BIANCA SABRINA RODRIGUES DOURO[1]
(coautora)
ROCHELE JULIANE LIMA FIRMEZA BERNARDES[2]
RODRIGO ARAÚJO SARAIVA5
(orientadores)
RESUMO: Com o avanço tecnológico, houve o surgimento do mercado digital, inclusive, na rede social Instagram, porém, os fornecedores, ao utilizarem essa nova modalidade de comercialização para divulgar seus produtos e serviços, violam o direito do consumidor de acesso à informação adequada e clara. Assim, esta pesquisa procurou verificar se a legislação existente é suficiente para garantir esse direito básico do consumidor durante a relação de consumo no mercado da rede social Instagram. Dessa forma, objetivou-se demonstrar como ocorre a violação a esse direito, descrevendo a sua importância, bem como os possíveis danos acarretados pela falta de informação durante a relação de consumo, proporcionando revisão bibliográfica em Direito do Consumidor e coleta de jurisprudências pátrias. Para tanto, realizou-se pesquisa documental e bibliográfica com abordagem dedutiva. Ao final, verificou-se que, embora o legislador pátrio tenha elaborado um código próprio e leis esparsas visando a garantia desse direito, a legislação brasileira consumerista ainda se mostra insuficiente para garantir o direito do consumidor de acesso à informação adequada e clara nesse novo comércio. Por isso, nota-se a relevância do estudo, visto que, a medida que esse mercado se expande, a vulnerabilidade do consumidor torna-se mais expressiva, tornando-se necessária a efetivação de seus direitos e a consequente imposição para que os fornecedores cumpram com suas obrigações legais, punindo de forma mais severa aqueles que não o fizerem.
Palavras-chave: consumidor; informação; rede social; violação.
O ato de consumir constitui uma ação inerente ao homem, posto que é dessa forma que se adquire aquilo que é necessário e indispensável à sua sobrevivência. Entretanto, com o desenvolvimento do comércio, o ser humano que antes comprava com o objetivo de suprir suas necessidades, passou a comprar demasiadamente, por desejo ou satisfação social, surgindo, assim, o fenômeno do consumismo.
Destarte, os comerciantes com o objetivo de alavancar as vendas, buscaram formas de incentivar o consumidor a comprar cada vez mais, servindo-se dos meios de divulgação da época, como rádios, revistas impressas, jornais e televisão, com o intuito de atingir a coletividade, isto é, alcançar o máximo de pessoas possíveis.
Anos depois, com o advento da internet, houve uma transição no modo de consumo, e, consequentemente, na forma de oferecer produtos e serviços, passando-se a priorizar o ambiente eletrônico, dando espaço para o surgimento do e-commerce por meio de estabelecimentos virtuais existentes em plataformas digitais, sites e redes sociais, proporcionando mudanças no padrão de consumo, uma vez que conferiu praticidade no momento de comprar ou vender produtos e serviços.
Foi nesse contexto, que a rede social Instagram, criada, originalmente, para a publicação de fotos e vídeos, bem como para a comunicação entre pessoas em diversos lugares do mundo, transformou-se em uma modalidade de comércio on-line. Assim, empresas estrategicamente se utilizaram dessa rede social, em razão do compartilhamento de conteúdo entre usuários, com o objetivo de influenciá-los ao consumo.
Entretanto, essa nova modalidade de comercialização trouxe consigo o desencadeamento de práticas por parte dos fornecedores que violam alguns direitos básicos e fundamentais do consumidor, em especial o seu direito ao acesso à informação. Isso ocorre quando os fornecedores, ao divulgarem seus produtos e serviços, não apresentam a descrição destes de forma clara e adequada no que tange às características relevantes e necessárias, omitindo informações sobre os mesmos, descumprindo o que lhe é legalmente imposto.
Diante desse cenário, evidencia-se o centro de onde surgiu o problema de pesquisa deste estudo, qual seja: a legislação existente no ordenamento jurídico brasileiro é suficiente para assegurar o direito básico do consumidor de acesso à informação clara e adequada no âmbito do mercado digital através da rede social Instagram?
Com efeito, o presente artigo tem como objetivo demonstrar como a insuficiência legislativa implica na violação do direito básico do consumidor ao acesso à informação clara e adequada no âmbito do mercado digital por meio da rede social Instagram. Visa também, descrever a importância desse direito básico e fundamental garantido ao consumidor pelo Código de Defesa do Consumidor, bem como a demonstração dos possíveis danos acarretados pela falta de transparência e informação nesse mercado de consumo, além de proporcionar uma revisão bibliográfica e coleta de jurisprudências de tribunais pátrios a respeito da temática.
Buscando alcançar referidos objetivos, realizou-se pesquisa documental e bibliográfica com abordagem dedutiva, através de um levantamento em artigos científicos, doutrinas, legislações e jurisprudência, nas seguintes bases de dados: Google Acadêmico e Scielo.
Dessa forma, torna-se evidente a relevância da presente pesquisa no cenário atual em que a sociedade se encontra, tendo em vista que, conforme a rede social Instagram transforma-se cada vez mais em um ambiente de comercialização, faz-se necessária a efetivação da proteção do consumidor. Assim, verifica-se a relevância da pesquisa para o ordenamento jurídico, pois, é necessário garantir ao polo mais vulnerável da relação consumerista o seu direito à informação, e exigir do fornecedor a realização de ofertas transparentes, a fim de que seja efetivada a aplicação das normas consumeristas às relações de consumo.
No tocante à relevância acadêmica, a pesquisa proporciona aprimoramento científico na área de Direito do Consumidor, contribuindo para a evolução contínua do Direito, demonstrando que este precisa ser adaptado constantemente à sociedade, abrangendo as novas relações jurídicas que surgem diariamente.
O trabalho se desenvolve no decorrer de quatro capítulos. O primeiro versa sobre a evolução do direito do consumidor e da relação jurídica de consumo. O segundo aborda o direito básico do consumidor ao acesso à informação clara e adequada. Por sua vez, o terceiro discorre sobre as facilidades ocasionadas pela desenvoltura do mercado digital, onde os seus subtópicos demonstram como ocorre esse mercado na rede social Instagram e quais são seus pontos negativos. Por último, o quarto capítulo explana como o direito básico do consumidor de acesso à informação é violado no mercado digital na rede social Instagram.
2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICO-SOCIAL DA RELAÇÃO DE CONSUMO E O ENQUADRAMENTO JURÍDICO PREVISTO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O consumo é enquadrado como uma característica inerente à vida do ser humano. Desde os primórdios, as pessoas viram-se obrigadas a passar por um processo de adaptação para atender as suas necessidades básicas. Dessa forma, o desejo dos indivíduos em experimentar coisas novas os levavam a realizarem trocas entre si de produtos que necessitavam e não possuíam. Assim, observa-se que a relação consumerista entre os sujeitos se configura como um dos mais antigos meios de sobrevivência.
