ELOISA DA SILVA COSTA
(orientadora)
Resumo: Por certo, a relação de trabalho, assim como, as relações sociais do cotidiano, acabam por gerar conflitos entre os sujeitos, os quais necessitam de proteção no âmbito do direito. Sabe-se que existem limites para que os desentendimentos, não ofendam os direitos tutelados dos indivíduos, sendo um dos principais, os direitos de personalidade, responsáveis por proteger, em suma, a honra, imagem, liberdade e privacidade. Ante o exposto, diante de um conflito que extrapole o limite, atingindo o ânimo psíquico, moral e/ou intelectual do agente, é certo que haverá algum prejuízo, que neste sentido, não há como se mensurar, haja visto, que cada ser em seu íntimo será afetado de uma forma diferente. Caberá ao direito, a responsabilidade em regrar, como este dano será reparado. Na competência da Justiça do Trabalho, ora objeto de estudo, a reparação do dano extrapatrimonial, após a Reforma Trabalhista de 2017, trouxe parâmetros fixos quanto a quantificação dos valores devidos, os quais serão amplamente debatidos a seguir, a fim de concluir se a nova disposição é justa ou injusta, constitucional ou inconstitucional. Para tanto serão consultados sites eletrônicos e bibliográficos, bem como julgados sobre o referido tema, analisando todas as suas peculiaridades, com o intuito de apurar a constitucionalidade da norma.
Palavras-chave: Dano extrapatrimonial; Reforma trabalhista; Parâmetros; Indenizar.
Abstract: Certainly, the work relationship, as well as everyday social relationships, end up generating conflicts between subjects, who need protection under the law. It is known that there are limits so that misunderstandings do not offend the protected rights of individuals, one of the main ones being personality rights, responsible for protecting, in short, honor, image, freedom and privacy. In view of the above, in the face of a conflict that goes beyond the limit, reaching the psychic, moral and/or intellectual spirit of the agent, it is certain that there will be some damage, which in this sense, there is no way to measure it, given that each being in your intimate will be affected in a different way. It will be up to the law, the responsibility to rule, how this damage will be repaired. Within the competence of the Labor Court, now the object of study, the repair of off-balance sheet damage, after the 2017 Labor Reform, brought fixed parameters regarding the quantification of the amounts due, which will be widely discussed below, in order to conclude whether the new provision is fair or unfair, constitutional or unconstitutional. For this purpose, electronic and bibliographic sites will be consulted, as well as judgments on the aforementioned topic, analyzing all its peculiarities, with the aim of ascertaining the constitutionality of the norm.
Keywords: Off-balance sheet damage; Labor reform; Parameters; Indemnify.
Sumário: 1. Introdução. 2. Da relação de emprego. 3. Do dano moral/extrapatrimonial na justiça do trabalho. 4. Da reparação dos danos morais/extrapatrimoniais na justiça do trabalho. 5. Da forma de reparação pelos danos morais sofridos pelo empregado. 6. Das discussões quanto a constitucionalidade ou não do artigo 223-G, parágrafo primeiro da CLT. 7. Aplicabilidade dos parâmetros objetivos. 8. Conclusão e referências.
O dano moral, é decorrente da violação de um dos direitos de personalidade, reconhecidos na Constituição Federal Brasileira de 1988, com o objetivo de propiciar proteção à dignidade da pessoa humana, sendo, portanto, devido sempre que houver a prática de uma conduta atentatória a qualquer um deles.
Na esfera Civil, nasce o dever de indenizar e reparar o dano, ainda que moral, sempre que um sujeito mediante ação ou omissão, seja por negligência ou imprudência, praticar ato ilícito e ferir direito de outrem (artigo 186 Código Civil).
No mais, é possível que os danos morais sejam devidos nas mais variadas relações interpessoais, uma vez que, basta o convívio entre seres humanos, para que nasça mais cedo ou mais tarde, conflitos, seja de natureza moral ou material, que em decorrência dos prejuízos por estes causado, merecem reparação.
Logo no direito trabalhista não seria, pois, diferente, tendo em vista que neste a relação entre pessoas merece atenção ainda maior, já que os trabalhadores, nos termos da lei, são considerados hipossuficientes com relação a seus empregadores, fazendo-se necessário portanto, que de forma específica se definisse a configuração, caracterização e quantificação dos danos morais, para que a proteção a dignidade da pessoa humana fosse de fato alcançada.
