JOSÉ AUGUSTO BEZERRA LOPES[1]
RESUMO: Diante da importância da produção agrária, as propriedades rurais são constantes preocupações sociais, especialmente daqueles que adquirem terras com intuito de torna-las produtivas, mas que se sentem ameaçados em seu direito. Com vasto espaço rural, o território nacional contém várias propriedades rurais, todas elas protegidas pela Constituição Federal de 1988 e pelo Código Civil, cujos dispositivos deixam evidente que não poderão ser violados os direitos dos proprietários, salvo a situação excepcional de intervenção estatal quando observado o descumprimento da função social. Diante da sua finalidade, a Reforma Agrária foi instituída no Brasil através do Estatuto da Terra que, além de definir os imóveis por ele protegidos, apresenta o conceito da reforma, seus objetivos e principais mecanismos de promoção da inclusão agrária daqueles menos favorecidos, com destaque a desapropriação, que justificada diante do caso concreto, levará à perda da propriedade por intervenção estatal, indenizado devidamente o proprietário que deixou de atender a função social. Desenvolvida mediante consulta bibliográfica, com materiais analisados mediante técnicas qualitativas, a pesquisa apresenta a proteção legal ao direito de propriedade, bem como as excepcionalidades que autorizam a relativização dos poderes do proprietário rural, tudo em prol do desenvolvimento social, econômico e inclusivo das propriedades rurais, quando se tratar de desapropriação para fins de reforma agrária.
Palavras-chave: Propriedade rural. Intervenção Estatal. Reforma Agrária. Desapropriação.
ABSTRACT: Given the importance of agrarian production, rural properties are constant social concerns, especially for those who acquire land in order to make it productive, but who feel their rights are threatened. With vast rural space, the national territory contains several rural properties, all of them protected by the Federal Constitution of 1988 and by the Civil Code, whose provisions make it clear that the rights of owners cannot be violated, except in the exceptional situation of state intervention when observing the non-compliance with the social function. In view of its purpose, the Agrarian Reform was instituted in Brazil through the Land Statute, which, in addition to defining the properties protected by it, presents the concept of the reform, its objectives and main mechanisms for promoting the agrarian inclusion of those less favored, with emphasis on the expropriation, which justified in view of the specific case, will lead to the loss of property by state intervention, duly indemnifying the owner who failed to fulfill the social function. Developed through bibliographic consultation, with materials analyzed using qualitative techniques, the research presents the legal protection of the right to property, as well as the exceptionalities that authorize the relativization of the owner's powers, all in favor of the social, economic and inclusive development of rural properties, when dealing with expropriation for agrarian reform purposes.
Keywords: Rural property. State Intervention. Land reform. Expropriation.
Sumário: 1. Introdução. 2. Metodologia. 3. Definição de Propriedade Rural no Direito Brasileiro. 4. Meios de Aquisição da Propriedade Rural. 5. A Função Social da Propriedade e os demais Princípios do Direito Agrário. 6. Formas de Intervenção do Poder Público na Propriedade Rural. 7. A Reforma Agrária e suas Políticas Públicas. 8. Considerações finais. Referências.
1 INTRODUÇÃO
A propriedade é um dos direitos fundamentais assegurados pelo artigo 5º da Constituição Federal de 1988 e que possui uma função social a ser cumprida.
Quando essa propriedade é rural, seu papel possui relevância para toda a sociedade, ao passo que é por meio dela que ocorre a produção agrícola de alimentos para a população, gerando o sustento alimentar e o crescimento econômico do país.
Esse direito fundamental está garantido pela Constituição e pelos demais dispositivos legais, contudo está condicionado a observância do princípio da função social da propriedade disciplinado no inciso XXIII do artigo 5º da Carta Magna, para que o crescimento econômico não coloque em risco o equilíbrio do meio ambiente, outro direito fundamental assegurado pela Constituinte.
Nesse contexto, tendo em vista que o Brasil é um grande produtor de alimentos que tem assumido um papel de relevância mundial para a garantia da segurança alimentar, é fundamental a discussão acerca do direito agrário no País e sua regulamentação a fim de assegurar o desenvolvimento econômico de modo sustentável, sem causar danos ambientais.
Isto posto, esta pesquisa científica tem o propósito de estudar a propriedade rural e o direito agrário no Brasil através dos institutos que regulamentam a atividade agrária no território nacional.
Assim sendo, tendo como ponto de partida a conceituação da propriedade rural, serão estudados os meios para a sua aquisição, a função social da propriedade rural e seus demais princípios norteadores, bem como os meios de intervenção do Poder Público nessas propriedades segundo os ditames da reforma agrária no Brasil para concluir, ao final do estudo, quais os institutos jurídicos regem o direito agrário e a política de reforma agrária no Brasil da atualidade.
