ROCHELE JULIANE LIMA FIRMEZA BERNARDES
(orientadora)
RESUMO: O capitalismo e o consumismo andam lado a lado e isso se deve a forma que as pessoas são incentivadas a comprarem e a terem sempre o novo, o bom, o atual, o de última geração. Por isso, que quando o mundo se moderniza, as formas de consumo também acompanham essa modernidade, sendo através de lojas físicas e atualmente: em lojas virtuais, pela rede mundial de computadores (internet). Quanto a metodologia, a abordagem escolhida para a realização desse trabalho foi uma pesquisa qualitativa, no qual dados foram levantados e análises de obras renomadas foram realizadas para discutir profundamente sobre o assunto em questão. Com base nisso, surge questionamentos sobre como os direitos do consumidor se adaptaram a essa modernidade e se as antigas e novas leis são suficientes para suprir a proteção do uso de dados dos consumidores quando optam por essa forma de consumo.
Palavras-chave: consumismo; consumidor; Lei Geral de Proteção de Dados; dados; internet; vulnerabilidade; Código de Defesa do Consumidor, legislação; virtual.
ABSTRACT: The capitalism and consumerism are side by side and its due to the way people are encouraged to buy and always have the new, the good, the current, the lastest generation. Therefore, when the world is modernized, the forms of consuption also accompany this modernity, being through physical stores and nowadays: in virtual stores, through the world wide web (internet). As for the methodology, the chosen approach to carry out this work was a qualitative research, in which data were collected and analyzes of renowned works were carried out to discuss in depth the subject in question. Based on this, questions arise about how the consumer rigths have adapted to this modernity and if the old and new laws are enough to provide protetion for the use of data by consumers when they choose this form of consumption.
Keywords: consumerism; consumer; General Data Protection Law; data; internet; vulnerability; Consumer Protection Code, legislation; virtual.
1 INTRODUÇÃO
Diante da contemporaneidade, resta claro que a Constituição Federal de 1988 foi promulgada para constituir a base do Estado, que visa um caráter social, o qual define a cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos presentes na República Federativa do Brasil. Neste sentido, é inquestionável a atuação do legislador acerca de conteúdo do direito do consumidor, considerado um Direito Fundamental previsto no artigo 5º da Magna Carta. Desse modo, criou-se em 1990 o Código de Defesa do Consumidor (CDC), visando proteger o consumidor, considerado parte vulnerável das relações consumeristas.
Dessa forma, através de um avanço tecnológico que a atual sociedade vem passando, os dados pessoais, principalmente, os dados dos consumidores, ganham uma atenção do mercado, sendo utilizados para várias finalidades e os tornando vulneráveis. O atual modelo faz com que o CDC atue na proteção de usos abusivos dessas informações através de mecanismos garantidores e restritos quanto à divulgação dos dados pessoais, mas não se sabe ao certo se essa proteção é efetiva. Assim, para disciplinar a questão da proteção de dados foi promulgada em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados, que visa garantir o direito básico à liberdade e privacidade nesse novo mundo de compras online.
Logo, o presente artigo procura compreender tal problemática, qual seja: a Lei nº 13.709 de 2018 e do Código de Defesa do Consumidor são suficientes para proteger os dados dos consumidores na internet? Como hipótese para esse questionamento, sabe-se que o consumidor uma vulnerabilidade na relação com o vendedor e o CDC o protege, só que não de forma suficiente, visto que diante do Princípio da Vulnerabilidade, presente no artigo 4º, I do CDC, o consumidor goza de uma fragilidade técnica por não ter o conhecimento necessário acerca do produto.
Dessa forma, a relevância jurídica do tema está relacionada com a necessidade da criação de novos meios de proteção jurídicos a esse novo tipo de consumidor é de extrema importância para sociedade brasileira. Nesse novo formato de compra, o consumidor que sofre com a vulnerabilidade também não consegue identificar as consequências preocupantes em fornecer seus dados em uma compra online. Portanto, o presente artigo se mostra relevante em virtude da preocupação com tema, especialmente na divulgação dos dados pessoais dos consumidores, visto que é considerado um direito fundamental e está relacionado aos direitos de personalidade, privacidade, intimidade e vida privada.
