O tema proposto é deveras polêmico. Ele traz à lume um embate jurídico entre o interesse do Fisco em confronto com o aquiescer dos contribuintes. Uns dizem que o interesse do Fisco deve sobejar ao do contribuinte. Outros advogam pela supremacia do ordenamento jurídico para defenderem a assunção aos dizeres dos contribuintes.
Antes de imergir naqueles dizeres colimados entre si, urge destacar a natureza e a complexidade do autolançamento na ordem jurídica tributária e, conseguintemente, analisar os dispositivos legais acerca do prazo decadencial para, em última análise, concluir sobre a pertinência do prazo decadencial na matéria sob enfoque.
O auto-lançamento é uma espécie de lançamento tributário, isto é, uma das vias legais próprias para a constituição do crédito tributário. Ele encontra amparo no artigo 150 do CTN, o qual se transcreve:
Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
Consoante o comando legal supra, nesta espécie de lançamento o contribuinte apresenta uma declaração, atestando o cometimento do fato gerador de um tributo. Conseguintemente, ele emite o boleto expressando o quantum correspondente ao tributo e quita-o, submetendo a declaração e o valor pago à apreciação do Fisco. Ao proceder a apreciação, a autoridade fiscal confronta-o com a norma legal pertinente e, aferindo a legalidade da operação, homologa o lançamento tributário exarado pelo contribuinte. É por esta razão que tal modalidade de lançamento denomina-se, também, lançamento por homologação.
A diferença entre o autolançamento e o lançamento misto (por declaração) é que, no lançamento em comento, o contribuinte não se limita a providenciar a declaração da ocorrência de fato gerador – típica do lançamento misto ou por declaração -, mas aufere o seu valor e efetiva o pagamento do tributo.
Tecidas estas considerações, passa-se a análise da pertinência da decadência, no que tange ao autolançamento.
Decadência, em matéria tributária, constitui-se no transcurso de tempo par que o Fisco constituía o crédito tributário, ou seja, efetue o lançamento. O Código Tributário Nacional disciplinou-o em duas dicções legais diversas. A primeira encontra-se no artigo 150, parágrafo quarto. Confira-se:
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
À primeira vista, o prazo decadencial para lançamento de qualquer tributo é de cinco anos a contar do fato gerador, muito embora tal dispositivo não seja absoluto, pois, como dicciona o início desse comando legal, a lei poderá fixar prazo decadencial diverso. Saliente-se, por oportuno, que tal prazo decadencial foi incluído na matéria específica do lançamento por homologação, aplicando-se, portanto, ao caso em tela como regra específica.
Por outro lado, o prazo decadencial para a consecução do lançamento tributário também foi descrito por outro comando legiferante. Trata-se da orientação do artigo 173, inciso primeiro do mesmo codex. Transcreve-se:
Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
Diversamente da redação do parágrafo quarto, artigo 173, também do CTN, é o influxo do dispositivo legal supra declinado. Em que pese coadunar-se com o transcurso temporal de cinco anos, estatuiu dies a quo diverso. Enquanto este estabelece o início da decadência no primeiro dia do exercício financeiro posterior ao operou-se o fato gerador, aquele – parágrafo quarto, artigo 150, do CTN – avoca o termo inicial para a ocorrência do fato gerador.
Exsurge, destarte, uma dúvida: quando se terá o influxo do prazo decadencial, mormente em se tratando de autolançamento?
A jurisprudência tem entendido pela subsunção, todavia, em situações diferentes. A primeira situação fática aferida pelos arestos pátrios outrora consolidados advogam pela aplicação do inciso primeiro, artigo 173, do CTN, quando o contribuinte escuda-se do dever legal de apresentar a declaração de ocorrência do fato gerador e, de igual modo, deixa de perfazer o devido pagamento. Nesse espeque, o prazo decadencial para a fisco efetivar o lançamento de ofício será mais suavizado, se comparado com o outro dispositivo. (REsp 445.137/MG)
De outro norte, o parágrafo quarto, artigo 150, do CTN encontraria vazão nos casos em que o contribuinte cumpriu o seu dever legal de entregar a sua declaração ao fisco, bem como efetuar o pagamento do tributo correspondente. Assim, o fisco teria o prazo de cinco anos, contados do fato gerador, para homologar o lançamento tributário de autoria do contribuinte. Expirado este transcurso, operar-se-ía a homologação tácita daquele lançamento. (REsp 101.407/SP; REsp 183.603/SP)
Em que pese tal posição doutrinária e jurisprudencial, peca-se num ponto principiológico do direito: lei especial derroga lei geral, segundo o qual a norma (lei em sentido lato) tem aplicação sobre norma de caráter geral.
Nesse particular, o parágrafo quarto, artigo 150, do CTN goza de status de norma especial, pois, o caput o artigo 150 evidencia o tratamento especial destinado ao autolançamento.
À guisa destes questionamentos, o Pretório Excelso – no julgamento dos Recursos Repetitivos - sufragou o aquele posicionamento, fazendo emergir a tese aqui propagada: subsunção do parágrafo quarto, artigo 150 do CTN, nos casos de lançamento por homologação.
Diante do exposto, muito embora a posição jurispridencial aponte para a aplicação de ambos os artigos, a especialidade do artigo 150 ao tema em apreço merece destaque, derrogando a subsunção do artigo 173, inciso I, do CTN, nos casos de autolançamento.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição de 1988. Portal online. <http://www.planalto.gov.br/legislacao>. Acesso em 12 abr. 2010.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Portal online. <http://www.planalto.gov.br/legislacao>. Acesso em 12 abr. 2010.
BRASIL. Superior Tr. Portal online. <http://www.planalto.gov.br/legislacao>. Acesso em 12 abr. 2010.
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009.
SABBAG, Eduardo. Elementos de Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
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