I – REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO E A TAXA SELIC
A restituição pressupõe o pagamento indevido. Nesta, há, efetivamente, um recolhimento que posteriormente vem a ser repetido pelo contribuinte. Neste sentido dispõe o art. 165 do Código Tributário Nacional:
“Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no §4º do art. 162, nos seguintes casos:
I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;
II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
III – reforma, anulação, revogação ou rescisão da decisão condenatória.”
A restituição tem assento no princípio de que ninguém deve enriquecer ilicitamente, devendo aquele que recebe o que não lhe era devido devolver ao que voluntariamente pagou.
Neste sentido dispõe Aliomar Baleeiro[1]:
“Velho e universal princípio do Direito, atribuído a Pomponio, não tolera locupletamento indevido com alheia jactura. Várias disposições legais mandam restituir o recebido indevidamente, ainda que, seguindo diretriz doutrinária de Beviláqua, o princípio não esteja enunciado com essa generalidade no Código Civil, que preferiu regular separadamente sua aplicação em cada instituto.”
A devolução do pagamento indevido de qualquer tributo se dá via ação de repetição de indébito, que segue o rito ordinário. Na substituição tributária deve se verificar no caso concreto quem assumiu o ônus econômico, nos termos do artigo 166 do Código Tributário Nacional e da súmula nº 546 do Supremo Tribunal Federal.
No pagamento indevido o contribuinte tem direito à devolução do tributo, da multa, dos juros e da correção monetária, nos termos do artigo 167 do Código Tributário Nacional.
No tocante a correção monetária e aos juros deve-se observar o disposto na Lei n.º 9.250/95, que prevê expressamente a aplicação dos juros na restituição:
Art. 39. Art. 39. A compensação de que trata o art. 66 da Lei nº 8.383, de 30 de dezembro de 1991, com a redação dada pelo art. 58 da Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, somente poderá ser efetuada com o recolhimento de importância correspondente a imposto, taxa, contribuição federal ou receitas patrimoniais de mesma espécie e destinação constitucional, apurado em períodos subseqüentes.
§4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% (um por cento) relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.
Alexandre Rossato da Silva Ávila[2] explica bem a aplicação da taxa SELIC:
“Porém, no que se refere à correção monetária e aos juros na restituição do indébito, deve ser observado que a Lei 9.250/95, com vigência a partir de 01 de janeiro de 1996, determinou a incidência da taxa SELIC, que é a mesma taxa utilizada pela Fazenda Pública para a cobrança de seus créditos. A jurisprudência tem entendido que a taxa SELIC abrange juros de mora e correção monetária. Por isto, a partir de 1º de janeiro de 1996, incide apenas a orientação da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça tem sido a seguinte: antes da Lei 9.250/95, a correção monetária incidia desde o pagamento indevido até a restituição ou compensação, acrescida de juros de mora de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado. Depois da Lei 9.250/95 aplica-se a taxa SELIC a partir do pagamento indevido ou, se for o caso, a partir de 1º de janeiro de 1996, não podendo ser cumulada com correção monetária ou juros.
Até a instituição da SELIC, os índices de correção monetária incidentes na restituição eram os seguintes: ORTN até fevereiro de 1986; OTN até janeiro de 1989, BTN de fevereiro de 1989 a fevereiro de 1991. De março a dezembro de 1991 alguns julgados aplicam o IPC e outros o INPC. A partir de janeiro de 1992 passou a incidir a UFIR, isto até 31 de dezembro de 1995. A SELIC, como índice de correção monetária e juros na restituição é aplicada desde 1º de janeiro de 1996.”
O Superior Tribunal de Justiça editou duas súmulas dispondo acerca da correção monetária e dos juros moratórios na repetição de indébito tributário. Vejamos o teor das súmulas nº 162 e 188:
NA REPETIÇÃO DE INDEBITO TRIBUTARIO, A CORREÇÃO MONETARIA INCIDE A PARTIR DO PAGAMENTO INDEVIDO.
(Súmula 162, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/1996, DJ 19/06/1996 p. 21940)
OS JUROS MORATORIOS, NA REPETIÇÃO DO INDEBITO TRIBUTÁRIO, SÃO DEVIDOS A PARTIR DO TRANSITO EM JULGADO DA SENTENÇA.
