RESUMO: Este artigo visa a uma reflexão teórica no que concerne às relações familiares e suas novas perspectivas, no tocante à afetividade e ao poder familiar. Importante atentar para a estrutura familiar nesse contexto e de como a quebra do vínculo afetivo, em razão de uma disputa judicial, pode desencadear uma série de graves consequências. Temas como Alienação Parental e Síndrome de Alienação Parental, em especial, serão abordados para um aprofundamento das questões atinentes aos processos litigiosos, que podem chegar a extremos como as falsas denúncias de abuso sexual infantil. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica por meio da qual foram obtidas contribuições de especialistas como GARDNER (2008), LOWENSTEIN (2008) e BARROS (2012), dentre outros, que discutem as diversas faces do desequilíbrio afetivo na esfera familiar. Concluiu-se que somente com intervenção interdisciplinar o processo poderá ser julgado de forma a preservar o bem-estar da criança, detectando os fatores alienantes e devolvendo a ela a possibilidade de restabelecer vínculos afetivos com os genitores.
Palavras-chave: Família. Afetividade. Alienação Parental. Síndrome de Alienação Parental.
Introdução
As relações humanas são dinâmicas e o sistema judiciário tenta acompanhar as transformações na sociedade e a evolução dos costumes, em virtude das crescentes demandas, o que traz inovações no ordenamento jurídico. A família tornou-se mais plural e outros valores foram agregados na construção dessa relação.
O presente trabalho pretende trazer à reflexão algumas considerações sobre a família, sob a ótica contemporânea em que se privilegia o afeto, e os problemas que podem surgir da sua desintegração. Necessário se faz compreender as relações que se estabelecem entre os sujeitos que constituem a célula familiar. O que se coloca em destaque nesse aspecto são as questões que envolvem o poder familiar, ponto de partida para a construção da identidade e da noção de pertencimento de uma criança.
Segundo João Gaspar Rodrigues (2013), “a família é um espaço privado de afetos. A afetividade é o núcleo vital e, por assim dizer, o elemento conceitualmente essencial no delineamento dessa instituição”.
Indiscutivelmente a afetividade é elemento fundamental na edificação das relações familiares, principalmente na primeira infância. O afeto vai nortear o crescimento saudável da criança e propiciar condições para que ela possa desenvolver suas potencialidades em plenitude. É o fio condutor que constrói a confiança entre pais e filhos, relacionando-se intimamente com a dignidade do ser humano, tão bem defendida pela Constituição Brasileira.
A quebra desse vínculo gera sofrimento e desequilíbrio. O abandono afetivo traz graves consequências e o distanciamento decorrente dele deixa a criança suscetível a problemas psíquicos profundos.
Em que pese a dor de uma separação entre os pais, os mesmos devem preservar ao máximo a estabilidade emocional da criança, deixando claro que o afeto permanece e que ausência de um dos genitores não acarretará em perda de atenção e confiança. Deverão ser encontrados meios para que o pai e a mãe participem ativamente da criação do filho menor de idade, ainda que em lares diferentes e com possíveis agregações de outros membros na família. Isso por si só já é tarefa complexa. O fato que vai complicar sobremaneira esse processo é quando a disputa entre os genitores pelos bens e pela guarda na seara jurídica torna-se acirrada e violenta, deixando o bem-estar da criança em segundo plano.
Tanto pai e mãe são responsáveis pela proteção e segurança do filho. Deveriam ser o alicerce para o bom desenvolvimento físico e emocional dele. É dever dos pais cuidar das necessidades básicas e preparar a criança para a vivência em comunidade, educando para que tenha boa índole e saiba lidar com os obstáculos naturais que a vida impõe a todos.
