Co-autor: LUÍS FERNANDO RIBAS CECCON - Advogado. Pós graduado em Direito Civil e Processual Civil junto a Faculdade Damásio de Jesus.
De proêmio, é de suma relevância, iniciarmos o estudo dos abrigos para veículos (garagens), citando o conteúdo normativo expresso no parágrafo primeiro, do artigo 1.331, do Código Civil de 2002, que reza, in verbis: "as partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas, sobrelojas ou abrigos para veículos, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se à propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários."
Destarte, Garagens, pois, seria o termo mais acertado ao que grafamos acima. Questões de apego à literalidade à parte, o assunto garagem prontifica-se na incidência de inúmeros litígios judiciais acerca da disciplina jurídica dos condomínios, bem como ao alcance desse dispositivo legal, urge tratá-la sob três facetas que seguem:
Outrossim, a considerar-se, garagem, unidade autônoma, impende fração ideal correlata no solo e nas partes comuns da edificação, sujeitando-se as regras de uma propriedade de per si, assim como um apartamento ou uma sala comercial.
Nesse diapasão, perante o Registro de Imóveis, neste caso, a garagem poderá fazer-se constar de matrícula própria.
Nessa mesma esteira de pensamento, ressalta-nos o entendimento, que a garagem constituída nos moldes de unidade autônoma, perfeitamente individualizada e discriminada, poderá ser livremente alienada e gravada por seu nu proprietário; não se admitindo no caso em tela a disciplina da norma civilista expressa no artigo 1.338, do Novo Código Civil, segundo a qual, resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículos, deverá fazer prevalecer o direito de preferência inicialmente aos condôminos, após aos estranhos ao quadro condominial e, em geral visão, aos possuidores.
Exponencialmente relevante, mostra-se a justificativa dessa assertiva suso mencionada, tendo em vista a dúbia redação que fora empregada no supra citado artigo 1.338 do Novo Código Civil que, ao fazer referência a área de abrigo para veículos remete-nos a impressão de estar vislumbrando a área comum de uso e fruição de toda a comunidade condominial.
Em sentido diametralmente oposto, assevera-se que a garagem, ou o denominado abrigo para veículos existente em uma edificação, pode afigurar-se como área de uso comum de todos os condôminos, onde cada um possui o direito sobre este espaço físico, considerado como um todo.
No mesmo sentido, em sede do Registro Imobiliário, a área correspondente a este espaço sub judice será, de conformidade com os respectivos cálculos informativos da constituição do condomínio, lançada como área comum nas próprias matrículas das unidades autônomas, conjugada com as demais áreas comuns correspondentes.
Nessa mesma esteira, segue-se que o espaço destinado ao abrigo para veículos, garagem, delimitado ou não em boxes de estacionamento, poderá constituir-se em direito vinculado a determinadas unidades autônomas, como se acessório fosse.
Destarte, no Registro de Imóveis, esse direito representado em determinado quantum de área, restará contido na matrícula da respectiva unidade autônoma que comportar um box na área destinada ao abrigo para veículos.
Nesse diapasão, em relação ao que tange o abrigo para veículos, garagem, outro mandamento legal nos chama a atenção, qual seja, o artigo 1.339, do Novo Código Civil, em especial a regra contida em seu parágrafo 2º, da qual reza expressamente, in verbis: "É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela não se opuser a respectiva assembléia geral".
Pedra angular que nos norteia em relação a alienação de parte acessória de uma determinada unidade autônoma, referente a garagem, consistente em um box de estacionamento, cuja área respectiva se junta na fração ideal dessa unidade e em única matrícula imobiliária, afirma-se que esta comportará de plano, alteração da fração ideal de todas as demais unidades, acaso ela seja alienada separadamente.
Consectário lógico desse entendimento presumi-se que a alienação de parte acessória, como bem individuado, deverá necessariamente demonstrar equivalência a uma fração ideal no todo.
Em outra via, afigura-se como perfeitamente admissível, que essa parte acessória seja alienada em comunhão com a unidade autônoma respectiva, pratica que consideramos ser mais acertada, seja em razão da inteligência do artigo 92 do Código Civil de 2002, seja pelas implicações que esse fracionamento iria acarretar na composição das demais unidades.
Nesse sentido, então, importante fazer menção quanto ao eventual conflito existente entre a regra emanada do parágrafo 2º, do artigo 1.339 Código Civil de 2002, com a constante no artigo 92 do mesmo diploma legal, à razão de que, se a coisa acessória supõe sua existência jurídica a uma principal, qual das normas deverá ser aplicada?
No conflito entre regras, a aplicação de duas diferentes prescrições jurídicas, ambas válidas, conduzem a resultados incompatíveis entre si. E assim preconiza de forma magistral o eminente doutrinador em semelhantes termos, Norberto Bobbio, que soluciona a questão prelecionando em semelhantes termos, que em determinados casos, tais tensões podem ser sanadas mediante o emprego de critérios de resolução de conflitos entre regras jurídicas.
Diante do exposto, pode-se veementemente estabelecer a prevalência da regra especial sobre a regra geral (lex specialis derogat legi generali), utilizando o tão consagrado Princípio da Especificidade.
Consectário desse entendimento, partindo-se da premissa de que as normas ao condomínio edilício possuem maior grau de especialidade, em outra conclusão não se chega, que não pela derrogação do artigo artigo 92, pelo do parágrafo 2º, do artigo 1.339, ambos do vigente Código Civil de 2002.
Em derradeira conclusão, importante afirmar que o desmembramento do abrigo para veículos, garagens, ou seja parte acessória, em relação as unidades autônomas (principal), depende sempre de prévia anuência de todos os condôminos, a ser deliberada em assembléia geral, desde que expressamente previsto no ato constitutivo do condomínio, conforme preconiza a parte final do parágrafo 2º, do artigo 1.339, do Novo Código Civil.
AUTORES COLABORADORES: MARINA VANESSA GOMES CAEIRO
LUÍS FERNANDO RIBAS CECCON
Precisa estar logado para fazer comentários.