1- Introdução
Proceder-se-á, no presente estudo, à discussão das principais incongruências inerentes ao modelo difuso de controle de constitucionalidade brasileiro, quando praticado pelo Supremo Tribunal Federal. Serão invocadas as deficiências da regra consagradora da participação do Senado na fiscalização da obra legislativa, não sem antes proceder-se, a um inventário dos marcos identificadores mais significativos desta modalidade de fiscalização normativa.
A exigência de participação do Senado Federal no controle difuso, para que se possa emprestar às decisões proferidas pelo STF eficácia erga omnes, revela-se obsoleta perante a atual configuração da jurisdição constitucional brasileira.
As circunstâncias históricas que tornaram propícia a criação da fórmula em comento não se reproduziram na nova ordem constitucional, inaugurada em 1988. Sua subsistência no sistema jurídico se mostra impertinente. Além disto, o seu manejo apresenta uma série de inconsistências e limitações que tanto comprometem a eficiência do método incidental, enquanto instrumento de tutela dos preceitos constitucionais, quanto fragilizam o papel do Supremo de guardião da Constituição.
A proeminência adquirida pelo modelo concentrado de investigação da legitimidade dos atos normativos, somada à transcendentalização dos pronunciamentos emanados da Excelsa Corte brasileira, completam um quadro em que se exalta a exigência de extinção, por despicienda, da prerrogativa constitucional outorgada ao Senado de intervir no controle incidental de normas praticado pelo Supremo Tribunal Federal.
Em última análise, pretende-se evidenciar as limitações deste regramento, demonstrando-se o quão dissonante ele se apresenta à luz do atual estágio vivido pela jurisdição constitucional brasileira.
2- A operacionalização da fiscalização incidental das normas
2.1- As características do modelo difuso de constitucionalidade
Começa-se por anotar que a aferição da compatibilidade vertical dos atos normativos, no modelo difuso, não poderá ser feita enquanto inexistir uma querela judicial real e concreta (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 268), que reclame, para a sua adequada resolução, o enfrentamento da questão constitucional. É dizer, não se instaura um procedimento judicial com o escopo precípuo de se impugnar diretamente a lei inquinada de inconstitucional, senão o ato, fato ou conduta que se quer praticar tendo-a como amparo (CLÈVE, 2000, p. 92).
Pode-se dizer, inclusive, que o desiderato do argüente da controvérsia constitucional não se traduz no desejo de preservação da harmonia e coerência do sistema normativo. Ele não se preocupa em ver extirpado do ordenamento jurídico o preceptivo legal supostamente violador da Lei Magna, tão pouco estar a clamar pela observância do postulado da supremacia da Constituição.
O que ele pretende, em verdade, é a simples obtenção de provimento judicial que obste a incidência do ato normativo acusado de ilegítimo perante o substrato fático por ele trazido aos autos do processo em que litiga.
Desta constatação extraí-se uma das características desta modalidade de fiscalização do afazer legislativo: enquanto inexistir uma querela jurídica palpável a reclamar a intervenção do judiciário, não se poderá atacar a espécie legislativa maculada pelo vício da inconstitucionalidade (BONAVIDES, 2008, p. 302). Daí dizer-se que o controle difuso pode também ser designado de controle concreto de constitucionalidade.
Deste elemento que se acabou de descrever emerge um segundo ponto que precisa ser consignado. Em verdade, trata-se de um consectário lógico da premissa acima assentada. Está-se a fazer referência à nota da prejudicialidade do conflito normativo à resolução da desavença intersubjetiva ensejadora do litígio judicial (VELOSO, 2000, p. 41).
Tal característica se faz presente na medida em que se percebe que desautorizado estará o juiz a dizer da legitimidade da norma infraconstitucional se as suas conclusões, a este respeito, não se revelarem imprescindíveis ao desfecho da controvérsia posta em apreciação (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 268).
Considera-se, assim, que a questão pertinente ao suposto vício do ato normativo deve ser enfrentada pelo juiz como prejudicial de mérito, enquanto antecedente lógico à resolução do conflito perante ele instaurado (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 300). Não se pode, pois, admitir que se pronuncie a invalidade de uma lei, se este juízo de desvalia não gerar nenhuma repercussão imediata perante o caso concreto em que se suscitou a dúvida constitucional.
Cuida-se, como se pode perceber, de um incidente cognitivo- de onde emerge a denominação controle incidental-, que tanto poderá ser ventilado por qualquer dos querelantes, enquanto fundamento jurídico de seu pedido ou defesa (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 299), como também emergir, por se tratar de questão de direito, por iniciativa do próprio magistrado (VELOSO, 2000, p. 43).
Este conhecimento de ofício da quizila constitucional legitima-se, sobremodo, ante a possibilidade de o ato impugnado, enquanto não houver obstada a sua eficácia, ferir direitos e garantias fundamentais das partes[1] (VELOSO, 2000, p. 43).
Cumpre anotar igualmente que a modalidade de aferição da constitucionalidade dos atos normativos em estudo, longe de constituir-se em um múnus atribuído a algum órgão específico, é vislumbrada como consectário da função jurisdicional (BITTENCOURT, 1997, p. 35). Exatamente por assumir esta premissa, o sistema jurídico que a contempla outorga a todos os seus órgãos investidos de jurisdição, independentemente do seu grau hierárquico, a prerrogativa de censurar as leis que compõe o seu ordenamento, desde que reconheçam sua ilegitimidade (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 299).
Importante acrescer, outrossim, que não se está diante de mera faculdade de que pode desfrutar o magistrado, mas sim de um autêntico poder-dever de afastar a incidência dos atos normativos ilegítimos dos seus julgados (BARROSO, 2007, p. 86). Vale dizer, não lhe é dado o direito de conhecer ou não da controvérsia constitucional. Inevitavelmente, ele terá de enfrentá-la, mesmo que, ao final, rejeite-a, por absolutamente impertinente.
E se é certo que qualquer órgão jurisdicional dispõe da atribuição de investigar a compatibilidade vertical dos atos normativos, é fato incontroverso também que todos os sujeitos integrantes de uma relação jurídica processual poderão ventilar a argüição de inconstitucionalidade (CLÈVE, 2000, p. 98). Não se adstringe tal faculdade aos indivíduos que se amoldem ao status de autor ou réu, vez que terceiros intervenientes, litisconsortes ou mesmo o Ministério Público, quando oficie, ou seja parte no feito, poderão igualmente suscitar a quizila constitucional[2] (CLÈVE, 2000, p. 98).
A esta altura da exposição, já se discorreu sobre os motivos pelos quais se qualifica a modalidade de controle de constitucionalidade aqui estudada em difusa, concreta e incidental. Falta-nos, todavia, a análise de outra expressão bastante corriqueira quando se quer fazer alusão ao tema em exame, qual seja, o controle “por via de exceção” ou de “defesa”.
Importa consignar que esta nomenclatura remonta ao período inicial de sua instauração no Brasil, em que o controle de constitucionalidade apenas poderia ser incitado mediante provocação dos indivíduos que tinham contra si uma pretensão deduzida por autoridade estatal calcada em norma supostamente inconstitucional (BARROSO, 2007, p. 81).
Mostrava-se imperioso que o indivíduo adotasse um comportamento passivo, e aguardasse a que fosse constrangido a se submeter ao regramento veiculado por ato normativo por ele reputado de ilegítimo (CLÈVE, 2000, p. 95-96). Assim, a menos que movido pelo intuito de robustecer a sua defesa, pugnando pelo desacolhimento do pleito estatal em face do seu patrimônio jurídico, vedada estava a instauração do debate constitucional (CLÈVE, 2000, p. 96).
Nesse sentido, assevera Lúcio Bittencourt (1997, p. 97) que “no controle por via de exceção, o lesado, em vez de atacar o ato diretamente, limita-se a se defender contra ele, se a autoridade tenta submetê-lo à sua aplicação”.
Evidentemente, esta versão restritiva do direito à provocação da jurisdição constitucional não se coaduna com a atual conjectura do modelo difuso de controle de constitucionalidade (CLÈVE, 2000, p. 96). Não se faz mais necessário que o sujeito tenha experimentado efetivo prejuízo decorrente da incidência de regramento inválido, sendo-lhe assegurada a prerrogativa de pugnar pela cassação dos seus efeitos, antes mesmo que estes tenham-lhe gerado alguma espécie de malogro (CLÈVE, 2000, p. 96).
Não se trata, obviamente, de uma permissão a que se possa discutir a lei de forma abstrata, pois o debate travado não poderá descuidar de aferir a repercussão oriunda da vigência do ato normativo impugnado perante o caso concreto (CLÈVE, 2000, p. 96).
Desta forma, o vocábulo “exceção” ou “defesa” deve ser apreendido em seu sentido amplo, de modo a alcançar toda espécie de tese jurídica, tenha esta sido lançada por autor ou réu, que se volte a tutelar algum bem jurídico da indevida incidência de uma lei inconstitucional (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 300).
O vocábulo “exceção” não poderá, igualmente, ser confundido com as modalidades de defesa instrumental postas à disposição do réu, tais quais as exceções de incompetência relativa e de suspeição (CLÈVE, 2000, p. 97).
A argüição de inconstitucionalidade não gera um incidente processual que reclame, para ser analisado, a instauração de autos apartados (CLÈVE, 2000, p. 97). Não se trata, assim, de uma defesa indireta, gerando, ao máximo, um incidente cognitivo que deve ser solucionado no bojo da fundamentação da sentença, decisão ou acórdão que se debruçará sobre a relação jurídica controvertida.
No que diz respeito ao âmbito cognitivo dos órgãos jurisdicionais, importa registrar que é possível argüir-se a ilegitimidade dos atos normativos primários ou secundários, bem como o direito pré-constitucional, oriundos dos três níveis de poder, independentemente de o juízo que venha a apreciar o caso concreto atuar na esfera estadual ou federal do judiciário (BARROSO, 2007, p. 84).
Pela clarividência de seu ensinamento, merece ser transcrito excerto da obra do constitucionalista acima aludido (2007, p. 84. Nota de rodapé n° 10):
A argüição de inconstitucionalidade compreende os atos legislativos em geral, inclusive emendas à constituição, lei complementar, lei ordinária, medida provisória (que é ato com força de lei), decreto legislativo e resolução de casa legislativa. Também estão abrangidos atos normativos secundários, como o decreto regulamentar, e mesmo atos dos regimentos internos dos tribunais. Não há distinção se o ato impugnado é federal, estadual ou municipal, ou se a impugnação se faz em face da Constituição Federal ou Estadual. Também tem pouca relevância se a inconstitucionalidade apontada é de natureza formal ou material.
Por também tocar a análise do objeto cognoscível, revela-se pertinente expor questão levantada por Dirley da Cunha Júnior (2008, p. 300) acerca da possibilidade de se aferir, também de modo incidental, as omissões inconstitucionais do Poder Público, não apenas através de mandado de injunção. Defende o autor a tese de que tal espécie de abusividade poderá ser enfrentada também mediante ação civil pública, ação popular, mandado de segurança ou outra qualquer ação judicial e perante qualquer órgão investido de jurisdição (2008, p. 300 e 302).
Em todos os casos, quando efetivamente comprovado que o descaso do Estado compromete preceitos constitucionais, deverá o Judiciário, provendo o caso concreto, e apenas ele, colmatar a lacuna inconstitucional, materializando-se o dispositivo da Lei Máxima desprezado pelo Poder Público (2008, p. 309).
Não se poderia finalizar esta breve exposição em torno das principais características do controle difuso de constitucionalidade sem se fazer menção à sua índole essencialmente informal.
Explica-se: a concepção clássica da fiscalização incidental, tal como forjado pelos norte-americanos, tinha com uma de suas principais premissas a prescindibilidade da observância de regramento procedimental específico, para que se pudesse argüir a ilegitimidade de alguma norma[3] (CAPPELLETTI, 1999, p. 86).
De mais a mais, por se tratar de questão de direito, e por traduzir-se em inequívoco interesse público, não está a ventilação da exceção de inconstitucionalidade sujeita à eficácia preclusiva[4]. Há de se ressalvar, apenas os casos que se amoldem às hipóteses de interposição de recurso extraordinário, onde o requisito do prequestionamento poderá, se inobservado, redundar em preclusão.
Para além da inexistência de método especificamente concebido a veicular o desate da controvérsia constitucional, há de se ressaltar que o controle difuso poderá ser exercido no bojo de qualquer espécie de procedimento (ação de conhecimento, de execução ou cautelar) ou rito (especial, sumário ou ordinário), sendo irrelevante, outrossim, a natureza da relação jurídica debatida (cível, penal, trabalhista ou eleitoral) (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 301).
Não seria despiciendo acrescer, ainda, que o modelo incidental de fiscalização normativa poderá ser manejado mediante o ajuizamento dos remédios constitucionais insculpidos na Carta Magna, tais quais o mandado de segurança, o habeas corpus, o habeas data, a ação popular e a ação civil pública (CLÈVE, 2000, p. 97).
A respeito deste último apontamento, há de se ponderar apenas o descabimento do manejo do mandado de segurança se o desiderato do seu impetrante se voltar à discussão de lei em tese (VELOSO, 2000, p. 45). Permite-se-lhe, todavia, invocar matéria constitucional enquanto causa de pedir de sua pretensão. Suficiente imaginar, neste sentido, a hipótese de a autoridade coatora haver praticado suposto ato ilegal ou abusivo tendo como amparo lei maculada pelo vício da inconstitucionalidade[5] (VELOSO, 2000, p. 45).
2.2- Os efeitos das decisões proferidas em sede de controle difuso de constitucionalidade
Passa-se à análise dos principais elementos característicos relativos ao plano eficacial das decisões oriundas de processos no bojo dos quais restou reconhecida, incidentalmente, a inconstitucionalidade de determinado ato normativo.