Assim, espera-se atrair a atenção para um grave problema presente na sociedade brasileira e incentivar os cidadãos a atentar-se ao fornecer seus dados. E, juntamente, demonstrar a importância desses dados e como eles podem acabar sendo usados de forma irresponsável e problemática violando a privacidade do consumidor. Também é de extrema importância uma compreensão completa do que de fato o comprador está fornecendo na hora da sua compra; ele estará consciente da importância do cuidado de fornecer seus dados, que vai muito além de um possível roubo de identidade. São inúmeros os problemas gerados por um vazamento de dados.
Quanto a metodologia, a abordagem escolhida para a realização desse trabalho foi uma pesquisa qualitativa, no qual dados foram levantados e análises de obras renomadas foram realizadas para discutir profundamente sobre o assunto em questão. Além disso, para embasar de maneira eficaz o tema proposto, foi adotado como técnica a pesquisa bibliográfica. Seguindo esse estilo, foram analisados inúmeros livros e artigos de diferentes autores e portais, bem como adotou-se a pesquisa documental, no qual dados foram coletados de matérias jornalísticas de diversos portais.
Portanto, além dessa introdução, o presente estudo possui mais quatro seções. A segunda aborda acerca dos aspectos constitucionais do código de defesa do consumidor, já no terceiro capítulo, será feita uma discussão da relação de consumo e a vulnerabilidade do consumidor, após essa discussão, o capítulo quatro irá abordar acerca do objeto central do estudo, qual seja, Lei geral de proteção de dados pessoais (LGPD), destacando o significado de dados e por fim, o último capítulo abordará acerca do Código de Defesa do Consumidor no combate ao vazamento de dados.
2 ASPECTO CONSTITUCIONAL DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Ao discutir acerca da tutela do consumidor, tem-se que o primeiro código a abordar o assunto, foi o Código de Hamurabi, o qual protegiam os consumidores em relação ao serviço deficiente. Também existia o chamado Código Massú, previsto no século XII a.c., que salvaguardava os consumidores de forma indireta, ao controlar as relações comerciais (OLIVEIRA, 2010, p. 6).
Dessa forma, nas últimas décadas, os países começaram a se unir, a fim de diminuir as barreiras tarifárias e promover o comércio internacional para concorrer no mundo globalizado. Com isso, os consumidores passavam a ter maior facilidade para adquirir produtos e serviços de qualquer parte do mundo. Porém, com essa facilidade incide também certas dificuldades que manifestam em uma vulnerabilidade do indivíduo nas relações de consumo. Assim, levados muitas vezes pelo impulso da mídia, acabam assumindo um risco pela omissão da lei que o proteja.
Por esse motivo, com base em grupos que defendiam os direitos dos consumidores e através da mobilidade da participação popular em chamar atenção dos legisladores para adotarem medidas que visavam a proteção dos consumidores, surgiu em 1890, o Sherman Antitrust Act, como a primeira manifestação de proteção ao consumidor. Entretanto, somente em 1962 é que houve de fato a consolidação da tutela.
Cabe ressaltar que é interessante abordar o contexto histórico do surgimento dos direitos dos consumidores, principalmente nos modelos estrangeiros, pois o atual Código de Defesa do Consumidor brasileiro teve influência desses modelos, respeitando o mercado de consumo do Brasil, e, hoje o CDC é um exemplo de legislação que protege os consumidores para várias outras legislações ao redor do mundo. Assim, uma das influências que o Código de Defesa do Consumidor recebeu foi por meio da Resolução nº 39/248, realizada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), entre outras.
