Resumo: A presente pesquisa tem como foco verificar a aplicação do mecanismo da Justiça Restaurativa em casos de violência contra mulher, a fim de propor medidas alternativas que venham a quebrar esse ciclo vicioso. O principal objetivo da Justiça Restaurativa nesse caso específico é o acompanhamento das penas e decisões deferidas pelo Juízo, referente ao agressor não se tornando meramente uma assistência social ou de tratamento, mas sim esclarecer todos os aspectos a respeito da violência contra mulher bem como citar a Lei 11.340/2006 Lei Maria da Penha e dados informativos e estatísticos sobre vítimas de violência no Brasil. Diante do exposto, tal tema é de suma relevância não somente pela sua atualidade, mas por trazer tratamentos atuais na modalidade de pena, mas como auxílio na ressocialização.
Palavra-Chave: Justiça Restaurativa. Violência contra mulher. Direito Penal
Sumário: 1. Introdução; 2. Justiça restaurativa; 2.1. Conceito de justiça restaurativa; 2.2. O início dos estudos sobre justiça restaurativa e sua aplicação em caso de violência contra mulher; 2.2.1. Lei n° 11.340- lei maria da penha; 2.2.2. A eficácia dos métodos restaurativos em homens agressores; 3. Conclusão; 4. Referências.
1.INTRODUÇÃO
A violência contra a mulher é um fenômeno que está diariamente presente na sociedade brasileira, seja de forma direta ou indireta. Felizmente, atualmente, a mulher atingiu grande evolução dentro da sociedade, no entanto, ainda busca alcançar a total igualdade de gêneros que está prevista na nossa Constituição Federal de 1988.
A violência contra a mulher é um litígio do qual envolve uma maior complexidade, visto que está violência não afeta somente a integridade física da vítima, mas também a sua integridade moral. Decorrente desses aspectos é possível destacar a justiça restaurativa como um meio alternativo ou secundário para enfim, ser obtido um resultado eficaz no que diz respeito aos crimes envolvendo o sexo feminino.
Diante dos fatos, o objetivo da Justiça Restaurativa é o acompanhamento das penas e decisões deferidas pelo juízo, referente ao agressor, nesse caso o serviço que será prestado será de cunho obrigatório e pedagógico e não meramente uma assistência social ou de tratamento. Através de reuniões será possível esclarecer o que é violência contra mulher bem como citar sua lei e dados informativos e dados estatísticos sobre vítimas de violência no Brasil.
A intenção é que no espaço proposto os mesmos possam se expressar, trazendo suas impulsividades à tona, para que seja viabilizado um ambiente terapêutico a respeito do tema abordado, visando sempre esclarecer e contribuir para erradicação da violência contra mulher, a fim de propiciar uma compreensão sobre a lei e seu comprimento da pena, visando assim um melhor convívio familiar.
Tal relevância do tema, se dá por tentar compreender o que impulsionou tal agressão contra mulher, de modo dinâmico promover que estes homens expressem suas motivações para cometer o ato de violência, como sentimentos, atos impulsivos, o que o levou a agressão e promover reflexão sobre estes.
Estatísticas têm comprovado a eficácia da justiça restaurativa no tratamento pena e na diminuição da reincidência de casos de violência contra mulher. Segundo dados colhidos do Juizado de Violência Doméstica contra Mulher de São Gonçalo, Rio de Janeiro, referentes ao ano de 2009, menos de 2% dos homens que praticam violência doméstica contra mulher participam de algum programa de pena alternativa e acabam voltando a agredir suas companheiras. Uma pesquisa feita na Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher, de São Luiz no Maranhão, onde não havia métodos de pena alternativa, revelou de 75% dos agressores eram reincidentes, um número superior a taxa de reincidência no Estado de São Paulo, que era de 58%, e no País que era de 70%, em 2009.
Diante dos fatos narrados acima, verifica-se a relevância deste tema não por ser atual, mas por trazer tratamentos atuais na modalidade de pena, mas como também um auxílio na ressocialização e reintegração do agressor na sociedade, a fim de que o mesmo não volte a praticar tais atos.