A questão que merece ressalva é quanto a quantificação dos valores realmente devidos pelo causador do dano moral, já que este, diferentemente dos danos materiais não se medem pela extensão dos danos, com quantificação fixada em critérios objetivos, de outro modo, os danos morais são de ordem subjetiva e não possuem critérios de equivalência e preço, por isso determinar sua reparação exige maior atenção e cuidado.
A reforma trabalhista de 2017, introduzida pela Lei nº 13.467/2017, trouxe novas disposições acerca dos danos de natureza extrapatrimoniais, prevendo rol específico quanto aos direitos de personalidade que merecem reparação em caso de violação no âmbito das relações trabalhistas assim como uma gradação das condenações a serem fixadas pelo Juiz Trabalhista.
Nesse sentido, considerando que os danos morais dizem respeito a reparação de ordem pessoal, que leva em conta direitos de personalidade, os quais não possuem valor, propõe-se o presente trabalho com o intuito de avaliar os critérios trazidos pela Reforma trabalhista, de modo a determinar sua constitucionalidade ou não, levando em consideração todo o aparato legal e doutrinário que já existe em nosso ordenamento jurídico.
A princípio, o direito do trabalho é um ramo que se destina a disciplinar as relações de trabalho, mais especificamente aquelas que se fundam numa relação de subordinação.
Nesse sentido, considerando as regras gerais, pode-se dizer que nem toda atividade considerada como trabalho, é regida pelas normas gerais do direito do trabalho, sendo que apenas a relação de trabalho subordinada, também conhecida como relação de emprego, é que segue as regras gerais, logo, toda relação de emprego é uma relação de trabalho, mas nem toda relação de trabalho é uma relação de emprego,
Isto posto, temos que os sujeitos que integram a relação de emprego, são empregadores e empregados, seja na sua individualidade ou de forma coletiva, quando representados por órgãos e/ou entidades.
Nesse sentido, a relação de emprego, se constitui numa prestação de serviço humana, realizada por uma pessoa física, a outrem, de forma pessoal, habitual, onerosa e subordinada.
Os requisitos mencionados estão elencados no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):
Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Nos termos da lei, a presença de ambos os requisitos constitui elementos essenciais à configuração da relação de emprego, sendo que a falta de qualquer um deles implica na existência tão somente de uma relação de trabalho.
Dessa forma, é imprescindível que o empregado, seja uma pessoa física, que de forma pessoal, preste serviços ao empregador, não sendo permitido a ele transferir sua tarefa a terceiros, dado o caráter infungível da prestação de serviços na relação de emprego.
Além disso, o serviço deve ser prestado com habitualidade, constituindo, pois, ato contínuo, que se prolonga no tempo.
O trabalho deve também ser realizado com subordinação, ou seja, o empregado deve exercer sua atividade com sujeição ao empregador, respondendo e executando suas ordens.
Por fim, para que se apresenta a relação de emprego é necessário também, que o empregado seja remunerado pela prestação de serviço, afinal ao se pôr à disposição do empregador, ele vende sua mão de obra, nascendo assim o dever de ser remunerado por quem o contrata. Desse modo, não pode existir uma relação de emprego se não houver uma onerosidade, uma remuneração financeira paga ao empregado.
No mais, enquanto de um lado da relação de emprego temos o trabalhador, do outro temos o empregador, definido no artigo 2º da CLT:
Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assinala e dirige a prestação pessoal de serviço.
Tendo em vista o foco do presente trabalho, o conceito de empregador trazido pelo artigo supra, dispensa maiores definições no momento.
Uma vez presentes todos os requisitos, tanto para a caracterização de empregado como empregador, apresentam-se constituída a relação de emprego, da qual decorrem direitos e deveres recíprocas entre as partes nela envolvidas.
3.DO DANO MORAL/EXTRAPATRIMONIAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO
O dano moral, ou dano extrapatrimonial, na Justiça do Trabalho é conceituado como a violação dos direitos juridicamente tutelados pelo ordenamento brasileiro, denominados de direitos da personalidade, que ferem diretamente à honra, imagem, liberdade, privacidade, assim como outros estipulados no Artigo 5º da Constituição Federal (CF), nos incisos V e X.
Os primeiros registros, do que atualmente é conhecido por danos morais, surgiu com o Código de Ur-Mammu, em meados dos anos 2140 e 2040 A.C, na Suméria, o qual previa penas de cunho pecuniário, para aqueles que causarem danos a outrem.
