RESUMO: O testamento consiste na manifestação de última vontade da pessoa, em que o indivíduo dispõe, por meio de documento público ou particular, na presença de testemunhas, em língua portuguesa ou estrangeira, para depois da sua morte, de forma parcial ou total sobre o seu patrimônio. O presente trabalho tem como escopo dispor sobre as espécies de testamentos ordinários elencados pelo Código Civil de 2002, apresentando as características de cada modalidade de testamento ordinário. Nesse sentido, a presente pesquisa se propõe a explorar os testamentos público, cerrado e particular por meio das respectivas disposições legais, posicionamentos doutrinários, jurisprudenciais, bem como fatos históricos e sociais.
Palavras Chave: Testamento Ordinário. Modalidades. Código Civil de 2002.
ABSTRACT: The will consists of the manifestation of the person's last will, in which the individual disposes, through a public or private document, in the presence of witnesses, in Portuguese or foreign, for after his death, in a partial or total way about his patrimony. The present work has as scope to dispose about the types of ordinary wills listed by the Civil Code of 2002, presenting the characteristics of each type of ordinary will. In this sense, the present research proposes to explore the public, cerrado and private wills through their respective legal provisions, doctrinal and jurisprudential positions, as well as historical and social facts.
Keywords: Ordinary Will. Modalities. Civil Code of 2002.
1. INTRODUÇÃO
O testamento consiste em disposição unilateral de última vontade, possuindo caráter personalíssimo e de natureza solene, sendo dotado de revogabilidade. Ou seja, o testamento não pode ser realizado por meio do instituto jurídico da representação.
Nesse sentido, a sucessão por meio de testamento decorre unicamente da manifestação de vontade, livre e consciente, do testador, sendo limitada, em regra, apenas pela legítima dos herdeiros necessários, conforme prevê o artigo 1.857, §1º, do Código Civil de 2002 (CC/02).
Assim, o presente artigo investiga, sob a ótica do Código Civil, as espécies de testamentos ordinários ou comuns previstas na referida norma civilista, cujo procedimento está disposto a partir do artigo 1.862 até o artigo 1.880 do citado diploma legal.
Ademais, dentro deste contexto, este trabalho procura fazer uma contribuição na área de Direito Civil, discriminando as caraterísticas gerais das modalidades de testamentos ordinários ou comuns, a saber, público; cerrado; e particular.
No mais, em relação à presente investigação, esta utilizou o método dedutivo, por meio de pesquisa bibliográfica, utilizando-se de jurisprudências e referenciais teóricos, tomando por base as posições doutrinárias mais atuais.
2. DO TESTAMENTO
Testamento é um documento que o indivíduo realiza quando pretende deixar, após a sua morte, os seus bens para pessoas determinadas, sendo, em apartada síntese, uma forma de planejamento sucessório, prevendo a maneira como o patrimônio do testador será dividido entre os seus herdeiros.
Segundo leciona Maria Helena Diniz (2007), o testamento é ato personalíssimo e revogável pelo qual alguém, de conformidade com a lei, não só dispõe, para depois de sua morte, no todo ou em parte, do seu patrimônio, mas também faz estipulações.
Na mesma linha é também o posicionamento jurisprudencial:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA ANULATÓRIA DE TESTAMENTO PÚBLICO E OUTROS ATOS JURÍDICOS - AUSÊNCIA DE ASSINATURA EM TODAS AS LAUDAS - DESNECESSIDADE - TESTAMENTO EM UMA FOLHA - LAVRATURA POR TABELIÃ SUBSTITUTA - POSSIBILIDADE - ART. 1.864, INC. I, DO CÓDIGO CIVIL - ASSINATURA DO ATO PELOS DEMAIS DESCENDENTES - DESNECESSIDADE - FALTA DE CAPACIDADE DA TESTADORA - NÃO COMPROVAÇÃO - VALIDADE DO TESTAMENTO PÚBLICO - SENTENÇA MANTIDA. O testamento é ato de última vontade, configurando um ato jurídico solene (de extremo rigor formal), personalíssimo, que pode ser mudado a qualquer tempo, a teor do art. 1.858 do Código Civil. (TJ-MG - AC: XXXXX00041591001 Patrocínio, Relator: Fábio Torres de Sousa (JD Convocado), Data de Julgamento: 28/01/2021, Câmaras Cíveis / 8ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 08/02/2021). Grifo Nosso.