Dessa forma, a ONU reconheceu internacionalmente os direitos dos consumidores, através da Resolução nº 2542/69, por meio dos artigos 5º e 10. No Brasil, as primeiras leis que visavam a proteção do consumidor surgiram em 1934, entretanto, só vieram ganhar relevância a partir da Constituição Federal de 1988, considerando como fundamental o direito do consumidor, a partir do artigo 5º, XXXII, que estabelece que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor” (BRASIL, 1988).
Assim, foi admitido na Constituição Federal o direito do consumidor como sendo um direito fundamental e de política pública, visto que tem o objetivo de proporcionar a proteção em face do consumidor não só codificando uma norma com o intuito de protegê-lo de forma abstrata, mas sim, protegê-lo de forma ativa pelo Estado, sendo um dever do Estado como legislador e como estado-juiz (BENJAMIN; MARQUES, 2014, p. 33-35).
Vale mencionar outro aspecto constitucional do Direito do Consumidor, qual seja, a estabilidade constitucional, visto que se encontra inserido no artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV da Constituição Federal, considerado como cláusula pétrea, ou seja, não é passível de extinção por emendas constitucionais ou mesmo revisão constitucional. Além disso, a Magna Carta de 1988, garante o direito do consumidor como princípio da ordem econômica, previsto no artigo 170, V, CF, o qual estabelece que:
Art. 170- A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
V- defesa do consumidor
Dessa forma, equipara-se como princípios relevantes para o sistema político-econômico do Brasil, como, propriedade privada, soberania nacional, livre iniciativa, entre outros. Assim, os princípios gerais da ordem econômica estabelecidos pela Constituição Federal devem existir harmoniosamente, visto que não gozam de superioridade entre eles, sendo todos relevantes.
Portanto, o direito do consumidor torna-se assunto fundamental da Constituição, cabendo a lei infraconstitucional regulamentar a sua atuação. Dessa forma, no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) estabelece a implantação de um Código de Defesa do Consumidor, com o objetivo de compatibilizar as relações entre consumidores e fornecedores.
Desse modo, após a CF estabelecer o direito do consumidor como um direito fundamental e diante das mudanças ocorridas no mercado mundial, o qual o Brasil também estava inserido, foi criado a Lei nº 8.078/90, o qual estipulou o Código de Defesa do Consumidor, sendo admitida como a mais moderna ao abordar os direitos do consumidor. Com o advento dessa Lei, houve mudanças nas relações de consumo, tutelando a hipossuficiência do consumidor em face da compra e venda de produtos e serviços.
Essa Lei foi imposta para solucionar os conflitos existentes nas relações de consumo, não só de forma indireta, mas também adotando todas as particularidades dessa relação, visto que a lei infraconstitucional abordou definições para essa espécie de relação jurídica que, até então, não era tutelada.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é uma garantia de proteção, por parte do Estado, daqueles considerados hipossuficientes economicamente em relação aos monopólios que existem em uma sociedade capitalista. Portanto, o CDC corresponde a um direito inerente a todo cidadão, constituindo, por meio da Constituição Federal, o meio de combate as desigualdades sociais existentes no Brasil.
3 RELAÇÃO DE CONSUMO E A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR
Antes de aprofundar na relação do consumo e a vulnerabilidade do consumidor, é necessário compreender quem faz parte dessa relação, isto é, quem é o fornecedor e quem é o consumidor. Essa definição é abordada pelo próprio Código de Defesa do Consumidor de 1990, em seu artigo 2º e 3º:
Art. 2° - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3° - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Dessa forma, compreende-se que consumidor é todo aquele que compra ou consome algum produto ou serviço e o fornecedor é quem produz ou cria o produto ou serviço o qual o consumidor irá utilizar. Consoante Miranda (2016, p.1):
O futuro das relações de consumo tem sido bastante promissor apontam pesquisas, principalmente porque as empresas cada vez mais têm percebido que o ambiente de negócios já não gira mais em torno de seus produtos e serviços. Para se manterem competitivas, as empresas estão dando os primeiros passos em implementar programas e iniciativas com o foco no cliente, alinhando as necessidades do consumidor.