Em seguida, com os avanços da sociedade, por volta de 1.700 A.C, criou-se o Código de Hamurabi, famoso pela frase “olho por olho, dente por dente”, significando que, o dano causado deveria ser devolvido na mesma proporção por aquele que foi lesado.
Na índia, em meados do século II A.C, o Código de Manu, vigente naquela época, também previa a reparação dos danos morais, bem como no direito romano, onde pode-se citar a Lei das XII Tábuas, que seguiu o mesmo preceito do Código de Manu, atribuindo punições pecuniárias aos causadores dos danos.
Analisando o surgimento dos danos morais no ordenamento jurídico brasileiro, é possível saber que seu primeiro aparecimento foi nas Ordenações Filipinas, quando da criação de um conjunto de regras, que dispunha inclusive que o homem que dormisse com uma mulher virgem, não vindo posteriormente a com ela se casar, teria o dever de pagar o dote para o futuro casamento dela.
Aproximando-se mais do atual conceito, em 1980, com o Código Penal Brasileiro, se estabeleceu a recompensa financeira para os indivíduos lesados em sua honra.
Logo após, o Código Civil Brasileiro de 1916, regrou para algumas situações a possibilidade de reparação de danos, contudo, ainda de forma bem genérica, e a depender da análise do juiz caso a caso.
Somente com a promulgação da Constituição de 1988 é que se foi possível concretizar a aplicação de danos morais, sendo o Artigo 5º, responsável por embasar juridicamente os pedidos judiciais a respeito do tema.
É o que preleciona o Artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal:
(...)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(...)
No mais, o reforço a esta disposição, surgiu em 2002, com o Código Civil, reafirmando e tirando qualquer dúvida quanto ao dever de indenizar e reparar o dano causado, ainda que exclusivamente moral.
Nos dias de hoje, prevalece a disposição trazida desde a Constituição Federal, devidamente regulamentada pelo Código Civil, de modo que quanto ao quantum a ser pedido, a regra, estabelecida pela CC/2002, é que se meça a indenização pela extensão do dano causado, avaliando o magistrado cada caso com suas particularidades.
Os artigos 186 e 927 do Código Civil, são responsáveis por tipificar a conduta que acarreta a obrigação de indenizar. A propósito, diz nestes termos o artigo 186 “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Complementa o artigo 927 “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Deste modo, é necessária a compreensão de que para se haver a reparação, é preciso a existência de um ato ilícito, e este ato, encontra-se descrito como sendo a ação ou omissão, cometida com culpa, que viola direito alheio, ainda que exclusivamente de ordem moral. Eis a máxima principal, via de regra, o primeiro preceito a ser seguido quando se trata deste assunto.
Importante salientar de outro modo, que em alguns casos, independentemente de o agente ter agido ou não com culpa, estará obrigado a indenizar.
Contudo, ao tratarmos dos danos morais na seara do direito do trabalho, assunto esse objetivado por este artigo, é de grande relevância mencionar as mudanças trazidas pela Reforma Trabalhista, em 2017.
De pronto, a alteração na nomenclatura “danos morais” para “danos extrapatrimoniais”, o que permitiu a aplicação nas relações de emprego, quanto a diretrizes e disposições da CLT, não muito distantes das regras gerais.
Além disso, com o advento da Lei nº 13.467/2017, instituiu-se na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, o título II-A, que trata particularmente do Dano Extrapatrimonial, anteriormente tratado como Dano Moral. Sinteticamente, os artigos pertencentes se referem aos prejuízos imateriais decorrentes da relação de emprego, além da responsabilização do agente que causou a lesão, e da classificação e valoração do dano extrapatrimonial.
Insta salientar que no âmbito dos danos extrapatrimoniais, estão abrangidos os danos decorrentes da relação de trabalho, conforme cita o artigo 223-A, da CLT, in verbis “Aplicam-se à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas os dispositivos deste Título.”.
Conceitua a primeira parte do Artigo 223-B, que toda ação ou omissão que cause prejuízos na esfera moral ou existencial decorrentes da relação de emprego é dano extrapatrimonial. Já no tocante, aos sujeitos passivos, aqueles que sofrem a ação, preceitua a segunda parte do artigo 223-B, da CLT, que abrange tanto as pessoas físicas, como as pessoas jurídicas.