2. JUSTIÇA RESTAURATIVA
2.1 Conceito de Justiça Restaurativa
O termo Justiça Restaurativa é atribuído a Albert Eglash que em 1977 escreveu um artigo intitulado Beyond Restitution: Creative Restitution, pubicado numa obra por Joe Hudson e Burt Gallaway, denominada “Restitution in Criminal Justice”. O artigo sustentou que havia três respostas ao crime, a retributiva, baseada na punição; a distributiva focada na reeducação e a restaurativa que o foco seria a reparação.
A prática restaurativa tem como fundamento maior reparar o mal causado pela prática do ilícito, que não é visto, a priori, como um fato jurídico contrário á norma positiva imposta pelo Estado, mas sim como um fato ofensivo à pessoa da vítima e que quebra o pacto de cidadania reinante na comunidade. Portanto, o crime, para a justiça restaurativa, não é apenas uma conduta típica e antijurídica que atenta contra bens e interesses penalmente tutelados, mas, antes disso, é uma violação nas relações entre infrator, a vítima e a comunidade, cumprindo, por isso, à Justiça Restaurativa identificar as necessidades e obrigações oriundas dessa relação e do trauma causado e que deve ser restaurado.
A base de sua força é o diálogo, no envolvimento emocional das partes, na reaproximação delas, é fundamental esclarecer que não há ênfase para a reparação material na Justiça Restaurativa. Dessa feita, a reparação do dano causado pelo ilícito pode ocorrer de diversas formas, seja moral, material ou simbólica, o ideal reparador é o fim almejado por esse meio alternativo de justiça e o consenso fruto desse processo dialético pode resultar em diferentes formas de reparação.
Trata-se de um processo estritamente voluntário, relativamente informal e caracterizado pelo encontro e inclusão. A voluntariedade é absoluta, uma vez que os componentes da comunidade protagonistas desse modelo alternativo de justiça (autor e vítima) livremente optam por esse modelo democrático de resolução de conflito. A informalidade também é sua característica, distanciando-se do formalismo característico do vigente processo penal. O encontro é requisito indispensável para o desenvolvimento da técnica restaurativa, pois o escopo relacional, intrínseco a esse modelo alternativo, é a energia para se alcançar democraticamente uma solução para o caso concreto, é fácil entender porque a inclusão também é regra da prática restaurativa, uma vez que os cidadãos contribuem diretamente para o processo de pacificação social. Na justiça tradicional, ao revés, o Estado impõe a vontade da lei e o distanciamento dos envolvidos na relação litigiosa é latente, cabendo-lhes, apenas, um papel de meros coadjuvantes.
2.2 O início dos estudos sobre justiça restaurativa e sua aplicação em casos de violência contra mulher
O debate acerca da aplicação da pena a infratores que ultrapassam a lei e cometem atos delituosos que causam lesões e danos a terceiros, abre precedentes para diversas interpretações jurídicas. Conforme a sociedade vai evoluindo, vêm se criando métodos e modelos de sistemas penais para coibir os atos de violência praticados a fim de obter a pacificação em prol do bem comum. A ideia principal da função da pena do Sistema penal Brasileiro, além de intimidar e reeducar, e tê-la como uma característica de retribuição do mal causado pelo ofensor a vítima.
A respeito da violência doméstica contra mulher, o ordenamento jurídico brasileiro trouxe diversos avanços, como a Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340/2006), visando aplicação penal ao agente agressor. Para tanto, a justiça retributiva dificultou a possibilidade de conciliação entre as partes conflitantes, dando ênfase a culpabilidade e estigmatização do infrator. Com isso, surge o seguinte questionamento: a punição do agressor que cometeu crime de violência, como consequência do dano causado corresponde verdadeiramente ao sentimento de justiça da vítima?
A partir dessas noções, foram levantadas as seguintes hipóteses: a ineficácia das soluções punitivas tradicionais está fazendo com que as práticas restaurativas sejam aplicadas com mais frequência nos casos de violência doméstica contra mulher, onde a vítima e o ofensor mutuamente buscam resolver seus conflitos. Com isso, o cárcere e os mecanismos tradicionais do sistema jurídico-punitivo não são suficientes para a prevenção e solução de problemáticas desta natureza.
O surgimento da Justiça Restaurativa como modelo jurídico alternativo visa coibir crimes de violência doméstica contra mulher por meio do direito ao diálogo entre as partes envolvidas, podendo ser realizada a reintegração do ofensor, a reparação dos danos, ou de outras formas de reestabelecer a paz social interrompida pelo delito.
