A despeito da importância do tema, o contrato de transporte é referido pelo Código Civil de 2002 em seu art. 730 e pode ser definido como o negócio jurídico bilateral, consensual e oneroso, pela qual uma das partes (transportador ou condutor) se obriga a, mediante remuneração, transportar pessoa ou coisa a um destino previamente convencionado. Podemos extrair dessa definição as suas duas espécies: transporte de coisas e transporte de pessoas.
Em consonância com o disposto no art. 743 do CC/02, o contrato de transporte de coisas pode ser definido como sendo aquele que o expedidor ou remetente entrega ao transportador determinado objeto para que, mediante pagamento de frete, seja remetido a outra pessoa (consignatório ou destinatário), em local diverso daquele em que a coisa (móvel ou semovente) foi recebida.
A partir das definições acima mencionadas, em especial, ao contrato de transporte de coisas e trançando um paralelo das obrigações advindas dessa relação contratual para os sujeitos, temos que: 1. obrigação do remetente: entrega da mercadoria em condições de envio; pagamento do preço convencionado, ressalvada a hipótese de este ser adimplido pelo destinatário; acondicionamento da mercadoria; declaração do seu valor e de sua natureza; recolhimento tributário pertinente; respeito as normas legais em vigor no sentido de somente expedir mercadorias de trânsito admitido no Brasil; 2. obrigações do transportador: receber a coisa a ser transportada no dia, hora, local e modo convencionados; empregar total diligência no transporte da mercadoria posta sob a sua custódia; seguir o itinerário ajustado, ressalvadas as hipóteses de caso fortuito e força maior; entregar a mercadoria ao destinatário da mesma, mediante apresentação do respectivo documento comprobatório de sua qualidade de recebedor (conhecimento de transporte); respeito às normas legais em vigor no sentido de somente expedir mercadorias de trânsito admitido no Brasil; 3. Obrigações do destinatário: Dever de retirar a coisa no local de desembarque quando não acertado o local da entrega, não possuindo o direito de ser avisado quando da chegada da coisa; dever de conferir a coisa entregue e apresentar reclamações, sob pena de decadência dos direitos.
Quanto à responsabilidade civil objetiva do transportador à integridade da carga, limitar-se-á nessa modalidade de contrato, conforme nos ensina Maria Helena Diniz, ao quantum constante do conhecimento de frete (tendo início a partir do instante em que ele, ou seu preposto, receber a coisa e terminando com sua entrega ao destinatário ou o seu depósito em juízo, se aquele não puder ser encontrado, evitando assim, a mora).
Ainda, de acordo com a doutrinadora, o risco com o transporte fica por conta do transportador, exceto se a coisa se perder ou deteriorar por culpa do remetente ou em razão de força maior. Todavia, será preciso esclarecer que o limite da responsabilidade ao valor atribuído pelo contratante só diz respeito à sua avaria ou perda. O transportador responderá pelas perdas e danos que remetente, destinatário ou terceiro vierem a sofrer com o transporte, em razão de atraso, desvio de itinerário etc., em qualquer limitação ao valor contido no conhecimento de frete.
Quando se tratar de transporte cumulativo, conforme preceitua o art. 756 do CC/02, o transporte cumulativo de mercadoria gera responsabilidade civil solidária perante o remetente, pela incolumidade da carga, por ser difícil determinar dentre os vários transportadores o culpado pelo dano causado, embora cada um seja obrigado pelo percurso parcial feito ou pela etapa assumida. Dessa forma, o remetente poderá acionar qualquer um deles para obter o quantum indenizatório pelo prejuízo sofrido. Ressalva-se nesse caso, a apuração final da responsabilidade entre eles, de forma que a reparação do prejuízo venha a recair, integral ou proporcionalmente, naquele em que cujo percurso houver ocorrido o dano. Dessa forma, o que pagar a indenização ao remetente, não sendo o culpado, terá ação regressiva contra o causador do prejuízo.
No que diz respeito à responsabilidade civil do destinatário, frise-se que a responsabilidade sobre a coisa passa a ser do destinatário no momento em que este recebe a coisa do transportador ou nos casos em que o destinatário for retirar a coisa.
Acerca do conhecimento de frete, trata-se de documento emitido quando da entrega do objeto ao transportador. É o correspondente ao bilhete de passagem no transporte de pessoas e possui a característica da literalidade, ou seja, o que estiver escrito no mesmo valerá como lei. Outra característica é a de ser um documento endossável, a exceção de possuir cláusula “não à ordem”.
Quanto à disciplina jurídica do contrato de transporte de pessoas, o Código Civil de 2002 regula a matéria nos artigos 734 a 742 e pode ser definido como sendo aquele em que o transportador se obriga a remover uma pessoa e sua bagagem de um local a outro, mediante remuneração.
