MARIZA FÁTIMA GONÇALVES[1]
KARINE DOS SANTOS WIEDERKEHR[2]
(coautores)
RESUMO: Este trabalho aborda a questão do acesso ao tratamento médico para pacientes com leucemia mieloide aguda em uma rede de saúde não referenciada ao seu plano de saúde. A relevância dessa temática está relacionada a necessidade de garantir o acesso ao tratamento para esses pacientes, que muitas vezes enfrentam dificuldades para obter o tratamento adequado. O objetivo é discutir aspectos orientadores que possam garantir a continuidade do tratamento médico para pacientes com leucemia mieloide aguda em uma rede de saúde não referenciada. A metodologia utilizada consistiu em revisão bibliográfica realizada a partir da análise de artigos científicos, livros e outras fontes relevantes sobre o tema. Os resultados mostram que é possível garantir o acesso ao tratamento médico para pacientes com leucemia mieloide aguda em uma rede de saúde não referenciada, mas que há desafios a serem superados. Entre eles estão a falta de informação sobre os direitos dos pacientes, a falta de fiscalização e a má administração dos recursos que financiam o sistema de saúde. Portanto, é necessário fortalecer a rede de saúde, garantir o cumprimento dos direitos dos pacientes e promover maior conscientização sobre a importância do acesso ao tratamento médico para pacientes com leucemia mieloide aguda em uma rede de saúde não referenciada.
PALAVRAS-CHAVES: Leucemia mieloide aguda. Continuidade do tratamento. Rede de saúde não referenciada. Direitos dos pacientes. Acesso ao tratamento médico.
ABSTRACT: This work addresses the issue of access to medical treatment for patients with acute myeloid leukemia in a non-referenced healthcare assurance network. The relevance of this topic is linked to the imperative need to ensure access to appropriate treatment for these patients, who often encounter difficulties in obtaining the necessary medical care. The objective is to discuss guiding aspects that can ensure the continuity of medical treatment for patients with acute myeloid leukemia in a non-referenced healthcare network. The methodology employed involved a bibliographic review based on the analysis of scientific articles, books, and other relevant sources on the subject. The results demonstrate that it is feasible to guarantee access to medical treatment for patients with acute myeloid leukemia in a non-referenced healthcare network, but there are challenges to be overcome. These challenges include lack of information about patient rights, inadequate supervision, and mismanagement of resources funding the healthcare system. Therefore, it is imperative to strengthen the healthcare network, ensure compliance with patient rights, and promote greater awareness of the importance of access to medical treatment for patients with acute myeloid leukemia in a non-referenced healthcare network.
KEYWORDS: Acute Myeloid Leukemia. Treatment Continuity. Non-referenced Healthcare Network. Patient Rights. Access to Medical Treatment.
INTRODUÇÃO
Por tudo aquilo que conhecemos de mundo, até hoje não se conheceu outro animal que tenha evoluído tanto ao ponto de prolongar sua vida além dos seres humanos.
A teoria evolucionista de Charles Darwin traz a premissa de que os animais que não se adaptam às condições do local onde vivem tendem a desaparecer. E no que diz respeito a esta adaptação, a sobrevivência da vida humana atualmente é desafiada pelas neoplasias, popularmente conhecida como câncer, que seja por circunstâncias hereditárias, sociológicas ou habituais acarretam a mutação das células humanas, que passam a desempenhar suas funções de forma equivocada, e caso não se obtenha êxito no seu tratamento, causam a morte do paciente.
Em 2023, com a evolução da medicina, o diagnóstico de uma neoplasia não representa mais a morte do paciente, todavia além de trazer inquietações de ordem psíquica e emocional à família, leva a uma corrida contra o tempo, na qual quanto mais cedo o diagnóstico e o início do tratamento, maiores são as chances de sua cura.
Embora o Brasil tenha um sistema de saúde universal, que ressalvadas as queixas quanto a má administração dos recursos que o financia, ainda é o grande responsável pelo tratamento de muitos brasileiros doentes, o foco desta discussão científica é a saúde suplementar, privada, cuja atividade é autorizada às operadoras de plano e seguros de saúde pelo artigo 199 da Constituição Federal, regulamentada pela Lei n. 9656/98 e fiscalizada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS.
Neste contexto, o artigo 1º da Lei 9656/98 afirma que os planos e seguros de saúde submetem-se ao Código de Defesa do Consumidor, submissão esta que fortalece a garantia dos direitos nela regulamentados, por compreender que o consumidor é vulnerável no mercado de consumo, principalmente aqueles hipervulnerabilizados pelas doenças que lhe acometem, diminuindo ao máximo a precarização de garantias e enrijecendo seu compromisso com a vida daqueles lhe confiaram a certeza de que teriam atendimento médico de qualidade em caso de necessidade.
Todavia essa confiança é diariamente quebrada frente ao tratamento cada vez mais restritivo que os planos de saúde têm dado à atuação médica, com a corriqueira negativa de cobertura de tratamento, mesmo nas hipóteses de cobertura obrigatória pelo rol de eventos em saúde da ANS.
Este trabalho propõe uma discussão quanto ao direito do paciente de leucemia mieloide aguda, pós transplante de medula óssea, a ter o direito a continuidade de seu tratamento, quando a rede referenciada vinculada ao seu contrato de plano de saúde já não dispõe de protocolos, recursos e profissionais aptos à continuidade de seu tratamento.
1. DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E O DIÁLOGO DAS FONTES.
A Biomédica Drielly Fernandes da Silva, em seu artigo científico Leucemia Mielóide Aguda, publicado perante a Academia de Ciência e Tecnologia, descreve a Leucemia Mielóide aguda como sendo:
“uma doença caracterizada pela expansão clonal, heterogênea e progressiva do tecido hematopoiético, causada pela alteração da célula-tronco, que provoca proliferação anormal de células progenitoras da linhagem mielóide, associada à perda da capacidade de diferenciação, ocasionando produção insuficiente de células sanguíneas maduras normais, com consequente substituição do tecido normal. Desse modo ocorre o predomínio de células imaturas na medula óssea (mieloblastos) podendo apresentar de formas indiferenciadas ou parcialmente diferenciadas, podendo invadir ou não a circulação periférica. Devido a essa proliferação intensa das células leucêmicas na medula óssea o tecido hematopoiético normal remanescente passa a ser substituído por várias células leucêmicas [...]. A LMA é uma neoplasia fatal quando não tratada é a morte geralmente é consequência da pancitopenia (anemia, sangramento ou infecção decorrente de resposta imune eficaz), resultante da substituição da medula óssea por mieloblastos[3]”.
O seu diagnóstico se dá através do exame de imunofenotipagem, que analisa a linhagem celular e a maturação das células nas neoplasias hematológicas. A confirmação da leucemia mieloide aguda acontece quando o resultado do exame apresenta percentual de células blastos 20% (vinte por cento) superior aos índices de referência. Confirmado o diagnóstico de leucemia mieloide aguda, seu tratamento em primeiro plano se dá através de quimioterapia e transplante de medula óssea.
Quando o portador de leucemia mielóide aguda detém um contrato de prestação de serviços de saúde, com uma operadora ou seguradora de planos de saúde, seu tratamento está adstrito a uma rede pré estabelecida de profissionais e hospitais previamente conveniados, e o tratamento geralmente se inicia nesta rede de atendimento.
Embora as operadoras de plano de saúde tenham construído uma boa rede de atendimento aos seus clientes na região de abrangência de seu contrato, em alguns casos a especificidade da condição clínica do paciente exige que seu tratamento se dê fora de seu domicílio, nos moldes do artigo 5º da Resolução Normativa 566, da Agência Nacional de Saúde Suplementar, abaixo transcrita:
Art. 5º Na hipótese de inexistência de prestador, seja ele integrante ou não da rede assistencial, que ofereça o serviço ou procedimento demandado, no município pertencente à área geográfica de abrangência e à área de atuação do produto, a operadora deverá garantir atendimento em:
I - prestador integrante ou não da rede assistencial nos municípios limítrofes a este; ou
II - prestador integrante ou não da rede assistencial na região de saúde à qual faz parte o município.
§ 1º Na inexistência de prestadores nas hipóteses listadas nos incisos I e II deste artigo, a operadora deverá garantir o transporte do beneficiário até um prestador apto a realizar o devido atendimento, assim como seu retorno à localidade de origem, respeitados os prazos fixados no art. 3º.
Portanto, diante da necessidade do encaminhamento do paciente a tratamento fora do domicílio a ANS lhe garante o direito de receber tratamento seja com prestador integrante ou não da rede assistencial do plano de saúde, e, quando o tratamento se dá além dos municípios limítrofes ou à região de saúde da abrangência contratual, a operadora ainda é responsável pelo pagamento de transporte e hospedagem do consumidor.
Contudo, embora a resolução seja expressa quanto ao direito do consumidor neste aspecto, quando o quadro do paciente de leucemia mieloide aguda não evolui favoravelmente, e já não há mais prestador integrante da rede assistencial na área geográfica de abrangência do contrato para continuidade do seu tratamento, as operadoras de plano de saúde tendem a negar a cobertura do atendimento, em prejuízo ao restabelecimento da sua saúde, mesmo quando há indicação médica para continuidade do tratamento em local diverso, inclusive com prestador não conveniado.
E, diante desta negativa, como o consumidor deve agir? Quais são seus direitos e garantias?
Como dito anteriormente a relação entre operadora/seguradora de plano de saúde e consumidores configurada uma relação de consumo, e neste aspecto o artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor afirma que é direito básico do consumidor a informação adequada sobre os diferentes produtos e serviços.
Por conseguinte, conforme esclarecido por Andrade, “o inciso IV do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor institui a transparência e a boa-fé no fornecimento dos produtos e serviços, que, em raciocínio conjugado com o artigo 4º, caput, CDC, expandem a exigência da boa-fé aos agentes contratuais tanto nos aspectos pré-contratuais, como formação e execução dos contratos de consumo[4]”.
Ainda, sob o viés da literatura médica, entende-se que o paciente de leucemia mielóide aguda esta em situação de emergência médica porque a ausência de tratamento médico pode causa-lo lesões irreparáveis, e portanto a cobertura do seu atendimento deve ser obrigatória pela operadora de plano de saúde, em conformidade com o artigo 35-C da Lei 9.656/98:
Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos:
I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente;
II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional;
III - de planejamento familiar.