Visto isso, o artigo seguinte, 223-C, da CLT, trata especificamente dos direitos tutelados quanto da proteção aos danos extrapatrimoniais pertinentes à pessoa física, sendo eles: a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física.
Desse modo, o dano extrapatrimonial, pode ficar configurado por um ato ilícito que acarrete situações degradantes, como por exemplo o empregador exigir que o empregado trabalhe em condições desumanas, ou em jornadas excessivas, o humilhando perante os demais, e desrespeitando os direitos básicos inerentes à sua pessoa.
Acertadamente é possível dividir o dano extrapatrimonial em duas espécies. Primeiramente os de cunho pessoal, sendo aqueles que ferem a integridade física do empregado, levando em consideração as dores físicas no sistema orgânico da pessoa, que possivelmente poderão ser cumulados com danos materiais, e segundamente, os de seara moral, pertinentes as dores psicológicas do agente, cumulados com danos estéticos e existenciais, a depender da situação concreta.
Trataremos de forma mais aprofundada sobre algumas hipóteses causadoras do dano extrapatrimonial decorrente da relação de emprego, a iniciar, pelo ato lesivo a honra e boa fama, o qual atinge diretamente o cunho pessoal da vítima, desestabilizando o seu psíquico quanto a si mesmo, e o descredibilizando perante a sociedade, como por exemplo, apelidos humilhantes atribuídos pelo empregador ao empregado.
O assédio sexual é outro ato lesivo tanto a honra, quanto a privacidade, autoestima, sexualidade e dignidade, haja vista que descaradamente o assediado tem sua esfera psicológica atingida, por condutas de cunho sexual praticadas pelo assediador. A título de exemplo, alguns empregadores utilizam-se de sua posição hierárquica superior para satisfazer sua lascívia, ameaçando que a negativa do empregado resultará em prejuízos.
Em outra toada, tem-se o assédio moral, ou seja, aquele em que o empregador se utiliza de reiteradas ofensas morais a pessoa do empregado, sendo passível de reparação extrapatrimonial. Por exemplo, os castigos vexatórios, aplicados ao empregado que não cumpriu uma meta pré-determinada naquele mês.
Ainda, podemos citar as práticas abusivas do poder diretivo, aquelas em que o empregador se utiliza desse poder para discriminar o empregado perante os demais, desrespeitando direitos inerentes, como por exemplo, controlar o tempo gasto nos sanitários, realizar revistas íntimas e corporais, dispensar em razão da etnia, entre tantas outras condutas infringentes.
É certo que as situações passíveis de causar reparação a danos extrapatrimoniais são diversas, e não cabem dentro de um rol taxativo. Contudo, devem ser alocadas dentro dos direitos tutelados pelo artigo 223-E e 223-D, além de essencialmente decorrerem da relação de trabalho.
Em suma, pode-se dizer que para a existência do direito à reparação do dano extrapatrimonial devem existir como requisitos essenciais, a ocorrência do dano e o seu nexo causal com a relação de emprego, bem como a demonstração de culpa do agente, para a sua referida responsabilidade subjetiva.
4.DA REPARAÇÃO DOS DANOS MORAIS/EXTRAPATRIMONIAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO
A Constituição Federal do Brasil de 1988, dispõe ser direito fundamental e social o direito ao trabalho, e segue além, ao dar integral proteção ao exercício dele.
O artigo 7º, desta Carta Magna, é totalmente dedicado a sustentar as principais direitos e princípios norteadoras da relação de trabalho, assegurando igualdade de condições e garantias mínimas em prol dos direitos fundamentais dos indivíduos, os quais se estendem sem qualquer distinção e/ou discriminação as relações de emprego.
É certo que o empregado e o empregador não se encontram em um mesmo patamar de igualdade econômica, motivo esse, do Artigo 7º, da CF, surgiram ainda a Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT, e os diversos princípios que regem essa relação, visando suprir a carência do empregado, o protegendo de possíveis abusos.
O Princípio do Valor Social do Trabalho, é um dos fundamentos do Estado Democrático, traduz, em suma, que o trabalho é a base para o sustento de todos os outros direitos, é de onde provém o sustento da pessoa humana, para a vida em sociedade, além de ser correlacionado com o princípio da dignidade da pessoa humana, visto que, é pela valorização do trabalho em que se encontra assegurada a existência digna da pessoa.