Conforme já se deixou assentado, o sistema difuso de constitucionalidade outorga a todos os órgãos jurisdicionais a prerrogativa de censurar as espécies legislativas emanadas do Poder Público. O juiz, após reconhecer a antinomia entre a legislação infraconstitucional e a Lei Maior, haverá de necessariamente recusar aplicação à norma de menor escala hierárquica à controvérsia apreciada (BITTENCOURT, 1997, p. 99).
De fato, em observância ao postulado da supremacia da Constituição, não se poderá permitir que uma lei inconciliável com Texto Magno possa, ainda assim, reger relações jurídicas que a ela possam aparentemente ser subsumidas. Indeclinável, pois, que juiz que afira, por ocasião da análise de uma lide de sua competência, vício desta envergadura, subtraia de sua resolução a sua incidência (CLÈVE, 2000, p. 112).
A norma inquinada não deixará, todavia, de existir no mundo jurídico, mas apenas não poderá ser utilizada como parâmetro a conduzir a solução do caso especificamente elucidado (BONAVIDES, 2008, p. 302-303). Cumpre anotar, a este respeito, que a apreciação da legitimidade da norma jurídica não faz coisa julgada (CLÉVE, 2000, p. 113), pois ela não integrará a parte dispositiva do decisum, inserindo-se no bojo das razões de decidir do julgamento, de modo suficiente apenas a alicerçar a fundamentação do juízo.
Desta forma, o ato normativo viciado, não importa a robustez com que viole a Constituição, não apenas remanescerá no ordenamento jurídico, com também, eventualmente, poderá reger outros fatos e condutas, mesmo que guardem nítida semelhança ao caso que ensejou o reconhecimento de sua inconstitucionalidade (BONAVIDES, 2008, p. 303). Suficiente, para tanto, imaginar que o magistrado que os aprecie convença-se, dissentindo da interpretação que apontou o vício normativo, da legitimidade da norma impugnada (BONAVIDES, 2008, p. 303).
Não se afigura impossível, ainda, que este posicionamento divergente emirja do próprio magistrado prolator da decisão que originariamente haja reconhecido a irregularidade da lei (BONAVIDES, 2008, p. 303), a qual, outrora rejeitada, passaria a incidir sobre um novo substrato fático, guarde ou não similitude com a situação inicial.
A factibilidade desta ocorrência se coaduna com a doutrina desenvolvida em torno dos limites da atuação do Judiciário nesta modalidade de fiscalização da constitucionalidade dos atos normativos. Conforme visto anteriormente, não atuam os tribunais no sentido de cassar as espécies legislativas viciadas (CLÉVE, 2000, p. 112). Não se trata de revisão dos trabalhos empreendidos por esta esfera do poder estatal, já que não se exerce a judicatura com o escopo de extirpar a lei viciada do ordenamento jurídico, mas apenas a pretexto de solucionar o conflito intersubjetivo apreciado.
O juízo de desvalia emitido sobre a norma jurídica acusada de inconstitucional equivale ao reconhecimento de sua inidoneidade a regrar o caso concreto. Tem-se, pois que todos os atos e condutas erigidos sob sua égide terão de ser desconstituídos (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 307-308). Impõe-se, em última análise, a inexistência da norma especificamente diante do problema analisado (BITTENCOURT, 1997, p. 95).
Esta eficácia inter partes e declaratória da invalidade da norma, se perfeitamente amoldada à concepção original do controle difuso de constitucionalidade, tem sofrido, em razão de suas limitações e das incongruências que podem ser geradas, temperamentos na nossa ordem jurídica.
Como bem ressaltado por Mauro Cappelletti (1999, p. 77-78), a inexistência de órgão judiciário de cúpula que possa emprestar às suas decisões, a respeito das questões constitucionais, efeito vinculante, de forma a orientar as instancias inferiores, oportuniza uma série de incongruências no sistema jurídico. Não se faz aqui menção apenas às decisões divergentes que possibilitam a coexistência de idênticas situações de fato sendo regidas por regramentos díspares (CAPPELLETTI, 1999, p. 77).
Não se pode desprezar a insegurança jurídica que pode ser gerada em razão de se entregar a avaliação da constitucionalidade de uma norma a análises pontuais (BONAVIDES, 2008, p. 305), desguarnecidas de um parâmetro interpretativo superior uniformizador. Além disto, é possível inferir também a constante necessidade de um mesmo juiz ou tribunal haver de se pronunciar indefinidamente sobre uma mesma questão de direito, sempre que provocado a tanto, nada obstante já haver cristalizado o seu entendimento sobre o assunto.
Cumpre observar, por fim, que a imposição de efeitos restritivos às decisões advindas do controle incidental, mesmo quando oriundas da mais alta instância do judiciário, conduz à necessidade de que toda pessoa tenha, ainda assim, de suscitar o debate constitucional, para preservar seu patrimônio jurídico de uma norma reiteradamente reconhecida ilegítima (CAPPELLETTI, 1999, p. 78).
Não custa repisar que, mesmo diante destes reiterados posicionamentos, não há qualquer garantia de que sua pretensão será bem sucedida, pois plenamente possível que o magistrado ou órgão colegiado que avalie a questão por ele instada, vá de encontro ao entendimento prevalente.
Estes problemas foram contornados, no Brasil, mediante a instituição, em 1934, da regra constitucional que impõe a participação do Senado como requisito imprescindível a se emprestar eficácia erga omnes às decisões proferidas pelo STF em sede de controle incidental de normas (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 309). A análise deste regramento será realizada com mais vagar em capítulo subseqüente deste trabalho.
Por ora, basta asseverar que foi esta a solução encontrada diante da inexistência, no Brasil, de uma cultura jurídica que fornecesse eficácia normativa às decisões provenientes do seu órgão jurisdicional de cúpula (CLÈVE, 2000, p. 114). Não há neste país instituto correlato ao stare decisis americano, cuja incidência impõe a paralisação da eficácia do ato normativo reconhecido como ilegítimo pela Suprema Corte (CLÈVE, 2000, p. 114).
Diante deste instituto, a norma maculada, em que pese remanesça formalmente no sistema jurídico, não poderá mais ser utilizada como suporte a amparar qualquer pretensão deduzida em juízo. Na verdade, ela acaba, na prática, dada a sua inaplicabilidade, por ser eliminada de forma definitiva do ordenamento jurídico (CAPPELLETTI, 1999, p. 82).
O postulado da eficácia declaratória e dos efeitos retroativos deste tipo de decisão vem igualmente sofrendo restrições pela jurisprudência e doutrina brasileiras (BARROSO, 2007, p. 21).
Com efeito, ante a possibilidade de a aplicação irrestrita dos efeitos desconstitutivos das relações jurídicas poder acarretar o desrespeito de preceitos constitucionais, tais quais os do direito adquirido e o da segurança jurídica (BARROSO, 2007, p. 21 e 25), defende-se que a regra da modulação dos efeitos, consagrada apenas para a modalidade abstrata de controle de constitucionalidade, seja estendida ao método incidental (MENDES, 2007, p. 292-298).
Neste diapasão, manifesta-se Dirley da Cunha Júnior (2008, p. 308):
(...) Neste contexto, em que pese os preceitos acima mencionados (faz ele alusão ao art. 27 da Lei n° 9.868/99, e ao art.11 da Lei n° 9.882/99, respectivamente) constarem de leis reguladoras do processo e julgamento das ações diretas de controle concentrado-abstrato de constitucionalidade, não temos dúvidas que elas podem servir de supedâneo para a modulação da eficácia temporal também no âmbito do modelo difuso-incidental de constitucionalidade.
3- O senado federal e o controle difuso de constitucionalidade
3.1- As circunstâncias fomentadoras da participação do Senado Federal no controle incidental de normas
A fórmula impositiva da atuação senatorial no controle difuso de constitucionalidade remonta a um período bastante divergente daquele instaurado pela Carta de 1988. Em 1934, inexistia, no Brasil, a modalidade abstrata de aferição da legitimidade dos atos normativos. Contava-se, tão-somente, com a investigação concreta do afazer legislativo, implantada desde a primeira Constituição republicana, de 1891[6].
A pecha de inconstitucionalidade imputada a uma determinada lei não gerava maiores desdobramentos, adstringindo-se os efeitos da decisão que a reconhecesse à relação jurídica processual no bojo da qual fora a argüição suscitada.
A inexistência de parâmetros jurisprudenciais formados pelo órgão de cúpula do nosso judiciário de modo a orientar as instâncias inferiores gerava inconvenientes (CUNHA JÚNIOR, p. 309-310).
A repetibilidade de demandas idênticas, provocadas por discussões que se reduziam a uma mesma questão de direito, e a insegurança proporcionada por interpretações divergentes geravam incômodos e precisavam ser solvidos (CLÈVE, p. 115).
Para além de incongruências de índole pragmática, o sistema difuso de constitucionalidade então vigente atraia um desconforto de natureza doutrinária.
Com efeito, um dos inúmeros influxos advindos da proeminência da doutrina americana sobre a nossa jurisdição constitucional proporcionou a incorporação do dogma da nulidade da lei inconstitucional no Brasil (BARROSO, 2007, p. 18). Desta forma, a decisão judicial que reconhecesse tal espécie de vício possuiria natureza meramente declaratória, retroagindo, em razão disso, seus efeitos, de modo a atingir todos os atos praticados sob sua égide relacionados ao caso concreto em apreciação.
Dito de outra forma, havíamos incorporado a tese de que um ato normativo inconstitucional, dada a envergadura do seu vício, deveria ser considerado inexiste, írrito ab initio (MENDES, 2004, p. 150).
Diante desta premissa, tornava-se ardorosa a tarefa de encontrar coerência em um sistema que permitia a manutenção no ordenamento jurídico de uma lei, mesmo quando a sua legitimidade já havia sido afastada pela mais alta instância do Judiciário (MENDES, 2004, p. 150). Não havia, pois, como amparar dogmaticamente a tese da ampla ineficácia da lei inconstitucional (MENDES, 2004, p. 150), se a única sanção estabelecida pelo nosso sistema à norma inconciliável ao Texto Supremo limitava-se a tolher sua incidência tão-somente ao caso concreto que culminou no reconhecimento do seu vício.
Foi diante deste cenário que se concebeu a regra em estudo.
Apontados os motivos ensejadores da necessidade de se criar algum mecanismo que pudesse conferir eficácia ampliativa às decisões do Supremo, cumpre indagar o porquê de se haver designado o Senado como instituição encarregada de cumprir este desiderato.
Algumas circunstâncias históricas precisam ser aqui registradas, pois cruciais a elucidar as razões que impulsionaram o constituinte de 1934 a elaborar uma fórmula, que se repetiria nas Constituições subseqüentes.
Com efeito, usufruía o Senado, na década de 30, de um prestígio político- institucional que o colocava em posição de proeminência em relação aos demais organismos que compunham o Estado brasileiro (PALU, 2001, p. 151). Atribuiu-se-lhe, na carta de 1934, o status de entidade coordenadora dos Poderes da República, o que o assemelhava, em certa medida, ao Poder Moderador Imperial (PALU, 2001, p. 124).
A própria nomenclatura que havia sido proposta para designar o Senado (Conselho Supremo), e que acabou não sendo aproveitada, bem indica este espaço especial a ser por ele ocupado no âmbito da ordem estatal que se queria inaugurar (PALU, 2001, p. 124- 125). Pretendia-se criar uma espécie de Quarto Poder, intento que acabou não se materializando (ALENCAR; p. 267-268, 1978, apud. MENDES, 2004, p. 151)
O Senado Federal não foi concebido pelo constituinte de 1934 como uma Casa Legislativa. Não há de se estranhar, aliás, o fato de o mesmo não haver sido incorporado ao Capítulo da Constituição que tratava do Poder Legislativo (PALU, 2001, p. 125). Criou-se, ao invés disso, um seguimento no Texto constitucional especialmente para lhe dar assento, denominado de “Da Coordenação dos Poderes” (PALU, p. 125).
Apenas para que se ilustre o papel de notável relevo conferido ao Senado pela ordem constitucional que se inaugurava naquele período, cumpre elencar algumas das atribuições que lhe foram estabelecidas[7].
Eram incumbências do Senado Federal, dentre outras, o exame dos regulamentos expedidos pelo Executivo, podendo suspender os que fossem considerados ilegais (art. 91, II); a convocação extraordinária da Câmara dos Deputados (art.92, §1°, VII) e revisão dos projetos de lei que deveriam ser aprovados conjuntamente (art. 91, VII); a promoção da coordenação entre os poderes federais e da continuidade administrativa (art. 88); edição de lei regulamentadora da intervenção federal (art. 41, §3°).
Foi exatamente neste cenário que se edificou a fórmula consagradora da eficácia ampliativa das decisões proferidas pelo STF. Não é difícil encontrar, dentro da arquitetura dos Poderes edificada pela Constituição de 1934, as razões que amparavam a designação desta competência ao Senado Federal.
Ora, enquanto entidade encarregada de velar pela harmonia e equilíbrio entre os Poderes (CLÈVE, p. 125), competiria ao Senado decidir, em última instância, pelo afastamento de um ato normativo- editado pelo Legislativo ou Executivo- em razão de entendimento oriundo de um órgão integrante do Judiciário, que o considerava inválido.
Assumia o Senado uma espécie de papel de interlocutor entre as diferentes esferas estatais, um verdadeiro árbitro das conseqüências que um pronunciamento judicial poderia provocar na obra edificada pelo Legislativo ou Executivo.
Não se pode desprezar o fato de que, naquele período, as concepções de separação de poderes enraizadas no país ainda sofriam nítida influência do modelo europeu do Século XVIII (VELOSO, p. 58). Aquela concepção rígida e inflexível não poderia mesmo se coadunar com a idéia de se atribuir a algum órgão judicial, ainda que localizado na cúpula do Judiciário, a prerrogativa de cassar a incidência de uma lei, de forma ampla e restrita.
Temia-se, fundamentalmente, a instauração, no Brasil, de uma espécie de “Governo de Juízes” [8] (CLÈVE, p. 124).