E no mesmo sentido, aqueles pacientes que por ventura tenham sido tratados com transplante de medula óssea também tem seu tratamento médico garantido, de forma obrigatória, em razão do artigo 20, §4º da resolução normativa 465 de 7 novembro de 2021 da Agência Nacional de Saúde Suplementar:
“Artigo 20, §4º: os exames e procedimentos pré e pós-transplantes, para fins das disposições da RN n. 259, de 17 de junho de 2011, são considerados procedimentos de urgência e emergência”.
Portanto, a negativa à cobertura contratual do tratamento médico solicitado pelo médico assistente configura defeito na prestação do serviço, a ser reparado pelo Poder Judiciário, nas hipóteses em que o consumidor contratou plano-referência de saúde, com cobertura médico-ambulatorial e hospitalar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas no rol de eventos em saúde da Agência de Saúde Suplementar - ANS.
Identificada a lesão ao consumidor, pertinente à negativa de autorização de procedimento prescrito por profissional responsável, O Código de Processo Civil afirma no artigo 19, I que o consumidor tem direito à declaração da modo de ser de uma relação jurídica, garantindo a ele a legitimidade de agir em desfavor da operadora de plano de saúde no campo jurídico.
Logo, a responsabilidade da operadora de plano de saúde emerge induvidosa, quando do exame dos elementos de formação do contrato e sua respectiva informação e expectativa objetiva, negou sua solicitação.
Não obstante, configurada a relação de consumo, cujas normas devem sempre ser interpretadas de forma mais benéfica ao consumidor, nos moldes da teoria do diálogo das fontes, estudada no Brasil pela Professora Cláudia Lima Marques, que em resumo afirma que diante de lesão ao direito do consumidor, as normas a serem aplicadas na solução de seu litígio não devem ser analisadas de modo isolado, mas em todo o seu conjunto, na medida que venha a trazer benefícios à satisfação do seu direito, e, o artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor, não se pode emitir julgamento restritivo, no sentido de tolher a autorização de atendimento médico, ambulatorial, de natureza terapêutica em caráter de urgência e emergência, quando a situação fática do consumidor foge à regra dos procedimentos administrativos, quando a legislação vigente no país, dentre elas, de natureza infra legal, buscam o cobertura contratual, de acordo com os interesses dos beneficiários de plano de saúde.
Nas palavras do professor Flávio Tartuce, “a teoria do diálogo das fontes surge para substituir e superar os critérios clássicos de solução das antinomias jurídicas (hierarquia, especialidade e cronologia). Realmente, esse será o seu papel no futuro[5]”.
Neste sentido, através desta teoria, afasta-se a aplicação do pacta sunt servanda aos contratos, buscando-se que sua execução esteja de acordo com seu fim social, tanto que a execução do contrato alheia à sua função social passa a ser ato ilícito, nos termos do artigo 187 do Código Civil: “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestadamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Desta forma, a negativa oferecida ao consumidor trata-se de abusividade contratual quando o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor, veda em seu inciso II, a recusa do atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos costumes.
Entretanto, é crucial abordar a hermenêutica do Código de Defesa do Consumidor (CDC) de maneira abrangente, considerando sua concepção global. Isso engloba a análise do artigo 51, que trata das nulidades automáticas devido a cláusulas abusivas. O referido artigo proíbe obrigações que prejudiquem excessivamente o consumidor, sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor e restrinjam direitos ou obrigações fundamentais relacionadas à natureza do contrato, ameaçando seu objeto ou equilíbrio contratual[6].
Faz-se necessário observar, também, o Princípios da Eticidade da formalização do contrato, que segundo Paula Ferraresi Santos, ele norteia toda a aplicação do Código Civil e do Princípio da Boa-fé dos contratantes, de origem consumerista, mas que também acabou sendo explicitado pelo Arts. 113 e 422 da legislação civil codificada, de aplicação não só para a execução do contrato como também para as fases pré e pós-contratual[7].
Partindo-se da premissa que caminhamos para uma interpretação extensiva das normas que regulamentam direitos e deveres de consumidores e operadoras de planos de saúde, quando estas trouxeram à realidade pátria a possibilidade de garantir a integralidade cobertura aos tratamentos médicos, sejam eles de caráter ordinário ou extraordinário (como é caso enfrentado pelo consumidor), sua intenção sempre foi sua proteção, garantindo aos beneficiários a manutenção de sua vida.
Caso o animus das próprias normas fosse de limitação do direito e acesso à saúde, em prejuízo à manutenção da vida do beneficiário do plano de saúde, estaríamos diante de uma violação constitucional em seu âmago, que merece imediata reação perante o Poder Judiciário.
Relacionando-se o fato com sua causa final, buscando o sentido e o alcance da norma, de forma mais benéfica ao consumidor hipossuficiente, em cumprimento, também, à teoria do diálogo das fontes, entende-se ser possível e de direito, que os consumidores que se encontrem nesta situação obtenham a concessão da providência judicial, garantindo a continuidade do tratamento médico em rede não credenciada.
2. DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
A dignidade da pessoa humana é fundamento da República Brasileira, e para garantir o pleno exercício desta dignidade o direito à vida tornou-se direito fundamental, conforme extrai-se do artigo 5º da Constituição Federal, norma esta que também é fundamento das relações entre consumidoras e operadoras de seguro/planos de saúde, por considerar que ninguém se submete à referida relação contratual se não tivesse interesse no restabelecimento de sua saúde, vindo a ser atendido pela sua rede profissional quando precisar.