Temos que, conforme o meio em que o transporte é feito, o contrato pode ser terrestre, marítimo, aeronáutico. Ressalte-se que nessa modalidade de contrato há dois contratantes: transportador, que é quem se compromete a fazer o transporte, e o transportado, que é o passageiro, quem paga certo preço ao adquirir um bilhete de passagem, que poderá ser nominativo ou ao portador, e dará direito a ser transportado, quem se apresentar com ele.
O transporte de pessoas abrangerá a obrigação de transportar a bagagem no próprio compartimento em que viajar o transportado, ou em depósito apropriado do veículo, mediante despacho. O transporte de bagagem é acessório ao contrato de transporte de pessoa, devendo haver pagamento, só no caso de excesso de peso, tamanho ou volumes.
Com a celebração do contrato o transportador será responsável nas seguintes situações: se não transportar o passageiro de um lugar para o outro, no tempo e modo convencionados. Salvo por motivo de força maior. Frise-se que, o passageiro por sua vez, tem direito a exigir o transporte, desde que apresente o bilhete de passagem, como também a observar as normas estabelecidas pelo transportador constantes do bilhete de passagem, no interior do veiculo. Destaca-se que se o comportamento do passageiro for anti-social, deverá o mesmo, ante o princípio da boa-fé objetiva, arcar com as conseqüências, mesmo de a responsabilidade do transportador ser objetiva. Conforme mencionado no art. 739 do Código Civil de 2002, o transportador não pode recusar passageiro, salvo casos previstos no regulamento, ou se as condições de higiene ou saúde do interessado justifiquem; não efetuar o transporte com cuidado, exatidão e presteza; houver danos causados aos viajantes, oriundos de desastre não provocado por força maior ou caso fortuito, ou por culpa exclusiva do passageiro. Em tal caso, a indenização será variável conforme a natureza e extensão do prejuízo. Como o transporte assume uma obrigação de garantia, deverá responder por todos os defeitos e vícios do veículo, que impeçam o seu uso pacífico pelo passageiro; ocorrer um acidente, cuja causa não seja esclarecida, sendo que ele responderá por isso, devendo provar que o fato deu-se por força maior, caso fortuito, ou culpa da vítima; e em caso de lesão corporal ou deformidade que invalide a capacidade de trabalhar, ao tratamento médico, lucros cessantes, e mais uma indenização arbitrada pelo juiz. No caso de morte deverá pagar o sepultamento da vítima, e uma indenização àqueles privados de alimentos pelo fato, bem como auxílio educação.
O código adotou de maneira expressa, a responsabilidade objetiva do transportador que responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo por motivo de força maior. Cumpre destacar que o dever do transportador de responder pela incolumidade do viajante e de conduzi-lo são e salvo ao seu destino não poderá ser afastado por estipulação que exonere o transportador de sua responsabilidade, por ter assumido obrigação de resultado, ou seja, de conduzir o passageiro são e salvo ao local de destino. Somente a culpa exclusiva da vítima ou a ocorrência de evento fortuito excluem o dever de indenizar.
Sintetizado e complementando o parágrafo anterior temos: há responsabilidade do transportador no transporte oneroso de pessoas, pois o transporte gratuito não se submete a tais regras; no contrato de transporte oneroso está implícita a cláusula de incolumidade do passageiro, cuja frustração gera responsabilidade objetiva do transportador; o art. 14 do CDC dispõe que o fornecedor de serviços responde independentemente de culpa, pelos danos causados na prestação do serviço; o art. 734 do CC traz hipótese de responsabilidade objetiva; a força maior e o caso fortuito externo excluem a responsabilidade do transportador, o mesmo quando há culpa exclusiva da vítima. Quanto ao passageiro pingente, que fica pendurado do lado de fora por falta de condições adequadas na prestação do serviço, há direito à indenização.
De acordo com a Súmula 187 do STF, temos:
“A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.”
Dessa forma, o transportador paga uma indenização, por dano moral ou patrimonial, variável conforme a natureza ou extensão dos prejuízos, abrangendo tanto danos emergentes como os lucros cessantes.
A responsabilidade do transportador requer que o dano ao passageiro ocorra durante a vigência do contrato, isto é, a partir do momento em que o indivíduo entra na estação de embarque, pede o bilhete no guichê, ou faz um sinal ao transportador, até o instante em que deixa o veículo, e atravessa o portão de saída da estação de desembarque.