3.2- A natureza jurídica da resolução senatorial e os limites de atuação do Senado
A intervenção do Senado no controle incidental volta-se a emprestar eficácia ampliativa às decisões proferidas pelo STF, em matéria constitucional. A partir de então, um singular aresto oriundo do Pretório Excelso, quando decidia sobre a legitimidade de uma norma qualquer, poderia usufruir de robustez suficiente a apaziguar eventuais querelas judiciais em torno de sua constitucionalidade.
Mostrava-se necessário, para tanto, que se emprestasse à resolução senatorial a mesma força desconstitutiva da decisão que oportunizou a sua edição (MENDES, p. 152). Vale dizer, dever-se-iam cassar todos os atos jurídicos praticados sob o manto da norma, cuja invalidade restou reconhecida pelo STF (CLÈVE, p. 123), independentemente de nova impugnação judicial.
Esta constatação, aliás, emerge do próprio desiderato do instituto concebido em 1934. Ora, não gozasse a manifestação do Senado de eficácia retroativa, remanesceria no sistema jurídico brasileiro o inconveniente de se conviver com situações de fato idênticas sendo regradas por normas díspares (CLÈVE, p. 123).
Explica-se: se a resolução senatorial possuísse efeitos ex nunc[9], irradiando-se apenas a partir da data em que promulgada, contemplados seriam apenas os indivíduos diante de situações futuras. Os eventos anteriores, todavia, ficariam ao relento, havendo de se sujeitar à incidência de uma norma inconstitucional.
Não é difícil imaginar, dentro deste cenário, que todas as pessoas não contempladas pela decisão do STF, e desguarnecidas em face da eficácia restritiva do ato senatorial, promoveriam o ajuizamento de demandas com o escopo de resguardar seu patrimônio jurídico, pugnando pelo acolhimento da orientação firmada pelo Supremo.
Importa asseverar, neste diapasão, que a resolução do Senado não se confunde com um ato revogatório (CASTRO, 2008, p. 64). Disto decorreria a exclusão da norma impugnada do ordenamento jurídico, o que implicaria a atribuição àquela Casa Legislativa de uma competência que lhe falece (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 313).
Além disto, a mera revogação não possui a amplitude adequada ao desiderato buscado com a criação da fórmula ora analisada, pois dotada de eficácia meramente prospectiva (MENDES, 2004, p. 152- 153).
Neste sentido, colhe-se a lição de Teori Zavascki (2001, p. 32):
Não se pode confundir o instituto da suspensão da norma com o da sua revogação. A norma revogada deixa de incidir a partir de sua revogação, mas incidiu validamente sobre os suportes fáticos ocorridos durante a sua vigência. Isso significa que, mesmo depois da sua revogação, a norma pode e deve ser aplicada pelo juiz, pelo administrador público e por quem mais tenha de apreciar controvérsias sobre fatos jurídicos anteriores. No caso de suspensão por inconstitucionalidade, as conseqüências são diferentes. A norma inconstitucional é nula desde a origem e, como tal, nunca teve aptidão para operar o fenômeno da incidência. É norma que nunca incidiu.
O ato suspensivo veiculado pelo Senado Federal, a despeito de não derrogar a lei, cassa toda a sua eficácia, como já se assentou, de forma ampla e retroativa (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 312- 313).
Deve-se registrar também que o alvo desta resolução poderá se voltar a toda e qualquer espécie legislativa. Desta forma, atos secundários, leis em sentido formal e material estão passíveis de censura (VELOSO, 2000 p. 58), provenham de qualquer das três esferas federativas do Estado brasileiro.
No que diz respeito ao aspecto procedimental, há de se observar que a atuação do Senado Federal está condicionada ao trânsito em julgamento da decisão do STF reconhecedora da ilegitimidade do ato normativo (MORAES, 2006 p. 649). Tão logo exaurido os prazos recursais, franqueada estará a sua intervenção.
Não há necessidade de que o Presidente do STF expeça comunicação formal àquela entidade deliberativa para que esta possa exercer a sua competência, tão-pouco se faz necessária, tal como ocorria em 1934, a intermediação do Procurador Geral de República como condição de exercício da prerrogativa que lhe foi outorgada pela Constituição (CLÈVE, 2000, p. 116).
Com efeito, o próprio Senado, através da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, poderá, de ofício, deliberar sobre a edição do ato suspensivo. (CLÈVE, 2000 p. 116) desde que, evidentemente, coberta a decisão do Supremo pelo manto da irrecorribilidade. Nada obsta, evidentemente, que aqueles outros dois órgãos acima referidos se encarreguem de cientificar o Senado Federal da decisão propiciadora da edição da resolução multicitada (MORAES, 2006, p. 649).
Deve-se registrar também que inexiste prazo previamente estipulado a que o Senado utiliza-se da prerrogativa constitucional em tela (VELOSO, 2000, p. 58). Por via de conseqüência, desconhece-se previsão que imponha sanção à Casa Legislativa, na hipótese de não haver sido editada a resolução suspensiva (CLÈVE, 2000, p. 120)
Este aspecto é consectário do fato de se reconhecer na atribuição confiada ao Senado uma natureza eminentemente política e não um dever que constitucionalmente lhe é imposto (CLÈVE, 2000, p. 121).
Atribui-se ao Senado não o dever de editar, de forma neutra e passiva, o ato que decretará a paralisação da eficácia da lei reconhecida como inconstitucional pelo STF. Inexiste qualquer previsão legal ou constitucional a amparar esta orientação. Trata-se a edição do ato suspensivo, ao contrário, de um mister discricionário (MORAES, 2006, p. 650), a ser exercido a partir de um juízo deliberativo imunizado a qualquer sorte de ingerência externa.
Nesse sentido, bem assevera Paulo Brossard (1976, p. 55):
Atribuir ao Senado papel mecânico, fazê-lo autômato, transformá-lo em carimbo, meirinho, cartório ou porteiro de auditórios, não significa apenas atribuir-lhe uma função absolutamente subalterna, mas, e especialmente, sem qualquer significação e utilidade, tarefa que poderia ser desempenhada, com proficiência e vantagem, por qualquer funcionário da secretaria do Supremo Tribunal. (...) tudo está a indicar que o Senado é o juiz exclusivo do momento em que convém exercer a competência, a ele e só a ele atribuída, de suspender lei ou decreto declarado inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal. No exercício dessa competência cabe-lhe proceder com equilíbrio e isenção, sobretudo com prudência, como convém à tarefa delicada e relevante, assim para os indivíduos, como para ordem jurídica.
De fato, houvesse o Senado de atuar de forma mecânica e vinculada, tornar-se-ia difícil imaginar as razões que impulsionaram o legislador constituinte a conceber uma fórmula tão complexa para que se pudesse conferir eficácia genérica às decisões do STF (MENDES, 2004 p. 154).
Afigura-se inviável imaginar também que as atribuições senatorias deveriam se limitar à simples investigação do preenchimento dos requisitos formais necessários à edição do ato resolutivo, tal como defendido por Zeno Veloso (2000, p. 58). Com efeito, verificar se o quórum necessário à instauração da sessão de julgamento foi preenchido, aferir se o número de votos foi suficiente à declaração de inconstitucionalidade bem como se a decisão proferida está ou não encoberta pelo trânsito em julgado não se apresentam como atribuições compatíveis à envergadura institucional usufruída ao Senado Federal.
Sua intervenção foi preconizada como uma ferramenta de ponderação da necessidade e conveniência de se suspender a eficácia do ato normativo impugnado. Antes de se cassar de forma erga omnes os efeitos de uma lei impugnada pelo STF, dever-se-ia averiguar a existência de razões a indicar a continuidade de sua vigência no sistema jurídico[10].
Entre possíveis justificativas a não edição do ato suspensivo, não se poderá apontar, certamente, a discordância quanto ao mérito da decisão tomada pelo STF. Com efeito, a participação do Senado no controle difuso cinge-se, tão somente, a conferir eficácia ampliativa às decisões do Supremo, não lhe sendo atribuída a prerrogativa de reconhecer o acerto ou desacerto de seu julgamento (MORAES, 2006, p. 650).
É preciso asseverar, pois, que a fórmula arquitetada pela Constituição de 1934, e até hoje existente no nosso ordenamento jurídico, não transformou o controle difuso em um modelo misto de aferição de constitucionalidade (CLEVE, 2000, p. 116). Cumpre apenas ao Supremo dizer da legitimidade do ato normativo. Sem este juízo prévio, desautorizado estará o Senado a suspender a eficácia de norma (MORAES, p. 650).
Da mesma forma, não poderá esta Casa Legislativa, tal como acima consignado, impugnar as razões condutoras do julgamento do STF.
Inexiste um amálgama entre avaliações de natureza jurídica e política em torno da compatibilidade vertical da norma acusada de inconstitucional. Cumpre ao Senado, tão-somente, apreciar a conveniência de potencializar os efeitos do julgamento proferido pelo STF, nada mais.
Curial asseverar, igualmente, que não possui o Senado a prerrogativa de estender ou restringir os limites do pronunciamento oriundo do STF. Vale anotar, a resolução suspensiva, se editada, deverá se ater aos exatos termos do posicionamento construído pelo Supremo em torno dos eventuais vícios do ato inquinado ( CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 312).
Não é dada ao Senado, assim, a faculdade de suspender apenas um segmento da norma, quando toda ela teve a sua invalidade apontada pelo STF, não lhe sendo autorizado, da mesma forma, rechaçá-la às completas, diante de um juízo que apenas em parte reconheceu a sua ilegitimidade (VELOSO, 2000, p. 59).
Não se permite a esta Casa Legislativa, outrossim, a possibilidade de restringir ou dilatar a eficácia temporal da decisão do STF. Vale anotar, as conclusões do julgamento emitido pelo Pretório Excelso acerca do termo a quo da ininvocabilidade da norma invalidada deverão vincular a manifestação do Senado Federal.
Nesse sentido, preconiza André Dias Fernandes (2009, p. 145):
O que determinará se a resolução produzirá efeitos retroativos ou apenas pro futuro será o próprio acórdão do STF. A resolução tem de guardar simetria com ele. Se o acórdão do STF operar efeitos ex tunc, produzi-los-á por igual a resolução senatorial. Se o acórdão do STF produzir efeitos meramente ex nunc, gerá-los-á talqualmente a resolução senatorial (grifos no original).
Cumpre registrar, ainda, que o Senado, uma vez decidido editar a resolução suspensiva, terá exaurido a sua competência, inexistindo a possibilidade de se retratar das conclusões outrora assumidas[11] (MENDES, 2004 p. 154).
3.3- As inconsistências decorrentes da participação do Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade.
Observado o contexto histórico propiciador da criação da fórmula aqui analisada, e assentada a natureza jurídica da resolução confeccionada pelo Senado, passa-se ao registro das incongruências inerentes ao seu manejo.
Impõe-se reconhecer, logo de saída, que a intervenção senatorial se limita aos casos em que o Supremo Tribunal Federal reconhece e declara a ilegitimidade de um ato normativo, ou de um seu dispositivo (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p.1085).
Ora, o desfecho de uma divergência criada em decorrência da suspeita de inconstitucionalidade de um ato normativo não necessariamente desembocará em um juízo que aponte a sua desvalia jurídica. Pode-se reconhecer, ao contrário, a sua absoluta conformidade ao Texto Magno, ou extrair do seu teor uma interpretação que o torne conciliável à Constituição, ou ainda delimitar a sua incidência a hipóteses fáticas que não o tornem inconstitucional.
Não se presta, todavia, a participação do Senado a outorgar eficácia ampliativa aos posicionamentos emitidos pelo Pretório Excelso, quando sua decisão está amparada em técnicas mais sofisticadas de resolução da controvérsia constitucional (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1084-1085).
Quando o Supremo, dirimindo o debate em torno da legitimidade de uma determinada espécie legislativa, utiliza-se da interpretação conforme à constituição, ou procede à declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto, a intervenção senatorial mostra-se imprestável (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1084-1085).
Revela-se inviável, igualmente, a utilização da regra em tela diante de manifestação do STF que, ao julgar improcedente a argüição de inconstitucionalidade, fixa o adequado parâmetro interpretado do dispositivo de lei questionada, bem como nas ocasiões em, solvendo intensa divergência em torno de algum preceito contido na Lei Maior, delimita a sua correta exegese (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1084-1085).
De que forma, então, compatibilizar todas estas circunstâncias, plenamente factíveis, aos delineamentos restritos da intervenção senatorial no controle difuso de constitucionalidade, cuja concepção, desde 1934, mostra-se inalterável?
A resolução do Senado não poderá veicular, como já se disse, conteúdo outro que não seja a paralisia da eficácia, total ou parcial, das leis inconstitucionais.
A imperar, a despeito disto, a tese da imprescindibilidade da participação do Senado, no controle incidental de normas, como requisito a emprestar eficácia transcendental às decisões do Supremo, há de se impor a delimitação dos pronunciamentos da Excelsa Corte, nas hipóteses acima referidas, apenas aos casos concretos.
Desta forma, os efeitos limitados da decisão do Supremo, em razão da ineficiência da fórmula constitucional em exame, permitem que os órgãos jurisdicionais inferiores não estejam vinculados à orientação firmada por este Tribunal. Faculta-se-lhes a possibilidade de apontar quantas soluções divergentes possíveis puderem se candidatar à solução da controvérsia constitucional que já deveria ter sido apaziguada, em razão da manifestação do STF.
Ante a inviabilidade de se editar a resolução senatorial, a solução apresentada a aquilatar a norma ordinária à Constituição poderá se limitar à relação processual singularmente apreciada pela Excelsa Corte.
Mas há ainda outras inconsistências que precisam ser anotadas.