Feito, portanto, a definição das pessoas que integram a relação de consumo, é importante ressaltar o princípio imposto pelo CDC, qual seja, o princípio da vulnerabilidade do consumidor. A proteção em face do consumidor se dar por causa da vulnerabilidade do mesmo, que diante da relação de consumo é considerado a parte hipossuficiente da relação, se submete a certas situações impostas pelo fornecedor, tido aqui, como a parte mais forte da relação de consumo.
O princípio da vulnerabilidade, reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), constitui que “o ponto de partida do Código de Defesa do Consumidor é a afirmação do Princípio da Vulnerabilidade do consumidor, mecanismo que visa a garantir igualdade formal material aos sujeitos da relação jurídica de consumo” (BRAGA NETTO, 2019, p. 66).
Portanto, o consumidor se submete cada vez mais a uma pressão psicológica, em virtude de propagandas que os encorajam a consumirem determinados produtos ou serviços com a ajuda da mídia. Além dessa manipulação feita principalmente pela mídia, existe a vulnerabilidade da maioria dos consumidores que caem na artimanha dos fornecedores.
Destaca Moraes (2009, p. 125) que:
Vulnerabilidade, sob o enfoque jurídico, é, então, o princípio pelo qual o sistema jurídico positivado brasileiro reconhece a qualidade ou condição daqueles sujeitos mais fracos na relação de consumo, tendo em vista a possibilidade de que venham a ser ofendidos ou feridos na sua incolumidade física ou psíquica, bem como no âmbito econômico, por parte dos sujeitos mais potentes da mesma relação.
Ainda em consonância com esse pensamento, o autor supracitado (2009, p. 125) afirma que esse princípio “decorre diretamente do princípio da igualdade, com vistas ao estabelecimento da liberdade”, o qual “somente pode ser reconhecido igual, alguém que não está subjugado por outrem”.
Para Ragazzi (2010, p. 151), “o princípio da vulnerabilidade do consumidor é o grande alicerce do microssistema, pois suas regras foram construídas com a finalidade de harmonizar as relações de consumo entre fornecedores e consumidores”. Dessa forma, ressalta-se que o consumidor não possui o domínio da relação de consumo, sendo submetido ao poder de quem o detém. Portanto, para garantir maior proteção ao consumidor, foi estabelecido outros princípios, como o princípio da proteção do consumidor, que se subdivide em princípio da responsabilidade objetiva e princípio da inversão do ônus da prova, que são medidas que buscam ajudar o consumidor em sua evidente vulnerabilidade ao enfrentar um problema com um produto ou serviço.
Cabe mencionar que há uma distinção entre vulnerabilidade e hipossuficiência. Assim, Braga Netto (2019) afirma que a primeira não necessita de uma condição econômica, já o hipossuficiente é encontrado após analisar o caso concreto, considerando a natureza do serviço, o grau de instrução do consumidor, bem como outras particularidades. Desse modo, a vulnerabilidade do consumidor é absoluta, pois, conforme o autor, “nem todo consumidor é hipossuficiente, embora todos sejam vulneráveis”.
O princípio da vulnerabilidade do consumidor está inserido no Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 4, inciso I, sendo garantido como um dos princípios da Política Nacional de Relações de Consumo:
Art. 4- A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
I - Reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;
É importante destacar que, além da proteção conferida pela Constituição Federal, existe ainda aqueles que detém de uma hipervulnerabilidade, como, os idosos, crianças, adolescentes, sendo esse o fundamento principal da vulnerabilidade, qual seja, as particularidades de cada consumidor e o que expande a sua vulnerabilidade.
Portanto, fica claro que, de acordo com o artigo 2º do CDC, bem como o que a doutrina majoritária estipula, o consumidor na sua relação de consumo estar em uma situação de vulnerabilidade. Assim, quando existir um desequilibro nas relações de consumo, deverá ser utilizado o Código de Defesa do Consumidor, a fim de garantir a sua eficácia.