Por bastante tempo, a produção era através da manufatura, tendo em vista que o trabalhador era encarregado de concretizar o serviço através da sua capacidade artesanal. No entanto, com o advento da Revolução Industrial do aço e do carvão, a população da zona rural começou a migrar para os centros urbanos, a qual, ao longo dos anos, manifestou interesse pelo consumo dos novos produtos e serviços, de modo a satisfazer as necessidades materiais que começaram a surgir (ALMEIDA, 2020), aumentando a demanda das fábricas, dando início ao processo de produção em massa.
Diante da formação do novo modelo de sociedade, os produtores passaram a priorizar o aspecto quantitativo, deixando em segundo plano o caráter qualitativo. Isso porque, os fornecedores só pensavam em benefício próprio, objetivando a expansão das negociações com um aumento dos lucros e diminuição dos gastos com a produção, de modo a desfavorecer o consumidor, visto que este não tinha a devida opção de escolha, a garantia de qualidade e as informações necessárias acerca dos produtos ofertados no mercado.
Nesse cenário em que os consumidores não tinham controle acerca do que era ofertado no mercado, o Estado Social surge no século XX, passando a intervir, ainda que minimamente, na economia e nas relações privadas, com o objetivo de promover a justiça social, tendo em vista que inexistia uma norma regularizadora que protegesse a parte mais fragilizada da relação de consumo.
Nesse sentido, em 15 de março de 1962, o presidente norte-americano John F. Kennedy, pronunciou-se e proferiu a seguinte frase: “Consumidores somos todos nós”, sendo considerado o posicionamento político mais expressivo referente à necessidade de proteção do vulnerável (SANTANA, 2014), o qual enviou uma carta ao Congresso Nacional demonstrando a importância de se legislar e garantir os direitos básicos dos consumidores, sendo considerado o marco inicial para a existência do Direito do Consumidor.
Em virtude dos vícios e defeitos recorrentes no novo modelo de sociedade amplamente exposto, os consumidores brasileiros encontravam-se totalmente desamparados de proteção jurídica, uma vez que o Direito aplicado às relações de consumo era aquele que regia as relações privadas, isto é, o Código Civil de 1916, o qual era manifestamente incompatível, haja vista não conter dispositivos que protegessem os vulneráveis da relação de consumo.
Deste modo, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu em seu art. 5º, inciso XXXII como dever do Estado, a promoção da defesa do consumidor. Assim, conforme determinação expressa no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o Congresso Nacional deveria elaborar o Código de Defesa do Consumidor no prazo de cento e vinte dias após a promulgação da Constituição.
Portanto, em 11 de novembro de 1990, foi instituído pela Lei 8.078, o Código de Defesa do Consumidor, para regular as relações de consumo, proteger o mais vulnerável e impor ao fornecedor a obrigação de oferecer produtos e serviços com maior qualidade e com todas as informações necessárias. Assim, pode-se afirmar que o CDC constitui
o instrumento legal para a efetivação da defesa do consumidor; sem o CDC, o imperativo constitucional de defesa do consumidor não passaria de uma folha de papel. Em suma, o Código de Defesa do Consumidor destina-se a efetivar, no plano infraconstitucional, princípios constitucionais, especialmente os princípios da isonomia substancial e da defesa do consumidor (CAVALIERI FILHO, 2019, p. 23).
Ainda, a defesa do consumidor constitui um princípio de ordem econômica, pois a Constituição Federal de forma inovadora, inseriu o consumidor como agente econômico e social, estabelecendo expressamente no artigo 170, inciso V, que “a defesa do consumidor é um dos princípios que devem ser observados no exercício de qualquer atividade econômica” (BRASIL, 1988), permitindo a intervenção estatal nas relações privadas, com o intuito de garantir os direitos fundamentais dos indivíduos.
Assim, é perceptível a progressão da legislação consumerista, visto que, após o mandamento constitucional, deu-se voz e vez aos que suportavam as imposições e os regramentos definidos unilateralmente pelos fornecedores, vinculando o ente estatal e os demais aplicadores das normas à defesa dos vulneráveis na relação de consumo, de forma a amparar o outrora desprotegido.
Deste modo, a relação de consumo passou a ser regularizada pelo Código de Defesa do Consumidor, tornando-se uma relação jurídica de consumo composta de elementos subjetivos e objetivos, sendo definida pela doutrina como “aquela relação firmada entre consumidor e fornecedor, a qual possui como objeto a aquisição de um produto ou a contratação de um serviço” (ALMEIDA, 2020, p.85).
Os elementos subjetivos da relação de consumo são os sujeitos que a compõe, isto é, o consumidor e o fornecedor. Por sua vez, os elementos objetivos são os objetos da relação, ou seja, produto e serviço. Referidos elementos são dependentes entre si, tendo em vista que “os conceitos em questão não se sustentam por si mesmos, nem podem ser tomados isoladamente. Ao contrário, as definições são dependentes umas das outras, devendo estar presentes para ensejar a aplicação do CDC” (MIRAGEM, 2020, p.139).
O art. 2º do Código de Defesa do Consumidor define que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (BRASIL, 1990). Atualmente, quanto ao termo “destinatário final”, existe divergência doutrinária, e consequentemente, surgiram duas correntes para explicar o tema, a corrente finalista e a corrente maximalista, além do posicionamento dominante do Superior Tribunal de Justiça, criando a corrente finalista mitigada.
A corrente finalista conceitua o destinatário final como aquele que adquire determinado produto ou serviço com a finalidade de satisfazer necessidade pessoal (CAVALIERI FILHO, 2019). Em contrapartida, a corrente maximalista interpreta o destinatário final como o sujeito que retira o produto ou o serviço do mercado e usufrui deste, não sendo relevante se a pessoa tem o intuito ou não de lucrar com estes produtos ou serviços (THEODORO JÚNIOR, 2017).
A terceira corrente foi criada pelo STJ, denominada como “finalista mitigada ou mitigada, pautada na ideia de se enquadrar a pessoa jurídica como consumidora desde que comprovada a sua vulnerabilidade” (ALMEIDA, 2020, p. 110). Além disso, o parágrafo único do art. 2º estabelece que “equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que hajam intervindo nas relações de consumo" (BRASIL, 1990).