Consoante se deixou assentado, inexiste uma obrigação imposta ao Senado para que se edite a resolução suspensiva do ato normativo apontado como inconstitucional pelo Supremo. Assim, caso não confeccionado o ato suspensivo, a norma jurídica impugnada remanescerá a incidir perante tantos outros fatos, passados ou futuros, passíveis de subsunção ao seu comando.
Esta possibilidade, quando efetivamente concretizada, dará ensejo a que um número indefinido de demandas judiciais seja instaurado. Todos os órgãos jurisdicionais, inclusive o STF, deverão se sujeitar a analisar litígios repetitivos, provocados por desavenças acerca de idêntica questão de direito, simplesmente porque o Senado, usufruindo de sua autonomia institucional, não provocou a paralisação da eficácia da norma incessantemente apontada como ilegítima (CUNHA JUNIOR, 2008, p. 314).
E o que é ainda pior. Imagine-se o surgimento de orientações jurisprudências divergentes a comprometer a estabilidade das relações jurídicas. Franqueada estava a possibilidade de se conviver com situações fáticas semelhantes sendo regidas de forma díspares.
Há então de se indagar: não foi exatamente a ocorrência destes fenômenos que se procurou evitar quando se concebeu a intervenção do Senado no controle difuso de normas? O grande desiderato do instituto da resolução senatorial não foi o de padronizar o ordenamento jurídico, alijando-se, de forma generalizada, a incidência de comandos normativos inconstitucionais?
Não se está a defender, evidentemente, a tese de que a norma constitucional aqui analisada seja interpretada de forma a materializar-se em um dever inescusável imposto àquela Casa Legislativa. Tal exegese agrediria frontalmente o peso político-institucional atribuído ao Senado. Põe-se em relevo apenas a grande contradição que atinge este regramento desde a sua criação.
Impõe-se consignar, ademais, que não se criou nenhuma previsão, constitucional, legal ou regimental a impor ao Senado um prazo para manifestar-se sobre a necessidade de confecção do ato suspensivo (VELOSO, 2000, p. 58). Certamente dispõe esta instituição da faculdade de decidir pela ampliação dos efeitos da decisão firmada pelo STF, mas não deveria ao menos haver previsão de algum instrumento por meio do qual se poderia veicular as razões da sua não edição da resolução[12]?
Mas isto seria manifestação de desídia, ou o prestígio político-institucional que lhe foi conferido lhe permitiria deixar a argüição de inconstitucionalidade de uma norma ao relento?
Há de se ressaltar ainda que o não exercício da prerrogativa de suspender a eficácia das leis inquinadas pelo vício da inconstitucionalidade colide frontalmente com o postulado da nulidade da norma inconstitucional por nós adotado (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1088).
Mostra-se inconciliável conviver-se com a premissa de que uma lei inconstitucional é inexistente, írrita desde o seu nascimento. (CUNHA JUNIOR, 2008, p. 307), ante a real possibilidade de sua subsistência no ordenamento jurídico, a despeito de o seu vício já haver sido incessantemente reconhecido (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1088).
Esta hipótese é plenamente factível, na medida em que condicionada a observância do princípio acima referido a um juízo eminentemente político, a ser proferido pelo Senado (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1088), se e quando entender conveniente.
Talvez resida aqui a grande incongruência proporcionada pela atribuição conferida ao Senado Federal.
Não se pode admitir que o juízo definitivo sobre a manutenção de uma norma no sistema jurídico esteja submetido a uma avaliação discricionária emanada de um órgão que não possui, ao contrário do Supremo Tribunal Federal, o precípuo múnus de guardião da Constituição (VELOSO, 2000, p. 57).
A normatividade incontrastável dos preceitos constitucionais não pode se sujeitar a deliberações pautadas em critérios de conveniência (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 314). Se uma norma é inconstitucional, ela não pode continuar a ser invocada como parâmetro de conduta, em razão da inércia do órgão encarregado de obstar a sua incidência.
Tanto nesta hipótese, quanto nas oportunidades em que o Senado sustenta expressamente a manutenção do ato normativo no ordenamento jurídico, não estaria este órgão, ainda que de forma velada, imputando-lhe o status de constitucional?
Ou, como aduz João Bosco Marcial de Castro (2008, p. 89-90), ao não editar a resolução suspensiva, acaba o Senado por subverter o ordenamento jurídico, submetendo a Constituição aos ditames estabelecidos pela legislação infraconstitucional, e não o contrário.
Outro ponto nodal a revelar a incongruência da regra em comento emerge do fato de que, se ao Senado é dado o direito de invocar especiais motivos pelos quais o ato normativo não poderá sofrer censura, por que lhe é negado o direito de, pelas mesmas razões, editar um ato que fique aquém daquilo que foi decidido pelo Supremo?
Vale dizer, não seria possível permitir que o Senado editasse uma resolução que suspendesse apenas uma parte da norma integralmente apontada pelo Supremo como inconstitucional[13]?
Da mesma forma, por que obstar a faculdade de modular os efeitos da resolução editada? Não poderia o Senado, invocando os mesmos motivos que poderiam ensejar a não suspensão da norma invalidada pelo STF, extrair fundamentação suficiente a conferir eficácia prospectiva ao ato encarregado de suspendê-la?
Esta faculdade outorgada ao Senado originou-se em um período em que o arranjo institucional dos Poderes erigia-o ao posto de entidade encarregada de velar pela harmonia e coordenação entre as diferentes funções estatais. Baseava-se a regra em uma concepção de tripartição de poderes que hoje se revela ultrapassada[14] (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1086)
Com efeito, não se encontra mais o Senado em uma posição institucional diferenciada, tal como em 1934. Não se pretende desprestigiar o relevo desta Casa Legislativa na atual ordem constitucional. Impõe-se, porém, reconhecer que ela deixou de ocupar aquela posição de proeminência antes referida (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1086).
Bem por isso, a manutenção da regra em análise no Texto constitucional tem desafiado a doutrina a extrair-lhe exegese que justifique a sua subsistência no sistema jurídico.
João Bosco Marcial de Castro (2008, p. 98), por exemplo, encontra na resolução editada pelo Senado Federal o desiderato de cientificar o ente federativo de onde se originou a norma invalidada pelo STF da necessidade de expedição de ato revogatório pertinente à sua exclusão do mundo jurídico.
Parte-se da premissa de que a resolução senatorial não possui natureza revogatória, bem como do fato de que apenas a entidade federativa responsável pela edição da lei inconstitucional usufrui de competência para extirpá-la do seu respectivo ordenamento jurídico (CASTRO, 2008, p.98).
Enquanto instituição representativa da federação brasileira, cumpriria ao Senado oportunizar a que o ente federativo pertinente pudesse formalmente excluir o ato normativo do seu sistema jurídico (CASTRO, 2008, p.98-100). Seria esta a função a ser desempenhada pelo Senado Federal, pois.
Mostra-se necessário rechaçar a solução apontada acima, ante a ausência de qualquer repercussão prática por ela proporcionada.
Com efeito, qual a valia de o ente político de onde emergiu a norma alvo de impugnação perante o STF revogá-la? Ainda que efetivamente a norma remanesça no ordenamento jurídico, a decisão do Supremo Tribunal Federal, mesmo que proferida em controle difuso, pela eficácia transcendental de que usufrui, inevitavelmente repercutirá perante as instâncias jurisdicionais inferiores.
A força normativa adquirida pelos comandos emanados do Pretório Excelso, inclusive diante de controvérsias constitucionais debatidas no bojo de processos subjetivos, mostra-se idônea o bastante a induzir o Poder Público a extirpar a norma impugnada do seu sistema jurídico, não sendo necessária, para tanto, a intervenção do Senado Federal.
De mais a mais, ainda que assim não proceda, a eficácia da decisão do Supremo retira da norma rechaçada por inconstitucional a faculdade de ser invocada em qualquer relação jurídica a que ela possa, a princípio, ser aquilatada.
Anote-se ainda a tese que empresta à competência constitucional em comento o efeito de publicizar as decisões do Supremo proferidas em sede de controle difuso de normas[15] (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1092-1093).
A autoridade do julgado emanado do STF, de per si, possuiria eficácia geral e vinculante, não se prestando a resolução senatorial a emprestar-lhe a eficácia aditiva por ele já alcançada, desde que acobertado pelo manto da irrecorribilidade (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1092-1093).
Ainda que se compartilhe com a última das premissas acima lançadas, não se pode deixar de reconhecer a impertinência do papel designado ao Senado Federal.
Será que haveria mesmo a necessidade de o Senado, mediante resolução, publicizar uma decisão emitida pela Excelsa Corte? E se o Senado se recusasse a editar o ato resolutivo?
Para além do inconveniente de se transformar o Senado em uma espécie de “Diário Oficial do Supremo Tribunal Federal” (LIMA, OLIVEIRA, STRECK, 2008, p. 02), a solução apontada não se coaduna, definitivamente, com um mister a ser exercido por esta Casa Legislativa.
O fato é que, na mesma medida em que se edificou um mecanismo voltado a corrigir as distorções do nosso sistema incidental de fiscalização dos atos normativos, permitiu-se que este mesmo instrumento fomentasse as falhas que a sua criação intentava corrigir.
Esta constatação não é destituída de repercussão prática.
As limitações que a acompanham desde o seu surgimento se mostram de forma mais nítida diante de outros mecanismos erigidos pelo legislador a emprestar eficácia erga omnes às decisões do Supremo proferidas em controle difuso, sem que para tanto seja necessária a edição do ato resolutivo aqui estudado. Da mesma forma, o desenvolvimento do método concentrado promoveu inequívoca retração do regramento em comento.
Estes aspectos serão abordados no capítulo seguinte.
4- A nova dinâmica do controle difuso de constitucionalidade na ordem jurídica brasileira
4.1- A prescindibilidade da intervenção do Senado como requisito necessário a que se possa conferir eficácia ampliativa às decisões do Supremo Tribunal Federal em controle difuso de constitucionalidade
As recentes reformas processuais implantadas no Código de Processo Civil brasileiro promoveram a subutilização da regra impositiva da participação do Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade.
Deve-se creditar tal acontecimento àquilo que Teori Zavascki (2001, p. 25) denominou de “a natural vocação expansiva das decisões sobre a constitucionalidade das normas”, e que vai se desdobrar na eficácia reflexa das decisões do Supremo proferidas em controle difuso (ZAVASCKI, 2001, p. 30).
De fato, o juízo de desvalia imputado a uma norma em face da Constituição, mesmo que propiciada por ocasião do enfretamento de uma lide concreta, não está vinculado ao substrato fático apreciado.
É que os preceitos normativos encerram, por essência, regramentos com ampla margem de aplicabilidade (ZAVASCKI, 2001, p. 26). Os dispositivos contidos em uma lei não se voltam a incidir perante um único fato, antes possuindo, via de regra, idoneidade suficiente a reger uma série indefinidamente indistinta de situações concretas (ZAVASCKI, 2001, p. 26).
À luz dessa premissa, indeclinável a constatação de que uma norma se torna inconstitucional por simples incompatibilidade material aos valores e regras insculpidos na Carta Magna. E para que se possa concluir pela ilegitimidade de uma lei, suficiente apenas a realização deste juízo valorativo[16].
Uma vez reconhecida a inconstitucionalidade de um ato normativo, as conclusões em que amparado o julgamento definidor deste vício devem servir de baliza orientadora da resolução de qualquer outro litígio passível de subsunção à espécie legislativa atacada (ZAVASCKI, 2001, p. 26).
Bem por isso, a orientação firmada pelo STF sobre controvérsias constitucionais deve vincular, aliás, como já vincula, as instâncias inferiores, independentemente de o método empregado para a investigação da legitimidade da norma haver sido o incidental ou o abstrato.
Inexiste óbice dogmático a inviabilizar que o Supremo, mesmo por ocasião em que exerce o controle difuso de constitucionalidade, aprecie a legitimidade da lei em tese (CUNHA e DIDIER JÚNIOR, 2009, p. 344).
Absolutamente desvinculado do problema subjetivo que reclama resolução, os trabalhos da Excelsa Corte se voltam à defesa da ordem constitucional, precipuamente (MARTINS e MENDES, 2007, p. 92-93). Percebe-se aqui uma desconstrução daquela premissa clássica sobre a qual se desenvolveu o controle difuso de constitucionalidade.
Vale dizer, a aferição da legitimidade da lei deixa de ser considerada uma mera questão prejudicial, analisada apenas enquanto requisito essencial à resolução do caso concreto, para se tornar o grande motivo a provocar a manifestação do Supremo (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1078).
O conflito de interesses particulares, por seu turno, tornou-se o pretexto a oportunizar ao Supremo Tribunal Federal o exercício de sua função de guardião da Constituição (MARTINS, MENDES, 2007, p. 92-93).
Possivelmente inexista fenômeno mais sintomático desta nova nuance empreendida ao controle difuso de normas do que a criação da repercussão geral, no âmbito do recurso extraordinário.
Este instrumento de filtragem processual, inserido justamente no bojo do principal mecanismo pelo qual o Supremo exerce o controle difuso de constitucionalidade, homenageia o seu papel de uniformizador da interpretação e aplicação das normas constitucionais (MARINONI, MITIDIERO, 2008, p. 34 e 40).
Sua observância impõe ao recorrente que demonstre, sob pena de não ter conhecido a sua irresignação, que o caso por ele apresentado possui magnitude- econômica, política, social ou jurídica- bastante a proporcionar que o seu desfecho repercuta perante outras relações jurídicas ali não apreciadas (MACHADO, 2008, p. 676).
Em outras palavras, este requisito de admissibilidade recursal impõe ao STF o dever de apreciar apenas aquelas controvérsias, cuja resolução possa transcender o caso singularmente analisado (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p.1103).
Torna-se o recurso extraordinário, bem se nota, uma relevante ferramenta de racionalização da prestação jurisdicional (MARINONI, MITIDIERO, 2008, p. 34), na medida em que possibilita que as instâncias inferiores adotem como parâmetro de julgamento a solução edificada pelo Pretório Excelso nas lides que reclamem a incidência dos preceitos legais avaliados por este Tribunal.