Neste particular, conforme narrado no início do artigo, as operadoras de plano de saúde afirmam que suas negativas de atendimento têm previsão legal e contratual, todavia tanto a lei de regência, as normativas da ANS e a atual interpretação jurisprudencial do rol de procedimentos em saúde atestam que havendo previsão contratual para o tratamento da doença, o plano de saúde não tem direito de negar cobertura contratual à solicitação médica.
Com a comprovação do diagnóstico de leucemia mieloide aguda, o consumidor não pode ser privado do tratamento, pelo uso de subterfúgios inerentes à discussão jurídica do direito do consumidor, com intuito muitas vezes de protelar a cobertura contratual até que o quadro de saúde do consumidor agrave-se ou torne-se irreversível.
Conforme dito alhures, a negativa oferecida ao consumidor trata-se de defeito na prestação de serviço, colocando em risco a sua saúde do consumidor, e submete-o ao agravamento de seu quadro clínico, pela falta de continuidade de seu tratamento, no prazo estipulado pelo médico que lhe acompanha.
Dentro do direito do consumidor Rizzatto Nunes conceitua defeito e vício na prestação do produto e do serviço da seguinte forma:
“Defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa intrínseca ao serviço (ou ao produto), que cause um dano maior que simplesmente o mal funcionamento, o não funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago – já que o serviço (ou produto) não cumpriu o fim ao qual se destinava, etc. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material e/ou moral do consumidor[8]”.
Assim, por tratar-se de defeito na prestação do serviço, entende-se que a responsabilidade das operadoras de plano de saúde é objetiva, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, leia-se:
“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.
Ou seja, levando-se em consideração que toda responsabilidade civil advém de um liame obrigacional, quando o CDC afirma que há responsabilidade civil pelos danos causados, em interpretação reversa, é hialina a interpretação de que o plano de saúde está obrigado a autorizar e arcar com os custos da consulta médica e procedimentos necessários, previamente agendados, fora do âmbito territorial de cobertura.
Levando-se em consideração que o contrato firmado é instrumento privado que prevê direitos e deveres a ambos os contratantes, caso as operadoras de plano de saúde desejassem que seu conteúdo fizesse “lei entre as partes”, conforme aduz o princípio do pacta sunt servanda, deveriam oferecer alternativa aos consumidores no próprio instrumento contratual, quando seus conveniados se declaram inaptos para atender o paciente.
Disposições contratuais e estatutárias (nos casos das operadoras de plano de saúde de autogestão) que excluem a cobertura do tratamento prescrito pela equipe médica, que diagnosticou o consumidor, tratam-se de claro exemplo de quebra da boa-fé objetiva do contrato, pois, ao contratar um plano de saúde de natureza individual/familiar, coletiva ou coletiva por adesão, a primeira expectativa é de que o mesmo preveja cobertura de todos os eventos futuros que vier a necessitar, ou, no caso em questão, que seja autorizado os atos acessórios necessários à prestação do serviço, a ser realizada com profissional não conveniado.
Por esta razão, o artigo 51 do mesmo dispositivo de lei acima mencionado, continua manifestando que,
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
A conduta dos planos de saúde perante o consumidor mostra-se exagerada, iníqua e abusiva, quando tem-se a premissa que a natureza de sua prestação de serviço é justamente garantir o êxito no tratamento dos portadores de leucemia mieloide aguda, independentemente de onde o tratamento deva ser feito.
Desta forma, negar atendimento no momento em que consumidor corre risco e danos irreversíveis, sob o fundamento de um contrato de adesão, o consumidor também direito de requerer ao Poder Judiciário a nulidade de eventual cláusula contratual que vede o atendimento e tratamento fora da rede referenciada, restabelecendo o equilíbrio contratual, nesta relação de consumo.
A jurisprudência se manifesta no sentido da inaplicabilidade de cláusulas contratuais que venham a tolher os direitos dos consumidores em eventos futuros incertos e não sabidos, vejamos:
TJSP - EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL PLANO DE SAÚDE Ação julgada improcedente por entender que a ré não deve ser compelida a cobrir procedimento cirúrgico realizado por médico não credenciado Inadmissibilidade Honorários de médico não credenciado que serão custeados pelo autor. Não é dado à seguradora negar procedimento em razão do solicitante não pertencer à rede credenciada Inteligência do art. 2º, inciso VI da Resolução n. 8 do CONSU Recurso provido. (TJSP – Apelação Cível n. 0030359-94.2013.8.26.0577. Rel. Des. José Carlos Ferreira Alves. 2ª Câmara de Direito Privado. Julgado em 20 de outubro de 2015).
A doutrina também é uníssona ao reconhecer que o direito à saúde é um bem personalíssimo, indisponível e indivisível, não confundindo-se como mercadoria, de modo que há limites à execução dos contratos de plano/seguro de saúde, os quais devem sempre priorizar a busca no restabelecimento da saúde do seu consumidor, independentemente das eventuais vantagens econômicas.
Portanto, cientes de que existem inúmeros abusos na execução dos contratos de plano de saúde, com infundadas negativas de atendimento às solicitações médicas, os órgãos administrativos de defesa do consumidor, sozinhos, já mostraram-se ineficazes ao controle da operadoras de plano e saúde, motivo pelo qual se vê cada vez mais a busca do Poder Judiciário para satisfação destes direitos, tanto que Nelson Nery Júnior, que também participou da redação do Código de Defesa do Consumidor, afirmou que "uma das formas de tutela contratual do consumidor é a que se realiza mediante o controle das cláusulas gerais dos contratos. Esse controle pode ser efetivado administrativamente ou pela via judicial. Tanto num como noutro caso, o controle pode ser abstrato ou concreto[9]".