Destarte, como forma de abranger um público maior na legislação consumerista, entende-se também como consumidores aqueles que sofrerem danos, sem que, necessariamente, seja destinatário final, conforme expressa o art. 17 do CDC, o qual define que “equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento” (BRASIL, 1990), e ainda, o art. 29, expondo que “equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas” (BRASIL, 1990).
O conceito de fornecedor está previsto no art. 3º do CDC, sendo definido como
toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços (BRASIL, 1990).
Sendo assim, toda pessoa física ou jurídica que ofertar produtos ou prestar serviços no mercado será considerada fornecedora dentro da cadeia de consumo. Referida atividade deve ser praticada com habitualidade pelo fornecedor, e não somente de forma eventual. No entanto, ressalta-se que o diploma consumerista não exigiu de forma expressa que a atividade praticada pelo fornecedor fosse de cunho profissional, bastando para tanto, que estivesse presente o requisito da habitualidade.
No tocante aos elementos objetivos da relação de consumo, o legislador consumerista preocupou-se em defini-los expressamente no Código de Defesa do Consumidor, valendo-se de termos universais utilizados no meio capitalista, com a finalidade de abranger os mais diversos bens expostos no mercado pelos fornecedores.
O art. 3º do Código de Defesa do Consumidor em seu parágrafo primeiro define produto como “qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” (BRASIL, 1990). Evidente que o legislador consumerista tentando proteger o consumidor das mais diversas situações, além de incluir os bens imóveis para que os contratos imobiliários e outros decorrentes destes fossem abrangidos pelo CDC, antecipou-se quanto à regulamentação de relações de consumo realizadas no âmbito da internet ao referir-se aos imateriais (MIRAGEM, 2020).
Em seguida, o parágrafo segundo do art. 3º do CDC determina que serviço consiste em “qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista” (BRASIL, 1990). Nesse sentido, para se tratar de relação consumerista, o serviço deverá ser ofertado no mercado, mediante o recebimento de uma remuneração paga pelo consumidor, constituindo atividade econômica do fornecedor.
Demonstrada a regularização da relação consumerista, evidencia-se que o Código de Defesa do Consumidor trouxe notáveis contribuições à ordem jurídica brasileira, regulamentando a efetiva proteção à parte mais vulnerável da relação consumerista, qual seja, o consumidor, com o objetivo de manter o equilíbrio entre as partes. Para tanto, o legislador consumerista elencou direitos básicos que devem estar presentes na relação de consumo, com o intuito de evitar abusos e excessos por parte dos fornecedores.
Dessa forma, levando em consideração as informações anteriormente explanadas quanto aos abusos suportados pelos consumidores e a importância da defesa do adquirente de produtos e serviços em qualquer âmbito propicio ao consumo, em razão de sua vulnerabilidade, passasse à análise do direito básico do consumidor ao acesso à informação adequada e clara.
3 O IMPERIOSO DIREITO DO CONSUMIDOR FACE À INFORMAÇÃO ADEQUADA E CLARA
Conforme destacado anteriormente, objetivando proteger o consumidor dos abusos praticados pelos fornecedores, o Código de Defesa do Consumidor reservou um artigo próprio, o sexto, para tratar dos direitos básicos do consumidor, os quais devem ser materializados dentro da relação de consumo.
O legislador, no momento da definição dos direitos básicos do consumidor, enfatizou que estes se tratam dos básicos, ou seja, serão norteadores das relações de consumo, não restando dúvidas quanto a aplicação de direitos não elencados expressamente no artigo 6º do CDC para a defesa dos vulneráveis (GARCIA, 2017).
Dessa maneira, para proporcionar segurança e irrefutabilidade quanto ao cumprimento dos direitos assegurados à proteção dos consumidores, faz-se necessária a aplicação, simultaneamente, do Código de Defesa do Consumidor, dos tratados e convenções internacionais em que o Brasil seja signatário, bem como das demais legislações, de modo a não excluir normas de proteção relativas à defesa dos interesses do consumidor.
Apesar de os direitos básicos dos vulneráveis da relação consumerista terem sidos reconhecidos legalmente, observa-se constantemente o crescimento de demandas judiciais, objetivando a concretização desses direitos pelos tribunais pátrios, em razão das práticas ilícitas por parte dos fornecedores durante o processo de consumo. Nesse sentido, destaca-se um entendimento da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia reconhecendo a violação do direito do consumidor de acesso à informação, vejamos:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR. DIVULGAÇÃO DE PROGRAMA DE PARCELAMENTO. EXCLUSÃO DO CURSO DE MEDICINA. PROPAGANDA ENGANOSA. DIREITO À INFORMAÇÃO VIOLADO. RECURSO PROVIDO. 1. No caso em exame, os apelantes propuseram a demanda de origem para que fosse deferida a possibilidade de adesão ao Programa de Parcelamento Estudantil Privado (PEP), oferecido pela recorrida, além dos danos morais sofridos, uma vez que, apesar da ampla divulgação desta modalidade sem restrições expressas, foi negado por não abranger o curso de medicina. 2. Com efeito, da documentação apresentada com a inicial (fls. 107/122), constata-se a inexistência de ressalva prévia a respeito da restrição ao curso de Medicina e, sequer, de qualquer outro curso oferecido. A propaganda dos serviços educacionais está atrelada diretamente ao sistema do Parcelamento Estudantil Privado (PEP) não prevê exclusão do referido curso para o financiamento divulgado. 4. Sobre o tema, o Código de Defesa do Consumidor é expresso a respeito da necessidade da publicidade de produtos e serviços ser realizada de forma clara, precisa, correta e ostensiva, sobretudo quando se trata de limitação dos direitos do contratante. 5. Noutro ponto, sabe-se que "O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina". No caso em exame, analisando o acervo probatório constante nos autos, a apelada não conseguiu demonstrar a correção do anúncio a respeito das restrições ao financiamento. 6. Efetivamente, a mera indicação genérica de consulta ao regulamento e as especificações em letras diminutas não são suficientes para tanto. Frisa-se que, em todas as divulgações apresentadas, não há sequer menção de que os termos ali expressos não teriam abrangência para todos os cursos, sendo apta a induzir o consumidor a erro ( (Classe: Apelação,Número do Processo: 0511319-60.2018.8.05.0001, Relator (a): José Edivaldo Rocha Rotondano, Quinta Câmara Cível, Publicado em: 02/04/2019 ).
(TJ-BA - APL: 05113196020188050001, Relator: José Edivaldo Rocha Rotondano, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: 02/04/2019, grifo nosso)
No caso acima, é evidente a atitude ilícita do fornecedor, haja vista o carecimento de informações expressas quanto à abrangência do programa de parcelamento, agindo em desconformidade com a legislação consumerista, pois o art. 6º, inciso III do CDC, exige que a mesma seja feita de forma clara e adequada, evitando o induzimento do consumidor a erro.
