1- INTRODUÇÃO
O presente artigo fez uma abordagem sobre os bens de família excluídos da impenhorabilidade e também sobre a polêmica criada acerca da constitucionalidade da penhorabilidade do bem de família do fiador de contrato de locação de imóveis.
O bem de família tem como característica fundamental preservar o imóvel familiar destinado a moradia, garantindo assim a impenhorabilidade de um único imóvel familiar bem como dos bens móveis que guarnecem a casa.
A lei 8.009/90 (lei a prevê o bem de família legal) ampliou significativamente a incidência do bem de família, salientando que a presente lei traz em seu bojo exceções ao benefício do bem de família, e em 1991 sofreu alterações através da Lei do Inquilinato (n° 8.245/91), que inseriu o inciso VII do artigo 3° do texto legal, que prevê a possibilidade de ocorrer à penhora do bem de família do fiador de contrato de locação, cuja constitucionalidade não é admitida pela doutrina e jurisprudência majoritária. A alteração feita pela lei n°8.245/91 que foi mencionada acima sofre acusações de contrariar um dos mais importantes princípios fundamentais previsto na Constituição Federal, o da Dignidade da Pessoa Humana. Como também o direito de moradia que foi elevado à categoria de direitos sociais pela Emenda Constitucional n°26/2000.
A pesquisa em tela foi realizada através do método técnico-científico, com base na doutrina, por meio de livros, legislações e da internet.
Esse artigo científico trata especificamente sobre as exceções do Bem de Família, inclusive o Art. 3°, inciso VII da Lei 8.009/90 que estabelece a possibilidade de penhora do Bem de Família do Fiador de contrato de locação. Colocando em pauta a visão constitucionalista e a inconstitucionalista a respeito dessa exceção.
2- BENS DE FAMÍLIA EXCLUÍDOS DA IMPENHORABILIDADE
O artigo 2º da lei 8.009/90 “exclui da impenhorabilidade os veículos de transportes, as obras de arte e os adornos suntuosos”.
Quanto aos veículos de transportes são penhoráveis os automóveis, caminhões, motocicletas, pelo fato de não serem essenciais para a vida digna do seu proprietário e de sua família. Faz-se uma ressalva quanto aos veículos utilizados como instrumentos de trabalho, nesse caso excepcionalmente ele será impenhorável.
No que tange a obra de arte serão penhoráveis quando não estiverem vinculadas ao imóvel, porque nesse caso podem ser retiradas sem serem destruídas.
Já os adornos suntuosos, que são os enfeites luxuosos também são penhoráveis, pois não existe motivo algum para serem protegidos pelo manto da impenhorabilidade do bem de família.
Destaca-se a decisão da 4ª Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande do Sul, prolatada em 19.12.1991, por unanimidade, em que foi relator o juiz Jauro Duarte Gehlen, considerou penhoráveis os aparelhos eletrônicos “sofisticados que mais se aproximam da suntuosidade e da ostentação”.
2.1 As Exceções da Impenhorabilidade Contidas no Art. 3º da Lei 8.009/90.
O caput do Art. 3º prevê que a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, e seus incisos estabelece as exceções, as ressalvas, onde poderá ser aplicada a penhorabilidade do bem de família.
De acordo com esses incisivos, mesmo que o devedor tenha um único imóvel residencial próprio, não será protegido pelo benefício da impenhorabilidade do bem de família, previsto na lei 8.009/90.
É importante salientar os casos de penhorabilidade do bem de família estabelecida pelo Art. 3º aplica-se somente nas hipóteses que beneficiam exclusivamente os credores ou os créditos previstos nos incisos. Portanto, o bem de família continua impenhorável com relação a outros credores, excetuando-se o caso específico de aquisição de imóvel residencial como produto de crime, previsto no inciso VI do mesmo artigo, pois nesse caso o bem estará sempre sujeito a penhora, independente do tipo de crédito.