2 METODOLOGIA
Este estudo acerca da propriedade rural, os institutos do direito agrário e a reforma agrária no Brasil foi elaborado a partir de estudo bibliográfico, com levantamento dos dados através de consulta a doutrinas, artigos científicos, leis e decisões jurisprudenciais acerca do tema objeto de estudo, tendo como principais meios de busca o acervo digital disponível na internet e em bibliotecas, obtidos de forma não onerosa.
Os materiais usados para confrontamento de informações estão em conformidade com legislação agrária e constitucional em vigor no Brasil, analisados por meio do método descritivo e exploratório, com apresentação do resultado de forma escrita.
Por se tratar de pesquisa teórica e bibliográfica, sem qualquer intervenção direta a outros seres humanos, não foi necessária a prévia submissão do trabalho à aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, conforme Resolução CNS 466/2012.
3 DEFINIÇÃO DE PROPRIEDADE RURAL NO DIREITO BRASILEIRO
A propriedade é direito fundamental assegurado pela Constituição Federal no caput de seu artigo 5º que declara: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]”. (BRASIL, 1988).
Paulo Nader comenta sobre o instituto da propriedade e seus aspectos objetivos e subjetivos nos seguintes termos:
Objetivamente considerado, é instituto de Direito Privado que regula o domínio sobre as coisas em geral, definindo os direitos e os deveres do proprietário. Nesta condição é parte integrante do Direito das Coisas e referencial para os demais direitos reais. Enquanto o direito subjetivo da propriedade abrange, em tese, a plena disponibilidade da coisa, os demais direitos reais contêm uma fração apenas ou algum tipo de poder sobre ela. [...]. O direito de propriedade é vasto, pois encampa todos os poderes possíveis sobre a coisa, ressalvados apenas os limites impostos por lei a favor do interesse social (NADER, 2016, p. 128 e 129).
Portanto, a propriedade ou domínio é um instituto que garante ao proprietário “a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”, conforme preconiza o artigo 1.228 do Código Civil (BRASIL, 2002).
Por sua vez, a propriedade rural, que é o objeto central dessa pesquisa, consiste no domínio sobre um imóvel rural, cuja definição legal está contida no Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/1964):
Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se:
I - "Imóvel Rural", o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada; [...]. (BRASIL, 1964).
Portanto, considera-se propriedade rural aquela em que o dono tem direito ao uso, gozo, disposição e o direito de reaver o domínio, exercida sobre um imóvel que tenha como destinação a exploração da terra por meio da pecuária, agricultura, agroindustrial, etc., independentemente de onde esteja localizado.
São várias as espécies de propriedade rural: a propriedade familiar; a pequena propriedade rural; a média propriedade rural; o minifúndio, o latifúndio (CUNHA e MAIA, 2016), caracterizados a depender da expansão do imóvel rural e cujas formas de aquisição serão tratadas nas linhas seguintes.
4 MEIOS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL
São variadas as formas de aquisição de uma propriedade rural, as quais podem ser classificadas em aquisições originárias ou derivadas, conforme explica Flávio Tartuce:
Como ocorre na posse e também nos demais direitos, a propriedade admite formas de aquisição originárias e derivadas. Nas formas originárias, há um contato direto da pessoa com a coisa, sem qualquer intermediação pessoal. Nas formas derivadas, há intermediação subjetiva (TARTUCE, 2018, p.1182).
Ou seja, a aquisição da propriedade é considerada originária quando é “desvinculada de qualquer relação com titular anterior. Nela não existe relação jurídica de transmissão. Inexiste ou não há relevância jurídica na figura do antecessor” (VENOSA, 2017, p. 172), começando a surtir efeitos dali pra frente, sem vínculo com a propriedade anterior.
Os meios originários de aquisição dessa propriedade são: por meio da Acessão por formação de ilhas, aluvião, avulsão, abandono de álveo ou por plantações ou construções, conforme disciplina o artigo 1.248 e seguintes do Código Civil (BRASIL, 2002); ou através da Usucapião, em que a propriedade é adquirida em razão da posse prolongada exercida sobre bem, disciplinada a partir do artigo 1.260 do Código Civil.
Por outro lado, a aquisição derivada da propriedade é aquela em que “existe transmissão da propriedade de um sujeito a outro, em várias modalidades” (VENOSA, 2017, p. 172) e os efeitos daquela propriedade são transmitidos para o novo proprietário, dando continuidade aquele domínio.