Dessa forma, o fornecedor é obrigado, no momento da inclusão do produto ou do serviço no mercado, a explicar de forma transparente e pormenorizada ao consumidor, acerca do que está sendo exposto à venda, com especificação correta de qualidade, quantidade, características, composição, bem como os tributos incidentes e o respectivo preço, e ainda, os riscos que apresentem.
Com efeito, é evidente que o detentor do conhecimento técnico e dominador do processo de produção é o fornecedor, enquanto que o consumidor não sabe como o produto foi produzido, o que foi utilizado ou quem produziu, tornando-o vulnerável. Consequentemente, a informação é essencial para colocar o consumidor em posição de igualdade na relação consumerista.
Deste modo, trata-se de um dos direitos básicos do consumidor mais cruciais, uma vez que, o artigo 5º, inciso XIV da Constituição Federal, resguarda e assegura o acesso à informação a todos os cidadãos, de forma a garantir, inclusive, aos consumidores, a adequada e autêntica informação acerca dos produtos e serviços ofertados no comércio.
À vista disso, o acesso à informação de forma clara e adequada proporciona aos vulneráveis da relação de consumo a escolha consciente, ou seja, favorece o consumidor na manifestação do seu poder de decisão com mais assertividade, reflexão e exatidão, de modo a diminuir os riscos da escolha apressada e alcançar as devidas expectativas criadas por obter um produto ou serviço pretendido. Por esse motivo, o fornecedor deverá:
além de informar ao consumidor (dever de informar) e de esclarecê-lo (dever de esclarecer), tem o fornecedor especialista, diante de um consumidor não especialista, o dever de aconselhá-lo e de orientá-lo (dever de aconselhamento), o que significa dotar o consumidor de todas as informações e indicações necessárias, bem assim a posição crítica do especialista, para que possa escolher entre as diversas opções que se lhe apresentam (CAVALIERI FILHO, 2019).
Por esta razão, a expressa disposição legal do artigo 31, caput, do CDC, determina que a oferta e apresentação de produtos ou serviços no mercado de consumo deve assegurar informações “corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores” (BRASIL, 1990).
Ainda, ressalta-se que, o parágrafo único do art. 6º, inciso III do CDC, incluído pela Lei nº 13.146 de 2015, define que essas informações comunicadas ao público acerca dos produtos e serviços, devem ser acessíveis às pessoas com deficiência, observadas as disposições do regulamento.
Não obstante a imposição legal para que o fornecedor disponibilize as informações necessárias quanto ao que oferta no mercado, frequentemente se verifica a violação deste direito básico, através de produtos ou serviços com informações incompletas e insuficientes para que se constate a confiabilidade do que está sendo comercializado.
Isso porque, frisa-se, o vulnerável na relação consumerista é o consumidor, e pelo fato de não deter do mesmo conhecimento técnico que o fornecedor, este é obrigado a mantê-lo ciente das informações pertinentes ao produto ou serviço oferecido, e ainda, disponibilizar todos os dados indispensáveis ao consumidor relativos ao que será vendido. Portanto, referido direito é intrinsecamente ligado à realidade de que o fornecedor deve realizar anúncios sem desprender-se dos princípios da transparência e da boa-fé nos métodos comerciais.
Essa obrigação legal imposta ao fornecedor quanto à divulgação de todas as informações pertinentes àquilo ofertado no mercado, deve ocorrer em todo setor mercantil, inclusive no âmbito do comércio eletrônico ou e-commerce, que vem se destacando bastante nos últimos anos, em razão da facilidade e agilidade proporcionada ao processo consumerista, o qual será objeto de estudo do tópico seguinte.
4 A EXPANSÃO DO CONTEMPORÂNEO MERCADO DIGITAL E OS DESDOBRAMENTOS NOS DIREITOS CONSUMERISTAS
Com o avanço tecnológico dos últimos anos, tem-se observado o desenvolvimento de uma nova modalidade de comercialização, a qual é realizada no âmbito do “mundo virtual”, denominada de comércio eletrônico. Nesse mercado, as partes estabelecem uma relação de consumo sem efetuarem qualquer contato físico entre si, valendo-se somente de seus computadores, smartphones, tablets ou outro meio de comunicação conectados à internet que as permitam acessar o estabelecimento virtual dos fornecedores.
À vista disso, a atividade desenvolvida no comércio eletrônico pode ser conceituada como aquela em que as partes, mediante a transmissão eletrônica de dados, efetuada por meio de computador ou outro veículo que permita essa comunicação sem qualquer contato físico, constituem uma relação virtual (NEVES, 2018).
Diante desse cenário, torna-se perceptível que esse modelo de comércio está se destacando cada vez mais em relação ao comércio tradicional, em razão das diversas facilidades que proporcionou às relações de consumo estabelecidas entre fornecedores e consumidores para compra e venda de produtos ou serviços, acompanhando a celeridade em que a sociedade atual se encontra.
Isso porque, o advento de um comércio por meio da internet, possibilitou a inclusão de empresas e marcas de pequeno e médio porte no mercado, as quais antes não tinham tanta visibilidade mercantil, devido às limitações enfrentadas quanto à logística física e à pequena diversidade de produtos ou serviços oferecidos.
Além disso, permitiu às empresas o ingresso em setores nos quais jamais imaginariam alcançar, em razão das condições suportadas no passado, como os altos investimentos necessários para superar a concorrência, gerando um horizonte de oportunidades para os fornecedores crescerem no mercado.
Dessa forma, a competitividade entre as empresas não será pautada por seu tamanho, sua vantagem ou seu país de origem como ocorria no passado. Agora, será possível a competição de empresas menores, mais jovens e locais com empresas maiores, globais e mais antigas no mercado. No fim das contas, não haverá uma única empresa que domine de forma total as demais empresas, visto que nesse novo mercado, a empresa mais competitiva será aquela que possuir uma maior conectividade com comunidades diversas de consumidores (KOTLER; KARTAJAYA; SETIAWAN, 2017).
São nítidos os benefícios trazidos pelo comércio digital, uma vez que sua dinâmica mercantil permite que fornecedores disponibilizem seus produtos e serviços no mercado com uma redução dos gastos, tendo em vista que os custos para manter um estabelecimento virtual funcionando são consideravelmente inferiores àqueles para manter um estabelecimento físico, pois neste deve haver um maior investimento em funcionários, logística e, principalmente, em publicidade.