Nesse sentido, tendo por base a doutrina de Sílvio de Salvo Venosa (2013), enumera-se as seguintes características gerais do testamento:
a) Negócio jurídico unilateral, posto que só depende da vontade do testador para a sua configuração jurídica;
b) Documento solene, uma vez que se faz necessário a observância das formalidades legais;
c) Ato personalíssimo, pois somente pode ser praticado pela pessoa do testador, não sendo admitido testamento mediante procuração ou outro meio equivalente;
d) Ato causa mortis, pois somente terá eficácia após o falecimento do testador;
e) Negócio jurídico gratuito, já que não tem por finalidade trazer vantagens para o testador;
f) Ato jurídico revogável, porque o testador pode, a qualquer tempo, revogar total ou parcialmente a disposição realizada anteriormente, salvo se importar em reconhecimento de estado de filiação.
É necessário ressaltar que as formalidades legais previstas, especialmente para as formas de testamento público ou particular, caso ausentes não ensejam por si só a nulidade do testamento, devendo ser preservada e considerada a vontade do testador. Nesse sentido, é a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. NULIDADE DE TESTAMENTO. PRETERIÇÃO DE FORMALIDADE LEGAL. VÍCIOS FORMAIS INCAPAZES DE COMPROMETER A HIGIDEZ DO ATO OU POR EM DÚVIDA A VONTADE DO TESTADOR. SÚMULA N. 7/STJ. A análise da regularidade da disposição de última vontade (testamento particular ou público) deve considerar a máxima preservação do intuito do testador, sendo certo que a constatação de vício formal, por si só, não deve ensejar a invalidação do ato, máxime se demonstrada a capacidade mental do testador, por ocasião do ato, para livremente dispor de seus bens. Precedentes do STJ. Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp n. 1.073.860/PR, relator Ministro Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe de 1º/4/2013.).
O legislador infraconstitucional previu no Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) as modalidades de testamento ordinário ou comum, bem como as formas especiais de testamento, conforme se extrai dos seguintes artigos do CC/02:
Art. 1.862. São testamentos ordinários:
I - o público;
II - o cerrado;
III - o particular.
[...]
Art. 1.886. São testamentos especiais:
I - o marítimo;
II - o aeronáutico;
III - o militar.
Ademais, cumpre destacar que o ordenamento jurídico nacional não admite outros testamentos especiais além dos contemplados no Código Civil, conforme prevê o artigo 1.887 do próprio CC/02.
No mais, frisa-se que o objeto desta pesquisa se restringe à análise das espécies de testamentos ordinários ou comuns, a saber: testamento público, cerrado e particular.
Por último, caso não seja possível o testador assinar o seu testamento, o legislador civilista previu a possibilidade de assinatura a rogo. No entanto, nos termos do artigo 1.801 do Código Civil de 2002, são proibidos de realizar assinatura testamentária a rogo do testador: o herdeiro instituído, ou legatário, o seu cônjuge ou companheiro, ou os seus ascendentes e irmãos.
3. DO TESTAMENTO ORDINÁRIO OU COMUM
O artigo 1.862 do Código Civil de 2002 estabeleceu três espécies de testamentos ordinários ou comuns, a saber: o público, o cerrado e o particular.
3.1 Do Testamento Público
O testamento público é aquele redigido por tabelião ou substituto legal, em seu livro de notas, conforme as declarações do testador, as quais são prestadas perante duas testemunhas, que devem acompanhar todo o ato e, ao final, assiná-lo. Frisa-se que o testamento público apresenta-se como o mais seguro, em face de suas formalidades legais essenciais.
