil. V.6: direito das sucessões/ Flávio Tartuce, José Fernando Simão: prefácio Zeno Veloso. - 5.ed., rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: METODO, 2012.
https://wwws.cnpq.br/cvlattesweb/PKG_MENU.menu?f_cod=57EBBFC2FC094859F9E40D640D805BE1#
Bacharelando em Direito pela Universidade Brasil e Escrevente no Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Fernandópolis-SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: APPOLONI, Cesar Augusto dos Santos. União estável e a sucessão hereditária do companheiro e a inconstitucionalidade do Artigo 1.790 CC Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 nov 2017, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51041/uniao-estavel-e-a-sucessao-hereditaria-do-companheiro-e-a-inconstitucionalidade-do-artigo-1-790-cc. Acesso em: 07 nov 2024.
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