Hoje a mãe e o pai têm papéis iguais na criação da prole. Não há divisões rígidas de papéis (provedor/cuidador). Os pais são corresponsáveis. A mãe multitarefa se esforça dentro e fora de casa para que nada falte à família. Cada vez mais o pai passivo e distante dá lugar a um pai que quer mais participação e não deseja ficar à margem da vida do filho. Ele não quer apenas contribuir financeiramente, ele quer estar presente e conviver, apesar do fim do casamento. Isso vem polarizar a discussão no processo de guarda: um contra o outro e a criança apenas um joguete, enquanto os interesses dos pais estão duelando judicialmente. Nesse momento vulnerável, em que a separação litigiosa acontece, as pessoas em que o menor deveria se apoiar estão sabotando o afeto familiar.
Observa-se que o processo pode vir carregado de mentiras e manipulação, com reforços negativos e deturpação dos fatos, estabelecendo-se os fenômenos da Alienação Parental (AP) e mais gravemente da Síndrome de Alienação Parental (SAP), que serão aprofundados mais adiante.
Desenvolvimento
O processo que envolve o divórcio, a partilha e a guarda dos filhos é doloroso e causa um estresse profundo nas partes. Controlar os sentimentos negativos que surgem não é fácil. Inconscientemente os pais assumem papéis cruéis e podem colocar a carga de toda frustração e rancor nos ombros dos filhos. É nesse momento, onde o pior aflora, é que a disputa vai ganhando contornos dramáticos e as coisas saem do controle. A maneira como a criança vai reagir a esse conflito é determinada pela forma que a separação acontece.
Nesse diapasão, é necessário entender o conceito de Alienação Parental, tão presente hoje na seara do Direito de Família. É preciso estar atento ao alienador, ao alienado e, sobretudo, à parte mais frágil, que sofre as mais sérias consequências.
De acordo com o art. 2º da Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010, a Alienação Parental é definida como sendo
a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que se repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. (BRASIL, 2010).
Um dos genitores abre mão da proteção do filho para obter uma vingança pessoal, para satisfazer caprichos e exercer o poder familiar de forma perversa, onde situações são criadas para prejudicar o outro genitor, sem perceber muitas vezes que o filho vai carregar essas marcas e moldar a sua vida com conflitos e incertezas. Ele vai ser privado do bom convívio com os pais e se tornar um adulto com mais propensão a traumas intensos. Precocemente a criança é obrigada a participar de jogos, simulacros que ela não entende, em detrimento do aprendizado emocional e da construção afetiva que vai nortear o seu desenvolvimento. O estado mental é prejudicado nesse ambiente desfavorável ao seu pleno desenvolvimento.
Não cabendo aqui estereótipos de qualquer tipo, nem juízo de valores ou de padrões , observa-se que como a guarda fica na maioria das vezes a cargo da mãe, ela se torna mais comumente o genitor alienador, que utiliza o filho como objeto de manipulação para atingir seus fins, que é principalmente o afastamento e o isolamento do pai. O genitor alienador quer se tornar a única referência para a criança e ser detentor de todas as supostas verdades, com o falso intuito de proteger a prole, o que encobre vários tipos de transtornos e desvios de comportamento, que a seu ver se justificam. Para isso, pode incutir na cabeça do filho ideias equivocadas sobre os sentimentos do pai. A criança se vê obrigada a escolher um lado, pois é incutido em sua cabeça que não pode ter o amor dos dois pais. Importante salientar que a alienação também pode ser feita por outros familiares, além do pai e da mãe.
O psiquiatra americano Richard Gardner, em seus estudos e em sua práxis, observou e assim conceituou a Síndrome de Alienação Parental (SAP):
A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável. (GARDNER, 2002).
O genitor alienador visa sistematicamente a quebra do vínculo entre a criança e o genitor alienado, utilizando-se de vários artifícios para que essa ruptura aconteça. Gardner fala em doutrinação da criança pela SAP. O abuso acontece de variadas formas e a criança se vê envolta, repetidamente, numa rede de histórias e situações forjadas, que se tornam reais para ela.
