Indaga-se: qual o exato momento em que cessa o prazo decadencial na hipótese de a Fazenda Pública realizar uma ação fiscal?
É bastante comum questionar-se qual o exato momento em que cessa o prazo decadencial na hipótese de a Fazenda Pública realizar uma ação fiscal: seria o da data do termo de início de ação fiscal; o da data da lavratura do Auto de Infração - AI pelo agente fiscal; ou o da ciência, pela notificação, do lançamento tributário ao contribuinte autuado?
No melhor dizer da doutrina, é a notificação que dá eficácia ao lançamento tributário e, enquanto este não é levado ao conhecimento do contribuinte, é apenas um ato interno da Administração.
Cabe salientar, no entanto, que o aviso de lançamento não é lançamento, no qual apenas se dá ciência dele, que já existe. Sendo assim, a notificação não seria, conforme leciona Souto Maior Borges,(1) um requisito de existência do ato de lançamento, e sim, tão-somente, de eficácia do próprio ato, não podendo desse modo ser considerada na demarcação dos prazos decadencial e prescricional porque não constitui requisito de “existência”, mas apenas de sua eficácia.
Discordamos, com a devida vênia, desse entendimento doutrinário, no que se refere à demarcação dos referidos prazos, pois a notificação desempenha a função de levar ao sujeito passivo o conhecimento do lançamento efetuado, configurando-se como requisito de perfeição do lançamento. Se os efeitos do lançamento tributário pudessem ser produzidos sem o conhecimento do contribuinte, os princípios de certeza e segurança jurídica estariam sendo ofendidos. Assim, “mesmo no silêncio da lei, os prazos que se referem ao lançamento se contam a partir da sua notificação ao contribuinte, regularmente efetuada.”(2)
E é nesse sentido, também, que a jurisprudência de nossos tribunais superiores(3) tem se manifestado:
“(...) O período decadencial se estende até o instante da notificação do auto de infração ou do lançamento do débito; momento a partir do qual a exigibilidade do crédito fica suspensa até decisão final no processo administrativo. Após, inicia-se o prazo prescricional. (...)”
Há de se notar ainda que, se o agente do Fisco efetuar um lançamento tributário, sem dar conhecimento ao contribuinte, o mesmo não produzirá nenhum efeito, pois estar-se-á cerceando-lhe o direito de se manifestar e contestar,(4) nada se podendo exigir dele, simplesmente por não ter havido o aperfeiçoamento da relação jurídico-tributária, dado que se produziu algo sem eficácia, isto é, um lançamento sem efeito.
Pela notificação do lançamento é que o sujeito passivo toma ciência da existência da relação jurídica formada com o sujeito ativo, além de o próprio CTN exigir que o lançamento seja regularmente notificado ao contribuinte (CTN, art. 145).
Paulo de Barros Carvalho(5) resume com perfeição o efeito da notificação ao afirmar que “se o lançamento existir e for válido, não irradiará qualquer efeito jurídico, enquanto não comunicado ao sujeito passivo por intermédio do ato de notificação.”(7)
O mesmo, entretanto, não podemos dizer quanto a “qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento” ou outra notificação de início de ação fiscal, disposta no art. 173, parágrafo único do CTN,(6) e comumente denominada de termo de início de ação fiscal. Essas medidas não têm o condão de cessar o prazo decadencial de 5 (cinco) anos para o Fisco exercer o seu direito de constituir o crédito tributário.
Isso porque, o direito da Fazenda Pública, disposto no art. 173, caput do CTN, refere-se à constituição propriamente dita do crédito tributário, que ocorre com o lançamento tributário, e não simplesmente ao ato de iniciar a sua constituição. Assim, com o início da ação fiscal, não estará cessado o prazo decadencial até que se efetue o respectivo lançamento tributário, com a sua devida notificação.
Dessa forma, o momento em que consideramos encerrado o prazo decadencial, ou seja, em que não se pode mais falar em decadência para fins de extinção do direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário, está delimitado pela data em que o contribuinte toma ciência do ato de lançamento, por qualquer dos meios definidos na legislação tributária. Na hipótese então de ser lavrado auto de infração - AI, será a data em que o autuado é notificado do mesmo, e não a data do termo de início de ação fiscal ou a data postada no AI, momento em que a sua lavratura é tão-somente iniciada ou concluída pelo agente fiscal.
Referência bibliográfica
BORGES, José Souto Maior. Lançamento tributário. 2 ed., São Paulo: Malheiros, 1999.
CARVALHO, P. B. Decadência e prescrição. São Paulo: Saraiva, 1998.
HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso de prazo. 2 ed., Brasília: Lúmen Juris, 2007.
XAVIER, A. Do lançamento – teoria geral do ato, do procedimento e do processo tributário. 2 ed., São Paulo: Forense, 1998.
Notas
(1) BORGES, J. S. M. Obra citada. p. 186 e 323.
(2) XAVIER, A. Obra citada. p. 193-195.
(3) BRASIL. STJ. REsp 533486/RS, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, 2ª T, DJ 06.03.2006. No mesmo sentido, REsp. nº 118.158/SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 1ª T, DJ de 17.8.98: “Com a notificação do auto de infração consuma-se o lançamento tributário. Após este ato, não mais se cogita em decadência.”, entre outros. Disponível em: http://www.stj.gov.br. Acesso em: 20 jul. 2006.
(4) BRASIL. CF. “Art. 5º (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;” Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 12 jul. 2006
(5) CARVALHO, P. B. Obra citada. p. 74-75.
(6) BRASIL. CTN. “Art. 173. (...) Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.” Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 12 jul. 2006.
(7) HABLE, J.. Obra citada. p. 71-75.
(8) UNIÃO. Decreto nº 70.235, de 06 de março de 1972. Dispõe sobre o processo administrativo fiscal, e dá outras providências. “Art. 23. Far-se-á a intimação: I - pessoal, (...); II - por via postal, telegráfica ou por qualquer outro meio ou via, (...); III - por meio eletrônico, (...).”, entre outras. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 12 jul. 2006.
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