A saúde é um direito fundamental garantido constitucionalmente de forma gratuita e universal, adequadas às necessidades da pessoa humana.
O Sistema Único de Saúde foi criado pela Constituição Federal de 1988 (regulamentado pelas Leis nº 8.080/90 e 8.142/90) com a finalidade de alterar a situação de desigualdade na assistência à saúde da população tomando obrigatório o atendimento público a qualquer cidadão. O SUS é destinado a todos os cidadãos e é financiado com recursos arrecadados através de impostos e contribuições sociais pagos pela população e compõem os recursos do governo federal, estadual e municipal, ou seja, todos nós contribuímos. Este Sistema tem como meta prestar serviços com qualidade adequados às necessidades, independente do poder aquisitivo do cidadão.
Os artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988 reconhecem a saúde como direito fundamental das pessoas e dever do Estado. Assim dispõe o Artigo 196 da nossa Carta Maior: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação”. No mesmo sentido o artigo 2º da Lei Nº 8.080/90 diz que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”. Destarte, a saúde é um direito público subjetivo, um bem jurídico constitucionalmente tutelado. Ao poder público cabe formular e implementar políticas sociais e econômicas que visem a garantir aos cidadãos o acesso universal e igualitário à assistência médico hospitalar.
No momento em que um cidadão brasileiro não for atendido pelo Sistema Único de Saúde, sendo este atendimento imprescindível, o caminho a ser percorrido será a via judicial. Não visualizo outro caminho. A própria Constituição Federal em seu artigo 5º inciso XXXV dispõe que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Dessa forma é legítima a intervenção jurisdicional que visa a afastar lesão ou ameaça a esse direito, ou seja, o direito a saúde. Não entendo aqui a invasão do Poder Judiciário em outra esfera, mas sim a possibilidade de fazer cumprir um direito fundamental garantido pela própria Constituição. É por desconsideração do Estado que a justiça é acionada.
O mínimo existencial é considerado um direito às condições mínimas de existência humana digna que exige prestações positivas por parte do Estado. Sabemos que a dignidade humana é o alicerce e o ponto de partida para a efetivação de qualquer direito fundamental. Dentre outros, podemos incluir no mínimo existencial a saúde básica. Sem ela não há o que se falar em dignidade da pessoa humana. Se o mínimo existencial for descumprido acredito ser justificável a intervenção do Judiciário nas políticas públicas seja para corrigir seus rumos ou ainda implementá-las.
No entanto (e não raras vezes), para justificar o não cumprimento da sua obrigação constitucional, o Estado alega a inexistência de recursos em virtude de limitação orçamentária. É preciso entender que a saúde, um dos bens mais importantes na vida das pessoas, não tem preço. Não há como impor limites de recursos: é dever de o Estado atender as necessidades vitais do ser humano.
A respeito do assunto, tem-se levantado a questão da “reserva do possível” a qual sustenta a idéia de que a efetivação dos direitos sociais estaria condicionada às limitações de ordem econômica. Ora, o Estado deve garantir o direito à saúde determinando que o mesmo providencie os recursos necessários, seja através da suplementação de créditos orçamentários, ou ainda do remanejamento/transferência de outra categoria menos importante. É insuficiente a justificativa de que inexistem recursos, principalmente em casos que envolvem o direito à vida e à dignidade humana.
A teoria da reserva do possível tem sido interpretada como limitação à efetivação de direitos fundamentais sociais em face da incapacidade jurídica do Estado em dispor de recursos para a efetivação do direito. Essa teoria não pode servir como barreira para a não realização dos direitos e prestações sociais. Ela não pode ser usada como desculpa para omissão Estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais. Não se pode negar a prestação do direito à saúde/vida sob ao argumento da indisponibilidade de recursos.
Não podemos negar que a saúde insere-se no mínimo existencial para uma vida digna. Dessa forma, quando se recorre ao Judiciário para que conceda medicamentos ou tratamentos médicos, independente do valor dos mesmos, necessário se faz a concessão da tutela pretendida, tendo em vista que para aquela pessoa que está demandando, este é o único meio de garantir o seu direito ao mínimo existencial.
Acredito que se deve sempre levar em conta que entre proteger o direito à vida, direito este inalienável assegurado pela própria Constituição da República em seu art. 5º, caput, ou fazer prevalecer um interesse financeiro e secundário do Estado, há uma só e possível escolha: respeitar sempre o direito à vida.
A saúde pública necessita de atenção especial. É inaceitável ver pessoas morrendo em corredores de hospitais públicos por falta de atendimento.
REFERÊNCIAS
MÂNICA, Fernando Borges. Teoria da Reserva do Possível: Direitos Fundamentais a Prestações e a Intervenção do Poder Judiciário na Implementação de Políticas Públicas Revista Brasileira de Direito Público, Belo Horizonte, ano 5, n. 18, p. 169-186, jul./set. 2007.
OLIVEIRA, Rafael Sérgio Lima de. CALIL, Mário Lúcio Garcez. Reserva do possível, natureza jurídica e mínimo existencial. Paradigma para uma definição. Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 7. ed. Ver. atual. ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2007.
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