Demonstra-se, igualmente, a secundariedade deixada à lide subjetiva. A análise do conflito de interesses particulares deixa de ser vislumbrado como o exercício de uma atribuição jurisdicional, pura e simples, tornando-se mais uma das oportunidades de que se serve o Supremo para solver desavenças de índole constitucional, cuja repercussão, necessariamente, deverá se sobrepor à relação processual que propiciou o seu pronunciamento.
A amplitude da eficácia de suas decisões, outrossim, precisa ser vista como corolário da preservação dos princípios da igualdade e estabilidade das relações jurídicas, na medida em que voltada a diminuir a possibilidade de se conviver com tratamentos normativos dissonantes e incongruentes a reger situações fáticas semelhantes (ZAVASCKI, 2001, p. 26).
Outras inovações na legislação processual civil brasileira, por referendar a tese sustentada neste tópico do trabalho, merecem registro.
A mudança promovida no regramento concernente ao incidente de inconstitucionalidade no âmbito dos Tribunais bem elucida o quão despicienda se tornou a regra contida no art. 52, X da CF/88. Com efeito, a partir da incorporação do §1º ao art. 481 do CPC, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional, em controle difuso, deverão veicular, necessariamente, os Tribunais superiores e de apelação (ZAVASCKI, 2001, p. 33).
Torna-se desnecessária, pois, a instauração do incidente previsto nos dispositivos 480 a 482 do CPC, quando a controvérsia ventilada na argüição de inconstitucionalidade já houver sido previamente solucionada pelo STF (VELOSO, 200, p. 47-48). Impõe-se aos Tribunais o acolhimento da manifestação exarada pelo Pretório Excelso, independentemente de haver o Senado se expressado ou não pela suspensão da norma atacada na decisão paradigma.
A sua intervenção no controle difuso, nestas hipóteses, revela-se absolutamente desnecessária, pois a decisão do Supremo, por si só, constitui-se em precedente vinculante (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1086).
Os poderes conferidos ao relator, pelo art. 557, caput e §1ª-A, também explicitam o prestígio dos precedentes emanados do STF (ZAVASCKI, 2001, p. 37-39). A observância destes dispositivos impede, de um lado, que recursos sejam recebidos, quando o fundamento da irresignação neles versada contrariar jurisprudência edificada no âmbito da Corte Superior.
Impõe-se, por outro lado, e também como consectário do relevo incontrastável adquirido pelos pronunciamentos da Excelsa Corte, que sejam providas liminarmente as impugnações às sentenças oriundas dos juízes de primeira instância, quando o entendimento nestas firmado colidir com a orientação do STF.
Estas regras, evidentemente, não deixarão de ser aplicadas quando a controvérsia motivadora dos posicionamentos divergentes tiver como pano de fundo matéria constitucional (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1089-1090), e os arestos de onde se construiu a jurisprudência do Supremo houverem se originado no âmbito do controle incidental de normas.
Mas a força das orientações firmadas pelo Supremo não se adstringem ao âmbito dos Tribunais. Com efeito, igualmente os juízes de primeira instância, por força do art. 518, §1º, do CPC, possuem a prerrogativa de não receber os recursos de apelação movidos em face de sua sentenças, quando estas houverem buscado amparo em súmula do STF.
Trata-se de requisito negativo de admissibilidade recursal (MACHADO, 2008, p. 621) plenamente passível de obstar pleitos veiculados por recorrentes, diante da tentativa de suscitar debates em torno de controvérsias constitucionais de há muito apaziguadas pelo Supremo.
Perceba-se que a súmula do STF, que não é a vinculante, é guindada à condição de parâmetro de conduta do juízo a quo, independentemente de o pronunciamento oriundo daquele Tribunal, emergido por ocasião de apreciação de controle incidental de normas, não haver sido seguido de manifestação do Senado Federal[17].
Neste diapasão, urge indagar: qual a valia de eventual pronunciamento do Senado em torno da suspensão de uma lei, cujo teor já foi apontado como inconstitucional pelo Supremo?
E mais: na hipótese de o Senado haver expressamente consignado os motivos pelos quais deixou de conferir eficácia ampliativa à decisão do STF, deveriam os órgãos judiciais inferiores, olvidando o fato de o Supremo ocupar a cúpula do judiciário e de ser o guardião mor da Constituição, recusarem-se a adotar as balizas construídas por ele?
Os precedentes firmados pelo Supremo adquiriram idoneidade, inclusive, a ponto de vedar o reexame necessário (art. 475, § 3º, do CPC), diante dos casos em que a sucumbência do Poder Público estiver vinculada a entendimento pacificado no âmbito daquela Corte (CUNHA e DIDIER JR., 2009, p. 347).
A possibilidade de manejo de ação rescisória com escopo de anular sentença ou acórdão amparado em preceptivo legal que viola preceito constitucional é outro importante caso em que se sobressai a eficácia transcendental das decisões do STF (ZAVASCKI, 2001, p. 135 - 137). Uma vez havendo a Corte Suprema, mesmo que por ocasião de um processo subjetivo, firmado posicionamento em torno de um dispositivo da Constituição, acaso contrariando, abre-se a oportunidade a que se veicule a rescisória com fulcro no art. 485, V, do CPC (ZAVASCKI, 2001, p. 135 - 137).
A obsolescência da participação do Senado no controle difuso de constitucionalidade transparece, igualmente, na fase de cumprimento de sentença, quando se franqueia ao devedor ou à Fazenda Pública utilizar-se de incidente processual (art. 475-L, §1º, e art. 741, parágrafo único, ambos do CPC) com o escopo de fulminar pretensão executiva amparada em título fundado em lei que haja sido reconhecida como inconstitucional pelo Supremo (BRAGA, DIDIER JÚNIOR, OLIVEIRA, 2008, p. 531-535).
Mais uma vez, importa asseverar que o sucesso da irresignação manifestada no bojo da impugnação ao cumprimento de sentença, ou dos embargos interpostos pela Fazenda Pública, não torna necessário que a fundamentação em que alicerçada haja sido buscada em decisão do Supremo em sede de controle abstrato de constitucionalidade, ou que, em se tratando de controle difuso, tenha havido prévia manifestação do Senado Federal (BRAGA, DIDIER JÚNIOR, OLIVEIRA, 2008, p. 532).
Não se pode olvidar, ainda, o efeito decorrente da edição de súmula vinculante pelo STF, pois está também a demonstrar a prescindibilidade da intervenção senatorial no controle incidental de normas (CUNHA e DIDIER JÚNIOR, 2009, p. 346).
Todos estes elementos acima evidenciados demonstram que o legislador brasileiro vem emprestando às decisões do Supremo Tribunal Federal, prolatadas em controle difuso de constitucionalidade, a mesma eficácia daquelas firmadas por ocasião da fiscalização abstrata dos atos normativos (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1086).
A importância cada vez maior que vem sendo conferida aos precedentes do Supremo é diretamente proporcional à obsolescência da fórmula consagradora da participação do Senado Federal do controle difuso de constitucionalidade.
As sucessivas decisões proferidas pelo STF em matéria constitucional , ainda que em sede difusa, em razão do inequívoco prestígio adquirido, tornam irrelevante o pronunciamento do Senado acerca da pertinência de se editar ou não um ato suspensivo da lei reiteradamente declarada inconstitucional por este Tribunal.
4.2- A proeminência do modelo concentrado na atual configuração do sistema judicial de fiscalização normativa
A ordem constitucional inaugurada em 1988 proporcionou significativo aperfeiçoamento à fiscalização abstrata das leis no Brasil[18] (CLÈVE, 2000, p. 90-91). Não se pode olvidar a preeminência adquirida, nas últimas décadas, por este modelo de controle de constitucionalidade.
Concebido e utilizado como instrumento meramente secundário a provocar a censura dos atos normativos ilegítimos editados pelo Legislativo, em um ambiente de prevalência do sistema difuso, tornou-se o processo objetivo o principal mecanismo de salvaguarda da ordem constitucional, relegando-se a via incidental à posição ancilar por aquele outrora ocupada (MENDES, 2007, p. 208-209).
Passa-se adiante a elencar as inovações que justificam a assertiva acima desenvolvida.
A ampliação do rol de legitimados a provocar a atuação do Supremo Tribunal Federal, em sede de controle concentrado de normas, veio a corrigir o deficiente quadro procedimental arquitetado pela ordem constitucional revogada (MENDES, 2007, p. 208-209).
Com efeito, se até a edição da Carta de 1988, competia exclusivamente ao Procurador Geral da República decidir sobre a pertinência de se argüir, mediante ação direta, a ilegitimidade dos atos normativos, passou-se, a partir de então, a conferir esta prerrogativa a um plexo significativamente heterogêneo de entidades públicas e privadas (MENDES, 2007, p. 208-209).
É perceptível, ademais, que os órgãos e entidades elencados no art. 103, da CF/88, não foram selecionados de forma aleatória. Evidencia-se, ao contrário, que o desiderato do legislador constituinte foi o de potencializar a possibilidade de se adentrar à Corte Suprema brasileira a mais diversificada gama de questões de índole constitucional.
Na atual sistemática, os conflitos federativos ganharam inolvidável relevo. Ao se outorgar ao Presidente da República, bem como aos Governadores de Estado, o direito à propositura da ação direta de inconstitucionalidade, permite-se que os desrespeitos aos limites de atuação das entidades federativas por estes chefiadas sejam oportunamente corrigidos[19] (MENDES, 2007, p. 209).
A legitimidade conferida aos partidos políticos constitui-se em outra inovação que não poderia passar despercebida. Aprimora-se o sistema democrático brasileiro quando se permite às minorias parlamentares, até mesmo àquelas mais inexpressivas, a faculdade de ensejar o debate constitucional (MENDES, 2007, p. 209).
Este quadro ampliativo alcança o seu ápice quando se estende esta prerrogativa às mais diversas entidades representativas da sociedade civil, tais quais as entidades de classe de âmbito nacional e as confederações sindicais.
Não se preocupou, porém, o legislador constituinte apenas em estabelecer uma nova configuração subjetiva ao controle abstrato das leis. Novos institutos e ferramentas processuais foram criados a partir da promulgação da Constituição de 1988 com o escopo de emprestar maior efetividade à fiscalização concentrada dos atos normativos.
Neste diapasão, cumpre consignar a instituição da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Trata-se de valiosa ferramenta voltada a encarecer a supremacia e força normativa dos preceitos constitucionais (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1179). Sua criação permitiu ao STF não apenas censurar as agressões sofridas pelo Texto Magno em razão de condutas comissivas perpetradas pelo legislador. O manejo desta nova ferramenta permite que toda omissão atribuível ao Poder Público, desde que comprovadamente inviabilize a efetividade de uma norma constitucional, seja maculada por ilegítima.
Impõe-se observar a magnitude alcançável pela ação de inconstitucionalidade por omissão: volta-se este instrumento não apenas à mora legislativa, visto que sua eficácia protetiva é robusta o suficiente a condenar a desvalia de toda e qualquer postura da Administração Pública que traduza-se em desprezo aos valores consagrados na Constituição[20] (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 386).
Outra inovação que merece registro decorre da criação da argüição de descumprimento de preceito fundamental.
Este instituto processual, concebido pelo poder constituinte originário, mas apenas exercitável a partir de sua regulamentação, ocorrida com a edição da Lei n° 9882, de 03 de dezembro de 1999, veio a preencher importantes lacunas deixadas pelo sistema concentrado de controle de constitucionalidade vigente (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1143).
Matérias até então insuscetíveis de conhecimento direto pelo STF, e que apenas poderiam ser apreciadas incidenter tantum, tais quais as normas pré-constitucionais, o direito municipal e a legislação revogada, tornaram-se cognoscíveis por aquela Corte em sede de controle abstrato (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1143).
Percebe-se a concretização daquela premissa outrora firmada: não apenas se ampliou o número de legitimados a incitar o debate em torno das questões de índole constitucional. Constata-se, igualmente, a extensão de condutas e matérias propiciadoras de atuação da Excelsa Corte brasileira.
A ADPF, todavia, não proporcionou apenas o alargamento das matérias suscetíveis de apreciação pelo STF em sede de controle concentrado. A Lei n° 9.882/99, ao regulamentá-la, estabeleceu ainda a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal aferir controvérsias constitucionais de forma incidental e abstrata, mediante a suspensão dos processos em trâmite perante as instâncias ordinárias, no bojo dos quais emergiu a suspeita de desrespeito a preceito constitucional fundamental.
Esta inovação forneceu ao modelo concentrado de controle de constitucionalidade uma ferramenta que, se bem utilizada, tornará o manejo da via difusa ainda mais restrito. É que, ante a inovação estatuída no art. 2º, § 1º, da Lei n° 9.882/99, o surgimento, no bojo de uma relação processual instaurada nas instâncias inferiores, de divergência em torno de algum preceito fundamental, cuja resolução pelo juízo a quo apresente potencial risco de desrespeitá-lo, é possível de conhecimento direto pelo STF.
Perceba-se a magnitude deste novo regramento: ao invés de se permitir que a controvérsia constitucional seja apreciada no âmbito do tradicional controle difuso, e que apenas em sede de eventual recurso extraordinário possa o STF conhecer da matéria, faculta-se-lhe, desde logo, emitir, de forma definitiva e com eficácia erga omnes e força vinculante, seu entendimento sobre a questão (MARTINS e MENDES, 2007, p. 106 e ss.)
Esta novidade veio a prestigiar, sobremodo, o papel do STF enquanto guardião da Carta Magna. Mediante a utilização da fórmula preconizada pela Lei n° 9.882/99, a Excelsa Corte é convocada a intervir imediatamente nas questões que ameaçam a supremacia dos valores consagrados na Constituição.
