EMENTA: DIREITO CIVIL. Prescrição e Decadência. Renúncia no direito civil.
I – Questão relevante decorre a respeito da possibilidade de renúncia da prescrição e da decadência em direito civil.
II - Passemos à análise do tema.
II.1 O tempo exerce forte influência no direito, mormente na aquisição e extinção de direitos. Aponta Paulo Dourado de GUSMÃO ser a influência do tempo bastante importante nas relações jurídicas, as quais podem ser “constituídas para durar por tempo indeterminado, e outras, por tempo determinado.” Nos primórdios, as ações eram eternas.
Dessa forma, podemos perceber que, desde os primórdios, o Estado foi buscando estabelecer a paz social e solidificar as situações fáticas existentes. A inércia do titular do direito em exercê-lo não pode perdurar eternamente. Como consabido, “dormientibus non sucurrit jus”.
SOUZA FILHO, a respeito do tempo, afirma: “A prescrição promove a consecução de um interesse jurídico-social, a saber: proporcionar segurança às relações jurídicas. É instituto de ordem pública.”
O princípio da segurança jurídica, ademais, deve prevalecer sobre os interesses meramente individuais do titular do direito supostamente violado.
II.2 A renúncia à prescrição vem disciplinada no artigo 191 do Código Civil, ipsis verbis:
“Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.”
Assim, é possível ao devedor renunciar a prescrição, de forma expressa ou tácita. Todavia, a renúncia deve ocorrer posteriormente à consumação do instituto.
II.3 A IV Jornada de Direito Civil da Justiça Federal, a respeito do tema, assim se manifestou no Enunciado 295:
295 – Art. 191. A revogação do art. 194 do Código Civil pela Lei nº 11.280/2006, que determina ao juiz o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a possibilidade de renúncia admitida no art. 191 do texto codificado.
II.4 Conforme leciona o Prof. Vitor Frederico Kümpel:
“O artigo 191 do Código Civil dispõe sobre a renúncia da prescrição, ou seja, a renúncia ao direito de argüir para a qual a ação está prescrita. Admite-se a renúncia da prescrição quando a prescrição já estiver consumada e quando a renúncia não prejudicar terceiros.
O próprio artigo dispõe que a renúncia pode ser expressa ou tácita. Geralmente, a renúncia é tácita, decorrendo da conduta do devedor. Não se admite a renúncia antecipada, visto ser a prescrição de ordem pública.
Os terceiros que poderiam ser prejudicados com a renúncia da prescrição são, em geral, outros credores (exemplo: um credor ingressa com uma ação que está prescrita; o devedor, se pagar a dívida, não terá como pagar os outros credores; no caso, não poderá o devedor renunciar a prescrição).”
II.5 A renúncia à prescrição poderá ser expressa ou tácita. Edilson Pereira Nobre Júnior assim menciona:
“Quanto às modalidades em que a renúncia poderá se materializar, haurimos, na literatura jurídica, duas. Inicialmente, temos a expressa, em que o prescribente, de maneira inequívoca, abre mão da prescrição existente em seu favor, declarando, oralmente ou por escrito, desta não querer se beneficiar. O outro tipo consiste na tácita, ou implícita, cuja configuração se centra na prática, por aquele, de atos incompatíveis com o desejo de se favorecer com a exceptio.”
II.6 A questão da possibilidade de o magistrado reconhecer de ofício a prescrição, de certa forma, derroga parcialmente o artigo 191 do CC. Fora do processo, poderá o devedor renunciar expressa ou tacitamente à prescrição. No processo, a renúncia tácita da prescrição pelo devedor não mais é possível, sendo lhe lícito tão-somente à renúncia expressa.
II.7 No que concerne à renúncia à decadência, incide a inteligência do artigo 209 do Código Civil, o qual destaca ser “nula a renúncia à decadência fixada em lei”. Nesse diapasão, assevera Maria Helena Diniz:
“Renúncia de decadência prevista em lei. A decadência resultante de prazo legal não pode ser renunciada pelas partes, nem antes nem depois de consumada, sob pena de nulidade. Logo, os prazos decadenciais, decorrentes de convenção das partes, são suscetíveis de renúncia, por dizerem respeito a direitos disponíveis, visto que se as partes podem estabelece-los, poderão abrir mão deles.”
Por conseguinte, inviável renunciar a decadência legal, sendo lícito apenas renunciar a decadência convencional.
III. Diante do exposto, infere-se:
i.) Com supedâneo no artigo 191 do CC, é possível ao devedor renunciar a prescrição, de forma expressa ou tácita. Todavia, a renúncia deve ocorrer posteriormente à consumação do instituto.
ii.) A questão da possibilidade de o magistrado reconhecer de ofício a prescrição, de certa forma, derroga parcialmente o artigo 191 do CC. Extrajudicialmente, poderá o devedor renunciar expressa ou tacitamente à prescrição. No processo, a renúncia tácita da prescrição pelo devedor não mais é possível, sendo lhe lícito tão-somente a renúncia expressa.
iii.) No que concerne à renúncia à decadência, incide a inteligência do artigo 209 do Código Civil, o qual destaca ser “nula a renúncia à decadência fixada em lei”. Portanto, inviável renunciar a decadência legal, sendo lícito apenas renunciar a decadência convencional.
REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 12ª ed., 2006, 1838p.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil – Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 9ª ed., 2002, 206p.
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Forense, 22ª ed., 1997, 441p.
NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira . PRESCRIÇÃO: DECRETAÇÃO DE OFÍCIO EM FAVOR DA FAZENDA PÚBLICA. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 211, 1998. Disponível em http://www.jfrn.gov.br/docs/doutrina31.doc . Acesso em 03/12/2007.
SOUZA FILHO, Luciano Marinho de Barros e. NOVOS RUMOS DA PRESCRIÇÃO E DA DECADÊNCIA NO DIREITO BRASILEIRO. Universo Jurídico, Brasil, 30/04/2006. Disponível em <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=2598> Acesso em: 04/11/12007.
A esse respeito: GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil – Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 9ª ed., 2002, p. 179.
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Op. Cit., p.245.
“O direito não socorre aos que dormem.”
SOUZA FILHO, Luciano Marinho de Barros e. Op. Cit.
DINIZ, Maria Helena. Op. Cit., p. 249.
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