A aquisição derivada de uma propriedade rural pode ocorrer por meio do registro imobiliário, principal forma derivada de aquisição cuja regulamentação está prevista entre os artigos 1.245 a 1.247 do Código Civil, ou através da sucessão hereditária em razão da morte do proprietário anterior, transmitindo o domínio ao herdeiro legítimo ou testamentário (TARTUCE, 2018).
Uma vez adquirida a propriedade de um imóvel rural, o proprietário tem seu direito sobre o bem resguardado pela lei, contudo deve ater-se aos princípios constitucionais e agrários que devem ser observados sob pena da perda do domínio sobre a propriedade. A considerar sua relevância, passemos a estudar cada um deles.
5 A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E OS DEMAIS PRINCÍPIOS DO DIREITO AGRÁRIO
Ao reconhecer a propriedade como direito fundamental, a Constituição determinou expressamente que esta propriedade deve atender à sua função social.
Ele é o princípio constitucional que fundamenta o direito à propriedade no Brasil, o qual “impõe ao proprietário o dever de zelar pelo uso lícito de seu terreno, ainda que não esteja na posse direta”. (LENZA, 2018, p. 1.151).
Ao efetivar a função social da propriedade, o legislador, ao mesmo tempo que estabelece mecanismos de conversão da posse em domínio, seja com a multiplicação das modalidades de usucapião ou com a possetrabalho, que é desapropriação indireta, penaliza a não utilização ou subutilização da coisa de variados modos, como a indenização, por exemplo, com títulos da dívida pública (art. 8º do Estatuto da Cidade). Além disto, há diversas formas de intervenção na propriedade privada. Quando a lei condena o mau uso da propriedade, diz Roberto Kaisserlian Marmo, “sanciona, em muitas hipóteses, em favor do ser (social), em detrimento doter (individual)...” (NADER, 2016, p.133).
De acordo com o Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/1964), em dispositivo legal semelhante ao artigo 186 da Constituição Federal, a função social da propriedade rural é atendida quando estão presentes os seguintes requisitos:
Art. 2° É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei.
§ 1° A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente:
a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias;
b) mantém níveis satisfatórios de produtividade;
c) assegura a conservação dos recursos naturais;
d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem (BRASIL, 1964).
Além da função social a ser cumprida pelo proprietário de imóvel rural, este deve ater-se também ao princípio da primazia da atividade agrária frente ao direito de propriedade, o qual permite a desapropriação de um imóvel rural para fins de reforma agrária (artigo 184 e 185 da Constituição Federal) quando constatado que aquela propriedade não está cumprindo sua função social, de modo a dar prioridade ao uso produtivo da terra em detrimento daquele que mantem um imóvel rural improdutivo (CUNHA e MAIA, 2016).
No mesmo sentido, o princípio da supremacia do interesse público assegura que, em caso de conflito, o interesse coletivo deve prevalecer sobre o interesse de um particular, o que permite a desapropriação de terras rurais pelo Poder Público para fins de interesse social.
O desenvolvimento sustentável é outro princípio constitucional e ambiental aplicado no direito agrário, assim como o princípio de preservação de recursos naturais e da biodiversidade, para assegurar que a utilização produtiva da terra não coloque em risco o direito das presentes e futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (BRASIL, 1988).
Por sua vez, o princípio da dicotomia do direito agrário preconiza que a propriedade rural deve estar disponível a todos aqueles que nela desejam produzir, “de modo a viabilizar a inclusão de milhares de famílias excluídas do mercado de trabalho e diminuir a desigualdade social historicamente presente no Brasil” (CUNHA e MAIA, 2016, p.269) o que é possível por intermédio da reforma agrária.
Para isso o direito agrário tem como princípios o combate a minifúndios e latifúndios e a proteção a pequenas e médias propriedades rurais produtivas, por atenderem a sua função social, dentre outros (CUNHA e MAIA, 2016).
Esses princípios demonstram, portanto, a preocupação do legislador com a função social da propriedade rural no Brasil, que tem papel fundamental para o desenvolvimento econômico do Pais.
Quando esses princípios não são observados, pode o Poder Público intervir na propriedade rural do particular.
6 FORMAS DE INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO NA PROPRIEADE RURAL
Diz a Carta Magna de 1988 que o direito à propriedade está garantido. Neste sentido, o Código Civil prevê uma série de direitos relacionados a essa propriedade, especialmente quanto ao direito de defende-la perante a coletividade e o Estado.
Todavia, o mesmo ordenamento jurídico nacional permite que, em situações excepcionais, o poder público possa intervir na propriedade privada dos cidadãos, aqui compreendidas também as propriedades rurais.