No tocante, a todo o exposto acima, certamente a reparação do dano extrapatrimonial, assunto deste trabalho, é um dos direitos amparados pelo Estado ao empregado.
É certo se dizer, como cita Bonfim, que é dano extrapatrimonial, o qual atinge a esfera moral do empregado, qualquer situação que se dê mediante a relação de trabalho, diminuindo a imagem, capacidade ou que impeça a sua ocupação, veja:
O maior patrimônio ideal do trabalhador é a sua capacidade laborativa, que deriva da reputação conquistada no mercado, do profissionalismo, da dedicação, da produção, da assiduidade, da capacidade etc. Nesta linha de raciocínio, é de se considerar ato lesivo à moral do empregado todo aquele que afete o indivíduo para a vida profissional, insultando, de forma leviana, a imagem profissional do empregado, impedindo sua ocupação profissional no mercado etc. (BONFIM, 2014, p.953).
Logo, o que se verifica é que não há incertezas quando do dever de reparação pelos danos morais suportados pelo empregado em decorrência de sua relação de emprego para com o empregador, de outro modo, o que se discute na doutrina e jurisprudência é mais especificamente quanto ao valor devido em forma de indenização, tendo em vista as mudanças ocorridas na legislação trabalhista sobre tal ponto.
5.DA FORMA DE REPARAÇÃO PELOS DANOS MORAIS SOFRIDOS PELO EMPREGADO
A grande novidade agregada com a Reforma Trabalhista, foi a quantificação, ou melhor, a “tarifação” da reparação dos danos morais, que passaram a ser chamados de extrapatrimoniais no contexto do trabalho, quando se dá pela relação de emprego. Em suma, foi criada uma tabela em que vincula o último valor pecuniário percebido a título de salário pelo ofendido, multiplicado pelo grau de ofensa do dano, dividido em leve, média, grave e gravíssima.
Aprofundando-se mais, o artigo 223-G, dispõe sobre os critérios que o juiz analisará, utilizando-se de sua discricionariedade, ao apreciar o pedido de reparação de dano extrapatrimonial, a fim de definir o grau da lesão sofrida, in verbis:
Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:
I - a natureza do bem jurídico tutelado;
II - a intensidade do sofrimento ou da humilhação;
III - a possibilidade de superação física ou psicológica;
IV - os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;
V - a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;
VI - as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;
VII - o grau de dolo ou culpa;
VIII - a ocorrência de retratação espontânea;
IX - o esforço efetivo para minimizar a ofensa;
X - o perdão, tácito ou expresso;
XI - a situação social e econômica das partes envolvidas;
XII - o grau de publicidade da ofensa.
Cumulado com a primeira parte do Artigo 223-G, e definido o grau da lesão, para o arbitramento do dano extrapatrimonial a ser reparado, o juiz seguirá o determinado no parágrafo primeiro, do referido artigo, in verbis:
§ 1o Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação:
I - ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;
II - ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;
III - ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;
IV - ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.
A esse parágrafo supracitado é que se deu o nome de “tarifação” ou “tabelamento” dos danos extrapatrimoniais, surgindo-se a grande dúvida sobre sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade, uma vez que, seguindo o nele disposto, pessoas percebendo salários distintos, caso sofram o mesmo tipo de dano, não serão reparadas da mesma forma, já que o valor devido a título de reparação se mede, não só pela extensão do dano, mas também pela remuneração do ofendido.
Veja, se em um caso hipotético, a faxineira da empresa percebendo a época dos fatos um salário de R$1.500,00, e a secretária pertencente ao mesmo empregador, perceba o valor de R$3.000,00, sofrem do gerente, assédio moral nas mesmas condições, ao ingressarem na Justiça do Trabalho, ao final de seus processos, a reparação do dano sofrido será desigual, baseado no fato que a secretaria por receber salário mais elevado, será assim recompensada com indenização mais valorosa.
Esse exemplo, mostra de forma simples, que por esse tabelamento presente na Justiça do Trabalho, não está conservando o princípio da igualdade, pelo contrário está evidenciando a desigualdade entre os mais favorecidos perante os menos favorecidos, ignorando a isonomia que tanto se busca no direito, regida pelo Artigo 5º da CF, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
6.DAS DISCUSSÕES QUANTO A CONSTITUCIONALIDADE OU NÃO DO ARTIGO 223-G, PARÁGRAFO PRIMEIRO DA CLT
Desde a edição da reforma trabalhista (Lei 13.467/17), momento em que passou a vigorar os parâmetros do artigo 223-G, parágrafo primeiro da CLT, inúmeras são as discussões acerca de sua constitucionalidade ou não, bem como, se sua aplicação consagrava de fato os princípios objetivos do direito do trabalho.