Nesse mesmo sentido, é o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves:
O testamento público é a espécie de testamento mais segura que as demais formas, por mais que ele permite que qualquer pessoa tenha conhecimento do seu teor. (Direito Civil Brasileiro, direito das sucessões. 4ºed. rev. São Paulo: Saraiva, 2010.)
Nesse contexto, o artigo 1.864 do Código Civil de 2002 prevê os requisitos necessários para a celebração de testamento público:
São requisitos essenciais do testamento público:
I - ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de acordo com as declarações do testador, podendo este servir-se de minuta, notas ou apontamentos;
II - lavrado o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a duas testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se o quiser, na presença destas e do oficial;
III - ser o instrumento, em seguida à leitura, assinado pelo testador, pelas testemunhas e pelo tabelião.
Ademais, o CC/02 prevê que o testamento público pode ser escrito manualmente ou mecanicamente, bem como ser feito pela inserção da declaração de vontade em partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas todas as páginas pelo testador, se mais de uma, consoante o parágrafo único do artigo 1.864.
Salienta-se que se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu substituto legal assim o declarará, assinando, neste caso, pelo testador, e, a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias.
Cumpre destacar que o indivíduo inteiramente surdo, que saiba ler, poderá celebrar testamento público, desde que leia o seu testamento, ou, se não o souber, designe quem o leia em seu lugar, estando presentes as testemunhas, nos termos do artigo 1.866 do Código Civil de 2002.
Já no caso do testador que seja cego, o Código Civil só permite que aquele realize testamento na forma pública, sendo obrigatório que o testamento lhe seja lido, em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento, conforme se extrai do artigo 1.867.
Ainda, o Código Civil prevê que o testamento público também se aplica para os testadores que sejam analfabetos, já que não lhes é permitido fazer o testamento na forma cerrada ou particular, consoante as seguintes disposições legais:
Art. 1.872. Não pode dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba ou não possa ler.
[...]
Art. 1.876. O testamento particular pode ser escrito de próprio punho ou mediante processo mecânico.
§ 1 o Se escrito de próprio punho, são requisitos essenciais à sua validade seja lido e assinado por quem o escreveu, na presença de pelo menos três testemunhas, que o devem subscrever.
3.2 Do Testamento Cerrado
O testamento cerrado é, nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves, secreto ou místico, tido também como nuncupativo implícito, elaborado pelo próprio testador, em regra.
Nesse sentido, o artigo 1.868 do Código Civil de 2002 dispõe que o testamento cerrado deve ser escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo, e, neste caso, devendo ser assinado por aquele.
O testamento cerrado para ser válido deve ser aprovado pelo tabelião ou por seu substituto legal, devendo, ainda, observar as seguintes formalidades essenciais, nos termos do artigo 1.868 do Código Civil de 2002:
I - que o testador o entregue ao tabelião em presença de duas testemunhas;
II - que o testador declare que aquele é o seu testamento e quer que seja aprovado;
III - que o tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas testemunhas, e o leia, em seguida, ao testador e testemunhas;
IV - que o auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e pelo testador.
Ademais, ressalta-se que o testamento cerrado pode ser escrito mecanicamente, desde que seu subscritor numere e autentique, com a sua assinatura, todas as paginas.
Cumpre destacar que o testamento cerrado pode ser escrito em língua nacional ou estrangeira, pelo próprio testador, ou por outrem, a seu rogo, nos termos do artigo 1.871 do Código Civil de 2002.
Diante das especificidades essenciais, quem não saiba ou não possa ler, não poderá realizar a disposição de seus bens por meio de testamento cerrado. No entanto, o indivíduo surdo-mudo pode realizar testamento cerrado, desde que o escreva por inteiro, o assine de próprio punho e, posteriormente, o entregue para o oficial de registro público, na presença de duas testemunhas, devendo escrever, na face externa do papel ou do envoltório, que aquele é o seu testamento, cuja aprovação lhe pede, conforme se extrai do artigo 1.873 do Código Civil de 2002.
