Com o advento da lei Nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, cujo conteúdo regulamenta os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos entre outras providências, a sociedade, assim como Doutrinadores e Legisladores brasileiros, têm afrontado, e ao mesmo tempo, tratado com toda cautela, o conceito dinâmico e as inúmeras formas de caracterização das novas famílias, das famílias recombinadas, assim como tentam abarcar as entidades menos recentes e até então marginalizadas aos olhos da Lei.
Tal progresso conta com o preceito Constitucional regido pelo Caput do Artigo 5º, que dispõe da igualdade entre homens e mulheres perante a Lei, há de se falar então, em desenvolvimento jurídico, seguido pela evolução dos costumes, pela dinâmica social, muito embora ainda existam diversas travas legislativas para que esse preceito seja utilizado com todo o seu conjunto e para que foi formado.
Esta equidade constitucional chega em boa hora, aja vista que já não basta vivermos na condição social com inúmeras regalias traçadas pela sociedade machista e conservadora em que habitamos, cingida pela desigualdade histórica entre os direitos e deveres de cada sexo, assim como justificativas bizarras utilizadas para acobertar as traições e devaneios masculinos.
É sabido que tal norma Constitucional não inibirá as proposições do movimento social fálico, entretanto, surge como salvaguarda para as diversas pessoas que até então viviam acorrentadas em relacionamentos que não detinham atributo algum com os laços de família, como o afeto, convivência fraterna e, por último e não menos importante, a livre vontade, tantas vezes tipificadas apenas pelo caráter parcimonioso que compreendia aquela união que não possuía predicado algum de entidade familiar. Com a não concordância da possibilidade de dissolução do casamento, o Estado acabava condenando inocentes à vivência compartilhada contrária à sua vontade.
Marcas impressas de casamentos realizados com intuitos não da celebração do amor, mas do interesse econômico-social, são impressões que assinalaram diversos núcleos familiares no século XIX, celebrados sob a régia legislação patriarcal do Código Civil de 1916, resguardados nos preceitos da Igreja Católica.
No Brasil de hoje, já não podemos imaginar tais unidades familiares convivendo com o intuito de satisfazer unicamente os interesses de uma das partes, muito menos colocarmos sobre o véu da unidade do Poder Familiar valores implícitos, cravar os sentimentos com expressões de importância econômica. Vivemos nos tempos onde a afetividade, a vontade e o Eudemonismo são os pilares dos relacionamentos familiares.
É inerente à natureza humana a busca incessível pela felicidade, busca essa, pautada em seus desejos, vontades e direitos de realizá-los. Cabe a cada um o desejo de seguir o seu caminho, trilhar a sua estrada. E pensando assim, o legislador constituinte, ungido de aparente coragem, traçou na Lei 6.515/77 essa possibilidade, que até então estava cristalizada no sentido Sacro da legislação da época.
Vivemos em um país laico, cercado de princípios de origem judaico-cristã, onde tais preceitos tentam estabelecer e justificar valores para frear as conquistas da dinâmica social.
É certo que nenhuma das partes que contraem o divórcio são vencedoras, todos são perdedores, este instituto trás consigo um legado indesfazível de lacunas, sinais e prejuízos que poderão acompanhar as partes até o fim das suas vidas. Fático é que não podemos atribuir culpa a ninguém por ter deixado de amar, como também não podemos crucificar os que enganaram-se com seus sentimentos, empregando na investidura do casamento um sentimento que julgava ser o amor.
Fato é que a convivência desgastada e desrespeitosa entre as partes, acarretará em um somatório de infelicidade contido nas vidas daqueles que não desejam mais conviver, tratamentos pautados no desrespeito mútuo, na traição e muitas vezes na violência doméstica. Contudo, não existe dolo no divórcio, existe um conglomerado de fatos sociais que levam as partes a utilizarem o instituto do divórcio como uma nova chance de buscar a prosperidade.
Falar em resguardo do objetivo Sacro dos Laços Matrimoniais e negativar a chancela personalíssima da vontade do casal, sem que se cristalize o anseio das partes, tão primorosamente protegido no momento de realização do casamento, é provir com extrema anástrofe valorativa, não agasalhada pelo direito.
Não podemos comparar o Estado Democrático de Direito no qual habitamos, aos países que ainda não possuem tal subisídio jurídico resguardado em sua legislação. Obrigar alguém a conviver e a ter afeição para com quem não mais se quer é mais que desumano, é uma afronta ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e à própria Carta Magna.
A prerrogativa da existência do divórcio não vincula os casais de fé Católica, Cristã ou outra, a contrair a separação. A fé não se deixa abalar por institutos trazidos pela lei, pelos novos ou futuros movimentos sociais, ela será sempre ascendente aos feitos humanos. O mesmo preceito de vontade que une duas pessoas apresenta-se no livre arbítrio do divórcio, resguardado pelas Sagradas Escrituras.
A verdade é que a existência do divórcio não acabou, e certamente não acabará com a instituição familiar. Na contramão desse desenvolvimento, encontramos ainda o entrave da legislação civil, camuflada de segurança à família, que prevê espaçamento de tempo reflexivo da separação ao divórcio, tentando reverter, muitas vezes, algo irreversível, levando, em diversos casos, os próprios interessados a mentir nos tribunais acerca do tempo do fim do relacionamento de fato, vestígios da aparente coragem dos legisladores.
O certo é que o efeito das mudanças frenéticas da dinâmica social sempre virá, e aplicar-se-ão, de modo direito, positivado, ou consagrados pela jurisprudência, sempre que surgir a necessidade de resguardo de novos institutos pela Jurisdição.
O Estado deverá resguardar, a todo tempo, os direitos dos cidadãos iguais, bem como dos desiguais de acordo com suas desigualdades. Sempre virão jovens e futuras gerações carregadas de preceitos e preconceitos a serem libados, fazendo surgir deste modo, púberes e duvidosos costumes, a serem discutidos, permutados, revistos e jamais apaziguados por total, de contínuo conservando em si um pouco do que já foi e do que sempre será.
Quem quiser entender, que entenda.
Referencias Bibliográficas:
Código Civil Brasileiro de 2002
Constituição Federal do Brasil 1988
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias / Maria Berenice Dias. – 5. Ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
LEI Nº 6.515, DE 26 DE DEZEMBRO DE 1977 que regulamenta os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dá outras providências.
OLIVEIRA, Euclídes Benedito de. Impedimentos matrimoniais na união estável. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha Pereira (coord.). Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família. Família e Cidadania. O novo CCB e a Vacatio Legis. Belo Horizonte: IBDFAM/Del Rey, 2002.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família: uma abordagem psicanalíta. 2ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família / Sílvio de Salvo Venosa. - 4. Ed. – São Paulo : Atlas, 2004. – (Coleção direito civil; v. 6).
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