(Súmula 188, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/06/1997, DJ 23/06/1997 p. 29331, REPDJ 21/11/1997 p. 60721)
A respeito da natureza e da aplicação da taxa SELIC transcrevemos a seguinte passagem do voto do Min. Luix Fux no julgamento do AgRg nº 639.917 –PB:
“A taxa SELIC é o valor apurado no Sistema Especial de Liquidação e de Custódia, mediante cálculo da taxa média ponderada e ajustada das operações de financiamento por um dia. A referida taxa reflete, basicamente, as condições instantâneas de liquidez no mercado monetário e se decompõe em taxa de juros reais e taxa de inflação no período considerado, razão pela qual não pode ser aplicada cumulativamente com outros índices de reajustamento, como, por exemplo, com a UFIR, o IPC e o INPC.”
No mesmo sentido: “A Selic é composta de taxa de juros e correção monetária, não podendo ser cumulada, a partir de sua incidência, com qualquer outro índice de atualização” (STJ, REsp 830.102/SP, Relator Ministro Castro Meira, DJ de 02/06/06).
II – NATUREZA DOS CRÉDITOS DE IPI E INAPLICABILIDADE DA TAXA SELIC
No tocante ao ressarcimento dos créditos de IPI, não há na legislação tributária previsão de qualquer acréscimo seja de juros ou de correção monetária.
Isto corre em razão da correção monetária de dívidas e obrigações não se assemelhar à correção de créditos escriturais, oriundos de operações contábeis, pois neste caso não há um devedor. A sistemática dos créditos de IPI é apenas uma técnica utilizada para operacionalizar um benefício cuja utilização é facultativa. Por isso, na manutenção ou utilização de tais créditos não se aplicam as mesmas regras da restituição, pois aqui não há uma relação obrigacional.
A correção monetária, prevista na legislação, incide apenas sobre o crédito tributário constituído ou quando recolhido com atraso. Nesse sentido a correção monetária está prevista na legislação. Diferenciam-se dos créditos escriturais, que existem para fazer valer o princípio da não-cumulatividade.
O Supremo Tribunal Federal tem entendimento de que a não incidência de correção monetária sobre os créditos de IPI não viola os princípios constitucionais da isonomia e da não-cumulatividade:
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. IPI. CORREÇÃO MONETÁRIA DOS CRÉDITOS ESCRITURAIS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA NÃO-CUMULATIVIDADE. Nos termos da jurisprudência deste Tribunal, não incide correção monetária sobre créditos escriturais de IPI. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 410795 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 29/09/2009, DJe-204 DIVULG 28-10-2009 PUBLIC 29-10-2009 EMENT VOL-02380-05 PP-00880 LEXSTF v. 31, n. 371, 2009, p. 209-213)
Os créditos de IPI obtidos pelo estabelecimento industrial na forma do artigo 153, §3º, II, da CRFB e do art. 11 da Lei nº 9.779/99, inclusive quando acumulados ao final do trimestre-calendário, cuja utilização não foi obstaculizada por ato ilegítimo da Administração Fazendária, não podem ser objeto de correção monetária em razão de sua natureza contábil e da ausência de previsão legal autorizativa.
Da mesma forma ocorre com o crédito presumido de IPI previsto na Lei 9.363/96, que por se tratar de um benefício fiscal que teve todos os seus critérios definidos pelo legislador, e foi criado no intuito de desonerar a cadeia de produção e colaborar para uma melhor competitividade das empresas brasileiras.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que só há autorização para atualização monetária dos créditos de IPI quando há resistência injustificada do Fisco em admitir o pedido de ressarcimento:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. IPI. CRÉDITO PRESUMIDO. ART. 4º, DA LEI N. 9.363/96. CORREÇÃO MONETÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA INJUSTIFICADA DO FISCO EM RECONHECER TAIS CRÉDITOS. SIMPLES DEMORA NA APRECIAÇÃO DO PEDIDO ADMINISTRATIVO DE RESSARCIMENTO.
1. Em se tratando de créditos escriturais de IPI, só há autorização para atualização monetária de seus valores quando há resistência injustificada do Fisco em admitir o pedido de ressarcimento. Tema examinado pela Primeira Seção, sob o rito do artigo 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008, no REsp. 1.035.847/RS.