No mais, segundo o artigo 1.874 do Código Civil de 2002, o testamento místico depois de aprovado e cerrado, será entregue ao testador, devendo o tabelião lançá-lo, no seu livro, nota do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado e entregue.
Por fim, falecido o testador, o testamento será apresentado ao juiz, que o abrirá e o fará registrar, ordenando que seja cumprido, caso não se verifique nenhum vício externo que o torne eivado de nulidade ou suspeito de falsidade, consoante determina o artigo 1.875 do Código Civil de 2002.
3.3 Do Testamento Particular
O Testamento particular, também denominado de testamento hológrafo, consiste na disposição de última vontade elaborada exclusivamente pelo testador, escrito de próprio punho ou por meio de processo mecânico, conforme prevê o artigo 1.876 do Código Civil de 2002. Ademais, o testamento particular pode ser escrito em língua estrangeira, contanto que as testemunhas a compreendam, nos termos do artigo 1.880 do Código Civil de 2002.
Frisa-se que se o testamento particular for escrito de próprio punho, deverá cumprir os seguintes requisitos essenciais para que tenha validade, a saber: ser lido e assinado por quem o escreveu, na presença de pelo menos três testemunhas, que o devem subscrever.
Já se elaborado por processo mecânico, não pode conter rasuras ou espaços em branco, devendo ser assinado pelo testador, depois de o ter lido na presença de pelo menos três testemunhas, que o subscreverão.
Assim, realizado o testamento particular, se o testado falecer, deverá ser publicado em juízo o referido testamento, com citação dos herdeiros legítimos, segundo prevê o artigo 1.877 do Código Civil de 2002.
Com relação às testemunhas no testamento particular, o Código Civil prevê:
Art. 1.878. Se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição, ou, ao menos, sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como a do testador, o testamento será confirmado.
Parágrafo único. Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e se pelo menos uma delas o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova suficiente de sua veracidade.
Entretanto, em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, a critério do juiz, segundo estabelece o artigo 1.879 do Código Civil de 2002.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o exposto, o ordenamento jurídico nacional ao tratar das disposições de última vontade do testador previu diversas formas de testamento ordinário ou comum, a fim de possibilitar ao indivíduo modalidades que atendam as suas pretensões, conferindo proteção legal ao seu planejamento sucessório.
Nesse sentido, o legislador, ao editar o Código Civil de 2002, estabeleceu de maneira simplificada, formas para que o testador elabore a cédula testamentária sem amarras jurídicas, dando-lhe a opção de realizar testamento público, cerrado ou particular, conforme os seus interesses sucessórios, devendo, para tanto, ser observados os aspectos essenciais elencados no Código Civil de 2002.
Ainda, extrai-se da presente investigação, que, entre as modalidades de testamento ordinário ou comum, a forma pública, isto é, o testamento público, apresenta maior segurança jurídica, diante das suas exigências legais, uma vez que reclama ser elaborado pelo tabelião, que, por consequência, o dotará de fé pública, registrando-o na serventia registral própria, ou seja, Registro Central de Testamentos (RCTO).
Já o testamento particular, apesar de ser elaborado de forma mais simples, requer, para a produção dos seus efeitos, que, após o óbito do testador, as testemunhas confirmem perante o Poder Judiciário a veracidade da disposição de última vontade realizada pelo testador.
Dessa forma, verifica-se que o ordenamento judicio nacional tem por escopo facilitar o acesso de todos ao planejamento sucessório, principalmente por meio das formas de testamento ordinário ou comum previstas expressamente no Código Civil de 2002.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Graduado em Licenciatura Plena em Matemática pela Universidade Federal do Tocantins (UFT); Especialista em Gestão Pública pela Faculdade Educacional da Lapa FAEL); Graduando em Direito pela Universidade Federal do Tocantins (UFT).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JOÃO PEREIRA DA SILVA JÚNIOR, . Espécies de testamentos ordinários no direito pátrio Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 set 2022, 04:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/59129/espcies-de-testamentos-ordinrios-no-direito-ptrio. Acesso em: 23 dez 2024.
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