Uma observação importante a fazer é com relação a existência de remanescente, quando o valor adquirido na venda do bem de família for superior ao valor necessário para a satisfação do crédito. Nesse caso, o valor que sobrar deverá ser devolvido ao devedor, não podendo este ser atingido por outros crédito, para que se possível adquirir outro imóvel. A impenhorabilidade do valor remanescente se dá por subrogação.
2.1.1 Créditos de trabalhadores da residência e contribuições previdenciárias
O inciso I, do Art. 3º prevê a primeira exceção a impenhorabilidade do bem de família, que se dá nas execuções de créditos trabalhistas e contribuições previdenciárias.
A lei refere-se aos trabalhadores da própria residência, ou seja, os empregados domésticos e os trabalhadores que prestam serviços e estão intimamente vinculados a residência. Não serão beneficiados por esse dispositivo os trabalhadores que prestam serviços eventualmente na residência do devedor.
Nesse sentido, Rainer Czajkowski (1997, p. 100-101) entende que:
A lei ao referir-se a trabalhadores da própria residência pretendeu beneficiar aqueles empregados que passam a conviver intimamente com a família, participando do seu cotidiano, dos problemas, conflitos e comemorações, tendo, em geral, acesso a todas as dependências da moradia. Esta noção identifica-se profundamente com a expressão “trabalho doméstico” e é nesta acepção que deve ser aplicada. Empregados de condomínios residenciais não possuem tal vinculação. Porteiros, garagistas, zeladores, etc., mantêm-se via de regra afastados das contingências familiares de cada um dos moradores. Pouca diferença faria, a rigor, quanto as funções por eles exercidas, se o prédio fosse comercial ao invés de residencial.
Com relação às contribuições previdenciárias a lei refere-se apenas àquelas devidas a Previdência Social Pública, e não a Previdência Privada, derivada das relações trabalhistas previstas nesse art. e inciso.
2.1.2 Financiamento para construção ou aquisição de imóvel
O inciso II, do art. 3º, dispõe acerca da segunda exceção relacionada a impenhorabilidade do bem de família, consagrando a penhorabilidade na execução de “crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou a aquisição de imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”.
Esse inciso trata da hipótese de o titular de um bem contrair um empréstimo por meio de financiamento para construir ou adquirir um imóvel que será destinado a moradia familiar. O seu titular não poderá alegar que por se tratar de bem destinado ao uso da família deverá ser beneficiado pela impenhorabilidade legal, pois esse bem deverá ser penhorado no limite da dívida com os devidos acréscimos legais, caso contrário a lei estaria contribuindo para o enriquecimento sem causa do dono do imóvel.
Além do valor correspondente ao empréstimo, o dispositivo legal abrange também aos acréscimos decorrentes do financiamento, como é o caso dos juros, correção monetária e multas.
Enfatiza-se que a penhora estabelecida no caso em questão não poderá incidir sobre o imóvel residencial do fiador ou do avalista de tal empréstimo, pois o fiador não assumiu e nem foi beneficiado por esse financiamento. Sendo assim, o único imóvel estabelecido como bem de família do fiador não poderá ser penhorado.
2.1.3 Credores de pensão alimentícia
O inciso III, do art. 3º, estabelece a penhorabilidade do bem de família em caso de execução de pensão alimentícia.
O devedor de alimentos poderá ter seu bem de família penhorado, pois não está protegido pelo benefício de lei 8.009. Nas palavras de Álvaro Villaça de Azevedo (2002, p. 188):
O bem de família pode ser, também, executado pelo não pagamento de débito alimentar, porque, à guisa de defender-se a célula familiar, não pode ser negada a proteção existencial do próprio integrante dela. Primeiro, deve sobreviver o membro da família e, depois, esta, como fortalecimento da sociedade e do próprio Estado.
Criou-se uma enorme controvérsia a respeito da interpretação desse dispositivo, e consequentemente a que espécie de alimentos o legislador se refere.
A jurisprudência dominante enquadrou na exceção do Art. 3º, III, apenas os alimentos decorrentes do Direito de Família e não outras dívidas que resultem do ato ilícito.