Neste aspecto, apresenta-se ilegal não garantir a continuidade do atendimento aos portadores de leucemia mielóide aguda, na exata requisição do médico assistente, principalmente quando ele já não vê capaz de auxiliar a cura do paciente, e indica sua continuidade em rede não credenciada ao plano de saúde.
E, importa ressaltar que judicialização mostra-se necessária para garantir seus direitos básicos trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor, quais sejam: a proteção contra cláusulas abusivas, o direito de informação expressa sobre o objeto do contrato, conforme prevê seu artigo 6º, em seus incisos III e IV.
Assim, esta norma deve ser muito mais balizada em matéria de plano de saúde, vez que diretamente ligada ao direito à vida, sendo que qualquer obscuridade que possa surgir deve ser repelida do mundo jurídico.
Diante do diagnóstico do consumidor, não há como tolerar a submissão a dispositivo contratual que contrarie a legislação vigente em detrimento de sua saúde e qualidade de vida, dispositivo este usado em seu desfavor, pelo plano de saúde para não autorizar os procedimentos e consultas requeridos pela sua equipe médica.
3. DO DESCUMPRIMENTO DAS FUNÇÕES SOCIAIS DO CONTRATO.
De acordo com Andreza Cristina Baggio “nas relações de consumo, é a valorização da confiança depositada no vínculo e a boa-fé das partes contratantes que tornam objetiva a proteção da vontade, e criam inclusive um novo fundamento para a força obrigatória do contrato[10].”
Em reforço a este posicionamento, o STJ ao julgar o Resp. nº 1014547-DF, entendeu que o contrato deve cumprir sua função social, e está somente é cumprida quando o contrato atingir sua finalidade[11].
Neste ínterim, quando analisamos os contratos de prestação de serviços de saúde, chegamos à conclusão que sua função social é a preservação da vida, conforme também observado pelo Tribunal do estado de São Paulo, ao julgar o Agravo de Instrumento 520.683-4/5-00.
O Egrégio Tribunal do Estado de Mato Grosso do Sul também já deixou consignado[12] que o enunciado 409 da V jornada de Direito Civil, qual determina que os contratos devem ser interpretados em conformidade com a boa-fé, usos do lugar da celebração, bem como de acordo com as práticas habitualmente adotadas entre as partes, deve ser respeitado nas relações contratuais.
Cabe ainda ressaltar as lições do mestre Orlando Gomes[13], qual leciona que a boa-fé se traduz em lealdade, confiança, e colaboração nas tratativas contratuais.
Por conseguinte, quando a operadora de plano de saúde já custeou o tratamento médico do consumidor através de tratamento fora do domicílio, custeando, inclusive, tratamento antineoplástico de alto custo para o plano, infere-se que sua conduta contratual cria expectativa da continuidade do tratamento médico no consumidor.
Portanto, a atitude do plano de saúde ao negar a autorização para continuidade do tratamento de saúde do consumidor, no nosocômio adequado, além de representar uma falha na prestação de serviços, afronta a legislação consumerista e constitucional, rompe também com o direito civil, ferindo o princípio da função social do contrato, bem como o princípio da confiança, transparência.
4. DO SISTEMA UNIMED.
A realidade brasileira ainda trás uma especificidade quanto aos planos de saúde, no que diz respeito à cooperativa de trabalho médico, UNIMED. Cooperativa esta presente em todos os Estados brasileiros, que, somando-se todas as cooperativas vinculadas ao sistema, talvez torne-se o maior plano de saúde em operação nacional.
Embora ela esteja presente em todos os Estados brasileiros, sua organização se dá de forma regionalizada, dividida em graus, representados pelas denominações: Singulares, Federações, Central Nacional Cooperativa Única e Confederação Nacional Única, cada um deles com níveis diferentes de cobertura contratual.
Conforme informações obtidas em seu sítio eletrônico:
“Singulares representam o primeiro grau de atendimento e destinam à prestação de serviços aos associados, constituídas por médicos, e com área de ação em um ou mais municípios. Federações e Central Nacional Cooperativa Única representam o segundo gr de atuação: a primeira é destinada à prestação de serviços, ao monitoramento das atividades e à representação político-institucional das singulares associadas, podendo ainda operar planos de saúde; a segunda constitui-se por Federações e Cooperativas Médicas Singulares de Trabalho Médico Unimed e, excepcionalmente, por uma Central Cooperativa Odontológica, destinada à operação de planos de saúde, observadas às normas de comercialização e à prestação de serviços a suas associadas. Por fim, a Confederação Nacional Única, constituída exclusivamente por Federações e pela Cooperativa Central Nacional, destinada à prestação de serviços a elas e às Singulares, bem como a representação político-institucional da marca em todo o território nacional”[14].
Portanto, embora todas as UNIMED’S nacionais pertençam ao mesmo sistema, seus consumidores são setorizados, de modo que a existência de um profissional credenciado num destes graus de atendimento não garante que os clientes do Sistema Unimed possam por ele ser atendido, apenas aqueles cujo contrato preveja a prestação do serviço naquela estrutura.