Ao assentar, desde logo, sua interpretação sobre determinado preceito fundamental, o STF impede o surgimento de divergentes orientações jurisprudências sobre a matéria (MARTINS e MENDES, 2007, p. 106-107), dirimindo quizilas que, houvessem de ser solvidas apenas mediante o controle difuso, poderiam se transformar, até o definitivo pronunciamento do Supremo, em risco potencial à supremacia da Lei Máxima (MARTINS e MENDES, 2007, p. 106-107).
Assim, de forma incidental, pois se trata de uma controvérsia que surgiu no seio de um litígio intersubjetivo, mas abstrata, pois a questão é enfrentada em tese, e não como simples prejudicial à resolução de uma lide concreta, exerce o Supremo Tribunal Federal de forma mais eficiente seu mister de guardião da Constituição.
Não se poderia concluir esta exposição sem mencionar a criação da Ação Declaratória de Constitucionalidade. É bem verdade que houvesse sido o instrumento inaugural da fiscalização abstrata dos atos normativos no Brasil, concebido desde 1965, vislumbrado em seu caráter ambivalente, tal como sustentado por Gilmar Ferreira Mendes[21], desnecessária seria a concepção deste novo instituto.
Vale anotar, desde que fosse permitida o ajuizamento da representação de inconstitucionalidade com o espoco precípuo de dirimir divergências motivadas pela insegurança acerca da legitimidade das espécies normativas, despiciendo seria incrementar as ferramentas processuais já disponibilizadas a guarnecer o Texto Magno. A ação direta de inconstitucionalidade, por si só, considerado o seu real alcance, tornaria obrigatório o seu manejo diante de debates portentosos em torno da validade de uma lei contestada em face da Constituição.
Mas não foi apenas a criação da ADC a contribuição da Emenda Constitucional n° 03, de 17 de março de 1993, à jurisdição concentrada de constitucionalidade. A reforma implantada naquele ano conferiu às decisões emanadas do STF, em sede de controle abstrato, pela primeira vez, efeito vinculante (MARTINS, MENDES, 2007, p. 549 e ss.).
Interessante observar que a previsão restritiva daquela emenda, limitando este atributo apenas às decisões oriundas de ações diretas de constitucionalidade, não obstou a que o Supremo Tribunal sedimentasse entendimento que alargava esta prerrogativa também às decisões proferidas em sede de ADIN (MARTINS, MENDES, 2007, p. 549 e ss.). Coube à legislação ordinária superveniente (Lei n° 9868, de 10 de novembro de 1999) positivar esta orientação jurisprudencial, tornando definitivamente equivalentes os efeitos das decisões provenientes do STF, quer se trate de ADC ou ADIN.
E qual a importância desta inovação?
O efeito vinculante impõe a todos os órgãos integrantes da Administração Pública, bem como às instâncias judiciárias inferiores, a observância do conteúdo não apenas versado na parte dispositiva dos acórdãos e decisões liminares oriundos da Excelsa Corte. Esta qualidade eficacial já é obtida através dos efeitos erga omnes da decisão (MARTINS, MENDES, 2007, p. 549 e ss.). O que se tem por incrementado aqui é o dever de estrito respeito à fundamentação em que alicerçada as conclusões dos julgamentos emanados pelo STF, por ocasião da fiscalização abstrata das normas.
Dito de outra forma, a exegese construída pelo Tribunal em torno da legitimidade de um determinado comportamento ou ato normativo adquire robustez bastante a servir de parâmetro a orientar a conduta dos agentes públicos em situações semelhantes ao caso singularmente posto à apreciação daquela Corte (MARTINS, MENDES, 2007, p. 548).
Isso traz como conseqüência um fator inestimável ao prestígio dos pronunciamentos oriundos da mais alta instância do nosso judiciário. O reconhecimento do efeito vinculante permite a qualquer indivíduo vitimizado por ações emanadas da Administração Pública, desde que desrespeitosas ao entendimento cristalizado pelo STF, em sede de ADIN, ADC, ou ADPF, o manejo de reclamação constitucional[22] (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1287).
Potencializa-se, assim, a autoridade do julgado não apenas perante o caso isolado que ensejou a manifestação do STF. Os motivos determinantes que o albergaram possuem força bastante a impor a paralisação de comportamentos que se amoldem ao substrato fático veiculado na norma jurídica, cuja censura consubstanciou-se em decisão paradigma.
Em última análise, veda-se que condutas futuras a esta equiparáveis sejam reiteradas, ainda que mediante um instrumento normativo que não se constituiu objeto do julgamento originário, e ainda que por agentes estranhos à lide que proporcionou o pronunciamento da Excelsa Corte brasileira (MARTINS, MENDES, 2007, p. 548).
A perda de prestígio do modelo incidental é diretamente proporcional à força expansiva do método concentrado de controle de constitucionalidade. À celeridade e maior eficácia da prestação jurisdicional trazidas pelo modelo abstrato contrapõem-se às limitações inerentes à forma difusa de fiscalização do afazer legislativo.
Neste contexto, a manutenção da fórmula da resolução senatorial no sistema incidental outra coisa não faz senão contribuir a dilatar ainda mais o fosso que o segrega do método abstrato de controle de constitucionalidade.
Como bem pontua Dirley da Cunha Júnior (2008, p. 314-315):
Essa competência do Senado, todavia, se foi necessária nos idos de 1934, e talvez até a década de 80, não revela hoje utilidade, em face do novel sistema jurídico desenhado pela vigente Constituição da República. De feito, num sistema em que se adota um controle concentrado-principal, e as decisões de inconstitucionalidade operam efeitos erga omnes e vinculantes, a participação do Senado para conferir eficácia geral às decisões do Supremo Tribunal Federal, prolatadas em sede de controle incidental, é providência anacrônica e contraditória. Ora, se o Supremo Tribunal Federal pode, em sede de controle concentrado-principal, suspender, liminarmente e em caráter geral, a eficácia de uma lei e até mesmo de uma Emenda Constitucional, qual a razão hoje de limitar a declaração de inconstitucionalidade pronunciada pela Corte no controle incidental às partes do processo e condicionar a sua eficácia geral à intervenção do Senado?
É inolvidável a proeminência conquistada pelo método concentrado de controle de constitucionalidade na nova ordem constitucional.
Os institutos inaugurados; a legislação que os regulamentou; a notória ampliação do rol de legitimados a suscitar as controvérsias de índole constitucional; o amplo poder conferido às decisões, inclusive às monocráticas; a modulação dos efeitos; a dilatação do objeto normativo e das condutas estatais passíveis de sindicabilidade tornaram a fiscalização abstrata a principal bandeira de defesa dos preceitos constitucionais (MARTINS, MENDES, 2007, p. 77-78).
Esta afirmação ganha ares de irrefutabilidade quando se constata que a atual configuração dos métodos de defesa do sistema jurídico brasileiro permite que praticamente todas as questões constitucionais de relevo sejam enfrentadas e solvidas diretamente pelo STF, através do controle concentrado de constitucionalidade (MARTINS, MENDES, 2007, p. 77-78).
Neste diapasão, os contornos em que sedimentada a atuação senatorial, diante da robustez adquirida pelo modelo concentrado de constitucionalidade, a partir da Constituição de 1988, contribuem decisivamente para que a regra consagradora de sua intervenção no controle difuso se transforme em um anacronismo no nosso sistema jurídico (CLÈVE, 200, p. 124).
5- Conclusão
O fenômeno da obsolescência da fórmula consagradora da participação do Senado no controle difuso de normas, além de derivar de inconsistências existentes em sua própria configuração, emerge da reestruturação da arquitetura constitucional dos poderes, bem como da proeminência conquistada pelo controle concentrado de constitucionalidade. Não se pode olvidar, ainda, a tendência de transcendentalização dos pronunciamentos do STF em matéria constitucional, que vem se incorporando ao sistema jurídico brasileiro.
O Senado Federal, na atual ordem constitucional, integra o Poder Legislativo, não mais estando à margem da tripartição estatal para ocupar espaço diferenciado na arquitetura institucional do Estado brasileiro.
A regra aqui estudada remonta a um período em que se atribuía ao Senado, como uma de suas funções precípuas, o papel de agente moderador entre o Legislativo, Executivo e Judiciário. Não custa recordar, igualmente, o descrédito de que padecia a judicatura quando exercia a fiscalização do afazer legislativo.
Este cenário de há muito sofreu profundas modificações.
Não apenas o Senado Federal deixou de ser vislumbrado como a instituição encarregada de exercer a coordenação entre os Poderes, como também se percebeu o gradativo prestígio conquistado pelo Judiciário, enquanto fiscalizador da legitimidade da produção normativa, nas últimas décadas.
É sintomático, neste sentido, a variedade de ferramentas processuais postas à disposição do Supremo Tribunal Federal para velar pela supremacia da Constituição. Em se tratando de controle concentrado de constitucionalidade, desde 1965, não se promoveu outra coisa senão a criação de aparelhos mais eficientes a tutelar os preceitos constitucionais.
As deficiências do modelo difuso, recrudescidas pela manutenção de uma regra que restringe demasiadamente a atuação do STF, explicitam-se à proporção que se robustece o método concentrado de fiscalização normativa.
Esta afirmação não se encontra destituída de repercussão prática.
Não se há de desprezar o nível de incongruência com que se pode atingir a ordem jurídica, em razão da convivência de sistemas de controle de constitucionalidade tão díspares.
Ora, suponhamos que, em uma lide concreta, haja o STF declarado a inconstitucionalidade de uma norma, e, ato contínuo, expedido comunicado ao Senado Federal, para fins de edição da resolução suspensiva. O ato, todavia, não é editado, pois aquela Casa legislativa, por desídia, deixa de apreciar a questão, ou expressamente manifesta-se pela impertinência de se suspender a lei inquinada.
Diante disto, um dos legitimados ao ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade apresenta ao STF pretensão de que este Tribunal, desta feita mediante processo abstrato, expresse uma vez mais seu juízo de desvalia em relação àquela mesma norma.
Acolhido o pleito, a norma definitivamente terá a sua eficácia cassada, a menos que se questione a autoridade do Supremo enquanto guardião da Constituição, o que implicaria, igualmente, a destituição de eficácia erga omnes e vinculante às suas decisões proferidas em controle concentrado.
Ocorre que, até que o Supremo pronuncie-se, definitivamente, acerca da questão constitucional, em sede de controle abstrato, remanescerá o estado de incerteza em torno da norma, cuja suspeita de inconstitucionalidade foi levantada. Tudo por conta das restrições impostas às suas decisões, quando proferidas no âmbito de uma lide concreta.
Inolvidável constatar o potencial de lesividade à segurança e estabilidade das relações jurídicas advindas da indefinição acerca da legitimidade de uma norma infraconstitucional. Até que se torne irrecorrível o acórdão prolatado pelo STF no processo abstrato de constitucionalidade, o que certamente levará alguns anos, todas as possíveis interpretações em torno do ato normativo questionado poderão emergir como resposta às lides sucessivamente instauradas em seu redor[23].
Mostra-se necessário transformar o sistema incidental de controle de constitucionalidade numa ferramenta mais idônea a guarnecer os valores insculpidos no Constituição. Curial, assim, que sejam quebrados os entraves que tanto inviabilizam que os pronunciamentos do Supremo, proferidos no bojo de uma lide concretamente instaurada, possuam a mesma magnitude daqueles advindos dos processos abstratos.
Propõe-se, fundamentalmente, que o mesmo status processual usufruído por um acórdão do STF prolatado, por exemplo, em uma ADIN ou ADPF, seja estendido às decisões concernentes às demais oportunidades de que este Tribunal disponha para se pronunciar sobre a constitucionalidade de uma norma.
É preciso reconhecer, primeiramente, que a atividade cognitiva conduzida pela Corte Suprema, ao perquirir a legitimidade de um ato normativo, não se torna mais ou menos exauriente em função do tipo de procedimento instaurado.
Não se desprezam as peculiaridades do regramento procedimental estatuído para reger os processos de controle concentrado, pelas leis n° 9.868/99 e n° 9.882/99, evidentemente. Ainda assim, não se pode imputar às especificidades ali existentes razões suficientes a concluir-se no sentido de que o STF se dedica com mais vagar ao enfrentamento da controvérsia constitucional neste tipo de procedimento.
Já que se defende a uniformização da eficácia das decisões do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional, tenha o entendimento se originado de processo subjetivo ou abstrato, pode-se advogar, por coerência à proposta aqui sustentada, a tese de que as regras procedimentais estabelecidas para a regência dos processos de natureza objetiva sejam transpostas, na medida do possível, às lides de índole concreta.
Neste sentido, oportuno consignar que a nova configuração do incidente de inconstitucionalidade, trazida pelos parágrafos do art. 482, do CPC, bem como a fórmula consagradora da apreciação da repercussão geral, no âmbito do recurso extraordinário (§6º do art. 543, do CPC), já materializam esta idéia.
Não se abandona, ainda assim, a premissa outrora levantada. Vale dizer, não são as especificidades do rito destinado a disciplinar o controle abstrato de constitucionalidade o motivo a impor limitações aos efeitos das decisões proferidas em sede de controle normativo incidental[24]. Não foi por isso que se criou a fórmula impositiva da participação do Senado neste tipo de procedimento.
Não se trata a regra em análise de uma espécie de mecanismo de compensação voltado a dirimir as deficiências cognitivas do método difuso, mas de uma estratégia voltada a suprir a ausência, no nosso sistema jurídico de formação romanística, de efeitos vinculantes dos julgados emanados do órgão de cúpula do Judiciário.
Deixe-se assentado, pois, que a inserção de terceiros no bojo de um procedimento concentrado, instaurado perante o STF, se democratiza o exercício da jurisdição constitucional, ao oportunizar, por exemplo, a manifestação de amicus curiae ou da entidade pública encarregada de editar a norma argüida de inconstitucional, não amesquiam os pronunciamentos daquela Corte, quando advindos de processo subjetivo.
O que importa é que o STF, enquanto guardião da Constituição, encare a controvérsia constitucional de forma exauriente.
