DANIEL FEITOSA NARUTO[1]
(coautor)
RESUMO: Não é segredo que possuímos o maior contencioso do mundo, em média um a cada dois brasileiros em idade adulta possui um processo judicial ativo. Há muitos anos o direito vem privilegiando a ferramenta em detrimento da matéria; não se discute a necessidade de cumprir requisitos formais obrigatórios para a aplicação do direito material de forma isonômica, respeitando o devido processo legal. Porém, transformamos nosso Poder Judiciário em indústria, com gasto anual superior a R$100 (cem) bilhões. Acesso ao Judiciário, não se traduz na resolução célere dos conflitos daqueles que mais necessitam da resposta do Estado. É imperioso encontrarmos uma solução que reduza o alto índice de judicialização sem tolher o cidadão deste acesso, garantido pela Constituição Federal e fundamental no Estado Democrático de Direito. Por mais contraditório que pareça, esses eventos ocorrem em plena revolução no universo jurídico, diante de aparato jurídico-tecnológico à disposição dos operadores do direito capaz de gerar eficiência, bem como dar celeridade e segurança jurídica na resolução de conflitos.
Palavras-Chave: Litigiosidade; Tecnologia digital; Processo Civil; Poder Judiciário; Direito Quântico.
ABSTRACT: It is no secret that we have the largest litigation in the world, on average one out of every two Brazilians in adulthood has an active lawsuit. For many years, the law has privileged the tool over the matter; there is no discussion of the need to comply with mandatory formal requirements for the application of material law in an isonomic way, respecting due legal process. However, we transformed our Judiciary into an industry, with annual expenses exceeding R$ 100 (one hundred) billion. Access to the Judiciary does not translate into the speedy resolution of the conflicts of those who most need the State's response. It is imperative that we find a solution that reduces the high rate of judicialization without hindering citizens from this access, guaranteed by the Federal Constitution and fundamental in the Democratic Rule of Law. Contradictory as it may seem, these events take place in the midst of a revolution in the legal universe, in view of the legal-technological apparatus available to the operators of law capable of generating efficiency, as well as providing speed and legal security in conflict resolution.
Keywords: Litigation; Digital technology; Civil Procedure; Judicial power; Quantum Law.
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é promover uma reflexão sobre a importância da inovação no universo jurídico, focado no processo civil, ampliando e facilitando canais digitais que empoderem o cidadão na solução de seus problemas sem a intervenção estatal e aproximando a tutela jurisdicional da sociedade.
O presente trabalho busca também demonstrar a relevância do Direito Processual Civil e do Direito Quântico na construção das soluções propostas.
Através da aprovação do Novo CPC, o Direito Processual Civil buscou inovar em dois pontos nevrálgicos para a alta litigiosidade. No robustecimento das soluções consensuais de conflitos, bem como na criação do sistema de precedentes.
Por outro lado, a harmonização do Direito Quântico pressupõe que a força resultante do multiverso jurídico não necessariamente se consubstancia na instauração processual; esta é força importante, porém subsidiária na concretização do direito dentro da sociedade, ou seja, é papel do Estado pensar também em soluções fora da abrangência do Poder Judiciário, demonstrando a importância das demais forças multidisciplinares. Trata-se de pesquisa qualitativa exploratória, de procedimento monográfico, com abordagem dedutiva e técnica de pesquisa bibliográfica.
1 CULTURA DO LITÍGIO NA SOCIEDADE BRASILEIRA. UM NOVO OLHAR PARA O CONTENCIOSO
Anualmente 18% (dezoito por cento) da população adulta brasileira recorre à Justiça na ânsia de que terceiros resolvam seus conflitos. Já as despesas para a manutenção da máquina judiciária ultrapassaram o patamar de R$ 100 bilhões (cem bilhões de reais) em 2019, o equivalente a ¼ (um quarto) do valor gasto com toda a educação básica no mesmo ano.[2]
Por obvio, devemos reconhecer a importância do Poder Judiciário e do amplo acesso à Justiça para o nosso Estado Democrático de Direito. Não há dúvida de que ambos são peças fundamentais na garantia de nossos direitos, principalmente no atual cenário pátrio.
Igualmente, não há que se falar de baixa produtividade. Nossos Juízes estão entre os 3 (três) mais produtivos do mundo e mesmo assim continuamos com o gargalo na prestação jurisdicional.