Ou seja, por mais que sejam pessoas jurídicas distintas, todas as UNIMED’S pertencem ao mesmo sistema cooperativo, que possui credibilidade nacional, decorrente da propaganda conjunta do grupo empresarial, o que acaba por atrair maiores clientes ao seu serviço.
Portanto, entende-se que os métodos de gestão de contratos, orientados pela divisão de bases geográficas, não pode determinar a restrição de atendimento ao consumidor, porque, se o tratamento prescrito pelo médico assistente é fornecido em rede credenciada a outra Cooperativa do Sistema, deve entender-se que o credenciamento do profissional é estendido a todos os consumidores Unimed, independentemente de onde seja sua base cooperativa.
Tal questão já foi analisada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, nas Apelações Cíveis 11116397520158260100 e 11017974220138260100, entendendo ser evidente, em razão do convênio de atendimento existente entre as várias cooperativas Unimed's, todas pertencem ao mesmo grupo, e são afetadas por relação de reciprocidade e colaboração. Ainda, no que pertine à oferta, vislumbra-se um sistema que é apresentado ao consumidor como nacional, vendendo a nítida imagem de cobertura em todo o território brasileiro, com intercâmbio de atendimento entre as cooperativas, que pela teoria da aparência demonstra-se a existência de solidariedade entre as diversas cooperativas do grupo UNIMED.
Sobre o tema:
PLANO DE SAÚDE – ILEGITIMIDADE DE PARTE – UNIMED PAULISTANA e CENTRAL NACIONAL UNIMED – Preliminares que se confundem com o mérito, com que são examinadas – Preliminares rejeitadas. PLANO DE SAÚDE – Ação cominatória promovida por beneficiários de plano de saúde por remissão aderente de unidade da Unimed Paulistana – Menor portador de "neoplasia maligna", beneficiário do plano de saúde por remissão, realizando tratamento no Hospital Centro Infantil Dr. Domingos A. Boldrini – Atendimento suspenso pela operadora sob a alegação de que o plano contratado foi alterado de Nacional para Regional, não abrangendo o referido nosocômio – Abusividade – Alegação da Unimed Central de que o contrato foi celebrado apenas entre os autores e a Unimed Paulistana – Legitimidade de ambas, presente – Cooperativas autônomas, mas interligadas, constituindo grupo econômico – Empresas que figuram como compromitentes em Termo de Ajustamento de Conduta Subdivisão das Unimed's em diversas unidades, e que não podem criar dificuldades no momento da prestação do serviço quando em tratamento de saúde o aderente – Precedentes deste Tribunal – Direito do beneficiário a ser mantido no plano de saúde e dar continuidade ao tratamento no referido nosocômio – Irrelevância de os beneficiários fazerem jus a remissão da contraprestação em virtude do falecimento do titular do plano – Termo de ajustamento de conduta firmado pelas corrés que não os exclui, por estarem nessa condição – Sentença que julga procedente em parte a ação para esse fim, mantida. DANO MORAL – Suspensão do contrato estando um dos autores em pleno tratamento de patologia grava – Configuração – Indenização devida – Quantum indenizatório mantido, mesmo porque fixado em valor módico, atendendo aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade – Sentença que assim decide, mantida. Apelos não providos. (TJ-SP 11116397520158260100 SP 1111639-75.2015.8.26.0100, Relator: João Carlos Saletti, Data de Julgamento: 28/11/2017, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/01/2018).
PLANO DE SAÚDE – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – CONSUMIDOR - PACIENTE COM CÂNCER DO SEIO MAXILAR COM METÁSTASE NOS PULMÕES – ESPÉCIE RARA COM NECESSIDADE DE TRATAMENTO EM HOSPITAL PAULISTANO ESPECIALIZADO – CONVÊNIO COM UNIMED MINAS GERAIS - NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO DE PLANO DE SAÚDE DE CATEGORIA SUPERIOR DA UNIMED PAULISTANA EM RAZÃO DA RESIDÊNCIA DO PACIENTE FORA DA ÁREA DE ATUAÇÃO – PROCEDÊNCIA DO PEDIDO – CONSUMIDOR PODE CONTRATAR PLANO SUPERIOR AO SEU COM PAGAMENTO DO PRÊMIO RESPECTIVO – REDE INTERLIGADA DE COOPERATIVAS DA UNIMED – DIREITO AO TRATAMENTO ESPECIALIZADO EM NOSOCOMIO DE REFERÊNCIA ANTE À INEXISTÊNCIA DE PROFISSIONAIS CAPACITADOS NA REGIÃO DO PLANO DE ORIGEM - (SÚMULAS 99, DO TJSP)- SENTENÇA MANTIDA. Deve ser mantida sentença que obrigou a ré a aceitar a contratação pelo consumidor de plano de saúde superior ao seu em Unimed de outro Estado, pois inexistente equipe especializada na região do plano a que é conveniado. Inteligência da súmula 99, do TJSP. Inadmissível exigência de carência na migração para categoria superior. Marca nacional da Unimed conhecida pelos consumidores. Precedentes que reconhecem o grupo econômico e a solidariedade das cooperativas Unimed do país. Sentença mantida. RESULTADO: apelação desprovida. (TJ-SP - APL: 11017974220138260100 SP 1101797-42.2013.8.26.0100, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento: 21/10/2015, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/10/2015).