Existem ações diretas de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, ajuizadas pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho — Anamatra (ADI 6.050 e 5.870); pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria — CNTI (ADI 6.082); e pelo Conselho Federal da OAB (ADI 6.069), ambas questionando a constitucionalidade do referido artigo, que promoveu a tarifação dos danos morais.
Em sessão realizada no dia 27/10/2021, o Ministro Relator Gilmar Mendes votou no sentido de conhecer das ADIs e, no mérito, julgar parcialmente procedentes os pedidos nela formulados, estabelecendo que:
”As redações conferidas aos art. 223-A e 223-B, da CLT, não excluem o direito à reparação por dano moral indireto ou dano em ricochete no âmbito das relações de trabalho, a ser apreciado nos termos da legislação civil; 2) Os critérios de quantificação de reparação por dano extrapatrimonial previstos no art. 223-G, caput e § 1º, da CLT deverão ser observados pelo julgador como critérios orientativos de fundamentação da decisão judicial. É constitucional, porém, o arbitramento judicial do dano em valores superiores aos limites máximos dispostos nos incisos I a IV do § 1º do art. 223-G, quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade”.
Na referida sessão, após o voto do Ministro Relator, o julgamento foi suspenso em razão do pedido de vista dos autos formulado pelo Ministro Nunes Marques, estando, até a publicação do presente artigo, pendente de solução.
O julgamento das referidas ações é de enorme relevância para o mundo jurídico, tendo em vista que a princípio o que entende muitos doutrinadores é que a vigência da referida norma fere a dignidade da pessoa humana e o princípio da isonomia, já que colocar parâmetros para a quantificação e reparação dos danos morais, seria o mesmo que padronizar a dor e o sofrimento humano.
Nesse sentido, Carlos Leite, ao proferir seu voto diante da composição da sumula n. 48, do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região, afirma ainda que não se pode taxar a reparação de danos morais, já que cabe ao Magistrado diante do caso concreto, analisar todas as circunstâncias e fixar o quantum que melhor ampare os envolvidos, vejamos:
“O novo art. 223-G da CLT revela a intenção do legislador ao impor verdadeira capitis diminutio na competência dos magistrados do trabalho em fixar o valor dos danos morais. Além disso, o dispositivo em causa é flagrantemente inconstitucional, porquanto a fixação do dano moral é tipicamente um julgamento por equidade e com equidade, ou seja, o magistrado deve adotar a técnica da ponderação com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (LEITE, 2018, p.63)
Do mesmo modo, Jorge Neto e Cavalcante, consagram que “Seguramente, não se pode admitir o “tabelamento” (“tarifação”) dos danos morais pela lei, cabe ao magistrado fixar a indenização considerando o caso concreto”. (NETO; CAVALCANTE, 2019. P.685)
Tal norma, garante por um lado, a segurança jurídica, principalmente para o empregador, que arcará com valores semelhantes a depender do dano, já que a lei, impõe condições específicas que determinam o valor devido a título de reparação, de outro lado, porém, temos o empregado, que agora se encontra desprotegido juridicamente, afinal não nos parece certo considerar que o dano seja reparado considerando apenas seu salário.
Em síntese o que se observa é que majoritariamente doutrinadores e juristas são contra a tarifação dos danos morais, pois acreditam que isso fere diretamente princípios básicos previstos já na Constituição Federal. No mais, aguarde-se o resultado do julgamento das citadas ações diretas de inconstitucionalidade para que então o entendimento seja pacificado.
7.APLICABILIDADE DOS PARÂMETROS OBJETIVOS
De modo geral na pratica o que tem ocorrido, é que o disposto no artigo 223-G da CLT, não tem sido aplicado no julgamento das ações trabalhistas que versam sobre pedidos de reparação de danos extrapatrimoniais sofridos pelos empregados.
A verdade é que, como já exposto, grande parte dos Magistrados, acreditam, ao menos em parte, que a tarifação dos danos morais é inconstitucional, de modo que a quantificação dos danos morais se faz muito mais justa quando considerando o caso concreto em todas as suas faces.