Também é notório o recente empenho do legislador e do Judiciário em estimular a mediação e conciliação, traduzido na obrigatoriedade das audiências de conciliação e na multiplicação dos CEJUSCs, unidades do Poder Judiciário focadas na solução de conflitos. A despeito desses e de outros esforços os números de conciliação na Justiça permaneceram inalterados.
Por outro lado, no universo contencioso é inegável a supremacia da forma frente à matéria. O direito material representa o conjunto de regras, eleitas pela sociedade para reger de forma segura as relações entre pessoas e / ou coisas que as integram. Tais regras são referentes a fenômenos da vida ordinária, como a união de duas pessoas, a constituição de crédito, os atos ilícitos causadores de dano a outrem, as prestações de serviços, a relação do homem com o meio ambiente e relações de consumo, entre outras.
O direito processual, ferramenta para persecução do direito material, somente entra em cena para instrumentalizar o pleito de sujeito que se sente lesado em algum de seus direitos, informando ao Estado o que lhe desagrada e pedindo-lhe solução mediante invocação do próprio direito material, provoca a instauração do processo[3].
Muito embora o papel instrumental do direito processual, ferramenta na aplicação do direito material, o processo cível ganhou a relevância de protagonista ultrapassando o próprio direito material nas mais diversas pautas de discussões jurídicas.
Nessa esteira, a maioria dos Tribunais vê seu número de litigiosidade aumentar. O resultado não poderia ser diferente em um país com mais advogados que o resto do mundo, em que a cultura litigante impera.
Mas, de qual maneira combater o alto índice de litigiosidade sem tolher os cidadãos do amplo acesso à justiça garantido pela Constituição Federal?
Precisamos pensar em soluções fora do guarda-chuva do Poder Judiciário, é fundamental distinguir acesso à justiça de acesso ao Judiciário. Cabe ao Estado com o auxílio da sociedade (empresas e cidadãos) possibilitar a célere resolução dos conflitos, sem a intervenção mandatória do Juiz, ou seja, o papel do Estado está em estimular a autocomposição, como verdadeiro filtro e catalizador da prestação jurisdicional e por esse motivo deve fazê-lo, também, fora do Poder Judiciário.
A adoção de políticas públicas que incentivem a autocomposição na educação básica e desenvolvam ambiente seguro capaz de aproximar e igualar empresas e cidadãos para que estes tentem solucionar problemas antes de se valer do Judiciário, são quesitos fundamentais para canalizar a atuação de nossos Juízes onde de fato ela é necessária.
Por vezes, o peso da realidade no entendimento amplo do Direito é esquecido. Para avançarmos no tema será necessário entender o universo jurídico como força resultante de outras forças, como direito positivo, realidade e direitos humanos. Esta visão holística e transversal do Direto construída de forma inovadora pelo professor Ricardo Sayeg na correlação de física quântica e direito, será fundamental para entendermos a alta litigiosidade e aplicação multidisciplinar de soluções inovadoras:
O Direito deve acompanhar a evolução humana de racionalização do universo e de perspectiva da realidade, mediante o seu rigoroso e científico atrelamento as evoluções da Física e da Matemática. Na linha da relatividade, tal como desenvolvida por Einstein, embora a Física seja marcada, desde os primórdios, pela consideração da experimentação como sendo absolutamente necessária; o empirismo é de importância secundária em relação ao pensamento puro, que se utiliza da Matemática e da Lógica, como os instrumentos, por excelência, do desvendar do universo.[4]
Ao longo dos anos o universo jurídico se blindou de mudanças que pudessem afetar seu status quo. A cultura do litígio na sociedade brasileira é danosa aos cidadãos e dificulta a gestão dos passivos judiciais pelas empresas, afugentando investidores. O alto volume de processos possibilita inovações no campo da jurimetria e pré-processual; mas, o maior desafio está em romper a blindagem e inovar também fora do guarda-chuva do Poder Judiciário.
