Co-autor: LUÍS FERNANDO RIBAS CECCON - Advogado. Pós graduado em Direito Civil a e Processual Civil junto a Faculdade Damásio de Jesus.
Erigiu-se primordialmente, o instituto sub judice, na jurisprudência anglo-saxônica a ora denominada desconsideração da personalidade jurídica, sendo vastamente conhecida como "disregard of legal entity" ou "disregard doctrine", expressões estas por vezes utilizadas por alguns doutrinadores brasileiros. Nos países da Common Law utilizam-se também vertentes retóricas denominadas de "piercing the corporate veil". No Direito Alemão, apresenta-se ainda em "Durchgriff derr juristichen Person"; no Direito Italiano "superamento della personalitá giuridica" e no Direito Argentino "desestimácion de la personalidad".
É de suma relevância constar que, no Brasil a expressão utilizada diuturnamente e mais acertada para tal instituto jurídico em fulcro é a denominada desconsideração da personalidade jurídica; não se podendo sequer apontar no que assevera para a despersonalização da pessoa jurídica, visto que não se trata de mero termo de carga axiológica, mas sim por haver clarividentemente uma grande e vasta distinção entre ambos os institutos legais em análise.
Os termos susos referidos possuem denominação diametralmente oposta, assim o sendo, despersonalizar é completamente dispare de desconsiderar a personalidade jurídica, em fulcro.
Diante do exposto, a palavra despersonalizar possui por base precípua o ato de anular a personalidade, o que não é visto na desconsideração da pessoa jurídica. Nesta mesma esteira, jamais se anula a personalidade, ao contrário, esta se resta ainda mais tutelada, não se tratando de despersonalização, mas de sim de simples desconsideração, com a retirada momentânea de eficácia do manto protetor da personalidade jurídica mediante um processo judicial conduzido por um magistrado devidamente investido e competente no efetivo exercício jurisdicional.
A desconstituição da personalidade jurídica não possui por escolpo anular a personalidade jurídica, mas somente objetiva desconsiderá-la no caso concreto, dentro de todos os seus parâmetros legais, em relação as pessoas de seus sócios, bem como de seus administradores, quando verificados casos latentes de má-fé e de fraude no âmbito empresarial.
A desconsideração da personalidade jurídica, trata-se de uma técnica de ordem eminentemente judicial que se aplica a casos concretos específicos e extraordinários; razão pela qual se fala em suspensão episódica e temporária. Há que se afirmar, que a pessoa jurídica continuará a existir para todos os seus demais atos, nos quais não haja um motivo justificado para que se estenda os efeitos da desconsideração jurídica, ora aludida.
Diante da possibilidade de se desvirtuar abusivamente da função protetiva da personalidade jurídica, é que surgiu a doutrina da sua desconsideração, a qual permite a superação da autonomia patrimonial da pessoa jurídica em relação a figura de seus sócios.
De plano, há que ressaltar que a desconsideração prescindia de fundamentação legal no ordenamento jurídico pátrio para a sua preliminar aplicação nos casos concretos que se apresentavam as portas do Poder Judiciário, visto que não havia nenhuma lei expressa nesse sentido no Brasil, que autorizaria a aplicação de tal teoria em análise. Por isso utilizávamos analogicamente o artigo 135 do Código Tributário Nacional, que responsabiliza pessoalmente os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado por créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poder ou infração a lei, contrato social ou estatutos.
Diante da inércia legislativa por delongos anos, o legislador pátrio houve por bem acolher a tão almejada teoria da desconsideração da personalidade jurídica diante do oportuno Código de Defesa do Consumidor, cujas normas positivadas foram transpostas e estendidas a outras relações, que não somente as de cunho consumeirista.
Concernente às infrações a ordem econômica (Lei 8.884/94), a que se ditar que houve praticamente a repetição do inteiro teor do artigo 28 do Código Consumeirista (Lei 8.078/90).
Posteriormente, acolheu-se a desconsideração da personalidade jurídica tangenciando às lesões ao Meio Ambiente (Lei 9.605/98), de igual forma acolhendo redação similar ao disposto no artigo 28, parágrafo 5º do ora analisado Código de Defesa do Consumidor. Desta feita, em termos de direito positivado a análise a ser feita é mediante a luz do que reza expressamente os ditames legais do Código de Defesa do Consumidor.
Com o advento e promulgação do Código Civil de 2002, dispôs acerca da repressão do uso indevido da personalidade jurídica, quando esta for desviada de seus objetivos fins para a prática de atos eivados ilicitude. Reza, com efeito, o artigo 50 do Código Civil: “Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”.
É de suma importância ainda salientar, a importância do princípio da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, o que nos leva impreterivelmente, a aplicar a tese da desconsideração da personalidade jurídica com o máximo de cautela judicial, ou seja, apenas em casos excepcionais, onde devidamente estarão atendidos todos os requisitos dispostos na lei infraconstitucional; visto que tais requisitos são demasiadamente específicos referindo-se basicamente ao desvirtuamento, por má-fé ou fraude por parte do sócio ou administrador, em ato atentatório a estrutura da pessoa jurídica.
Para que ocorra efetivamente a desconsideração da personalidade jurídica, é fundamental a prova concreta nos autos que a finalidade da pessoa jurídica fora desvirtuada por má-fé, confusão patrimonial ou fraude.
Por fim, conclui-se que, com a desconsideração da personalidade jurídica ocorre o fenômeno da despersonificação, ou seja, para que o patrimônio dos sócios responda pelas obrigações contraídas em nome destes, é estritamente fundamental e necessário que se configure as figuras: da fraude, da confusão patrimonial, da má-fé na persecução do objetivo social, ou ainda do abuso de direito relacionado à autonomia patrimonial.
AUTORES COLABORADORES: MARINA VANESSA GOMES CAEIRO
LUÍS FERNANDO RIBAS CECCON
Precisa estar logado para fazer comentários.