Desta feita, são formas de intervenção estatal admitidas no Brasil: a desapropriação; o confisco; a limitação administrativa ou poder de polícia; a servidão administrativa; a requisição e a ocupação temporária, cuja atuação do Poder Público somente se dá de forma justificada (TIMOTEO, 2016).
Da compreensão dos dispositivos que regulam a matéria, tem-se a desapropriação como a forma de maior destaque quando o assunto é a intervenção estatal no imóvel rural, isto porque, consiste em procedimento administrativo que retira a propriedade para o poder público, indenizando previamente o indivíduo.
A intervenção mencionada está autorizada na Constituição Federal de 1988 que, em seu artigo 5º, inciso XXIII exige que a propriedade atenda à sua função social, e no inciso XXIV dispõe que “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição” (BRASIL, 1988)
Acompanhando o disposto na Lei Maior, o Código Civil no §3º do artigo 1.228, estabelece que “o proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente” (BRASIL, 2002).
Por se tratar de medida autorizada em casos extremos de inobservância da função social por parte do proprietário, a desapropriação do imóvel rural é um dos instrumentos utilizados para fins de reforma agrária, assunto que de agora em diante passa a ser apresentado.
7 A REFORMA AGRÁRIA E SUAS POLÍTICAS PÚBLICAS
Conforme debatido ao longo de toda a pesquisa jurídica sobre a propriedade rural e os institutos jurídicos do direito agrário, as normas constitucionais e infraconstitucionais buscam proteger a propriedade rural e garantir a sua utilização de forma produtiva, para que ela atenda a sua função social.
Os dispositivos legais e os princípios do direito agrário estão em conformidade com a reforma agrária instituída no Brasil, cuja definição legal está contida no artigo 1º do Estatuto da Terra, in verbis:
Art. 1° Esta Lei regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, para os fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola.
§ 1° Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade. [...] (BRASIL, 1964).
A reforma agrária busca tornar as áreas rurais brasileiras mais produtivas através da distribuição da terra, que historicamente está concentrada em poder de uma pequena parcela da população.
Apesar do Brasil ser um país de grande extensão territorial, existem milhares de agricultores que possuem menos de 20 hectares de terra ou terra alguma, o que demonstra a concentração fundiária e desigualdade social do pais. E foi com o intuito de combater essa desigualdade que se mostrou necessária a reforma agrária, para permitir que vários agricultores tenham acesso à terra, possam dela tirar seu sustento e com isso reduzir a desigualdade social (NADER, 2016).
A Política de Reforma Agrária é o conjunto de medidas conduzidas pelo Poder Público a fim de promover a distribuição de terras entre trabalhadores rurais, atendendo aos princípios de justiça social e aumento da produtividade, conforme disposto na Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra).
Além de promover cidadania, proporcionar a desconcentração e democratização da estrutura fundiária e gerar renda no campo, a Reforma Agrária favorece:
* A produção de alimentos básicos.
* O combate à fome e à pobreza.
* Promoção da cidadania e da justiça social.
* A interiorização dos serviços públicos básicos.
* A redução da migração campo-cidade.
* A diversificação do comércio e dos serviços no meio rural (INCRA, 2022).
Conforme estabelece o artigo 16 do Estatuto da Terra, a reforma agrária tem o seguinte objetivo:
Art. 16. A Reforma Agrária visa a estabelecer um sistema de relações entre o homem, a propriedade rural e o uso da terra, capaz de promover a justiça social, o progresso e o bem-estar do trabalhador rural e o desenvolvimento econômico do país, com a gradual extinção do minifúndio e do latifúndio(BRASIL, 1964).
Essa distribuição ou redistribuição de terras rurais pode ocorrer por várias formas (artigo 17 do Estatuto da Terra), dentre elas a desapropriação por interesse social, citada brevemente no tópico anterior, cuja finalidade está prevista também no Estatuto da Terra:
Art. 18. À desapropriação por interesse social tem por fim:
a) condicionar o uso da terra à sua função social;
b) promover a justa e adequada distribuição da propriedade;
c) obrigar a exploração racional da terra;
d) permitir a recuperação social e econômica de regiões;
e) estimular pesquisas pioneiras, experimentação, demonstração e assistência técnica;
f) efetuar obras de renovação, melhoria e valorização dos recursos naturais;
g) incrementar a eletrificação e a industrialização no meio rural;
h) facultar a criação de áreas de proteção à fauna, à flora ou a outros recursos naturais, a fim de preservá-los de atividades predatórias. (BRASIL, 1964).