Por mais contraditório que pareça, esses eventos ocorrem em plena revolução no universo jurídico, diante de aparato jurídico-tecnológico a disposição dos operadores do direito capaz de gerar eficiência, bem como dar celeridade e segurança jurídica nas tarefas processuais. De toda forma nota-se que o gasto com tecnologia – solução que poderia ser perene e escalável – é inferior a 3% (três por cento). [5]
2 CONSUMIDOR.GOV – INOVAÇÃO PRÉ PROCESSUAL E FILTRO NECESSÁRIO NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL
A melhor forma de garantir amplo acesso à justiça a todos é viabilizar meios de solução consensual de conflitos que não necessariamente estejam atrelados à demanda judicial. Com os atuais índices de litigiosidade pátrios, o poder público precisa estimular a auto composição, sem que necessariamente exista a tutela e intervenção do Estado.
Como já vimos, não podemos ignorar os custos de aplicação do direito subjetivo por regras processuais.
A utilização da máquina judiciária gera custos financeiros e sociais, representados pelo valor anual de R$ 100 bilhões (cem bilhões de reais) gastos em 2019 com o Poder Judiciário[6]. Mas, também por outros dois custos; o primeiro deles referente aos transtornos e desafios produtivos causados tanto ao autor quanto ao réu e o segundo erros na aplicação do direito, pois o processo não se traduz em uma atividade mecânica de aplicação do direito, mas, antes disso, é uma atividade orientada por fins sociais, que comportam erros como a condenação de pessoa errada, ou a condenação da pessoa certa, mas em valor errado.[7]
Foi pensando neste cenário de judicialização excessiva por vezes de casos de baixa complexidade, que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), em conjunto com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e grandes empresas desenvolveram o consumidor.gov; serviço público e gratuito para a resolução de conflitos relacionados a questões de consumo, de fácil acesso e disponível a todos, mesmo para aqueles que não possuem advogado e não conhecem os trâmites jurídicos, burocráticos para solucionarem seus problemas.
Em suma, o consumidor.gov é canal digital que permite a interlocução direta entre consumidores e empresas para solução alternativa de conflitos de consumo pela internet, tudo isso antes do ingresso de ação judicial.[8]
As três principais inovações do Consumidor.gov.br foram:
(i) Possibilitar contato direto entre consumidores e empresas, em ambiente totalmente público e transparente, dispensada a intervenção do Poder Público na tratativa individual; e
(ii) Introduzir conexão de forma ágil pela internet criando ambiente de fácil acesso onde o consumidor tem a garantia que sua demanda será analisada e respondida em prazo fixo.
(iii) Mensurar e divulgar indicadores de satisfação dos clientes e da capacidade das empresas de solucionar os problemas gerados pela prestação de serviços.
Parece algo simples, sem nenhum avanço tecnológico complexo para sua implementação. Porém, os números foram surpreendentes; dos clientes que procuram a plataforma mais de 80% (oitenta por cento)[9] tem sua demanda atendida, e aqueles que não têm seus problemas solucionados recebem explicações claras e objetivas sobre os motivos da negativa.
Após o retrospecto favorável o Poder Público decidiu iniciar piloto no TJDF conectando GOV e PJE na mesma plataforma. O objetivo era claro, gerar eficiência na prestação jurisdicional e filtrar demandas de baixa complexidade, empoderando assim os consumidores na resolução de seus problemas sem a necessidade da tutela jurisdicional.
Fica claro que o sucesso da ferramenta do consumidor.gov está atrelado a solução de três pontos crônicos: O fácil acesso (internet e mobile); empoderamento do consumidor; e certeza de tratamento rápido e individualizado da demanda, de tal forma que o princípio do amplo acesso à justiça se concretiza de forma mais simples, ágil e ampla nesta ferramenta do que nos autos de processo judicial.
3 JURIMETRIA VS MACHINE LEARNING: SOLUÇÕES PARA LITIGIOSIDADE E CONTENCIOSO MASSIFICADO
O consumidor.gov configura excelente exemplo da possibilidade de inovar e combater a alta litigiosidade sem a necessidade da aplicação de tecnologias sofisticadas. Existem diversas maneiras de aplicar soluções digitais e garantir à sociedade a resolução célere de seus problemas, sem que se faça uso de instrumentos de inteligência artificial ou machine learning. Fluxos de trabalhos, estruturação de esteiras jurídicas, escalonamento de boas práticas, são exemplos de mecanismos que podem alcançar resultados iguais ou melhores quando comparados às ferramentas tecnológicas.