Em relação ao tratamento, à prevenção e atenção da violência, voltadas para homens e mulheres, Saffioti (2004, p.68) aponta a necessidade de trata-las como uma relação, no caso uma relação de gênero:
As pessoas envolvidas na relação violenta devem ter o desejo de mudar. É por esta razão que não se acredita numa mudança radical de uma relação violenta, quando se trabalha exclusivamente com a vítima, sofrendo estas algumas mudanças, enquanto a outra parte permanece sempre o que foi. Mantendo seu hábito, a relação pode inclusive, torna-se ainda mais violenta. Todos percebem que a vítima precisa de ajuda, mas poucos veem esta necessidade no agressor. As duas partes precisam de auxílio para promover uma verdadeira transformação da relação violenta. (SAFFIOTI,2004, p.68)
As famílias que vivem situações de violência tendem ao isolamento, seja por sua iniciativa, pelo sentimento de vergonha que a situação gera, seja pelo preconceito de outros em relação à problemática. No interior da própria família, o silêncio sobre o tema se impõe, por medo ou pela impossibilidade de ser achar uma solução ou para evitar reviver o sofrimento. A consequência é mais silêncio, pois não se pode tocar no assunto nem em outros que possam lembra-lo e assim e assim sucessivamente. Nas ações de atenção voltadas para essas famílias ou para seus membros é extremamente oportuno incluir atividades conectivas com outras pessoas, famílias ou grupos. Além, claro da devida conexão com as redes de justiça e a de atenção ou serviços.
A justiça restaurativa vem com pressupostos que viabilizam uma melhor forma de resolução de conflitos, sendo neste sentido a melhor forma para que se consiga atingir a solução para todas as situações possíveis, como modelo complementar, deixando de lado apenas aquela visão que trabalha apenas em cima da visão de punir tão somente, buscando-se restaurar, como se faz necessário na violência intrafamiliar. Com a finalidade de se alcançar uma cultura de paz e uma sociedade saldável. Contudo, a justiça restaurativa faz-se presente no ordenamento jurídico brasileiro de forma a melhor resolver os conflitos decorrentes de violências. Necessitando de reparação portanto os conflitos existentes entre marido e esposa, sendo as pessoas que conhecem e matem relações afetivas as principais personagens.
Esse tipo de pena alternativa não se aplicará a todos os homens nem a todos os crimes de violência contra mulher. Sendo assim aqueles homens autores de violência doméstica, que não cometeram outro crime a não ser a violência contra mulher e não possuem antecedentes criminais, diferenciando-se daqueles indivíduos que cometeram crimes graves contra mulher como estupro, tentativa de homicídio e homicídio já com histórico de violência contra outras pessoas além da parceira.
Atualmente, ainda poucos tribunais utilizam a técnica nessa área. Um dos estados com exemplo desse trabalho é o Paraná. Em Ponta Grossa, cidade com 341 mil habitantes, a Justiça Restaurativa vem sendo aplicada desde 2015 nos casos de violência doméstica e, segundo a juíza Jurema Carolina Gomes, da Comissão de Justiça Restaurativa do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), são elevados os índices de satisfação entre os participantes, o projeto não tem o intuito de substituir a prestação jurisdicional da Justiça tradicional, nem semear a ideia de impunidade ao agressor, mas possibilitar um método, com base no diálogo, para o reconhecimento e a responsabilização dos atos praticados. “Mais do que ter violado uma lei, queremos que essa pessoa entenda que causou um dano a alguém e que esse dano precisa ser reparado, ainda que simbolicamente”, diz a magistrada Jurema Carolina Gomes.
O método promove intervenções focadas na reparação dos danos, no atendimento das necessidades da vítima e na responsabilização do ofensor com objetivo de promover a pacificação das relações sociais. Pode ser utilizada em crimes graves, sem necessariamente excluir o sistema criminal, pois, de fato, não deve ser excludente de pena ao agressor. Não há um momento ideal de iniciar as práticas restaurativas: ela pode ocorrer na fase anterior à acusação, na fase pós-acusação (antes do processo), assim como na etapa em juízo, tanto antes do julgamento quanto durante o tempo da sentença. E pode ser uma alternativa à prisão ou fazer parte da pena.