Corroborando com a inconstitucionalidade do artigo 223-G da CLT, segue trecho de sentença proferida pelo juiz do trabalho da 1ª Vara do Trabalho de Araraquara – SP:
“Declaro a inconstitucionalidade do artigo 223-G, § 1º, da CLT, incluído pela Lei 13.467/2017 para afastar a previsão legal do tabelamento do dano extrapatrimonial com base no salário do trabalhador. A previsão legal macula direitos fundamentais assegurados constitucionalmente, contrariando os princípios da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade e razoabilidade, além da reparação integral de cada caso concreto, como exigem os artigos 1º, III e IV, e artigo 5º, V, da Constituição Federal. A condenação em reparação pelos danos morais tem amparo no artigo 1º da Constituição da Federal e nos princípios constitucionais da valoração do trabalho e da dignidade humana. O estabelecimento de tarifa para a reparação de danos é claramente inconstitucional, por afrontar os artigos 1º, III; 3º, IV; 5º, caput e incisos V e X e caput do artigo 7º da CR/88. O art. 223-G, da CLT, prevê tratamento discriminatório e de menor proteção ao trabalhador em relação aos demais membros da sociedade quanto às reparações por danos extrapatrimoniais, já que em relação a estes se aplicam as regras do Código Civil que são mais amplas, sem estabelecimento de tarifas para a reparação e se encontram em consonância com a CF/88 e seus princípios da proteção integral. Restringir o valor da reparação pela dor do trabalhador constitui inegável discriminação. O que o texto da reforma trabalhista faz é alterar, reduzir e discriminar o trabalhador, dizendo que existe uma dignidade da pessoa humana que vale mais do que a dignidade da pessoa humana "trabalhador", o que não se coaduna com os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e do trabalho como fator de valorização do ser humano. Ressalte-se que a declaração de inconstitucionalidade de lei pelo magistrado de primeira instância é válida e é exceção à cláusula de reserva de plenário, conforme súmula vinculante 10 do STF a contrário senso. O "quantum" indenizatório, para sua fixação, deverá observar a extensão e a gravidade do dano, assim como a capacidade econômica do ofensor e do ofendido. Além disso, o seu montante deverá ser apto a punir o causador do dano, a desestimular a repetição do ato lesivo (caráter pedagógico), e, ainda, a compensar a dor, o dissabor, da vítima, sem, contudo, causar-lhe enriquecimento indevido, devendo se ater à compensação dos danos experimentados na esfera extrapatrimonial da vítima, evitando-se, assim, o crescimento indiscriminado de demandas que representam aventuras judiciais sem o corresponde arrimo legal. Diante da necessidade de se estabelecer o valor da indenização devida e atentando para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a condição sócio-econômica das partes envolvidas, a gravidade e a extensão do dano fixo a indenização pelos danos morais em R$300.000,00 (trezentos mil reais) cuja atualização deverá seguir os parâmetros estabelecidos pela súmula 439 do C. TST”.
Na sentença, o douto magistrado entendeu pela inconstitucionalidade da previsão legal, por entender que esta macula direitos fundamentais constitucionalmente previstos além de contrariar os princípios da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade e razoabilidade, entendendo que restringir o valor da reparação pela dor do trabalhador constitui inegável discriminação.
Essa toada acaba por fixar os danos morais considerando um conjunto de fatores, atentando para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a condição socioeconômica das partes envolvidas, a gravidade e a extensão do dano.