2. Não se enquadra na hipótese excepcional a simples demora na apreciação do requerimento administrativo de restituição ou compensação de valores, sobretudo quando não há prova da existência de impedimento injustificado ao aproveitamento dos créditos titularizados pelo contribuinte. Precedentes: AgRg no REsp 1.085.764/SC, Rel. Min. Mauro Campbell, Segunda Turma, DJe de 10.09.2009; REsp 1.115.099/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 26.03.2010; REsp 985.327/SC, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, DJe de 17.03.2008.
3. Recurso especial provido.
(REsp 1144427/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/06/2010, DJe 28/06/2010)
A impossibilidade da aplicação da Taxa SELIC às situações envolvendo o ressarcimento de IPI também encontra respaldo na jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais:
“IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – IPI. Período de apuração: 01/04/2003 a 30/04/2003. IPI CRÉDITO PRESUMIDO. AQUISIÇÃO DE PESSOAS FÍSICAS. Em que pese o entendimento pessoal do Relator, defere-se o crédito presumido do IPI quando da aquisição de pessoas físicas, nos termos do entendimento pacificado da Câmara Superior de Recursos Fiscais. IPI. CRÉDITO PRESUMIDO. AQUISIÇÃO DE COOPERATIVAS. CRÉDITO PRESUMIDO. LEI N° 10.276/2001. BASE DE CÁLCULO. AQUISIÇÕES DE INSUMOS JUNTO A PESSOAS FÍSICAS, PRODUTORES RURAIS. Devem ser excluídas da formação da base de cálculo do crédito presumido de FPI as aquisições de insumos junto a produtores rurais, pessoas fisicas, visto que estes não sofrem a incidência do PIS/Pasep e da Cofins, uma das condições estabelecidas na lei para a fruição do beneficio. Havendo incidência do PIS e da Cofins quando dos insumos da venda da cooperativa para o exportador, há de se reconhecer o direito ao crédito presumido do IPI.CRÉDITO PRESUMIDO. LEI n° 10.276/2001. ATUALIZAÇÃO. TAXA SELIC. Incabível qualquer forma de atualização do ressarcimento do crédito de IPI, diante da inexistência de previsão legal. Recurso negado..[3]
Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI PERÍODO DE APURAÇÃO: 01/04/2001 a 30/06/2001 IPI. CRÉDITO PRESUMIDO. PESSOAS FÍSICAS E COOPERATIVAS. A lei não autoriza o ressarcimento referente às aquisições que não sofreram incidência da contribuição ao PIS e da Cofins no fornecimento ao produtor exportador. CRÉDITO PRESUMIDO. INSUMOS NÃO ADMITIDOS NO CÁLCULO. Não são suscetíveis do benefício de crédito presumido de IPI os gastos com combustíveis, energia elétrica, consoante Súmula n° 12 do Segundo Conselho de Contribuintes, e outros que, embora sendo necessários ao estabelecimento industrial, não se revestem da condição de matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem, visto que sequer entram em contato direto com o produto fabricado. TAXA SELIC. RESSARCIMENTO. INAPLICABILIDADE. O ressarcimento não se confunde com a restituição pela inocorrência de indébito. Não se justifica a correção em processos de ressarcimento de créditos, visto não haver previsão legal. Recurso voluntário negado.[4].”
No voto do segundo acórdão do citado ressaltou-se que: “não há como equiparar a situação originária de um indébito com valores a serem ressarcidos oriundos de créditos incentivados ou básicos. Estes decorrem do confronto entre créditos e débitos em Conta gráfica de IPI, de modo a abater o imposto correta e devidamente pago em operações anteriores, do imposto devido nas operações subseqüentes, com fulcro no princípio da não-cumulatividade. Portanto, não há imposto indevidamente pago.”
A Instrução Normativa nº 900 de 30 de dezembro de 2008 da Receita Federal do Brasil, dispõe expressamente no seu artigo 72, parágrafo 5º, inciso I, que não incidirão os juros compensatórios no ressarcimento dos créditos de IPI.
Conclui-se que na hipótese de crédito incentivado de IPI não há ingresso indevido de valores, mas sim renúncia fiscal com o propósito de estimular setores da economia, cuja concessão deve se subsumir estritamente aos termos e condições estipuladas pelo poder concedente.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARNEIRO, Raphael Funchal. Da inaplicabilidade da taxa SELIC no ressarcimento dos créditos de IPI Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 out 2010, 07:18. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21823/da-inaplicabilidade-da-taxa-selic-no-ressarcimento-dos-creditos-de-ipi. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Magalice Cruz de Oliveira
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Precisa estar logado para fazer comentários.