No entanto, soluções inovadoras passam pela utilização desses instrumentos tecnológicos. Nessa esteira, é importante destacar que enquanto a Ciência da Computação, permanece focada principalmente em como programar computadores manualmente, o aprendizado de máquina se concentra na questão de como fazer os computadores se programarem, lastreados por experiência e dados.
Ambas as ferramentas, inteligência artificial ou machine learning ainda carecem de robustez e aplicabilidade no direito, principalmente quando comparamos aos ganhos e avanços gerados em a outras searas de conhecimento. Porém devem cada vez mais serem estimuladas em decorrência de seu potencial e relevante função na redução da litigiosidade no país, bem como na criação de demais soluções inovadoras para o direito.
Por obvio, os usuários (operadores do direito), precisam mudar seu mindset e entender as novas tecnologias como ferramentas que lhe auxiliarão nas mais variadas atividades jurídicas, substituindo trabalhos repetitivos, sem desnaturar funções e atividades intelectuais jurídicas.
Não se trata da criação de juízes ou advogados robôs, mas sim da tecnologia à serviço do universo jurídico e principalmente da autocomposição e célere resolução dos conflitos daqueles que mais necessitam.
O cidadão comum que desconhece ou não tem intimidade com o direito, não raro, elenca como principal crítica do distanciamento do direito a dificuldade de obter respostas objetivas para perguntas simples. “Faço jus ao meu pedido?”; “Qual a probabilidade de ganhar este processo?”; “Qual o valor médio arbitrado pelo magistrado?”; “Em quanto tempo o processo será encerrado?”.
A ausência de respostas assertivas e objetivas para estes questionamentos não está atrelada a ineficiência do advogado. O direito é matéria subjetiva e qualquer decisão depende de julgamento individual e humano.
Porém, se estes mesmos advogados e/ou departamentos jurídicos de empresas tivessem acesso à totalidade de julgamentos, bem como a demais informações dos Tribunais, traduzidas em dados estruturados que garantissem a assertividade dos números, o custo de transação poderia ser melhor mensurado para ambas as partes.
Em outras palavras, a incerteza sobre determinada situação aumenta a animosidade entre as partes e a esperança de lograr êxito em determinada demanda.
É preciso evitar que o Poder Judiciário seja usado como se loteria fosse. A visão de dados e estatísticas confiáveis no direito lastrearia decisões mais assertivas antes da instauração do processo.
Caso alguém que se sentisse lesado em algum de seus direitos tivesse acesso a dados objetivos sobre chances de êxito, tempo e valores referentes a instauração de um processo, poderia de forma mais assertiva optar ou não em se valer do Poder Judiciário. A recíproca também é verdadeira, caso aquele que usurpasse o direito de outro, tivesse a certeza da condenação, poderia realizar o ressarcimento e evitar os custos financeiros e sociais do litígio.
Esta solução que tem como base forma de utilização dos dados jurídicos é a jurimetria, cujo conceito foi exposto por Richard De Mulder em 2010: “Jurimetrics is […] the empirical study of the form, the meaning and the pragmatics (and the relationships between those) of demands and authorizations issuing from state organizations with the aid of mathematical models and using methodological individualism as the basic paradigm for the explanation and prediction of human behavior.” [10]
No decorrer dos anos, ferramentas foram desenvolvidas para alcançar o conceito de jurimetria ora exposto, mas enfrentaram a falta de padronização e complexidade dos documentos jurídicos, bem como o alto volume de peças processuais e decisões.
Porém, as novas tecnologias já citadas de inteligência artificial e machine learning, utilizadas em informações extraídas dos processos judiciais possibilitaram que corporações, advogados e a própria sociedade possam tomar decisões jurídicas com embasamento analítico.
Os avanços são inúmeros, desde auxiliarem operadores jurídicos e a sociedade em entender de forma mais objetiva o blindado universo jurídico, evitando sua utilização desarrazoada, até outras utilidades voltadas para grandes corporações que necessitam das mesmas informações para gerir seus contenciosos de forma eficiente, com dados estruturados nas seguintes áreas:
(i) Contenciosa: no cálculo da provisão de processos, no acompanhamento de aderência de teses usadas, direcionando a interlocução com os magistrados; e
(ii) Consultiva: na varredura das ações judiciais de determinada empresa em processo de due diligence, bem como na avaliação de aderência de cláusulas contratuais.