Da mesma forma, em julgamento de recurso ordinário a 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho, decidiu pelo cabimento de indenização por danos morais, o qual deveria obedecer a critérios de prudência e equilíbrio para sua fixação:
RECURSO DO RECLAMADO. DESCONHECIMENTO DOS FATOS PELO PREPOSTO. CONFISSÃO FICTA. DANOS MORAIS. TRANSPORTE DE VALORES. Provado pelo autor que, no exercício de sua função, transportava valores, por imposição do empregador, e sem a habilitação para essa atividade, a qual deve ser desempenhada por profissional especializado, devida a indenização por danos morais. Recurso do Reclamante conhecido e parcialmente provido. INDENIZAÇÃO DANO MORAL. ASSÉDIO MORALTRANSPORTE DE VALORES. QUANTUM INDENIZATÓRIO. no que concerne ao valor cabível a título de danos morais por transporte de valores, entende-se que este deve obedecer a critérios de prudência e equilíbrio, sem constituir acréscimo patrimonial, atentando-se ainda ao caráter inibitório da indenização. no caso em apreço, a reclamada é instituição financeira de grande porte, um dos maiores bancos do país, desta forma, entende-se por razoável o quantum fixado pela instância primária, no importe de R$ 15.000,00, vez que suficiente para desestimular a prática do ato ilícito pela reclamada, além de estar em consonância com outras decisões deste órgão colegiado em casos análogos. Recurso do Reclamante conhecido e parcialmente provido. (TRT-11 - RO: 00019081720175110018, Relator: ORMY DA CONCEICAO DIAS BENTES, Data de Julgamento: 11/10/2018, 3ª Turma, Data de Publicação: 17/10/2018)
Mais uma vez o que ocorre é a fixação dos danos morais levando em conta muito mais que parâmetros meramente legais, mas considerando também a razoabilidade, proporcionalidade e o equilíbrio entre o dano causado, os prejuízos efetivamente sofridos bem como observando o caráter inibitório da indenização.
Claramente o que se vê é que apesar da existência do artigo 223-G da CLT, sua aplicação tem ficado de lado, já que os magistrados de todo o Brasil tem optado pela definição do “quantum” devido a título de danos morais considerando, não só gravidade do dano, ou a remuneração do empregado vítima da ofensa, mas também a aplicabilidade de fatores peculiares ligados ao caso concreto, como a extensão do dano, a capacidade financeira do empregador, além de priorizar a igualdade de tratamento e a não discriminação entre empregados.
O presente artigo visou fazer uma análise a respeito dos danos extrapatrimoniais, em suma, a violação dos direitos de personalidade dentro da relação de trabalho, alterado recentemente pela Lei nº 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista, que acrescentou artigos na Consolidação das Leis Trabalhistas, com intuito de regulamentar o referido tema, anteriormente conhecido em todas as searas do direito, como dano moral.
Durante as pesquisas realizadas foi possível pontuar com precisão as principais mudanças trazidas pela reforma, na qual o legislador tinha como principal preocupação proteger, de forma especial o empregado, pessoa considerada hipossuficiente, por não estar em patamar de igualdade econômica com o empregador.
Contudo, a grande polêmica da reforma foi quanto da aplicabilidade do artigo 223-G, da Consolidação das Leis Trabalhistas, que em seu parágrafo 1º, e incisos seguintes, regrou como base de cálculo para a reparação do dano, o último salário contratual do empregado/ofendido, popularmente no meio jurídico, conhecido como “tarifação” ou “tabelamento” dos danos extrapatrimoniais.
Veja bem, se em uma mesma empresa, dois empregados sofrerem o mesmo dano extrapatrimonial, mas que percebem salários diferentes, o juiz ao julgar e condenar a reparação dos danos, nos moldes do referido artigo, não estará seguindo o princípio da igualdade, mas estará evidenciando a desigualdade entre eles, baseado na condição econômica.
Em face disso, é que o presente artigo apresentou algumas decisões recentes e concretas de alguns aplicadores da lei, além de posicionamentos de doutrinadores, favoráveis à inconstitucionalidade da aplicabilidade do artigo supracitado, que acreditam ferir princípios básicos previstos na Constituição Federal.
Acerca do tema, ainda não há um posicionamento firmado a respeito da constitucionalidade ou inconstitucionalidade até o encerramento deste artigo. Contudo, em vista dos argumentos expostos, considera-se ser inaplicável esses parâmetros aos casos concretos, em razão de grave violação à Constituição Federal, e ainda, em razão de não atingir o principal objetivo da norma, qual seja, o de proteger o empregado.
Em suma de todo o exposto, acredita-se que a reforma trazida pela Lei nº 13.467/2017, foi de grande importância na seara trabalhista, mas que acima disso, houve uma inconstitucionalidade quanto ao artigo 223-G, no tocante a sua aplicabilidade, a qual deve ser revisada pelos legisladores, com intuito de não acarretar ao ofendido maiores danos e desigualdades.
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Graduando em Direito pela Universidade Brasil
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Ailton José dos. Os danos morais no direito do trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jul 2023, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61919/os-danos-morais-no-direito-do-trabalho. Acesso em: 23 dez 2024.
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