Diante disso, evidencia-se que a internet inovou o mercado consumerista, ao criar uma nova modalidade de contratação, qual seja, a eletrônica, de modo a facilitar, cada vez mais, a atuação de empresas de pequeno e médio porte, viabilizando um maior alcance na divulgação e distribuição de seus produtos e serviços, assegurando de forma bem mais prática a expansão dos negócios e consequentemente, dos lucros auferidos pelos fornecedores, pois é inegável que
a tecnologia possibilita a automação e a miniaturização, que reduzem os custos dos produtos e permitem às empresas atender aos novos mercados emergentes. As inovações disruptivas nos diferentes setores de negócios levaram produtos mais baratos e simples aos pobres, antes considerados um ‘não mercado’. Produtos e serviços que já foram exclusivos estão agora disponíveis para os mercados de massa no mundo inteiro (KOTLER; KARTAJAYA; SETIAWAN, 2017, p.20).
Portanto, denota-se que o comércio digital promoveu o rompimento de barreiras demográficas e geográficas, proporcionando ao fornecedor um alcance maior de consumidores, localizados em cidades, estados, regiões e até países diferentes, com despesas significantemente mais baixas, visto que antes se fazia necessária a intervenção de terceiros, como redes hoteleiras e companhias áreas para que essa negociação pudesse ser realizada. Dessa forma, o que antes era inviável, principalmente para pequenas empresas, as quais possuíam uma clientela limitada, tornou-se possível.
Ademais, através do mercado virtual, as empresas puderam determinar seus próprios horários comerciais, possibilitando ao consumidor, o acesso aos produtos e serviços a qualquer hora do dia, os quais antes eram limitados a horários de funcionamento convencional do comércio ou dos shoppings centers, ou, ainda, afetados em razões de fuso horários nacionais e internacionais (TEIXEIRA, 2015).
Dessa maneira, denota-se que o desenvolvimento do mercado no âmbito digital permitiu a celebração de contratos de consumo de forma fácil, ágil e simplificada, visto que por meio de um simples clique confirmando a aceitação da contratação (one click contracts), o mesmo está firmado e pronto para ser cumprido, sendo possível, ainda, uma rápida e segura forma de pagamento por meio de cartões digitais ou transferências bancárias (MIRAGEM, 2020).
Por meio desse novo modelo de contratação, surgiram, além das acimas mencionadas, outras funcionalidades decorrentes dos modelos de comércio eletrônico existentes, os quais surgirão a depender de como o processo de compra e venda será realizado e quem serão os sujeitos que firmarão a relação de consumo.
Nesse sentido, podemos subdividir o comércio eletrônico em quatro tipos principais, quais sejam: Business to Business (B2B), Business to Consumer (B2C), Consumer to Consumer (C2C) e Consumer to Business (C2B).
No Business to Business (B2B) ou empresa-empresa, a relação de consumo eletrônica é estabelecida por duas pessoas jurídicas, ou ainda, quando a empresa recebe produtos do fornecedor, ao passo que, no Business to Consumer (B2C) ou empresa-consumidor, a relação se configura quando a venda é realizada diretamente ao consumidor final, referindo-se ao modelo mais tradicional em sociedade (MORAES, 2015).
Assim, diante do que se verifica por meio da convivência no meio social, o modelo frequentemente utilizado pelas pessoas é aquele em que a empresa oferece produtos e serviços ao consumidor final, constatando, deste modo, que se tratam das vendas destinadas àqueles que adquirem aquilo que é ofertado com o objetivo de usá-lo.
Por conseguinte, o Consumer to Consumer (C2C) ou consumidor-consumidor, viabiliza negociações entre consumidores, isto é, abre possibilidade para transações entre pessoas comuns, e sob outra perspectiva, tem-se ainda o Consumer to Business (C2B) ou consumidor-empresa, onde, nesta hipótese, existirá a troca de bens entre pessoa física para pessoa jurídica, como no caso dos Shutterstock, onde são vendidos imagens ou vídeos que podem ser utilizados, por exemplo, em uma campanha publicitária empresarial (SAMPAIO, 2017).
Uma vez compreendido quais sujeitos podem estabelecer vínculos consumeristas, resta saber onde os mesmos serão concretizados. Para tanto, o e-commerce conferiu três modalidades de plataformas objetivando a concretização dessas transações, são elas: M-Commerce, T-Commerce e S-Commerce.
O primeiro estará configurando no momento em que a relação comercial for firmada através da utilização de aparelhos móveis, isto é, quando o consumidor finalizar uma compra por meio de seu smartphone, notebook ou tablet. Por seu turno, caso a compra seja efetuada por meio de televisão, por intermédio do controle remoto, estaremos diante do T-Commerce.
Conforme entendimento de Gabriel (2010, p.160) “podemos definir o comércio social (s-commerce) como um subconjunto do comércio eletrônico (e-commerce) que emprega ferramentas colaborativas de redes sociais para auxiliar na compra e venda on-line”. Em outras palavras, o S-Commerce refere-se à utilização dos mecanismos proporcionados pelas redes sociais que promovem a interação social entre usuários para influenciá-los a comprar determinado produto e/ou serviço, valendo-se de avaliações e comentários feitos por outras pessoas.
Em virtude disso, redes sociais, como por exemplo, o Instagram, tornaram-se, além de uma rede de interações sociais e compartilhamentos de mídias, um canal para divulgar e comprar produtos e serviços, permitindo aos usuários dividirem suas experiências, constituindo, dessa forma, uma modalidade de comércio eletrônico, conforme será explanado a seguir.
4.1 O desenvolvimento e modus operandi do mercado digital na rede social Instagram
Com o avanço da internet e a criação das redes sociais, barreiras geográficas e demográficas foram rompidas, possibilitando a interação social entre pessoas localizadas e conectadas em diversos lugares do mundo, por meio do compartilhamento de fotos, vídeos, conteúdos e informações de forma instantânea, facilitando a comunicação entre os usuários dessas mídias sociais.
Diante disso, visto que esse novo meio de interação proporciona a comunicação e o compartilhamento de conteúdo em tempo real entre os usuários conectados, as empresas perceberam uma oportunidade de desenvolverem um mecanismo de publicidade para divulgarem suas marcas, produtos e serviços, objetivando entregar o seu conteúdo ao maior número possível de usuários da rede, os quais se tornariam seus consumidores.