Por meio da reforma agrária e tendo como fundamento a função social da propriedade, admite-se a transferência da propriedade para um terceiro que tenha interesse em utilizar a área rural para torná-la produtiva e garantir a sua utilização em conformidade com os ditames legais.
Além da distribuição de áreas rurais, a reforma agrária prevista no Estatuto da Terra também determina a implementação de outras medidas de amparo aos proprietários rurais, que são denominadas de Políticas Agrícolas.
Conforme definição contida no parágrafo segundo do artigo 1º do Estatuto da Terra, políticas agrícolas são providencias adotadas pelo Poder Público para “orientar, no interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização do país” (BRASIL, 1964).
Assim sendo, o que se percebe é que o Poder Público tem como objetivo implementar a reforma agrária nas áreas rurais improdutivas a fim de possibilitar o desenvolvimento econômico do país através da utilização adequada das propriedades, enquanto reduz a desigualdade social resultado da má distribuição de terras.
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Da leitura dos dispositivos legais e constitucionais brasileiros resta inequívoco que a propriedade é um dos direitos fundamentais do ordenamento nacional, tanto que deve ser assegurada com a máxima proteção contra atos de terceiros e também do Poder Público, ressalvadas apenas as hipóteses em que a sua função social não é atendida.
Neste sentido, por possuir ampla relevância social e econômica, as propriedades rurais, aqui compreendidas como aquelas em que o domínio recai como um imóvel assim classificado, são essenciais ao desenvolvimento do agronegócio, uma das maiores fontes de renda e produção de riquezas no território nacional e devem atender as suas finalidades.
A produtividade das terras é um objetivo nacional, tanto que, não sendo atendida, poderá levar a uma série de implicações. Na legislação, a criação de uma Reforma Agrária dispõe uma série de medidas que promoverão a distribuição da terra em prol de um melhor uso das propriedades rurais.
Deste modo, em que pese a ampla proteção à propriedade, sendo ela rural e totalmente desvirtuada de sua função social de produtividade, preservação da natureza e do bem estar do proprietário e dos trabalhadores, poderá ser excepcionalmente objeto da intervenção estatal justificada, mediante justa indenização.
Dentre as formas de intervenção admitidas, a desapropriação se destaca, não apenas por seu caráter definitivo e irrevogável, mas também por ser um dos instrumentos utilizados pela reforma agrária.
Ante todo o exposto, compete ao proprietário o dever de manter a sua propriedade de acordo com o que dispõe a lei; enquanto que, é atribuição do Poder Público fiscalizar e desapropriar as terras que sejam improdutivas, promovendo a redistribuição em prol da reforma agrária e da redução da desigualdade social.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em: 01 fev. 2023.
BRASIL. Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4504.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%204.504%2C%20DE%2030%20DE%20NOVEMBRO%20DE%201964.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20o%20Estatuto%20da%20Terra%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.&text=Art.,e%20promo%C3%A7%C3%A3o%20da%20Pol%C3%ADtica%20Agr%C3%ADcola. >. Acesso em: 03 fev. 2023.
CUNHA, Belinda Pereira, MAIA, Fernando Joaquim Ferreira, coordenadores; Direito agrário ambiental. Nálbia Roberta Araujo da Costa, Iranice Muniz, Breno Marques de Mello, organizadores; Alex Jordan Soares Mamede ... [et al.]. – 1. ed. – Recife: EDUFRPE, 2016.
INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) Reforma Agrária. A Política. Publicado em 28/01/2020 e atualizado em 09/12/2022. Disponível em: <https://www.gov.br/incra/pt-br/assuntos/reforma-agraria/a-politica>. Acesso em: 15 fev. 2023.
NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 4: direito das coisas. – 7. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil : volume único . – 8. ed. rev, atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.
TIMOTEO, Bianca de Amorim. Modalidades de Intervenção do Estado na Propriedade Privada. Jusbrasil, 2016. Disponível em: <https://biancatimoteo.jusbrasil.com.br/artigos/342839664/modalidades-de-intervencao-do-estado-na-propriedade-privada>. Acesso em: 10 fev. 2023.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: reais. – 17. ed. – São Paulo: Atlas, 2017. (Coleção Direito Civil; 4).
Acadêmico do Curso de Direito da Universidade de Gurupi – UNIRG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIZZO, ERIVELTON. Propriedade rural: sob os institutos jurídicos do direito agrário e a reforma agrária no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 abr 2023, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61344/propriedade-rural-sob-os-institutos-jurdicos-do-direito-agrrio-e-a-reforma-agrria-no-brasil. Acesso em: 23 dez 2024.
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