4 LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS
Através da Internet, o consumo de produtos e serviços aumentou nas últimas décadas. Pensando nisso, alguns juristas sugeriram a necessidade de criar um instrumento legislativo que coibissem atos nas relações de consumo, surgindo uma nova espécie de contrato, o chamado contrato eletrônico, que constitui um contrato aplicado ao campo cibernético.
Dessa forma, o ordenamento jurídico foi se moldando nessas práticas de consumo virtual, aplicando as regras do regulamento europeu, já que não havia ainda uma lei que regulamentasse essa situação. Existiam de fato, a Lei do Cadastro Positivo e o Marco Civil da Internet, que abordava a temática do comércio eletrônico, porém de forma esparsa.
Assim, houve uma discussão no Congresso Nacional, a fim de que fosse estabelecido uma lei específica para tratar da proteção dos dados dos consumidores nessa nova forma de relação de consumo, surgindo, portanto, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – Lei n. 13.709/2018, que visa disciplinar a proteção dos dados pessoais em relação ao comércio eletrônico.
Segundo Pinheiro (2020, p. 15) essa Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) se tornou uma referência no ordenamento jurídico, reforçando os direitos e garantias fundamentais, inseridos na Constituição Federal, que garante a proteção dos direitos humanos. Essa lei garante a regulamentação do uso, proteção e transferência de dados pessoais no Brasil, certificando maior domínio dos cidadãos acerca de suas informações pessoais, sendo necessário o consentimento, de forma explícita, para coletar e usar os dados pessoais, podendo ainda o cidadão modificá-lo ou excluí-lo (SENADO, 2020).
Cabe ressaltar que a Lei Geral de Proteção de Dados tem por objetivo proteger certos direitos fundamentais, como a privacidade, liberdade de expressão, informação, inviolabilidade a intimidade, honra e imagem, bem como, a livre iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor e a dignidade da pessoa humana, direito que rege todo o ordenamento jurídico (BRASIL, 2021). Assim, a Lei surge como forma de evitar que os consumidores tenham seu dados pessoais evidentes de forma indevida, além de serem usados de forma diversa do que foi colocado, preservando a intimidade e o direito à privacidade, conforme estabelece o artigo 5º, inciso X, da CF.
Assim sendo, Blum (2018, p. 28) afirma que a lei que protege os dados pessoaisnão tem um foco específico em relação aos dados informados pelo consumidor, visto que as próprias redes sociais, com a sua anuência fornece esses dados. A proteção diz respeito a análise e normatização das formas de coleta, armazenamento, organização e utilização desses dados.
Portanto, além do direito a privacidade do consumidor, Barcellos (2018, p. 205) estabelece o direito à intimidade, o qual por meio da Lei Geral de Proteção de Dados busca garantir essa proteção em face da utilização dos dados pessoais dos consumidores pelos agentes públicos e privados. Conforme Pinheiro (2019, p. 31):
A regulamentação de proteção de dados pessoais é uma legislação principiológica […]. Sendo assim, tanto na origem europeia como na versão nacional traz um rol de princípios que precisam ser atendidos. A melhor forma de analisar a lei é pela verificação da conformidade dos itens de controle, ou seja, se o controle não está presente, aplicado e implementado, logo o princípio não está atendido.
Nesse sentido, a LGPD estipula determinadas regras para o tratamento dos dados pessoais, aplicando certos conceitos fundamentais, entre eles, a definição de dados, além de trazer um rol taxativo de possibilidades de como ocorre o tratamento dos dados. Portanto, cabe destacar a importância dessa lei em face da proteção do consumidor, no que diz respeito aos dados pessoais, aplicados, principalmente, nas relações de consumo virtuais.
Após analisar como surgiu a Lei Geral de Proteção de Dados, faz-se necessário compreender seu objetivo, bem como os fundamentos e princípios aplicados pela referida Lei. Portanto, o objetivo da LGPD é, segundo Oliveira (2019, p. 48) “salvaguardar os direitos fundamentais da privacidade, liberdade e o desenvolvimento da personalidade humana”. Essa proteção, como bem afirma o autor, serve para tratar o titular dos dados como um indivíduo que se encontra em posição desigual, destacando sua vulnerabilidade.