Em observância à envergadura do seu mister, espera-se deste Tribunal que se debruce perante uma argüição de inconstitucionalidade, suscitada em uma lide concreta, com o mesmo propósito e entusiasmo de salvaguardar os preceitos constitucionais que o animam nos procedimentos abstratos.
Pouco importa se o argüente da questão constitucional seja o Presidente da República, um Governador de Estado, ou um simples indivíduo que apenas deseje a proteção de interesses particulares. Em qualquer destes casos, o que persegue a Suprema Corte é a edificação de um enunciado que traduza a proeminência do Texto Constitucional.
A análise de possíveis vícios contidos em uma norma deve ser feita de forma dissociada das desavenças subjetivas que eventualmente hajam provocado a manifestação da Excelsa Corte. Mais do que nunca, impõe-se a mitigação da prejudicialidade da questão constitucional, enquanto premissa inafastável da instauração do método difuso de investigação da legitimidade dos atos normativos, no STF.
É dizer, sempre que o Supremo Tribunal Federal dispuser de oportunidade para enfrentar argüição de inconstitucionalidade, deverá, sobremodo, exercer a sua atribuição de guardião da Constituição, e não simplesmente apaziguar interesses colidentes.
A eficácia dos entendimentos emitidos pelo STF acerca de matéria constitucional não pode se prender, assim, à natureza do procedimento em que a questão constitucional é encarada. Não se pode apontar, aprioristicamente, uma defasagem da atividade investigativa desenvolvida por este Tribunal nas lides de índole concreta quando comparada com a que se empreende nos processos objetivos[25].
A transcendentalização dos pronunciamentos do Pretório Excelso advindos do controle difuso de constitucionalidade nada mais é do que reflexo desta premissa
Não se pode olvidar, neste diapasão, a preponderância que se tem emprestado aos precedentes firmados pelo STF em seus julgados. A eficácia reflexa das decisões proferidas pela Excelsa Corte, em sede de controle incidental, contribuiu decisivamente ao desprestígio do encargo distribuído ao Senado Federal aqui estudado.
A autoridade dos julgados oriundos do STF adquiriu robustez suficiente a se irradiar para além dos pólos de uma relação processual, sem que, para tanto, o auxílio da resolução editada por aquela Casa Legislativa seja necessário.
Um singular aresto advindo da Excelsa Corte, que haja enfrentado tema constitucional, já é suficiente a se transformar em parâmetro de conduta dos Tribunais inferiores. Perceba-se que a vedação à instauração do incidente de inconstitucionalidade, segundo os ditames do art. 481, § 1º, do CPC, não reclama que a orientação firmada pelo STF esteja sedimentada em sucessivas decisões.
Impõe-se indagar: o juiz de primeira instância disporia de liberdade para contrariar entendimento construído pelo Supremo Tribunal Federal em torno de controvérsia constitucional, diante da vinculação a que se sujeitam os Tribunais?
A leitura do §1º, do art. 518, do CPC certamente está a indicar uma resposta afirmativa. Segundo este dispositivo, deverá o magistrado vincular-se apenas a súmulas editadas pelo Pretório Excelso, e não a decisões isoladas por ele prolatadas, e isso apenas para os fins de recebimento de recurso de apelação.
Suponhamos, todavia, que um litígio tenha a sua resolução intimamente associada à interpretação de uma norma infraconstitucional, cujo sentido, alcance e validade já foram fixados pelo STF.
Ainda que o juiz de primeiro grau recuse-se a pautar-se pelo julgado do Supremo, a questão, se chegar a adentrar em um Tribunal de apelação ou superior, inevitavelmente será conduzida à luz do que fora estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal.
Não se defende aqui, evidentemente, uma exegese que congregue elementos ainda mais restritivos ao direito de recorrer àqueles já existentes na norma acima indicada. Uma interpretação deste viés revelar-se-ia ilegítima a toda prova, na medida em que criaria óbices a um direito fundamental, inexistindo previsão legal a ampará-lo.
Parece incoerente, todavia, permitir-se o prolongamento de uma lide, cujo desfecho já se encontra anunciado. É que, de uma forma ou de outra, seja em primeira ou segunda instância, ou ainda em sede de recurso extraordinário, o entendimento firmado pelo STF se sobressairá[26].
Este mesmo raciocínio deve se estender, ainda com mais vigor, aos casos em que o Supremo Tribunal Federal já tenha consolidado em sua jurisprudência entendimento acerca de matéria constitucional, mesmo que não materializado em súmula.
Se o art. 518, §1º, do CPC, de igual forma, não obsta a que o juiz divirja de orientação cristalizada pela Excelsa Corte, o dispositivo consagrado no art. 557, §1º-A, também do CPC, apresenta-se como ferramenta com idoneidade suficiente a viabilizar que a inobservância, pelo juízo de primeiro grau, dos parâmetros edificados pelo STF seja oportunamente repreendida.
Evidencia-se, em última análise, que o desiderato que tem animado o legislador brasileiro move-se no sentido de edificar um manto protetivo gradativamente robusto a guarnecer a autoridade dos julgados do Supremo.
Uma interpretação sistemática e teleológica dos dispositivos relacionados ao processamento dos recursos no sistema jurídico brasileiro está a indicar que o caminho a ser trilhado pela nossa jurisdição constitucional é o de equiparar, do ponto de vista eficacial, os pronunciamentos originados da Excelsa Corte, por ocasião do controle incidental, àqueles advindos da fiscalização abstrata dos atos normativos.
Não se olvide, ainda, a inovação proporcionada pela Emenda Constitucional n° 45/2004, ao oportunizar ao Supremo Tribunal Federal a possibilidade de edição de súmulas de eficácia vinculante.
Dentro deste cenário, deve-se reconhecer que a fórmula contida no art. 52, X, da CF/88, não pode mais continuar a ser vislumbrada como requisito impostergável à generalização dos efeitos das decisões tomadas pelo STF em controle incidental.
Revela-se impertinente, ainda assim, imputar à competência constitucional atribuída ao Senado efeito de mera publicização das decisões do STF. A se sustentar tal tese, transformar-se-ia uma regra obsoleta em inócua. Vale anotar, destituído de qualquer valia um ato resolutivo editado por aquela Casa Legislativa, se em nada acrescerá àquilo previamente estabelecido pelo STF.
O fato é que a decisão do Supremo Tribunal Federal, sobre matéria constitucional, em observância ao mandamento contido no art. 102, caput, da CF/88, deve prescindir de intervenção de qualquer outra instituição para que se torne pública, notória, e com eficácia ampla e vinculante, haja o pronunciamento se originado de controle abstrato ou difuso de constitucionalidade.
Por tudo o que se expôs, é possível perceber que a regra contida no art. 52, X, da CF/88 está a preencher o Texto Constitucional inutilmente.
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[2] Interessante questão, a este respeito, é trazida por Zeno Veloso (2000, p. 43). Defende o autor a necessidade de o Ministério Público ser convocado a intervir nos feitos, sempre que no seu bojo for levantada dúvida acerca da legitimidade de algum ato normativo, ainda que não participe da relação processual na qualidade de custus legis. Para chegar a esta conclusão, ampara-se no art. 127, da CF/88, para aduzir que, por ter como uma de suas funções institucionais a defesa da ordem jurídica, não pode deixar o Parquet de se manifestar sobre a constitucionalidade das leis, quer se trate de controle difuso ou abstrato.
[3] Esta característica, oriunda do constitucionalismo do EUA, foi incorporada, em parte, à jurisdição constitucional brasileira. De fato, inexiste, no primeiro grau, dispositivos legais a preceituar o modo de se deduzir em juízo a argüição de inconstitucionalidade (CLÉVE, 2000, p. 45). Não se pode olvidar, porém, que quando este tipo de questão alcança os tribunais, torna-se imprescindível observar, em respeito ao preceito constitucional da reserva de plenário (art. 97, da CF/88), regramento especificamente endereçado ao conhecimento da argüição levantada, encontrável tanto no código de processo civil quanto nos regimentos internos dos órgãos colegiados (BARROSO, 2007, p.87).
[4] Ainda que não consigne expressamente, Luís Roberto Barroso (2007, p. 82) deixa implícita esta assertiva, quando afirma que a parte autora, caso não apresente logo na inicial a tese da inconstitucionalidade do ato normativo, poderá fazê-lo em momento posterior. Evidentemente, esta flexibilidade não poderia deixar de ser estendida à parte demandada, sob pena de se sacrificar, entre outros princípios, o da paridade de armas.
[5] Estas mesmas considerações devem ser estendidas à ação civil pública. Com efeito, a despeito de remanescer certa controvérsia doutrinária e jurisprudencial em torno do assunto, é predominante o entendimento que considera factível o manejo desta ação coletiva, desde que, evidentemente, busque-se a discussão de bem jurídico materialmente aferível (BARROSO, 2007, p. 84).
[6] Durante o regime imperial, não se adotou, no Brasil, qualquer mecanismo judicial, sequer incipiente, de fiscalização do afazer legislativo. As concepções políticas em voga no país durante tal interregno impunham hostilidade a mais remota possibilidade de se outorgar ao Judiciário, inclusive à sua mais alta instância, a prerrogativa de declarar a invalidade de atos normativos editados pelo Parlamento. Não se pode olvidar a influência exercida pelos países europeus, sobretudo França e Inglaterra, sobre a arquitetura dos Poderes erigida pelo Constituinte de 1824 (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 283). Com efeito, o dogma da supremacia do Parlamento, materializado na concepção de que o conteúdo de uma lei, por traduzir a soberania popular, somente poderia ser definido pelo órgão legiferante restou devidamente prestigiado pela Constituição Imperial (CLÈVE, 2000, p. 80). Não bastasse o incontrastável prestígio emprestado ao Poder Legislativo por aquela Constituição, havia ainda outro óbice a inviabilizar o controle judicial das leis naquele momento histórico. Faz-se aqui referência ao Poder Moderador. Concebido com o escopo de instrumentalizar o equilíbrio e harmonia entre os demais poderes estatais (CLÉVE, 2000, p.80), tal instituto consubstanciava-se em uma prerrogativa usufruível exclusivamente pelo Imperador enquanto necessária a obstar qualquer espécie de ingerência ou intromissão entre as funções Legislativa, Executiva e Judiciária do Estado. Não é difícil concluir que eventuais controvérsias acerca da legitimidade de uma determinada norma, acaso motivassem desavença entre as instâncias judiciária e legislativa deveriam ser solvidas pelo Imperador, no gozo da mencionada prerrogativa constitucional (BITTENCOURT, 1997, p. 28). A situação será outra a partir da ordem republicana inaugurada em 1891. A forma de Estado federal, o regime de governo republicano, o sistema político presidencialista, e a estruturação do Poder Legislativo bicameral tornam inequívoca a assertiva de que a ordem constitucional, inaugurada naquele final de século, sofreu contundente influência do constitucionalismo norte-americano (CLÈVE, 2008, p. 82). Esta premissa não se fragiliza quando se analisam as atribuições confiadas ao Judiciário brasileiro. De fato, à luz dos preceitos contidos na Carta Magna recém editada, bem como da legislação infraconstitucional desenvolvida sob sua égide, indeclinável a constatação de que se adotava no Brasil, pela primeira vez, um modelo judicial de fiscalização normativa (BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1037). Assim como sucedia nos EUA, estabeleceu o constituinte de 1891 uma modalidade de controle caracterizável como difusa, incidental e sucessiva (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 285), reconhecendo-se explicitamente a competência das Justiças da União e dos Estados para o exercício do controle da legitimidade das leis (BITTENCOURT, 1997, p. 29).
[7] Todas elas foram listadas em PALU, 2001, p. 125 e 128.
[8] Talvez por isso haja sido rejeitada proposta veiculada no bojo dos trabalhos da constituinte de 1934 que apontava uma solução ao problema da limitação das decisões do Supremo divergente àquela que acabou prevalecendo. Propunha-se que uma lei deixaria de existir no ordenamento jurídico, independentemente de manifestação do Senado, desde que houvesse o Supremo Tribunal Federal reconhecido por duas vezes a sua ilegitimidade (MENDES, 1999, p. 27).
[9] Não se olvide, evidentemente, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal, mesmo por ocasião do controle difuso, utilizar-se da modulação dos efeitos, restringindo a eficácia dos seus julgados mediante a utilização da técnica prevista no art. 27, da Lei n° 9868/99. Confira-se, a este respeito, COELHO, BRANCO, MENDES, 2008, p. 1098-1101. Nestes casos, em razão da simetria que deve ser guardada entre a resolução senatorial e os efeitos da decisão do STF, a eficácia do ato edificado pelo Senado estará condicionada aos termos em que preconizado o acórdão do Supremo (FERNANDES, 2009, p.145).
[10] Um dos grandes fatores apontados como óbice à edição do ato suspensivo consiste na possibilidade de a decisão reconhecedora do vício normativo não estar calcada em sólida base jurisprudencial (FERNANDES, 2009 p. 144), ou haver sido proferida por maioria apertada (MENDES, 2004, p. 153). Pode-se indicar também o fato de o Tribunal haver mudado a sua composição, logo após uma decisão, reconhecendo-se a conveniência de se aguardar que os seus novos membros, em julgamentos futuros, cristalizem o posicionamento anteriormente firmado acerca da ilegitimidade de uma lei (MENDES, p. 153). Pode-se invocar, outrossim, motivos alheios às circunstâncias nas quais a decisão do Supremo foi proferida. Os desdobramentos econômicos e sociais advindos da paralisação dos efeitos das normas impugnadas, por exemplo, já formam levantados como fundamento a amparar o não exercício da prerrogativa constitucional em tela (CUNHA JÚNIOR, p. 313).