A controvérsia entre as terminologias Alienação Parental x Síndrome de Alienação Parental é muito bem diagnosticada por Gardner:
A maioria dos avaliadores, advogados do direito de família e de juízes reconhecem que tais programação e alienação da criança são comuns no contexto de disputas de custódia de crianças. Concordam, também, que há as situações em que a alienação da criança é o resultado da programação parental. Há alguma objeção ao uso do termo síndrome e alega-se que não é de fato uma síndrome, e que deve ser usado o termo alienação parental (AP). O problema com o uso do termo AP é que há muitas razões pelas quais uma criança pode ser alienada dos pais, razões que não têm nada a ver com programação. Uma criança pode ser alienada de um pai por causa do abuso parental da criança - por exemplo: físico, emocional ou sexual. Uma criança pode ser alienada por causa da negligência parental. As crianças com transtornos de conduta frequentemente são alienadas de seus pais, e os adolescentes atravessam geralmente fases de alienação. A SAP é vista como um subtipo da alienação parental. Assim sendo, substituir o termo AP pelo de SAP não deveria causar confusão, mas causa. (GARDNER, 2002).
Nessa abordagem, o artigo adota como mais contundente a SAP, que em linhas gerais pode-se assumir que é o nível bem mais agravado da AP, apesar de seu termo ainda estar envolto em críticas e discussões. Nesses casos, o comportamento do filho menor de idade já está comprometido e seu lado psicológico muito abalado por estar no centro dessa disputa, onde o certo e o errado se confundem. Ele assume as falsas verdades criadas pelo alienador e as reproduz, podendo até utilizar fantasias para suprir as lacunas e aprimorando as mentiras que são propagadas.
Não há consenso entre aqueles que lidam com esse assunto. Embora ele não seja antigo, tem sido cada vez mais encontrado nos processos envolvendo disputa familiar. Em situações litigiosas, muitos mecanismos são usados para alcançar o objetivo, assim como meios escusos para produzir provas e induzir os operadores do Direito a apoiar a sua causa.
Considerando o crescente número de denúncias de abuso sexual infantil, é importante analisar o que tem motivado esse incremento tão significativo. Hoje as informações sobre essa matéria estão mais acessíveis. A importância e a atualidade do tema são mais bem divulgadas. As pessoas estão mais alertas para identificar os sinais que evidenciam esse crime, ainda mais quando é feito contra um menor de idade, desprotegido e incapaz de se defender. Esse tipo de abuso acontece comumente no círculo próximo à vítima, sobretudo dentro do mesmo lar, o que torna a situação mais revoltante e assustadora. Quem deveria cuidar e proteger, está ameaçando, abusando e comprometendo a vida do próprio filho. Isso acontece na vigência de uma relação duradoura e também após uma separação. Todo abuso infantil deve ser investigado, sendo punidos os culpados e os negligentes. Isso é inquestionável. Para isso é necessário um suporte interdisciplinar e jurídico, com profissionais capacitados para analisar cada situação.
A Alienação Parental em ascensão pode chegar a extremos com falsas acusações, sendo a forma mais cruel a do abuso sexual, criado com intenções de prejudicar o “acusado” para afastá-lo do convívio com o menor e isolá-lo muitas vezes na disputa num processo judicial. Como tal assunto é de muita gravidade, é preciso muito tato para avaliá-lo. Se há indícios verdadeiros, os mesmos devem ser apurados com rigor. Se for constatado que é um fato criado pela imaginação do genitor alienador para atingir o genitor alienado e ter para si o afeto exclusivo do filho, é necessário que todas as informações possíveis sejam reunidas para que a complexidade do caso possa ser desvendada. Como distinguir realidade da ficção? O certo nos dois panoramas é que a criança, a parte mais sensível, fica mais prejudicada. Deve-se procurar no seu discurso, nas atitudes e comportamentos, indícios do que está por trás do que é dito. As falsas denúncias de abuso ganham contornos cada vez mais dramáticos, que põe toda a família e o círculo social mais próximo em conflito. Depois de levantar uma falsa acusação, a recuperação nunca é total. As marcas podem ser indeléveis, pois ainda que sejam esclarecidos os fatos, a sombra já foi lançada.