É entendimento sedimentado nos Tribunais de Justiça que as pessoas jurídicas de direito privado denominadas “UNIMED'S”, ainda que formalmente constituídas como cooperativas de trabalho médico distintas, formam um grupo econômico com idêntica matriz de propósito e atuação, diferindo tão somente quanto às respectivas áreas de cobertura regional. Nesse sentido:
“APELAÇÃO CÍVEL. Plano de saúde. Preliminar de ilegitimidade passiva afastada. Empresas que figuraram como compromitentes em Termo de Ajustamento de Conduta. Inépcia da inicial. Inocorrência. Indicação do valor referente aos danos morais é estimativa. Serviço de home care e tratamento de neoplasia interrompidos em decorrência da liquidação extrajudicial da Unimed Paulistana, operadora da qual são beneficiários. Pedido de migração de plano de saúde com manutenção dos termos do contrato originário firmado, bem como de indenização por danos morais. Sentença de parcial procedência. Interrupção abrupta dos serviços que causou evidente abalo moral, bem como colocou em risco a vida dos autores, que sofrem de graves patologias. Indenização mantida. Quantum indenizatório reduzido. Condenação individualizada. Recursos parcialmente providos.” (Apel. nº 1030318-24.2015.8.26.0001,2ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Joaquim José dos Santos , j.02.09.2017).
De igual sentir decisões do Colendo superior Tribunal de Justiça:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER PROPOSTA EM FACE DA UNIMED, BEM COMO DA ALIANÇA COOPERATIVISTA NACIONAL UNIMED, OBJETIVANDO O PAGAMENTO DA TAXA DE ADMINISTRAÇÃO CONTRATADA ATRAVÉS DO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS E HOSPITALARES. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA SUSCITADA. PELA PRIMEIRA RÉ. ACOLHIMENTO. SENTENÇA QUE JULGOU EXTINTO O PROCESSO E QUE MERECE SER ANULADA, EM RAZÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA, QUE DEVE SER APLICADA AO CASO DOS AUTOS. PROVIMENTO DO RECURSO. “Não merece prosperar a alegação trazida pela ré, acolhida pela ilustre Magistrada sentenciante, de que a Aliança Cooperativa Nacional Unimed e a Unimed Rio Cooperativa de Trabalho Médico do Rio de Janeiro Ltda, são pessoas jurídicas distintas, com CNPJ diferentes, tendo em vista a incidência da Teoria da Aparência, que entendeu devesse ser aplicada ao caso dos autos.Verifica-se da documentação acostada aos autos pela autora, mais notadamente do contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares juntado às fls. 13/32, constar o logotipo da Unimed em todas as páginas integrantes do contrato, pelo que não pode a ré ser considerada como parte ilegítima para figurar no pólo passivo da presente demanda.Frise-se, por oportuno, que o entendimento já sedimentado neste Egrégio Tribunal de Justiça, é no sentido de que a ré integra o mesmo conglomerado econômico - Sistema Cooperativo Unimed, dando azo, assim à responsabilidade solidária entre ambas quanto à prestação de atendimento médico-hospitalar”” (STJ - AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 1151856 RJ - Min. Sidnei Beneti j. 26.02.2010) grifei.
Quando a negativa de atendimento advir de consumidor de plano de saúde UNIMED, deve entender-se que há solidariedade entre as cooperativas, motivo pelo qual sequer pode-se afirmar em inexistência de rede credenciada para tratamento do consumidor, mas sim que o tratamento terá continuidade sob gestão e responsabilidade de outra cooperativa, do mesmo grupo econômico, sediada em local diverso da base contratual originária, porque resta caracterizado um verdadeiro grupo econômico.
Portanto, analisando o direito dos consumidores pelo viés da teoria da aparência, se todas as cooperativas médicas são aglutinadas com o mesmo nome (UNIMED), juridicamente também devem ser tratadas como uma única fornecedora, porque sua divisão administrativa não deve representar um entrave à satisfação do direito em juízo, sob risco de enfraquecer a segurança e finalidade jurídica da prestação do seu serviço.
CONCLUSÃO.
O direito do consumidor brasileiro é um dos mais vanguardistas do mundo a nível de proteção de sua população, tanto que ele se chama Código de Defesa do Consumidor e não tão somente Código do Consumidor, e tal diferença, já no seu próprio nome, nos permite concluir que o consumidor brasileiro foi considerado como vulnerável na relação de consumo, e portanto, análise jurídica dos seus litígios tem presunção de veracidade, tanto que para sua defesa em juízo foi criada a possibilidade da inversão do ônus da prova, seja em caráter ope judicis (decorrente da análise do caso em concreto ou ope legis (decorrente da própria lei).
Todavia é preciso se ter em mente que a existência do direito, por si só, não perfaz na garantia do pleno exercício deste direito, principalmente quando estamos diante de uma relação jurídica que envolve planos e seguros de saúde.
No que diz respeito ao mercado de consumo brasileiro, nos acostumamos a presenciar violações de direitos que não são devidamente responsabilizadas pelos órgãos administrativos de controle ou pelo próprio Poder Judiciário, até mesmo porque, o próprio desenvolvimento da jurisprudência passa pelos tribunais superiores que além do próprio direito posto a julgamento, também analisam as consequências políticas de seus veredictos, até mesmo porque, o direito do consumidor não está alheio aos princípios econômicos trazidos pela própria Constituição Federal e muitas vezes envolve toda uma cadeia a qual consumidores, trabalhadores, empresários e impostos que sustentam toda nossa estrutura de Estado.