O sistema jurídico retributivo e o restaurativo podem coexistir, sendo necessário que cada caso seja analisado criteriosamente, levando em consideração as circunstâncias de cada caso, bem como os papéis da vítima e do infrator frente a situação conflituosa, sempre observando aplicação da Lei Penal.
2.2.1 Lei n° 11.340- Lei Maria da Penha
A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, define a violência doméstica e familiar contra a mulher como crime e aponta formas de evitar, enfrentar e punir essa violência. Com a lei, a autoridade judicial ou policial pode conceder medidas protetivas de urgência, que são ações para proteger a mulher, como o afastamento do agressor/a do lar, proibição de contato com a vítima e testemunhas, suspensão do porte de armas, encaminhamento da mulher a programas de proteção, entre outras.
A lei protege a vítima mulher e o agressor pode ser homem ou mulher, que tenha relação de afeto ou convivência ou seja podem ser maridos/esposas, companheiros/as, namorados/as (que morem juntos ou não) e outros/as familiares (pai, mãe, irmão, irmã, filhos/as, genro, nora, etc).
O nome da lei é uma homenagem à biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes que em 1983, enquanto dormia, recebeu um tiro do então marido, ficando paraplégica. Depois de se recuperar, foi mantida em cárcere privado, sofreu outras agressões e nova tentativa de assassinato, também pelo marido, procurou a Justiça e conseguiu deixar a casa com as três filhas.
Importante frisar, que para que sejam configurados os crimes envolvendo violência doméstica ou familiar e, por conseguinte, aplicação das disposições normativas da Lei Maria da Penha, faz-se necessário observar um elemento específico contido no caput do art. 5º, portanto não se trata de qualquer espécie de violência dirigida contra a mulher que vai determinar sua aplicação, mas, sim, aquela levada a efeito em decorrência do gênero, ou seja, não se trata de exemplificar, mas de obrigatoriedade da norma.
Desde sua vigência até a data atual a Lei Maria da Penha passou por diversas alterações, a primeira alteração na Lei Maria da Penha é proveniente da Lei nº 13.505/2017, que acrescenta alguns dispositivos na Lei de Violência Doméstica determina, entre outras mudanças, que o trabalho prestado de atendimento à mulher vítima de violência doméstica deve ser prestado, preferencialmente, por servidoras do sexo feminino previamente capacitadas.
A lei também dá garantias quanto às perguntas e questionamentos que devem priorizar a saúde psicológica e emocional da mulher; protegê-la do contato com os agressores; e evitar a revitimização, ou seja, questionamentos sucessivos sobre o mesmo fato em diferentes fases do processo. Também foram incluídas novas diretrizes quanto ao local do atendimento e registro dos depoimentos.
As políticas e planos de atendimento às mulheres em situação de violência devem priorizar, segundo a Lei 13.505, a criação de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams), de Núcleos Investigativos de Feminicídio e de equipes especializadas para o atendimento e a investigação das violências graves contra a mulher.
Já no ano de 2018 houve o advento de duas leis (Lei nº 13.772, de 2018 e Lei nº 13.641, de 2018) que proveram outras mudanças no texto da Lei Maria da Penha, a Lei n.º 13.772/2018 trouxe um avanço ao art. 7.º, inciso II, onde alterou para expressamente constar que a “violação da intimidade” da mulher constitui uma forma de violência no âmbito doméstico, em que o legislador ordinário a inseriu como violência psicológica. Já a Lei nº 13.641/2018 alterou a Lei Maria da Penha e passou a prever como crime a conduta do agente que descumprir medida protetiva imposta, ou seja, referida Lei incluiu um novo crime, um tipo penal específico para essa conduta.
Mas as mudanças mais relevantes na Lei aconteceram no ano de 2019, foram mais de 23 alterações legislativas, realizadas por diversas leis tais como; Lei nº 13.894/2019: A Lei citada trouxe três alterações importantes, inseriu um novo inciso ao art. 9º §2º, trazendo ao juiz, nas situações que envolvem violência doméstica e familiar contra mulher, quando for o caso, a incumbência de encaminhar à assistência judiciária, inclusive para eventual ajuizamento da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável perante o juízo competente.
A segunda mudança, acrescentou uma nova redação ao art. 11, inciso V, e insere o art. 14-A e seus parágrafos e traz a atribuição de o Delegado de Polícia informar à ofendida os direitos a ela conferidos e os serviços a ela disponíveis, inclusive os de assistência judiciária para o eventual ajuizamento perante o juízo competente da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável.