A guerra que se instala nos embates judiciais nas Varas de Família está se agravando e as armas que estão sendo usadas assustam pelo poder de destruição e pelo nível doentio a que chegam. Como já mencionado, destacam-se as falsas denúncias de abuso, cujas consequências para os envolvidos são altamente graves, deixando sequelas que trarão prejuízos em vários aspectos. O poder judiciário é utilizado para punir o genitor alienado, com o afastamento definitivo do convívio filial. A programação é feita de tal forma que todos podem ser iludidos nesse emaranhado de acusações. A desestruturação se dá em todos os níveis e não poupa ninguém. A criança é a mais afetada, pois o seu desenvolvimento em todos os níveis foi comprometido, tendo que conviver com a culpa. Isso afetará o comportamento social e sexual. As relações afetivas serão construídas com esse trauma, causando dificuldade em estabelecer confiança com o outro. O genitor acusado injustamente terá sua reputação manchada e suas relações de trabalho sofrerão com essa difamação. O seu papel na sociedade e no estabelecimento de novas relações sofrerão, pois esse tipo de exposição nunca é deixado de lado, sendo alvo de comentários, o que dificultará ao mesmo refazer sua vida.
Necessário se faz tentar desvendar como uma denúncia tão séria pode ser feita levianamente, construída com histórias inventadas e induzindo o menor a acreditar na mentira, através de uma manipulação mental, com recursos de programação e lavagem cerebral. O prejuízo advindo desses relatos é altíssimo e compromete o futuro da criança, pois o abuso psicológico já ocorreu. A forma de apurar o que é real do que é irreal é muito difícil e precisa ser feita com muita seriedade, com uma análise mais abrangente de todos os envolvidos e um levantamento pormenorizado. Tem que haver muita cautela, pois é tarefa bem complexa separar o que de fato está acontecendo do que é relatado pelas partes. Afinal, quem está com a razão? Como avaliar o testemunho de uma criança? Até que ponto os relatos são confiáveis? Com a programação e as falsas memórias implantadas, a criança acredita no que está dizendo, pois a sua mente foi manipulada e direcionada para tal.
A falsa denúncia está ligada à Síndrome de Alienação Parental, que é o extremo da Alienação Parental. Tão logo identificada a AP, imprescindível buscar caminhos para que ela cesse, a fim de evitar uma evolução que culmine na SAP.
Para Gabriela dos Santos Barros,
os efeitos da alienação parental nos filhos são diversos: introspecção, conduta antissocial, isolamento social, sentimento de abandono e solidão, falta de autoestima, baixo rendimento escolar, fugas de casa, rebeldia, instabilidade emocional, depressão, melancolia, angústia, regressões no tocante ao comportamento (ações condizentes a uma idade mental inferior), negação da separação dos pais, culpa (posteriormente ou, no momento atual, a criança crê em que a situação conflituosa entre seus pais seja culpa sua, por conta, por exemplo, de seu mau comportamento ou seu baixo rendimento escolar), aproveitamento da situação conflituosa entre os pais (às vezes, a criança busca se beneficiar da circunstância, oferecendo-a como pretexto para atingir seus intuitos ou para escapar de suas responsabilidades ou fracassos), uso de álcool, tabagismo e outras drogas, suicídio (diante da tortura psicológica a que são submetidos pelo genitor alienante e do conflito interior do filho quanto a qual genitor apoiar, muitas crianças e adolescentes vítimas de alienação parental encaram o suicídio como uma válvula de escape; muitas vezes, o filho comete tentativa de suicídio para chamar atenção, suprir a carência parental, tentar reaproximar os pais ou simplesmente para encontrar o genitor alienado fora dos dias de visitação). Geralmente, quando o filho consegue alcançar certa independência do guardião, o que lhe permite entrever a irrazoabilidade do distanciamento a que foi induzido, padece de um grave complexo de culpa ao perceber que foi cúmplice de uma injustiça contra o genitor alienado. BARROS (2012)
Quando comprovada a SAP, parece não haver outra forma de proteger o filho além de evitar que o genitor continue a ter acesso a ele de forma irrestrita. Um afastamento se faz necessário e uma mediação pode tentar controlar o clima de animosidade entre os genitores visando o bem-estar da criança.