[11] Nada obsta, todavia, a que o próprio STF, mesmo após haver assentado a inconstitucionalidade de uma norma, e desde que antes de a intervenção senatorial haja se materializado, altere anterior posicionamento, passando a reconhecer a legitimidade da lei outrora impugnada (MENDES, 2004, p. 154). Neste caso, ainda que usufrua o Senado da atribuição constitucional de suspender o ato normativo, em razão do primeiro julgamento, restará frustrado o seu intento, caso efetivamente exercido, não produzido sua atuação qualquer repercussão prática (MENDES, 2004, p. 154). Por fim, registre-se interessante tese levantada por André Dias Fernandes (2009, p. 153). Sustenta o autor a possibilidade de a própria resolução senatorial, por travestir-se de inequívoca natureza normativa, ser passível de controle de constitucionalidade. A argüição, continua Fernandes, poderia ser suscitada em qualquer juízo, mediante controle incidental, não se adstringindo a acusação eventualmente levantada em seu desfavor ao crivo do STF.
[12] Como bem pontua Clèmerson Clève (2000, p. 120), poderá o Senado quedar-se inerte indefinidamente, inexistindo qualquer regra que lhe imponha, ao menos, manifestar-se sobre a norma argüida. Sobre este aspecto, Zeno Veloso (2000, p.59), ilustra alguns casos, nos quais o Senado, mesmo passados 25 anos do recebimento da decisão do Supremo, não havia expressado qualquer posicionamento sobre o tema nela ventilado.
[13] Não é por outro motivo que sustenta Clèmerson Clève que, constituindo-se a resolução senatorial uma manifestação discricionária, nada poderia obstar a que esta mesma margem de liberdade pudesse veicular a restrição do pronunciamento do Pretório Excelso (CLEVE, 2000, p. 121).
[14] Apenas para fins de ilustração da desconfiança que atingia o Poder Judiciário, pode-se citar o dispositivo contido na Carta de 1937, o qual preconizava a possibilidade de o Poder Legislativo, por provocação do Presidente da República, cassar as decisões judiciais que decretassem a inconstitucionalidade de uma determinada lei (CLÈVE, 2000, p. 86). Era esta a redação consagradora da regra em comento: art. 96, § único: “No caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa de interesse nacional de alta monta, poderá o Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento: se este a confirmar por dois terços de votos em cada uma das Câmaras, ficará sem efeito a decisão do Tribunal.” Mediante a aplicação do novo regramento, toda decisão judicial, independentemente do órgão jurisdicional de onde proviesse, era passível de ser cassada. Para tanto, mostrava-se suficiente que apresentasse em seu teor aquilo que o Presidente da República, considerasse ofensivo a ato normativo que traduzisse o “bem estar do povo” ou “interesse nacional de alta monta”. Insta observar apenas que tal regramento não se manteve nas ordens jurídicas subseqüentes ao regime varguista, mas não deixa, por isso, de servir de elemento elucidativo da dinâmica entre as três esferas do Poder Estatal da época.
[15] Confira a respeito os votos dos Ministros Gilmar Ferreira Mendes e Eros Roberto Grau proferidos por ocasião do julgamento, ainda inconcluso, da Reclamação Constitucional RCL nº 4335/AC.
[16] Não se despreza, obviamente, a possibilidade de haver incompatibilidade formal do texto normativo à Constituição, bem como, as hipóteses excepcionais em que uma norma, posto inconstitucional, remanesce, ainda assim, no ordenamento jurídico, em virtude das técnicas de interpretação conforme à Constituição ou mediante a declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto.
[17] Uma análise sistemática das regras contidas nos artigos 518, §1º e 557, caput e § 1-A, todos do CPC, permite inferir que mesmo que o juiz singular descuide de observar o dispositivo concernente à súmula impeditiva de recurso, deverá o relator da apelação, monocraticamente, negar, de forma liminar, o recebimento do recurso interposto (CUNHA e DIDIER JÚNIOR, 2009, p. 129-130). É como se a jurisprudência firmada pelo STF estivesse envolta por uma dupla camada a guarnecê-la de eventuais tentativas de contrariá-las.
[18] A Emenda Constitucional n° 16, de 26 de novembro de 1965, consagrou o modelo de fiscalização abstrata de normas no Brasil. Mediante a utilização da representação de inconstitucionalidade, poder-se-iam argüir, de forma concentrada e abstrata, vícios eventualmente existentes em atos normativos federais ou estaduais. Em que pese a inovação proporcionada pela reforma de 1965, não se pode deixar de ressaltar alguns aspectos trazidos pela representação de inconstitucionalidade, por evidenciar o grau de incipiência do modelo abstrato de fiscalização do afazer legislativo que permeou a jurisdição constitucional brasileira até a vigência da ordem inaugurada em 1988. O primeiro ponto a ser ressaltado pertine ao fato de que apenas ao Procurador Geral da República foi atribuída a prerrogativa do ajuizamento da representação de inconstitucionalidade (MENDES, 2007, p. 226). Não bastasse este característica assaz restritiva, curial ressaltar que o PGR não estava obrigado a veicular o pedido que lhe fosse dirigido, seja por particular ou por órgão ou pessoa jurídica de direito público, para conflagração da controvérsia constitucional. Competia-lhe, ao contrário, após aferir a pertinência da argüição a ele encaminhada, decidir pelo ajuizamento ou não da representação em tela, não sendo possível ao STF, de acordo com sua própria jurisprudência, conhecer das irresignações eventualmente ventiladas pelos que viram seu intento de ver extirpado do ordenamento jurídico uma lei pretensamente inconstitucional frustrado (MENDES, 2007, p. 226). Outra incongruência que merece registro emerge da constatação de que o PGR, à época em que concebida a representação de inconstitucionalidade, além de chefe do Ministério Público na esfera federal, exercia o múnus de representante judicial e extrajudicial da União (CLÈVE, 2000, p.130). Ora, o que aconteceria se, por exemplo, um determinado Estado ou Município socorresse-se do Procurador Geral da República com o intuito de ver afastada a incidência de uma lei federal, admitindo-se a hipótese de que mencionada norma, ainda que maculada pelo vício da inconstitucionalidade, comprometeria interesses econômicos da União, caso tivesse sua eficácia paralisada? Seria possível ao PGR dissociar-se do seu papel de representante da União, assumindo de forma exclusiva a batuta de advogado da Constituição, pugnando judicialmente pela invalidade dos dispositivos atacados, mesmo que a procedência de sua súplica traga conseqüências negativas ao ente federativo por ele representado? (Estas duas últimas indagações amparam-se em reflexões lançadas pelo Ministro Gilmar Mendes (MENDES, 2007, p. 212-213, nota de rodapé n° 59). Some-se aos inconvenientes já explicitados a incorporação, também ao controle abstrato, da necessidade de intervenção do Senado Federal para que se pudesse conferir às decisões do STF eficácia erga omnes. É bem verdade que se tentou suprimir este estágio procedimental no próprio projeto de emenda que culminou na edição da representação de inconstitucionalidade. Estatuía-se para o art. 101, § 3º, da CF/46, preceito que emprestava força transcendental autônoma às decisões do Supremo Tribunal Federal, competindo ao Presidente daquela casa legislativa, de acordo com a proposta dada ao art. 64 daquele mesmo diploma, tão-somente o dever de publicizar o quantum decidido (MENDES, 2007, p. 205). Restassem tais proposituras aprovadas, conferir-se-ia às decisões emanadas do Supremo Tribunal eficácia erga omnes. Tais mudanças, todavia, foram rejeitadas (PALU, 2001, p. 131-132), mantendo-se, tanto na Carta de 1946, quanto nos Textos Constitucionais editados durante o regime ditatorial, a regra consagradora da participação do Senado nas decisões proferidas pelo STF, tanto em sede de controle incidental quanto no recém instaurado modelo concentrado de constitucionalidade. O tratamento outrora homogêneo dispensado às decisões que versassem sobre questões constitucionais sofreria, a partir de 1977, uma dicotomia até hoje subsistente na jurisdição constitucional brasileira (CASTRO, 2008, p. 44). Os Ministros da Excelsa Corte, seguindo a linha preconizada por Moreira Alves, no Processo Administrativo n° 4477-72, passaram a defender a tese de que a intervenção do Senado Federal nos processos abstratos de controle de constitucionalidade seria despicienda, outorgando-se às decisões emanadas nos procedimentos de controle concentrado eficácia geral, independentemente de resolução normativa daquela casa legislativa (MENDES, 2004, p. 155).
[19] Até então, a menos que o PGR dissociasse o seu papel de advogado da Constituição do múnus de representante da União, eventual usurpação de competência cometida pelo Poder Central em detrimento das entidades periféricas da federação, por exemplo, apenas poderiam ser conhecidas pelo STF na via incidental (MENDES, 2007, p. 212-213). A representação interventiva, único remédio então instituído com o espoco de socorrer o equilíbrio e integridade do estado Federal brasileiro, mostrava-se demasiadamente limitado, na medida em que vocacionado apenas à tutela dos princípios constitucionais sensíveis, podendo, outrossim, ser veiculado apenas pela União.
[20] Neste mesmo sentido, BRANCO, COELHO, MENDES, 2008, p. 1186.
[21] Não se emprestou ao instituto da representação de inconstitucionalidade o alcance compatível à sua função de salvaguardar a ordem constitucional (MENDES, 2007, p. 230-231). Para que este desiderato fosse atingido integralmente, não era suficiente que o controle abstrato fosse arquitetado apenas com o escopo de extirpar do ordenamento jurídico os atos normativos que lhe fossem incompatíveis. Fazia-se necessário, outrossim, que os instrumentos processuais estabelecidos para operacionalizar esta modalidade de fiscalização das leis pudessem ser acionados todas as oportunidades em que se deparasse o Estado com controvérsia constitucional de monta. Com efeito, não se pode desconhecer que a incessante quizila em torno da legitimidade de um ato normativo pode comprometer, a depender da magnitude alcançada, o equilíbrio da ordem jurídica. Basta imaginar os efeitos oriundos de divergências jurisprudenciais em torno da constitucionalidade de uma determinada lei. Até que a Excelsa Corte pronuncie-se em definitivo sobre sua legitimidade, remanescerá o estado de insegurança provocado pelos pronunciamentos judiciais divergentes. Ocorre que o STF, como qualquer órgão jurisdicional, apenas poderá manifestar-se se for provocado. Pertinente, então, indagar: e se o PGR, convencido da constitucionalidade da hipotética norma, deixar de apresentar à Corte Suprema a representação de inconstitucionalidade? A única alternativa viável a contornar o inconveniente originado por esta moldura processual restritiva, arquitetada pela EC n° 16/65, seria aguardar que a questão constitucional alcançasse o STF em sede de controle difuso. A ausência de caráter ambivalente conferido à representação de inconstitucionalidade, de modo a emprestar-lhe idoneidade a solver controvérsias em torno da interpretação e aplicabilidade da legislação infraconstitucional era outro dos óbices do incipiente modelo abstrato que vigia no Brasil anteriormente a 1988 (MENDES, 2007, p. 230-231).
[22] Este entendimento está amparado em julgamentos proferidos pelo STF, ambos de relatoria do Ministro Maurício Corrêa, nas RCL. 1.987, DJ de 21-5-2004 e RCL.-AgRg.-QO 1.880, DJ de 19-3-2004).
[23] A menos, evidentemente, que o Ministro-relator da ADIN, utilizando-se do disposto no art. 10, da lei n° 9.868-99, suspenda cautelarmente todos os processos nos quais se discute a norma impugnada.
[24] Em verdade, os dispositivos em comento estão mais a evidenciar que o desiderato perseguido pelo STF, quando do enfrentamento de temas de índole constitucional, quer em sede de controle incidental ou abstrato, traduz-se na defesa da ordem jurídica calcada na prevalência normativa da Constituição. Com efeito, a intervenção do Ministério Público (art. 482, §1º, do CPC), do ente encarregado da edição da norma impugnada (art. 482, §1º, do CPC), de amicus curiae (art. 482, §3º, e art. 543, §6º, ambos do CPC) ou das entidades legitimadas ao ajuizamento de ações de índole abstrata nos processos subjetivos (art. 482, §2º, do CPC) revelam que as desavenças entre os atores processuais é mero pretexto ao enfrentamento e resolução de questões constitucionais.
[25] Não custa relembrar que a fórmula criada para se generalizar as decisões do Supremo foi edificada em um momento em que inexistia a modalidade concentrada de fiscalização normativa. Ela não surgiu como decorrência de uma análise comparativa entre os mecanismos abstrato e incidental de averiguação da constitucionalidade de um ato normativo. Ela não emergiu da constatação de que a investigação da legitimidade de uma norma, conduzida no bojo de um processo concreto, é incompleta ou falha, e que apenas as decisões emanadas no seio de um processo concentrado poderia aferir de forma exauriente a controvérsia constitucional. Ora, quando o modelo concentrado foi instaurado no Brasil, a obtenção de eficácia ampliativa de suas decisões, da mesma forma que nos processos incidentais, também exigiam a participação do Senado Federal. Esta regra apenas deixou de incidir no bojo dos processos de índole abstrata em 1977.
[26] Obviamente não se está aqui a sustentar uma tese que desemboque no engessamento dos pronunciamentos judiciais. O próprio STF dispõe de ferramentas para revisar a sua jurisprudência, modificando entendimentos outrora firmados. Não se olvide, outrossim, que o sistema recursal brasileiro não deixou de fornecer ferramentas a serem manejadas por aqueles que se sentirem prejudicados diante de julgados que acolham precedentes firmados pela Excelsa Corte. A título de ilustração, consultem-se os artigos 522, caput., e 557, §1º, ambos do CPC.
Bacharel em Direito, graduado pela Universidade Federal de Sergipe. Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Luiz Gustavo Lima. A atuação do Senado Federal no controle difuso de constitucionalidade e a nova dinâmica do modelo incidental no sistema jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 out 2010, 10:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21787/a-atuacao-do-senado-federal-no-controle-difuso-de-constitucionalidade-e-a-nova-dinamica-do-modelo-incidental-no-sistema-juridico-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
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