Cabe ressaltar que, conforme pensamento de Rizzatto Nunes (2021), com a entrada da Lei Geral de Proteção de Dados existe uma possibilidade de que os dados fornecidos pelos consumidores necessitem de uma autorização expressa para ser utilizados. Dessa forma, garante uma maior segurança aos consumidores que integram a relação de consumo.
Por isso, ao garantir essa proteção, a Lei busca alcançar a igualdade na relação entre o consumidor, portador dos dados pessoais, e o fornecedor. Dessa forma, a lei assegura métodos de segurança para o tratamento desses dados. No artigo 2º, da LGPD, encontra-se os fundamentos, sendo um deles a livre iniciativa, encontrado também no texto constitucional (Art. 1º, IV, CF):
Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos:
[…]
VI - a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; (Grifo nosso)
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.
A livre concorrência atua como a garantia da liberdade pública na ordem econômica, assim, conceituando concorrência, tem-se a competição em condições de igualdade. Assim, aos particulares são assegurados esses princípios constitucionais, um como fundamento e outro como princípio da ordem econômica, entretanto, devem respeitar o princípio da legalidade, bem como a função social da propriedade (OLIVEIRA, 2019, p. 60).
A defesa do consumidor, prevista pelo CDC, constitui um fundamento da proteção de dados. O CDC estabelece que haja um banco de dados referente a um cadastro de consumidores. Entretanto, comporta riscos pois gera uma expectativa ao consumidor de que as informações contidas no cadastro, quando repassadas ao fornecedor, ficam armazenadas por ele, como forma de segurança de informação, porém, nem sempre é respeitado pelo fornecedor, que, muitas vezes, utiliza com outras finalidades, violando a segurança do consumidor.
Dessa forma, como o CDC acaba se mostrando insuficiente para solucionar tal imbróglio, a LGPD surge como forma de proteger o consumidor, além de garantir a integridade, transparência e segurança dos dados desses consumidores. Em seu artigo 6º, aborda alguns princípios aplicados ao tratamento de dados, entre eles, a finalidade, adequação, necessidade, qualidade dos dados, transparência, segurança, prevenção, livre acesso e responsabilização e prestação de contas.
Nesse sentido, a Lei Geral de Dados tem por finalidade o aperfeiçoamento de um determinado direito, proporcionando a integridade e segurança do tratamento dos dados pessoais dos consumidores. Assim, esses princípios, além de funcionarem como orientação para o cumprimento da lei, são “verdadeiras normas jurídicas que impõem um dever-ser, dotados de cogência e imperatividade” (LEITE, 2008, p. 20-22).
Cabe destacar que para buscar a efetivação dessa Lei, foi implantado mecanismos de proteção. O primeiro deles refere-se à participação do controlador e operador, o qual garantem a proteção e tratamento dos dados pessoais. Já o outro mecanismo de proteção, constitui a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), o qual exerce competências normativas, fiscalizadoras e sancionatórias. Cabe ressaltar que ainda existem muitos controladores de dados que não utilizam nenhuma medida ou utilizam, de forma inicial, medidas que fação cumprir o que a Lei propõe, acarretando em uma baixa efetividade da LGPD.
Assim, apesar de ainda não ter atingido um cenário ideal para a prática de proteção dos dados dos consumidores, principalmente, nas compras online, a LGPD ainda poderá alcançar a sua eficácia através do incentivo de políticas públicas que visem garantir a proteção dos dados pessoais com mais eficiência.
4.1 O QUE SÃO DADOS?
Abordado acerca da Lei Geral de Proteção de Dados, é importante frisar acerca do conceito de dados, tendo diversos doutrinadores uma definição diferente. Sabe-se que o surgimento de uma lei específica que visa garantir a proteção dos dados pessoais veio através da expansão da tecnologia, aliada com a globalização, que trouxe como resultado a apreciação da informação, considerando que o acesso aos dados seria o mesmo que acesso ao poder.