É importante destacar, ainda, o assalto ocorrido durante o transporte. Apesar de divergências na doutrina, existem inúmeras jurisprudências, no sentido de que o assalto a mão armada no interior de ônibus, embora se pudesse ter meios de evitá-lo, equipara-se ao caso fortuito (fato imprevisível), que isenta de responsabilidade o transportador, sob o fundamento de que o dever de prestar segurança pública ao passageiro é do Estado, conforme disposto no art. 144 da Constituição Federal, dessa forma não se pode transferi-la ao transportador.
Importante registrar, quanto ao tema, a responsabilidade do transportador pelo dano causado ao seu preposto, visto que a responsabilidade civil do empregador será, em regra, subjetiva, exceto se a atividade é caracterizado como de risco habitual.
Tomou corpo no meio doutrinário a discussão a respeito da responsabilidade civil do transportador em face de pedestre, pois um acidente não atinge apenas os passageiros, mas também os transeuntes. Merece destacar a percuciente lição de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, in verbis:
Em nosso pensamento, trata-se de situação de responsabilidade civil aquiliana, também de natureza objetiva, por considerarmos o terceiro vítima do evento, equiparado ao passageiro/consumidor, nos termos do art. 17 do Código de Defesa do Consumidor.
Importante registrar que, em se tratando de transporte público, explorado por permissionário ou concessionário do serviço, a Constituição Federal em seu art. 37, § 6º, estabelece a responsabilidade sem culpa do transportador. Necessário, por derradeiro, registrar que ocorrendo à mudança de itinerário e se está se der por motivo de força maior, o transportador não poderá ser responsabilizado, nos termos do art. 737 do CC/02.
Quanto ao transporte gratuito, o mesmo poder ser definido como sendo aquele feito por simples cortesia ou amizade, dessa forma não regulamentado pelas normas legais sobre o contrato, e por isso não acarreta a responsabilidade civil objetiva do transportador.
Saliente-se que se o passageiro, conduzido gratuitamente, vier a sofrer alguma lesão, o motorista só terá responsabilidade subjetiva fundada na culpa. Dessa forma, o lesado só poderá acioná-lo provando sua imprudência, negligência ou imperícia, para haver a reparação do dano moral ou patrimonial sofrido durante o percurso. No transporte gratuito a responsabilidade é subjetiva e a doutrina entende que é aquiliana.
Observa-se, no entanto, que o transporte de idoso que é gratuito por força de lei especial, não tipifica transporte por mera cortesia e acarreta responsabilidade contratual objetiva do transportador.
Essencial registrar a questão relativa no transporte interessado, sem remuneração direta, posto que o condutor não seja diretamente remunerado, afere vantagem indireta à custa do conduzido. Ocorrendo um alboroamento lesivo no caminho, o transportador poderá ser responsabilizado, segundo as regras de responsabilidade civil contratual constante no sistema de defesa do consumidor. Como exemplo, podemos citar a situação em que um representante de vendas faz questão de levar o seu cliente até o seu stand. Trata-se de um acidente de consumo gerador de responsabilidade civil objetiva, devendo ser aplicadas as regras do contrato de transporte tendo incidência a cláusula de segurança.
Quanto ao transporte clandestino não há amparo legal que regule determinado tipo de transporte. Podemos entender por transporte clandestino, como sendo aquele pelo qual uma pessoa se introduz num veículo sem o conhecimento do condutor, viaja burlando a vigilância da fiscalização, etc. Nesse caso, o transportador não sabe que está levando algum passageiro ou alguma mercadoria. O ônus da prova recai sobre quem alega, pois a clandestinidade deve ser provada. Provada a clandestinidade não há responsabilidade do transportador, nem do prisma da responsabilidade contratual, nem do da responsabilidade aquiliana.
Conforme o meio em que é feito o transporte, o contrato pode ser: Terrestre: abrangendo todos os meios de transportes dessa modalidade, e analogicamente tem sido aplicados aos acidentes ocorridos em barcas, elevadores etc.; Marítimo ou aquaviário: o marítimo é chamado de fretamento, e no transporte de pessoas, aproxima-se da hospedagem; e Aeronáuticos ou aéreos: são os que utilizam o espaço aéreo internacional ou nacional, advento do artigo 1º da Convenção de Varsóvia.
Em suma, o estudo do instituto da responsabilidade civil se faz necessário para a melhor compreensão das relações contratuais e extracontratuais e para devida aplicação do direito ao caso concreto.
Referencias BIBLIOGRÁFICAS
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009
DINIS, MARIA HELENA. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2007
GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2007
Advogada. Mestra em Educação pela Universidade de Uberaba - Uniube.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Elizangela Santos de. Responsabilidade civil no transporte de pessoas e coisas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jun 2010, 01:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/20025/responsabilidade-civil-no-transporte-de-pessoas-e-coisas. Acesso em: 23 dez 2024.
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