Isso porque, os consumidores que antigamente eram influenciados por campanhas de marketing, buscando sempre ouvir as autoridades e especialistas sobre o assunto, passaram a acreditar e confiar mais nas opiniões de outros seguidores, pedindo conselhos para estranhos (KOTLER; KARTAJAYA; SETIAWAN, 2017), os quais compartilham suas experiências com o consumo de determinado produto ou serviço. Dessa forma, evidencia-se que as conversas entre os consumidores a respeito de marcas e produtos, passaram a ter
mais credibilidade do que campanhas publicitárias voltadas para um público específico. Círculos sociais tornaram-se a principal fonte de influência, superando as comunicações de marketing e até as preferências pessoais. Os consumidores tendem a seguir a liderança de seus pares ao decidir qual marca escolher. É como se estivessem se protegendo de alegações falsas das marcas ou de campanhas publicitárias ardilosas e usando seus círculos sociais para construir uma fortaleza (KOTLER; KARTAJAYA; SETIAWAN, 2017, p.18).
Foi nesse cenário que a rede social Instagram, criada em outubro de 2010 por Kevin Systrom e Mike Krieger para promover a publicação de fotos, vídeos e stories, além de possibilitar a troca de mensagens entre seus usuários via direct, tornou-se um meio de comércio digital utilizados pelos fornecedores para divulgarem e venderem seus produtos, tendo em vista que por meio dessa rede, os usuários comentam sobre suas experiências como consumidores daquela empresa, de forma a incentivar outras pessoas a comprarem naquele estabelecimento virtual.
Dessa maneira, as empresas, valendo-se dessa ferramenta digital, produzem seus conteúdos voltados sempre para o seu negócio, ofertando seus produtos e serviços de maneira criativa e chamativa, com o objetivo de atrair seguidores, ou melhor, consumidores, para que fiquem engajados no perfil, e consequentemente, consumam aquilo que é ofertado, além de divulgarem e indicarem a página para outros usuários.
Nesse sentido, evidencia-se que a rede social Instagram se tornou um instrumento de comércio eletrônico muito utilizado pelos fornecedores, visto que possibilita a divulgação de seus produtos e serviços com um custo publicitário significativamente baixo, uma vez que a criação de um perfil, bem como as publicações nele realizadas ocorrem de maneira gratuita. Além disso, permite uma interação imediata com usuários consumidores, após o compartilhamento de sua mercadoria por meio de fotos, vídeos ou stories.
Portanto, apesar de a rede social Instagram não ter sido criada para fins comerciais, empresas de pequeno, médio e grande portem têm visto muito potencial deste meio de comunicação para os negócios, visto que incentiva uma maior interação pessoal entre os usuários conectados e as empresas, quando comparado com outras modalidades de marketing digital, desde que o perfil criado seja utilizado da maneira correta, de forma criativa, a fim de atrair o máximo de seguidores consumidores.
4.2 As práticas ilegais no mercado digital diante da inobservância proposital dos direitos consumeristas básicos
À medida em que o e-commerce cresce gradativamente, inclusive no mundo das redes sociais, é perceptível que, como explanado em tópicos anteriores, há diversas vantagens. Dessa forma, nota-se que os consumidores, cada vez mais, buscam obter produtos e serviços com mais simplicidade e conforto, sem que, necessariamente, exija a sua locomoção para a concretização de uma compra.
Todavia, ao pensar em realizar esse tipo de compra, grande parte da população possui convenientes preocupações, haja vista a existência de falhas neste novo mercado, como por exemplo, pessoas que utilizam este meio para enganar consumidores através de sites criados com informações falsas, induzindo o vulnerável ao erro, com o intuito de obter vantagem indevida.
Dentre as desvantagens do e-commerce, tem-se o impasse no momento de avaliar o produto, uma vez que não há como experimentá-lo, causando insegurança no momento de concretizar a compra. Ademais, é inegável que a exigência do fornecimento dos dados pessoais do consumidor em sites corresponde à situação de risco, posto que outras pessoas podem ter acesso às informações (COSTA, 2016).
Assim, em virtude das lacunas e incertezas trazidas pelo mercado digital, é de suma importância destacar as principais desvantagens decorrentes deste meio de compra. Entre os mais frequentes, tem-se, sobretudo, a imprecisão de conhecer verdadeiramente, ou não, quem está do outro lado da internet oferecendo produtos ou serviços.
Sendo assim, o perfil pode ser criado com a finalidade de vender produtos, mas, de certa forma, é preciso conhecê-lo minuciosamente, com o fim de garantir que não seja um sujeito que simula ser um vendedor e não tenha o que oferecer. Portanto, o consumidor deve estar atento aos sinais e averiguar se o suposto fornecedor cumpre com o que retrata o perfil, principalmente no momento de efetuar a compra, onde, em alguns casos, solicitam um cadastro online ou os dados do cartão de crédito.
Com isso, apesar do custo benefício ser incomparavelmente menor em relação a abertura de um estabelecimento comercial padrão, há que se analisar os riscos que o ambiente virtual traz, principalmente pelo atributo de que a internet é um ambiente livre para todos e qualquer pessoa que possua o mínimo de conhecimento em tecnologia, tem a capacidade de criar um site comercial.
Dentre estes perigos, salienta-se ainda as incertezas decorrentes da abstração do produto, ou seja, em ambiente remoto não há a possibilidade de concretamente senti-lo, o qual é demonstrado e oferecido somente através de fotos e vídeos, surgindo novamente a dúvida quanto as particularidades do que está posto à venda. Logo, não ter a percepção do que se almeja comprar, de forma clara, como por exemplo, tamanho, cor, originalidade, qualidade e demais detalhes, é um fator que oportuniza espaço para receios e dúvidas no momento de concluir a aquisição.
Portanto, entre as principais desvantagens, tem-se a inexistência de contato físico; o não oferecimento da entrega do produto de forma imediata como realizado no âmbito presencial, e ainda, a impossibilidade de conhecer verdadeiramente o produto e experimentá-lo, a fim de ter certeza sobre aquilo que está prestes a ser adquirido (ODONE; AZEVEDO; COELHO, 2014).
Com efeito, em virtude destes malefícios derivados do e-commerce, torna-se fundamental citar demais problemas apresentados neste mercado, como por exemplo, vícios existentes no produto, mercadorias não entregues no prazo pré-estabelecido, ou ainda, dificuldades na devolução da mercadoria, e inclusive, a escassez de informação acerca dos produtos e serviços oferecidos no comércio eletrônico, a qual deve ser notoriamente disponibilizada aos consumidores.
Por conseguinte, diante deste cenário atual e consuetudinário presente na sociedade, compreende-se que, apesar do mercado digital facilitar o processo de compra, há a necessidade de usá-lo de forma cautelosa e moderada, a fim de evitar prejuízos e possíveis descontentamentos, posto que “é evidente que o consumidor está sempre em desvantagem, é vulnerável, e que no consumo pela internet essa vulnerabilidade é ainda mais concreta” (PINHEIRO, 2020, p. 11).