Vale mencionar que o artigo 1º, da LGPD destaca que:
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Para Pinheiro (2018) a definição de dados pessoais significa qualquer informação referente a uma pessoa determinada ou determinável, não sendo restringível a nome, sobrenome, endereço residencial ou idade, mas também perfis de compras, número do protocolo de Internet (IP), histórico de compras, entre outros.
Já para Gediel; Corréa (2008, p. 143), o conceito de dados pessoais pode ser extraído a partir da Diretiva da 95/46/CE do Conselho Europa, o qual preceitua em seu artigo 2º que os dados pessoais são:
qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável («pessoa em causa»); é considerado identificável todo aquele que possa ser identificado, direta ou indiretamente, nomeadamente por referência a um número de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica, psíquica, econômica, cultural ou social.
Na Lei 13.709/18, LGPD, em seu artigo 5º, I, estabelece o conceito legal de dados pessoais, como sendo “informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável” (BRASIL, 2021). Além disso, consta nesse artigo a definição de dados pessoais sensíveis e anonimizados. O primeiro, segundo Santos (2019, p. 5):
Origem racial ou etnia, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural.
Já os dados anonimizados significam, segundo a LGPD, “dado relativo ao titular que não possa ser identificado, considerando a utilização de meios técnicos razoáveis e disponíveis na ocasião de seu tratamento” (BRASIL, 2021). Essa designação é fundamental e pretende resolver problemas que envolvem o conceito e categorização, definindo, de forma clara, o que é um dado pessoal:
A noção de dados pessoais é bem ampla e abrange toda e qualquer informação referente a uma pessoa identificada ou identificável. Nisso incluem-se, é claro, o nome, o endereço, o telefone, os números dos documentos de identificação, mas também currículos escolares, dados profissionais, fiscais e bancários, dívidas e créditos, meios de pagamento, o endereço eletrônico, o IP (Internet Protocol – que permite a identificação do usuário de computador), imagens recolhidas por câmeras de segurança, fotografias disponibilizadas na Internet, e, ainda, hábitos de consumo, dados de saúde e biométricos (GEDIEL; CORRÉA, 2008, p. 144).
Portanto, o direito de proteção aos dados pessoais de seus titulares é marcado pela designação dos princípios que determinam o tratamento de dados pessoais, cujo seu exercício é definido dentro dos limites dos direitos fundamentais (PINHEIRO, 2018, p.62).
5 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NO COMBATE AO VAZAMENTO DE DADOS
O combate ao vazamento de dados pessoais dos consumidores deve ser uma das políticas mais atuantes na qual as empresas devem investir em face de garantir a segurança de seus clientes, porque como visto anteriormente, esses vazamentos provocam muito mais problemas do que apenas danos materiais.
É por essa razão que ao fazer uma compra ou adquirir um serviço por internet, deve-se, primeiramente, conferir se a empresa em questão tem um certificado de ambiente virtual seguro, que é simbolizado por um cadeado cinza ou verde. Outra maneira que depende exclusivamente do consumidor, é ter zelo e cautela ao fornecer dados de cartão de crédito e débito, como também de contas bancárias, endereços residenciais, pois dependendo de quem estar do outro lado pode usá-los para extorquir e até mesmo cometer estelionatos.
Por outro lado, quem vende também deve investir em segurança, combatendo a ação de possíveis hackers e crackers, pois ao adquirir um ambiente confiável para seus clientes, deixo-os mais confortáveis e propicies a consumirem sem ter receio de possíveis vulnerabilidades.
Além disso, uma maneira mais clara e honesta de se agregar nessa relação de consumo é através do contrato de adesão, afinal, quando um vendedor o apresenta para a parte durante a compra, está deixando claro as condições e cláusulas na qual o outro está se submetendo, e, dentre essas cláusulas e condições, explicar a forma que os dados e informações oferecidas serão processadas e usadas e de que como a empresa irá gerenciá-lo.