A terceira alteração da Lei Maria da Penha, trouxe um acréscimo na redação do art. 18, inciso II, de modo que o juiz diante do recebimento de medida protetiva de urgência requerida pela vítima, deverá decidir em 48 (quarenta e oito) horas. A Lei nº 13.871, de 2019 criou a obrigação de ressarcimento ao Estado pelos gastos relativos ao atendimento da vítima através do Sistema Único de Saúde (SUS), para aquele que por ação ou omissão, causar lesão, violência física, sexual ou psicológica e dano moral ou patrimonial a mulher.
Criou ainda outra sanção ao agressor, qual seja, de ressarcir os gastos estatais a utilização dos dispositivos de segurança destinados ao uso em caso de perigo iminente e disponibilizados para o monitoramento das vítimas de violência doméstica ou familiar amparadas por medidas protetivas.
Lei nº 13.880, de 2019: Instituiu a apreensão de arma de fogo sob posse de agressor em casos de violência doméstica, evitando que o agressor a utilize para qualquer finalidade e que a arma possa ser periciada e utilizada como prova no processo. E ainda suspende a posse proibindo, temporariamente, que o agressor tenha a arma no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, deste que este seja responsável legal da empresa. Lei nº 13.836, de 2019: Torna obrigatória a inclusão de informação, nos boletins de ocorrência, quando a mulher vítima de agressão ou violência doméstica for pessoa com deficiência.
Lei nº 13.827, de 2019: Tal alteração legislativa permite que as medidas protetivas, no âmbito da Lei Maria da Penha, sejam aplicadas por Delegado de Polícia ou por policiais, com chancela a posteriori do Poder Judiciário.
Lei nº 13.984, de 2020: A mais recente alteração legislativa surge para estabelecer como medidas protetivas de urgência a frequência do agressor a centro de educação e de reabilitação e acompanhamento psicossocial.
Deste modo, é importante observar que existem vários Projetos de Lei em andamento no Congresso Nacional, que visam promover diversas alterações na Lei Maria da Penha. A Lei 11.340/2006 é uma das conquistas adquiridas pela luta da mulher por maiores benefícios, garantias e proteção. É sempre importante falar sobre sua história, modificações e aplicação, de modo a se compreender que é uma das maiores, se não a maior, lei de proteção à mulher no território brasileiro e não por acaso, considerada pela ONU uma das três melhores leis do mundo na proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Enquanto o entendimento de muitos Juristas quanto a Lei Maria da Penha seja considerada como um método inteiramente eficaz no combate a violência doméstica, existem outros que entendam que a Lei não demonstra tamanha eficácia para o enfrentamento a violência de gênero , uma vez que tais ocorrências são derivadas de vínculos afetivos ou de um parentesco que existe ou existiu, como em casos de casais divorciados que necessitem manter contato em virtude dos filhos ou em términos não bem aceitos por ambas as partes. Desta forma, a mulher permanece condicionada ao medo e abuso, pois somente punir o agressor sem ter conhecimento dos fatos geradores, não transforma a vida das pessoas.
2.2.2 A eficácia dos métodos restaurativos em homens agressores
As atividades restaurativas tiveram início no Brasil em 2005, e desde então tem se expandido por todo o território nacional, trazendo resultados e experiências positivas, por observar atentamente os desafios e potenciais do contexto institucional da comunidade de cada região. Diante deste cenário o Conselho Nacional de Justiça publicou em 31 de maio de 2016 a Resolução nº 225/2016, a qual institui as Políticas Públicas de Justiça Restaurativa, sendo responsável pela formalização do procedimento restaurativo na esfera judicial.
De acordo com a Resolução nº 225/2016:
O primeiro passo para uma melhor compreensão da pretendida mudança de paradigmas objetivadas pela Justiça Restaurativa, está em investigar os motivos mais profundos que, em regra, levam as pessoas à transgressão e, nesse âmbito, verificar como a imposição da sanção penal por meio dos 12 procedimentos puramente punitivos é recebida no âmbito do consciente ou do inconsciente desse ofensor (CRUZ, 2016, p.24).