Assim, como forma de proteger o vulnerável da relação de consumo e respeitar os dispositivos legais, os fornecedores devem, de forma clara e precisa, disponibilizar informações acerca dos produtos e serviços, a fim de que não se viole o direito básico do consumidor ao acesso à informação, conforme se explanará a seguir.
5 ANÁLISE CRÍTICA DO PANORAMA LEGISLATIVO VIGENTE ACERCA DAS NORMAS CONSUMERISTAS
Apesar de existirem regulamentações brasileiras vigentes a respeito da obrigatoriedade de prestar informações relevantes a respeito do que está sendo ofertado, os fornecedores insistem na exposição dos itens omitindo informações indispensáveis aos produtos e serviços, como por exemplo, quanto aos valores e qualidade, tornando vulnerável o comprador com relação àquilo que se pretende adquirir.
Assim, referida conduta, além de recorrente no comércio tradicional, verifica-se ainda no cenário do comércio eletrônico, como em perfis elaborados na rede social Instagram, os quais são criados com o objetivo de ofertar produtos e serviços, mas acabam violando o direito básico do consumidor ao acesso à informação no tocante ao que se objetiva vender.
Entres as leis que regulam as medidas necessárias para evitar que o direito do consumidor ao acesso à informação seja violado, além da Lei nº 8.078/1990, isto é, o Código de Defesa do Consumidor, o qual consagra as regras que devem ser respeitadas em prol da proteção do consumidor, tem-se a Lei nº 10.962/2004, a qual foi alterada pela Lei nº 13. 543/2017, o Decreto Lei nº 7.962/2013 e a Lei nº 12.965/2014.
Deste modo, a Lei nº 10.962/2004 define procedimentos para que os fornecedores divulguem, de forma devida, o preço dos produtos e serviços postos em comercialização, harmonizando com a necessidade de transparência almejada nas relações de consumo, a fim de garantir ao cliente, seu acesso à ampla informação.
Por conseguinte, enfatiza-se ainda a existência do Decreto Lei nº 7.962/2013, o qual surgiu para dirimir lacunas existentes no Código de Defesa do Consumidor, regulando a contratação no âmbito do comércio eletrônico, tendo como objetivo sanar e controlar os atos inconvenientes praticados pelos fornecedores, de modo a reconhecer o princípio básico à informação do consumidor.
Assim, o artigo 1º, inciso I, do Decreto Lei nº 7.962/2013 institui que “a contratação no âmbito do comércio eletrônico precisa abranger alguns aspectos, dentre estes, informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor” (BRASIL, 2013), assegurando à parte vulnerável o direito ao amplo acesso às informações apropriadas e satisfatórias referentes ao que se pretende obter, visando o discernimento inequívoco no momento da decisão.
Com efeito, a Lei nº 12.965 foi sancionada em 23 de abril de 2014, conhecida popularmente como Marco Civil da Internet, estabelecendo, inicialmente, o respeito aos princípios, garantias, direitos e deveres, com o fim de que a internet seja usada devidamente, adequando o mundo digital e os cuidados necessários ao utilizá-la.
Assim sendo, diante da imperatividade constitucional explícita nos dispositivos legais vigentes, aplica-se ao uso da internet no Brasil o regime jurídico adotado às relações de consumo (FIORILLO, 2015). Deste modo, o artigo 7º, inciso VI da mencionada lei, “assegura aos usuários da internet o direito a informações claras e completas constantes dos contratos de prestação de serviços” (BRASIL, 2004), no entanto, embora haja normas impondo estas obrigações aos fornecedores, mostram-se, na prática, inoperantes.
Ressalta-se ainda a notável alteração feita no artigo 2º da Lei 10.962/2004, promovida pela Lei nº 13.543/2017, a qual inseriu o inciso III, elucidando que “as formas de afixação de preços em vendas a varejo para o consumidor no comércio eletrônico devem ser feitas mediante a divulgação ostensiva do preço à vista, junto à imagem do produto ou descrição do serviço, em caracteres legíveis” (BRASIL, 2004).
Destarte, em 2017, verificando a insuficiência das normas ao que diz respeito o e- commerce, a Lei nº 13.543 foi sancionada, alterando o artigo 2º da Lei nº 10.962/2004 para que houvesse uma imposição de limites no âmbito do comércio eletrônico referente às atitudes daqueles que fornecem. Porém, mostrou-se, mais uma vez, ineficiente para conter os comportamentos inadmissíveis cometidos pelos dominantes da relação consumerista.
Dessa forma, em que pese as tentativas do legislador brasileiro em tentar proteger os direitos dos consumidores no âmbito do comércio eletrônico, impondo formas de fixação de preços de produtos e serviços, por exemplo, na prática, infelizmente, é possível verificar que referidos dispositivos são insuficientes para garantir esses direitos, principalmente, no âmbito do crescente mercado das redes sociais.
Foi nesse contexto de insuficiência legislativa e avanço do mercado digital no âmbito das redes sociais que o Projeto de Lei nº 97/2020, de autoria do Senador Ciro Nogueira (PP/PI), foi apresentado ao Senado Federal, com o intuito de alterar a redação da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), para “impor ao fornecedor o dever de informar o preço do produto ou serviço ofertado por meio das redes sociais, e vedar a oferta de produtos ou serviços com preços diferenciados em razão de perfis ou características individuais de consumidores apuradas nessas redes”.
A justificativa para a elaboração do referido projeto de lei é exatamente a expansão desse novo comércio e como a vulnerabilidade dos consumidores torna-se ainda mais expressiva nesse meio, tendo em vista a quantidade de informações pessoais despejadas pelos usuários nas redes sociais, relacionadas aos seus interesses e preferências, de forma a facilitar aos fornecedores o entendimento a respeito das características e gostos desses potenciais consumidores, bem como subestimar por meio das publicações de seu perfil, o quanto cada um, individualmente, poderá pagar por um mesmo produto ou serviço.
Assim, como destacado pelo referido Projeto de Lei, mesmo que as informações pelos usuários das redes sociais sejam fornecidas de livre e espontânea vontade, não se justifica sua aplicação indevida por parte dos fornecedores, como meio de obter vantagens para fraudar a relação de consumo, de forma a prejudicar aquele que irá adquirir os produtos ou serviços, fazendo-se necessária a imposição de limites, a fim de evitar essas práticas abusivas e preservar a própria atividade econômica.
Como mencionado acima, a Lei nº 10.962/2004, que teve sua redação alterada pela Lei nº 13.543/2017, determinou os requisitos mínimos a serem cumpridos quando da divulgação de produtos e serviços no comércio eletrônico. No entanto, esse dispositivo, apesar de ser inovador e tentar acompanhar o surgimento desse novo comércio, torna-se omisso quando se trata do mercado existente nas redes sociais, principalmente, no Instagram.