A mediação familiar vai propiciar um diálogo mais aberto entre as partes para que possam chegar a uma solução consensual na administração de conflitos. O mediador deve estar capacitado a fazer as intervenções necessárias, deixando que as partes cheguem a um acordo.
Conforme destaca a psicóloga Denise Maria Perissini da Silva (2009), a mediação familiar pode servir de ajuda nos conflitos de SAP, principalmente naqueles “não elaborados, que normalmente seriam discutidos por meio de longos, onerosos e desgastantes processos judiciais, são transformados em diálogos e compartilhamento de decisões, com a intervenção do mediador”.
A tarefa de reverter o processo de alienação parental não é fácil, pois tem que contar com a colaboração das partes e trazer à consciência dos mesmos o enorme prejuízo sofrido pela criança. A parte alienada tem que se fazer mais presente e não se afastar por comodismo, por receio das ameaças do alienador e por medo da rejeição do filho.
Lowenstein (2008) menciona em seu artigo - O que pode ser feito para diminuir a implacável hostilidade que leva à Síndrome de Alienação Parental? - algumas maneiras de combater a alienação parental. Segundo ele, é muito importante que a criança seja levada a ver os pontos positivos do genitor alienado, que consiga relembrar a sua ligação com ele antes da separação ocorrer, visando a dar um fim à depreciação. A conscientização deve ocorrer tanto na criança quanto nos genitores para que possa haver uma mudança nos comportamentos hostis. Somente com a cooperação das partes é possível um avanço rumo à construção de uma relação mais saudável do filho com os pais. Para compreender o processo da SAP é preciso que o especialista faça uma avaliação individual e conjunta em diferentes momentos, a fim de obter informações mais consistentes sobre a dinâmica familiar. O genitor alienador deseja que os laços sejam cortados, tornando o filho excessivamente dependente dele. Faz com que ele se afaste do genitor alienado e dos outros familiares ligados a ele, criando animosidade, rejeição, incompreensão, angústia, raiva e medo. A recuperação do afeto é vital. Um atendimento especializado deve ser feito como acompanhamento para recuperar esses laços parentais.
Os operadores do Direito devem estimular o contato da criança com o genitor ausente, a fim de restabelecer a convivência e religar o sentimento. Devem estar atentos ao que é dito e como é dito, e principalmente o que está nas entrelinhas, daquilo que não é dito. Agir com firmeza no interesse do menor quando a SAP é constatada. Lowenstein (2008) afirma que
em casos extremos, a criança deverá ser retirada da influência do genitor alienante e a guarda da criança deverá ser dada ao genitor alienado ou a outro órgão, e que possa incluir um membro da família do genitor alienado. Isso deve ser feito através do tribunal e por sugestão do perito ou do mediador, quando não parece haverem sido feitos progressos para inverter o processo de alienação, e o alienador continua com a sua alienação.
Com toda essa complexidade instalada, a solução que se apresenta em cada caso deve levar em consideração a proteção do menor, seja de um abuso efetivo, seja de um genitor alienador. Detectar todas as nuances para julgar o processo que se apresenta requer um aprofundamento na questão, embasado nos trabalhos dos especialistas em Psicologia e em Serviço Social.