E diante disso tudo, o único artifício ao consumidor para fazer valer seus direitos é o conhecimento de toda proteção normativa que a lei lhe concede. O conhecimento emancipa o consumidor de toda violação de direitos, é a sua única salvação diante de tantas políticas administrativas dos prestadores e fornecedores de produtos e serviços criadas com o único proposito de lesar os seus interesses.
No caso dos pacientes de leucemia mieloide aguda, muitas vezes sua submissão a transplante de medula óssea como tratamento lhe traz uma condição especifica em todo seu quadro clínico e nas perspectivas de tratamento existentes a lhe ser administradas, de modo que nem todo centro médico tem condições de atende-lo.
Neste momento, o que se deve ter em mente é que independentemente do tratamento que venha a ser eleito pela equipe médica, o paciente tem o direito à continuidade do seu tratamento, em qualquer centro de médico, seja ele referenciado ou não ao seu plano de saúde.
E portanto, diante de negativa de cobertura, o consumidor, ciente de seus direitos, deve procurar um Advogado ou Defensor Público o mais rápido possível, para que diante dos relatórios médicos lhe apresentados eleja qual a melhor via processual a assegurar a garantia do cumprimento do contrato perante o Poder Judiciário.
REFERÊNCIAS.
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BAGGIO. Andreza Cristina. O Direito do Consumidor Brasileiro e a Teoria da Confiança. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
GOMES. Orlando. Teoria Geral dos Contratos. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1973. 5ª Ed.
JÚNIOR. Nelson Nery. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado Pelos Autores do Anteprojeto, Forense Universitária, 6ª edição.
NUNES. Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 6ª Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2011.
SANTOS, Paula Ferraresi. Responsabilidade Civil e Teoria da Confiança: análise da responsabilidade pré-contratual e o dever de informar. Revista de Direito Privado, vol. 13, n. 49, jan/2012.
SILVA. Drielly Fernandes. Leucemia Mielóide Aguda. Academia de Ciência e Tecnologia. 2012. Disponível em https://www.ciencianews.com.br/arquivos/ACET/IMAGENS/biblioteca-digital/hematologia/serie_branca/leucemias_linfomas_mieloma/leucemias/9-Leucemia-mieloide-aguda.pdf .
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. ver., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012.
[1] Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Norte do Paraná. Especialista em Direito do Consumidor pela Faculdade Damásio. Especialista em Direito da Infância e Juventude e Direito Constitucional pelo Centro Universitário da Grande Dourados. Defensora Pública de Mato Grosso do Sul.
[2] Bacharel em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados. Especialista em Gestão Pública Municipal pela Universidade Federal da Grande Dourados. Assessora Jurídica do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul.
[3] SILVA. Drielly Fernandes. Leucemia Mielóide Aguda. Academia de Ciência e Tecnologia. 2012. p. 1. Disponível em https://www.ciencianews.com.br/arquivos/ACET/IMAGENS/biblioteca-digital/hematologia/serie_branca/leucemias_linfomas_mieloma/leucemias/9-Leucemia-mieloide-aguda.pdf . Acesso em 01/12/2022, às 20h10.
[4] ANDRADE, Guilherme Augusto Brito. O contrato de timesharing sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 out 2023, 04:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigo/63562/o-contrato-de-timesharing-sob-a-tica-do-cdigo-de-defesa-do-consumidor. Acesso em: 03 dez 2023.
[5] TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. ver., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012, p. 66.
[6] IBIDEM 5.
[7] SANTOS, Paula Ferraresi. Responsabilidade Civil e Teoria da Confiança: análise da responsabilidade pré-contratual e o dever de informar. Revista de Direito Privado, vol. 13, n. 49, jan/2012, p. 213.
[8] NUNES. Luiz Antônio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 6ª Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2011. p. 358.
[9] JÚNIOR. Nelson Nery. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado Pelos Autores do Anteprojeto, Forense Universitária, 6ª edição, p.454/455.
[10] BAGGIO. Andreza Cristina. O Direito do Consumidor Brasileiro e a Teoria da Confiança. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 95.
[11] Resp. nº1.014.547-DF, rel Min Joao Otavio de Noronha, 25.08.20009
[12] Ap. Civil 2001.003925-0/0000-00 , rel Des. Hibernando Coelho Neto- Data de julgamento 11/11/2003.
[13] GOMES. Orlando. Teoria Geral dos Contratos. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1973. 5ª Ed. p. 49.
[14] Disponível em: https://www.unimed.coop.br/site/sistema-unimed . Acesso em 03/12/2023.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Grande Dourados, UFGD, em 2015. Pós Graduado em Direito do Consumidor pela Faculdade Damásio de Jesus, 2018. Pós Graduado em Direito Penal e Processo Penal pelo Centro Universitário da Grande Dourados - UNIGRAN, 2021. Atualmente é analista judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Guilherme Augusto Brito. O direito à continuidade do tratamento médico em rede não referenciada aos portadores de leucemia mieloide aguda Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2023, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/64121/o-direito-continuidade-do-tratamento-mdico-em-rede-no-referenciada-aos-portadores-de-leucemia-mieloide-aguda. Acesso em: 23 dez 2024.
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