Isso porque, nessa rede social, como muitos perfis de lojistas não divulgam as especificações corretas do produto, em especial, o valor, o usuário-consumidor precisa direcionar-se ao direct do fornecedor para obter maiores informações acerca do objeto divulgado, sem qualquer garantia de que, por exemplo, aquele seja o preço real do produto, e não um qualquer escolhido pelo divulgador com base na análise de suas características individuais e provável condição financeira demonstrada em seu perfil.
Assim, o Projeto, busca inovar a redação do art. 66 do Código de Defesa do Consumidor, o qual preconiza como infração penal, a prática de afirmar falsamente ou de forma enganosa, ou omitir informações relevantes sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços (BRASIL,1990), elencando que:
Art. 39 (...)
XV – ofertar um mesmo produto ou serviço com preços diferenciados em razão de perfis ou características individuais de consumidores apuradas em redes sociais.
Art. 66 (...)
§1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar oferta ou violar o disposto no art. 39, XV, desta Lei.
Deste modo, incorrendo os fornecedores em referidas condutas delitivas na seara consumerista das redes sociais, esta ação seria considerada como crime praticado contra a relação de consumo, punível com detenção de três meses a um ano e multa, diante do descumprimento de dever legalmente prescrito no art. 6º, inciso III, do CDC.
Por esse motivo, é forçoso reconhecer a necessidade de garantir o direito básico do consumidor ao acesso à informação adequada e clara nesse mercado digital da rede social Instagram, impondo aos perfis lojistas a obrigação de divulgarem todas as características indispensáveis a respeito do produto, principalmente, o respectivo preço, bem como as formas de pagamento aceitas, de maneira clara, ostensiva e legível, objetivando coibir práticas abusivas e enganosas que causem prejuízo econômico ao vulnerável.
Dessa maneira, constata-se que nosso ordenamento jurídico no ramo de Direito do Consumidor precisa evoluir e aperfeiçoar-se para proteger cada vez mais o consumidor em todos os meios suscetíveis ao comércio, pois, muito embora as legislações existentes regulamentem as relações de consumo, as mesmas ainda são insuficientes para abarcar esse crescente mercado da rede social Instagram, posto que essa violação ocorre diariamente, razão esta que ensejou a elaboração de Projeto de Lei nº 97/2020 para impor obrigações e sanções ao fornecedor que praticar essas ilegalidades no momento de efetivar divulgações em sua página na rede.
Conforme discutido, ao longo dos anos, o comércio evoluiu paralelamente com a sociedade, sendo conduzido pelas diversas modificações trazidas pelo meio social, com isso, percebeu-se a necessidade de regulamentar os vínculos gerados entre os indivíduos que compravam e vendiam, com o fim de equilibrar as relações de consumo. Assim, em 05 de outubro de 1988, foi promulgada a Constituição Federal, a qual passou a impor ao Estado o dever de proteger os vulneráveis da relação consumerista, isto é, os consumidores, destacando ainda, a necessidade da elaboração de lei especial para a devida defesa, surgindo, deste modo, o Código de Defesa do Consumidor.
Dessarte, referido Código regulamenta a obrigação do Estado de preservar os direitos dos consumidores, visto que são considerados vulneráveis da relação de consumo, elencando como básicos aqueles descritos no artigo 6º do mencionado Código, destacando-se, em especial, o descrito no inciso III, isto é, o direito do consumidor de acesso à informação adequada e clara.
No entanto, na prática, infelizmente, a violação deste direito é evidente e constante no comércio como um todo, mas principalmente no âmbito do crescente comércio eletrônico na rede social Instagram, a partir do momento em que o fornecedor divulga itens em seu perfil sem apresentar juntamente com estes, as informações e especificações daquilo que está sendo anunciado, especialmente o preço, dificultando o processo de consumo, posto que, a ausência de conhecimento acerca do produto ou serviço impossibilita que o consumidor realize sua compra com exatidão.
Deste modo, denota-se que a regulamentação do direito de acesso à informação clara e adequada no Código de Defesa do Consumidor tornou-se insuficiente para garanti-lo na prática, razão pela qual o legislador brasileiro elaborou novas leis objetivando a garantia desse direito, como a Lei nº 10.962/2004, alterada pela Lei nº 13.543/2017, o Decreto Lei nº 7.962/2013 e a Lei nº 12.965/2014.
Contudo, com o avanço do mercado digital, em especial, na rede social Instagram, referidas legislações demonstraram-se mais uma vez ineficientes para garantir o direito do consumidor de acesso à informação na relação de consumo estabelecida nesse âmbito, motivo que ensejou a criação do Projeto de Lei nº 97/2020, visando a imposição ao fornecedor de informar o preço dos produtos e serviços ofertados por meio das redes sociais, vedando a oferta de preços diferenciados baseados em características individuais dos consumidores apuradas em seus perfis pessoais dessas redes.
Isto posto, a presente pesquisa demonstrou que, apesar das tentativas inovadoras do legislador pátrio em acompanhar o avanço das relações de consumo, inclusive, no mercado da rede social Instagram, verificou-se que a legislação consumerista existente ainda se demonstra ineficaz para proteger o consumidor dos abusos praticados pelos fornecedores quanto a ausência de informações acerta de suas ofertas nesse novo comércio, tornando-se, portanto, imprescindível a criação e aprovação de normas que visem coibir mais severamente aqueles que realizarem referidas práticas abusivas e enganosas.
À vista disso, apesar de o presente estudo proporcionar aprimoramento científico na área consumerista, denota-se a indispensabilidade de futuras pesquisas acerca da temática, visando a adaptação do Direito às novas relações surgidas no recente mercado das redes sociais, para proteger o vulnerável de práticas ilícitas, efetivando seus direitos básicos.
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[1] Graduanda em Direito do Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA). [email protected].
[2] Professora Orientadora. Mestra em Direito pela PUCRS. Especialista em Direito Público com habilitação em docência do ensino superior. [email protected].
5 Professor Co-Orientador. Mestre em Criminologia pela Universidade Fernando Pessoa. Pós-graduado em Direito Civil, Processo Civil, Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. [email protected].
Graduanda em Direito do Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUSA, Suellen Danta. A violação do direito do consumidor diante da dificuldade de acesso à informação na rede social Instagram Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 jun 2022, 04:09. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58575/a-violao-do-direito-do-consumidor-diante-da-dificuldade-de-acesso-informao-na-rede-social-instagram. Acesso em: 23 dez 2024.
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