Diferente da mediação que é voltada somente para os conflitos, a Justiça Restaurativa tem como objetivo construir e fortalecer vínculos de pertencimento e significado, apresentando um paradigma próprio para que possamos enxergar os conflitos, os relacionamentos e a existência da comunidade.
Diferente da mediação que é voltada somente para os conflitos, a Justiça Restaurativa tem como objetivo construir e fortalecer vínculos de pertencimento e significado, apresentando um paradigma próprio para que possamos enxergar os conflitos, os relacionamentos e a existência da comunidade.
Tendo isso em mente, percebe-se que esse método não se preocupa somente com os danos provenientes de um determinado fato, mas também com os danos que emergem desse acontecimento, levando um olhar cuidadoso para o contexto, as relações de poder, os padrões de relacionamento, as colisões, as visões de mundo, as características pessoais e determinados posicionamentos de cada um dos envolvidos (VASCONCELOS, 2020, p. 226).
Na doutrina: Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas, Vasconcelos aborda algumas das práticas utilizadas na Justiça Restaurativa:
[...] Entre as suas práticas podemos destacar, de saída, a mediação vítima-ofensor, que costuma ser aplicada num círculo menos amplo, composto pela vítima, ofensor, facilitador e apoios necessários, daí por que também denominada mediação restaurativa, e os círculos de diálogo, não decisórios, bem como as variadas modalidades de círculos restaurativos, com poder decisório ou não. [...] Em virtude das peculiaridades do campo criminal, em que as ofensas podem ser físicas, morais, patrimoniais e psicológicas, práticas restaurativas são realizadas especialmente por meio desses encontros de mediação vítima/ofensor e/ou mediante várias modalidades de círculos de diálogo e de círculos restaurativos (VASCONCELOS, 2020, p. 226).
O procedimento restaurativo, aplicado aos casos de violência doméstica contra a mulher oferece um empoderamento para a vítima, uma vez que esta é colocada em destaque. Para que se possa abordar a complexidade deste fenômeno, se faz necessário a presença da mulher, do agressor, da família e da comunidade. Esses indivíduos são orientados por um facilitador ou coordenador, a conversarem sobre o problema principal para que assim possam construir juntos, algumas possíveis soluções (VASCONCELOS, 2020).
Muitos dos casos que levam a violência doméstica estão ligados a traumas de infância, falha na comunicação, embriaguez, as vezes estes indivíduos só estão buscando serem reconhecidos, pois sentem a necessidade de estar em uma situação de poder, e por este motivo acabam subjugando suas companheiras, usando para tanto de violência tanto física, quanto moral, psicológica dentre outras, para se sentirem no controle da situação.
Em síntese, a justiça restaurativa se configura como uma técnica de solução de conflitos que tem por escopo, através de uma escuta sensível entre as vítimas e os ofensores, auxiliá-los na busca de um acordo que promova a solução de outras esferas do problema. Voltado não apenas para a punição, mas também, e principalmente, à restauração de questões emocionais. O objetivo da Justiça Restaurativa não está ligado ao delito, e sim ao conflito gerado por ele, tendo em vista que essa prática tem como objetivo a complementação do amparo que é fornecido pelo Estado, já que a simples imposição de uma pena não resolve o conflito (ZEHR, 2008,p. 87).
Desta forma a Justiça Restaurativa tem a finalidade de proporcionar um equilíbrio nas relações sociais, trazendo como consequência um equilíbrio das necessidades das partes, bem como possibilita a participação da comunidade, para restabelecer os laços entre vítima-agressor e para que o agressor possa voltar a conviver em sociedade de forma digna. O método restaurativo traz em seu bojo a responsabilização do agressor, que por si próprio toma conhecimento do impacto gerado por suas atitudes negativas, tendo assim a possibilidade de mudar suas atitudes, uma vez que este de forma voluntária aceitou participar do método restaurativo (VASCONCELOS, 2020, p. 221.).
Verifica-se que a justiça restaurativa é voltada a subjetividade do ofendido, sua base é a reparação e o arrependimento do ofensor, o que coloca a vítima como o centro da relação e dona de Direitos, e está de fato sente que a justiça será pautada no emprego da reparação dos danos sofridos, o que permitirá o sentimento de justiça feita, e que o Estado de fato se preocupa com a ressocialização do ofensor e com a recuperação da vítima para a retomada de sua vida e integridade violada.
