Coautora: Silvana Duarte dos Santos: Pós-Graduada em Docência no Ensino Superior pelas Faculdades Integradas de Par. MS, Graduado em Administração pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), em Ciências Contábeis pelas Faculdades Integradas de Par.-MS
Resumo: Na esfera do Direito Internacional cresce a consciência sobre a necessidade de se criar um sistema de normas que promovam a efetiva proteção dos direitos fundamentais. Nesse contexto, a Constituição Federal de 1988 consagra o direito de livre locomoção dentro do território nacional, oferecendo o Habeas Corpus como remédio contra qualquer tentativa de restringir o seu exercício. Em decisão recente, o STF reiterou sua posição favorável à possibilidade de pleno acesso por parte dos estrangeiros, inclusive não domiciliados no Brasil a instrumentos de tutela à liberdade, sobretudo ao Habeas Corpus.
Palavras–chave: Habeas Corpus. Estrangeiros não domiciliados. Direitos Fundamentais.
Summary: In the sphere of international law is growing awareness about the need to create a system of standards that promote the effective protection of fundamental rights. In this context, the Constitution of 1988 enshrines the right of free movement within the country, offering the Habeas Corpus as a remedy to cure the breach of that right. In a recent decision, the Supreme Court reiterated its position that favored the possibility of full access by foreigners not domiciled in Brazil, the instruments of protection of freedom, especially on habeas corpus.
Keywords: Habeas Corpus. Foreigners not domiciled. Fundamental Rights
A Constituição Federal de 1988 garantiu a todos os brasileiros, natos ou naturalizados, e estrangeiros residentes no país, a liberdade de locomoção como direito fundamental. Dessa forma, o Constituinte originário atribuiu-lhe o status de norma fundamental de aplicação imediata.
[...]
XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;
Também, é previsto no texto constitucional o remédio do Habeas Corpus que se configura em verdadeira garantia a ser utilizada quando ocorrer lesão ou ameaça de lesão à liberdade de ir e vir.
Assim preceitua o artigo 5°, LXVIII, da Constituição Federal:
[...]
conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
No Brasil, a primeira manifestação do instituto deu-se em 1821, através de um alvará emitido por Dom Pedro I, pelo qual se assegurava a liberdade de locomoção. A terminologia “Habeas Corpus” só apareceria em 1830, no Código Criminal. [1]
É tendência atual do Habeas Corpus servir como meio idôneo para garantir todos os direitos do acusado e do sentenciado relacionados com sua liberdade de locomoção. Deve ser enfatizado, porém, que o Habeas Corpus não poderá ser utilizado para a corrreção de qualquer inidoneidade que não implique coação ou iminência direta de coação à liberdade de ir e vir. [2]
Portanto, resta induvidoso ser o Habeas Corpus, remédio constitucional de fundamental importância para a efetivação do consagrado direito à livre locomoção em território nacional, direito este, indisponível em um Estado Democrático de Direito.
Nesse contexto, saliente-se que não há direitos humanos sem democracia, tampouco democracia sem direitos humanos. O regime mais compatível com a proteção dos direitos humanos é o democrático.
Conforme apontado pela doutrina, a legitimidade para ajuizamento do Habeas Corpus é um atributo de personalidade, não se exigindo a capacidade de estar em juízo, nem a capacidade postulatória, sendo uma verdadeira ação penal popular. [3]
De todo o exposto, deve-se atentar que a Constituição Federal só assegura a validade e o gôzo dos denominados direitos fundamentais nos estreitos limites do território nacional. Nesse contexto surge a indagação sobre a legitimidade para a impetração do habeas corpus por estrangeiro não domiciliado no país visto que a Constituição Federal em seu artigo 5º caput faz referência expressa à garantia dos direitos fundamentais somente aos brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil.
A jurisprudência pátria posiciona-se no sentido do acatamento da impetração do Habeas Corpus por estrangeiros, inclusive por aqueles que não tenham domicílio no Brasil.
A posição do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a condição de estrangeiro não domiciliado no território nacional não impõe sua desqualificação como sujeito de direitos e possuidor da titularidade às garantias legais e constitucionais.
Essa condição, de estrangeiro em trânsito, não pode servir de empecilho ao pleno acesso aos instrumentos de tutela à liberdade, sobretudo ao Habeas Corpus.
Também, já assentou o STF que a condição de estrangeiro e a circunstância de não possuir domicílio no Brasil, não autorizam que se adote contra o mesmo qualquer tratamento discriminatório ou arbitrário.
Impõe-se ao Poder Judiciário a concessão ao réu posto nessa situação, os direitos básicos ao devido processo legal, à ampla defesa, ao contraditório, à paridade de armas e ao julgamento perante o seu juiz natural.
É nesse sentido a recente decisão em sede de Habeas Corpus que sedimentou a posição do STF em relação à concessão do referido instituto aos estrangeiros não domiciliados no Brasil:
O súdito estrangeiro, mesmo o não domiciliado no Brasil, tem plena legitimidade para impetrar o remédio constitucional do "habeas corpus", em ordem a tornar efetivo, nas hipóteses de persecução penal, o direito subjetivo, de que também é titular, à observância e ao integral respeito, por parte do Estado, das prerrogativas que compõem e dão significado à cláusula do devido processo legal. [4]
No mesmo sentido é posição da doutrina especializada que mesmo ao afirmar que os direitos fundamentais são assegurados aos brasileiros e estrangeiros residentes no país, ressalva que o fato de a Constituição não incluir os estrangeiros não residentes não justifica sequer a possibilidade de legislação ordinária abusiva contra eles, pois o princípio da dignidade humana, como um fundamento do Estado democrático de direito faz uma proclamação de valor universal, abrangendo o ser humano. [5]
De todo o exposto, conclui-se que, apesar de a Constituição Federal de 1988 garantir os direitos fundamentais somente aos brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, a doutrina e o STF, por meio de uma interpretação sistemática, tem expandido aos estrangeiros não residentes o acesso a tais direitos.
Notas:
[1] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 11ª Ed. São Paulo: Ed. Método, 2007. p. 751
[2] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 18ª Ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2005. p. 112
[3] ______p. 113
[4] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 102041/SP. Rel. Min. Celso de Mello. Julgamento em 20/04/2010. DJe 154 em 20/08/2010. disponível em: www.stf.jus.br
[5] SILVA. Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 13ª Ed. Malheiros. 1997. p. 190.
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