Conforme bem detalha Priscila Fonseca,
as providências judiciais a serem adotadas dependerão do grau em que se encontra o estágio da alienação parental. Assim, poderá o juiz: a) ordenar a realização de terapia familiar, nos casos em que o menor já apresente sinais de repulsa ao genitor alienado; b) determinar o cumprimento do regime de visitas estabelecido em favor do genitor alienado, valendo-se se necessário, da medida de busca e apreensão; c) condenar o genitor alienante ao pagamento de multa diária, enquanto perdurar a resistência às visitas ou à prática que enseja a alienação; d) alterar a guarda do menor, principalmente quando o genitor alienante apresentar conduta que se possa reputar como patológica, determinando, ainda, a suspensão das visitas em favor do genitor alienante, ou que elas sejam realizadas de forma supervisionada; e) dependendo da gravidade do padrão de comportamento do genitor alienante ou diante da resistência dele perante o cumprimento das visitas, ordenar sua respectiva prisão. (FONSECA, 2006, p. 167).
O último passo é recuperar a estrutura emocional da criança, vitimizada pela manipulação mental. Aos poucos a sensação de segurança deve ser reforçada. O filho precisa estar ciente de que ele pode conviver em harmonia com os pais, sem que suas atitudes impliquem na escolha de um em detrimento do outro. Lowenstein (2008) diz com propriedade que “o genitor alienado deve fazer o máximo possível para tranquilizar o filho de que não existe desejo de separá-lo do genitor guardião”. Superadas as mágoas, os pais poderão retomar a afetividade na relação parental em prol do bem-estar do filho.
Conclusão
A Síndrome de Alienação Parental incapacita a criança no desenvolvimento de suas potencialidades, do seu relacionamento com a família e com a sociedade. Ela vai muito além da Alienação Parental, que por si só já é grave. A discussão contextualizada e a consequente desmistificação dos falsos conceitos contribuem para uma melhor compreensão sobre as dificuldades encontradas pelos operadores do Direito, que necessitam de um apoio interdisciplinar para avaliar cada processo que se apresenta. Ao adentrar em situações que estão no âmago das emoções do ser humano, é preciso repensar de forma mais ampla conceitos como afetividade x poder familiar, Alienação Parental x Síndrome de Alienação Parental, em contrapartida ao abuso sexual infantil x falsas denúncias de abuso.
É necessária uma grande discussão sobre temas tão delicados e controversos, que afetam profundamente várias vidas, para que a construção dos acessos às informações seja mais bem compreendida, despertando a consciência de todos para ações reflexivas.
Por ser questão multidisciplinar, é fundamental uma abordagem não apenas jurídica, mas psicológica, para diferenciar o fato real daquele construído em falsas memórias. Alguns aspectos dificultam os pareceres dos peritos, que devem trabalhar em conjunto para analisar cada caso, com suas nuanças, sendo os atores de cada processo analisados em detalhes. A visão sobre o comportamento dos indivíduos que atuam no processo precisa ser mais abrangente, utilizando apropriadamente as ferramentas disponibilizadas pelo psicólogo e pelo assistente social.
A decisão final no processo é proferida pelo magistrado, mas ele deve ter o respaldo necessário para uma boa avaliação, contando com olhar mais aprofundado dos profissionais responsáveis pelos relatórios e avaliações psicológicas, a fim de achar uma solução que proteja a criança desses danos, que leva à situação de instabilidade emocional.
REFERÊNCIAS
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Bacharel em Letras pela Universidade Federal de Viçosa. Pós-graduação feita na Universidade Cândido Mendes. Servidora do Ministério Público do Estado de Minas Gerais<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TORRES, Denise Rosa. Família e afetividade: reflexões sobre a síndrome de alienação parental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 out 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/52340/familia-e-afetividade-reflexoes-sobre-a-sindrome-de-alienacao-parental. Acesso em: 31 out 2024.
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