3.CONCLUSÃO
Através da realização desse trabalho, observa-se que a discussão sobre Justiça Restaurativa em sim é recente no Brasil, ao apresentar a ideia que a mesma seja utilizada em casos de violência doméstica, vários questionamentos são levantados pois entende-se que a Justiça Restaurativa é uma alternativa a um Sistema Judicial escasso que propõe leis de suma importância com a Lei Maria da Penha, e no que tange a violência contra mulher, surgiu a questão da aplicabilidade desse novo modelo de justiça pois a violência contra mulher é entendida como crime grave.
No decorrer da pesquisa foi demonstrado a definição e evolução da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), tais evoluções relacionadas a forma de lidar com a violência praticada contra mulher no interior do seio familiar, trazendo as mulheres um maior respaldo legal e proteção para aquelas que são vítimas de tal violência. Restou certificado que a Justiça Restaurativa é um método que consiste em tratar as partes de maneira adequada, com acompanhamento psicológico, participação em grupos de ressocialização no caso do agressor, participação em círculos restaurativos onde estarão presentes: vítima, agressor e a família de ambos, tudo devidamente conduzido por um facilitador devidamente qualificado com o objetivo de levar as partes a se abrirem a falar sobre os problemas que causam tais situações.
Colocados todos esses aspectos, temos que a difusão da justiça restaurativa no direito brasileiro vem sendo erigida sobre novos interesses e valores que surgiram na seara jurídica, que nos demonstraram a urgência de se questionar as limitações do sistema penal atual e a necessidade de buscar, com embasamento científico, alternativas mais humanas e adequadas. Em análise última, é exatamente esse o grande mérito da justiça restaurativa, vale dizer, alcançar, em muitos casos, a pacificação das relações sociais de forma mais efetiva, a partir da ideia de atendimento dos indivíduos diretamente afetados para recolocá-los em uma circunstância melhor do que a crise em que se encontram, alça-los a uma situação ideal, desejada não só para eles, mas por todos os sujeitos de direito tutelados pelo ordenamento. E isso se faz, neste particular, por meio do atendimento tanto do agressor quanto da vítima.
Observou-se ainda que apesar de existir órgãos competentes para tratar desses casos, através da aplicação da Justiça Restaurativa, faz-se necessário considerar os percalços listados e a busca de pessoal adequado para desenvolver métodos de real eficácia, como exemplo para tratar do trabalho de reintegração do agressor na sociedade, para que não volte a praticar novos delitos.
4. REFERÊNCIAS
CNJ- Conselho Nacional de Justiça. Manual sobre programas de Justiça Restaurativa. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/09/manual-sobre-programas-de-justica-restaurativa.pdf. Acesso em 03 de março de 2022.
CRUZ, Fabrício Bittencourt da. Justiça restaurativa: horizontes a partir da Resolução CNJ 225. 1. ed. Brasília: CNJ, 2016. Disponível em: https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/cnj/justica_restaurativa_cnj_2016.pdf. Acesso em 07 de abril de 2022.
SAFFIOTI, H. I. B. Gênero, Patriarcado, Violência. São Paulo, Editora Fundação Perseu Abramo, Coleção Brasil Urgente,2004.
TJDF- Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Justiça Restaurativa: entenda conceitos e objetivos. Disponível em <https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2019/maio/justica-restaurativa-entenda-os-conceitos-e-objetivos>. Acesso em: 11 de maio de 2022.
VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. 7. ed. São Paulo: Método, 2020. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530981839/cfi/6/2!/4/2/2@0:0.0995>. Acesso em: 11 de maio de 2022.
ZHER, Howard. Trocando As Lentes - Um Novo Foco Sobre o Crime e A Justiça: Justiça Restaurativa. PDF do 10º capítulo do livro, publicado no Brasil pela Palas Athena Editora com tradução de Tônia VanAcker em 2008. Disponível em: https://www.amb.com.br/jr/docs/pdfestudo.pdf. Acesso em 07 de abril de 2022.
Bacharelanda em Direito pelo Centro Universitário Fametro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Camila Libório da Costa. Justiça restaurativa: aplicação da justiça restaurativa em casos de violência contra mulher Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 maio 2022, 04:04. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58540/justia-restaurativa-aplicao-da-justia-restaurativa-em-casos-de-violncia-contra-mulher. Acesso em: 23 dez 2024.
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