Medidas como essas que são tanto por parte do consumidor, como por parte de quem vende cria um cenário ideal de relação consumista, oferecendo confiança, afinal, o Código de Defesa do Consumidor dar uma base para a proteção e a Lei Geral de Proteção de Dados, de fato, protege.
É defeso destacar que mesmo o CDC sendo uma legislação que visa proteger o consumidor, estava apto apenas a solucionar as pendências que existia à época que foi promulgado. No entanto, isso serviu como impulso para que outras legislações futuras também tivessem um embasamento para se adaptarem a conflitos que surgissem com o avanço da modernidade. Ou seja, o CDC, por si só, não possui força jurídica para combater o vazamento de dados, contudo a Lei Geral de Proteção de Dados, que tem uma parte de sua origem no Marco Civil da Internet, vem justamente com o objetivo de suprir essas lacunas se adaptando aos novos tipos de golpes e de perigos que surgem para os consumidores quando optam por essa alternativa de consumo.
6 CONCLUSÃO
A relação de consumo é algo que está cada vez mais presente e intrínseca na vida atual, e tende a se adaptar conforme a modernidade avança no século XXI. Como foi estudado no presente trabalho, o consumo virtual é algo que vem tomando espaço a cada dia, pois a tecnologia faz parte e tudo e podemos ter qualquer coisa apenas com um click, e, por esse motivo o mercado também não ficaria de fora.
Após a análise de obras, autores e do próprio Código de Defesa do Consumidor e da Lei Geral de Proteção de Dados, é concluso saber que o advindo da Constituição Federal de 1988 deu margem a um cenário perfeito para que o consumidor seja protegido e tenha suas garantias. Sendo assim, atestamos que tanto o CDC, como a LGPD oferecem as garantias necessárias para que haja essa efetiva proteção à parte vulnerável, seja materialmente e moralmente, seja protegendo seus dado e informações pessoais.
Mesmo que o Código do Consumidor se mostre insuficiente para solucionar as lacunas trazidas pela modernidade, a Lei de Dados foi feita justamente para a realidade atual com o objetivo de melhorar esse direito, garantindo a integridade, a não violação e a segurança do tratamento dos dados dos consumidores
Portanto, constatou-se que devida a figura de vulnerabilidade do consumidor é que a Lei encontrou seu amparo legal devido a necessidade de criar uma legislação para suprir essas falhas nas relações de consumo, o que fez surgir o contrato eletrônico, fazendo o ordenamento jurídico se adaptar ao empregar, como base, costumes da Europa, pois ainda não havia esse tipo de lei no Brasil.
O fato da Lei Geral de Proteção de Dados ser nova no Brasil, não significa que ela esteja completa e absoluta em sua forma, afinal, o ordenamento jurídico deve se adaptar à medida que novas situações vão surgindo e à medida que a modernidade o obrigue.
Conclui-se que há suficiência na LGPD no que tange à proteção aos dados e informações dos consumidores, e, isso se deve por causa do embasamento jurídico que foi criado pela Constituição em 1988 e 1990 com a criação do CDC.
Por fim, é importante destacar a importância de uma legislação como essa no Brasil, pois além de servir como proteção e garantia de confidencialidade para quem é vulnerável, também serve de modelo internacional de como o país está à frente das dificuldades trazidas pelo mundo atual, ao adotas medidas para estabelecer a segurança nas relações de consumo.
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, Antonio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 5. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2014. p. 33-35.
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Artigo publicado em 22/11/2021 e republicado em 10/04/2024
Bacharelanda em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho-UNIFSA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, Maria Eduarda Lima. O Código de Defesa do Consumidor e a Lei Geral da Proteção de Dados: uma análise do uso de dados do consumidor virtualmente e sua vulnerabilidade¹ Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 abr 2024, 04:18. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/57518/o-cdigo-de-defesa-do-consumidor-e-a-lei-geral-da-proteo-de-dados-uma-anlise-do-uso-de-dados-do-consumidor-virtualmente-e-sua-vulnerabilidade. Acesso em: 24 dez 2024.
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