Em suma, devemos enxergar esta solução digital como ferramenta de auxílio aos advogados em tarefas operacionais, fornecendo assim gama importante de informações que até então eram desconhecidas ou obtidas de forma excessivamente trabalhosa pelos operadores do direito. E como verdadeiro facilitador para o entendimento do universo jurídico pelo cidadão que poderá compreender de forma objetiva a prestação jurisdicional, calculando o custo de transação da demanda.
CONCLUSÃO
O alto índice de litigiosidade nacional não se traduz na resolução das mazelas que afligem aqueles que mais necessitam da célere resposta do Estado. Da mesma forma, é necessário prestigiar a importância do Poder Judiciário e em nenhuma hipótese tolher os cidadãos do amplo acesso à justiça garantido pela Constituição Federal, pilar fundamental do Estado Democrático de Direito.
Como vimos, a solução passa pela difusão da inovação no universo jurídico; ampliando e facilitando canais digitais que empoderem o cidadão na solução de seus problemas sem a intervenção estatal e aproximando e materializando as decisões do Poder Judiciário para a sociedade.
Inovação é gênero da qual “nova tecnologia” é espécie. Em outras palavras, a tecnologia é apenas um dos instrumentos pelos quais a inovação se concretiza. Precisamos entender a importância da mudança de mindset difundida de forma democrática no universo jurídico, inovação não tem reserva de mercado. O cultivo de solos férteis onde operadores do direito são estimulados a pensarem de forma diferente, testarem novas aplicações, simplificarem processos e multiplicarem conexões é a forma muita mais duradoura de impregnar inovação no DNA do país, do que a mera aplicação de novas tecnologias.
O maior desafio é desenvolver soluções disruptivas que vão além da mera condução processual para entregar valor as empresas e a sociedade na redução do alto índice de litigiosidade, diminuindo o custo social do contencioso.
Soluções estas que podem ser encontradas na esfera processual. Exemplo importante foi a excelente estruturação do microssistema de precedentes idealizada pelo CPC de 2015. Os precedentes, mesmo que “à brasileira”, como muito bem caracteriza o Professor Cassio Scarpinella, conferiram segurança jurídica e possibilitaram escala no julgamento de processos massificados[11], de forma mais célere, o que se traduz na eficiência do Poder Judiciário.
Já o robustecimento da conciliação e mediação, escrito pelo mesmo diploma, não atingiu seu objetivo, pois “se não houver mudança na estratégia na solução de conflitos, com intensa utilização de meios alternativos, previsto o engajamento de todos os lidadores do Direito, incluídos os servidores da Justiça, e o treinamento dos estudantes, desde os bancos acadêmicos, dificilmente se conseguirá alcançar o objetivo de amplo e irrestrito acesso a uma ordem jurídica justa, que nos encaminhe à mudança de mentalidade”[12]
Tal inovação precisa ser a ferramenta usada pelo Estado e pelos operadores do direito na criação de soluções fora do Poder Judiciário, distinguindo acesso à justiça de acesso ao Judiciário.
Como foi dito na introdução deste artigo, fica claro a relevância do Direito Quântico na construção das soluções propostas. É necessário o Estado entender de maneira transversal o direito, este é o significado do Direito em Singularidade Jurídica integral, pois o multiverso jurídico composto por Positivismo, Realidade e Direitos Humanos é a expressão do papel do Estado em como melhor servir a sociedade.[13]
Em outras palavras, o entendimento do Direito Quântico demonstra que a força resultante do multiverso jurídico não necessariamente se consubstancia na instauração processual; esta é força importante, porém subsidiária na concretização do direito dentro da sociedade. Ou seja, é papel do Estado pensar, também, em soluções, fora da abrangência do Poder Judiciário. demonstrando a importância das demais forças multidisciplinares.
O descompasso pode aumentar na atual crise de saúde, os impactos sociais e financeiros decorrentes dos reflexos gerados pelo isolamento social e em alguns casos extremos pelo lockdown, agravam os conflitos na sociedade. Cancelamentos de eventos e viagens, alterações de regramentos por medidas provisórias, descumprimentos contratuais, insuficiência financeira e atrito nas relações trabalhistas, são apenas alguns exemplos das discussões que deverão ser absorvidas pelo Poder Judiciário já saturado pela demanda atual.
Novas necessidades surgem na sociedade de forma cada vez mais constante, o coronavírus foi apenas catalisador deste processo. O comércio digital ganhou mais de 5 (cinco) milhões de consumidores que na opinião das maiores varejistas “vieram para ficar”; por outro lado a proliferação das “lives” se desidratou com o passar do tempo, diminuindo em mais de 60% (sessenta por cento) as buscas por esta forma de entretenimento. O importante é separar o joio do trigo e identificar as tendências perenes que persistirão após o término dos efeitos econômicos decorrentes do isolamento social, segregando-as das necessidades provisórias.
O universo jurídico necessita mudanças de “mindset” que prestigiem o acesso à justiça de forma ampla e por vezes fora do guarda-chuva do Poder Judiciário. A garantia do acesso ao Judiciário é inócua sem que haja a resolução célere e efetiva dos conflitos. O mesmo seria garantir acesso à saúde e não ter leitos de UTI suficientes para atender a população; pois se todo o cidadão que se sinta lesado em algum de seus direitos, solicitar ao Estado prestação jurisdicional, continuaremos com o Judiciário sobrecarregado e incapaz de responder as demandas que lhe são solicitadas de forma célere e eficiente.
REFERÊNCIAS
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[1] Mestrando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Advogado.
[2] BRASIL. CNJ. Justiça em números 2019: ano-base 2019/Conselho Nacional de Justiça. Brasília: CNJ, 2020. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>. Acesso em: 25 out. 2020.
[3] DINAMARCO, Candido Rangel. Teoria geral do novo processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 15.
[4] SAYEG, Ricardo; BALERA, Wagner. Fator CapH – Capitalismo Humanista – A dimensão econômica dos Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 2019.
[5] BRASIL. CNJ. Justiça em números 2019: ano-base 2019/Conselho Nacional de Justiça. Brasília: CNJ, 2020. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>. Acesso em: 25 out. 2020.
[6] BRASIL. CNJ. Justiça em números 2019: ano-base 2019/Conselho Nacional de Justiça. Brasília: CNJ, 2020. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>. Acesso em: 25 out. 2020.
[7] CORREA, Cecília Barbosa Macêdo. Teoria econômica aplicada ao processo civil brasileiro. Revista de Informação Legislativa, 2013.
[8] BRASIL. Consumidor.gov.br. Disponível em: <https://www.consumidor.gov.br/pages/indicador/infografico/abrir#para>. Acesso em: 26 jun. 2020.
[9] BRASIL. Consumidor em números. Reclamações de consumo em 2018. Disponível em: <https://www.justica.gov.br/news/collective-nitf-content-1552676889.94/arquivos/consumidor-em-numeros-2018_portal.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2020.
[10] Em livre tradução: “Jurimetria é [...] o estudo empírico da forma, do significado e da prática (e das relações entre estes) de demandas e autorizações emitidas por organizações estatais com auxílio de modelos matemáticos e utilizando individualismo metodológico como o paradigma básico para a explicação e previsão do comportamento humano” (tradução nossa). MULDER, Richard De; NOORTWIJK, Kees van; COMBRINK-KUITERS, Lia. Jurimetrics Please! 2010. Disponível em: <http://zaguan.unizar.es/record/.../ART--2010-013.pdf>. Acesso em: 25 out. 2020. p. 47.
[11] SCARPINELLA BUENO, Cassio. Curso sistematizado de direito processual civil: procedimento comum, processos nos Tribunais e recursos, vol. 2. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2021.
[12] NETO, Caetano Lagrasta – Mediação e gerenciamento do processo : revolução na prestação jurisdicional : guia prático para a instalação do setor de conciliação e mediação. São Paulo: Editora Atlas, 2013.
[13] SAYEG, Ricardo; BALERA, Wagner. Fator CapH – Capitalismo Humanista – A dimensão econômica dos Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 2019.
Mestrando pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP no Núcleo de pesquisa processual cível. Pós-graduado em Direito Contratual pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo - FGV/SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FELIX, André Salgado. O olhar processual em soluções inovadoras na redução da litigiosidade e na célere resolução de conflitos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 jun 2022, 04:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58564/o-olhar-processual-em-solues-inovadoras-na-reduo-da-litigiosidade-e-na-clere-resoluo-de-conflitos. Acesso em: 24 dez 2024.
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
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