Uma pequena parcela de julgados tem considerado que essa interpretação seja feita de forma ampliativa. Esse entendimento justifica-se até certo ponto, imaginemos um credor de pensão alimentícia decorrente de indenização imposta por morte e que depende da mesma para a sua subsistência, deverá valer-se dessa exceção para que o credor cumpra com sua obrigação, não podendo este alegar a impenhorabilidade do seu bem de família.
Rita de Cássia Corrêa de Vasconcelos (2002, p. 64) segue a seguinte corrente:
Como se vê, a obrigação alimentar decorrente de ato ilícito constitui, na verdade, indenização paga na forma de alimentos, sendo a menção a “alimentos” na hipótese de homicídio, simples referencial para a fixação do quantum devido. A dívida, então, tem conteúdo de responsabilidade civil e não de Direito de Família.
Por fim, é importante observar que quando o bem do devedor é destinado a moradia dos credores, ou seja, dos filhos, a penhora não pode recair sobre esse bem, pois trata-se de uma prestação alimentar indireta.
2.1.4 Impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel
O art. 3º, inciso IV, prevê que não é oponível a impenhorabilidade legal do bem de família em razão de débitos derivados de impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel. Assim o bem de família poderá ser objeto de penhora quando o seu titular for devedor dos tributos mencionados anteriormente.
O art. 70 do Código Civil de 1916 já previa essa exceção, pois ressalvava da impenhorabilidade “as dívidas que provieram de impostos relativos ao mesmo prédio”.
O Código Civil atual em seu art. 1715 recepcionou a norma do Código Civil anterior e acrescentou as despesas de condomínio, esse art. dispõe que: “O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio”.
É certo que, seria inviável a moradia em condomínio de edificações se o condômino inadimplente pudesse valer-se da impenhorabilidade do imóvel residencial destinado a moradia da família para se eximir do pagamento das despesas de conservação e manutenção da casa comum.
Álvaro Villaça Azevedo (2002, p. 189) cita Alexandre Mars Carneiro que diz:
Que essas obrigações, sendo de natureza propter rem, impedem o absurdo de os condôminos adimplentes verem-se obrigados a suportar essa desigualdade de conduta, pagando débitos de condôminos relapsos. Haveria nesse caso, um enriquecimento sem justa causa e em prejuízo dos demais condôminos.
Nesse sentido é o entendimento da 2ª Câmara do 1º Tribunal de Alçada Cível do Estado de São Paulo, onde foi relator o Juiz Nelson Ferreira, “que admitiu a natureza da obrigação propter rem das despesas condominiais e taxas, possibilitando a penhora do bem de família para a sua cobrança”.
Ademais, na hipótese de inadimplência das taxas condominiais por parte do locatário do bem, o responsável pela dívida será o locador, pois este é o titular da unidade, e por esse motivo deverá pagar as despesas. Restando apenas para o locador o direito de recorrer à ação regressiva em face do locatário inadimplente. A esse locatário cabe ainda argüir a impenhorabilidade do bem de família e aí o credor irá cobrar do fiador, tema que iremos tratar mais adiante.
2.1.5 Hipoteca do imóvel residencial
O inciso V do Art. 3º, prevê a impossibilidade de argüir a impenhorabilidade do bem de família “na execução de hipoteca sobre o imóvel residencial oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar”.
Sendo indispensável para a validade do ato que a garantia hipotecária seja devidamente inscrita no Registro Imobiliário competente.
Observa-se que quando o dispositivo legal fala em hipoteca oferecida pelo casal ou entidade familiar, ele quis estabelecer a obrigatoriedade da autorização do outro cônjuge, prevista no Art. 1647, I do Código Civil 2002.
2.1.6 Residência adquirida com produto de crime e execução de sentença penal condenatória
O art. 3º, inciso VI, prevê duas situações distintas em que não poderá argüir a impenhorabilidade do bem de família.
A primeira ocorre quando o bem imóvel é adquirido com produto de crime, nesse caso a lei não leva em conta a qualidade do crédito e sim a origem do bem.
Nessa hipótese, a norma não refere-se apenas aos crimes de vantagem econômica imediata a exemplo do estelionato o extorsão. Os crimes que trazem vantagem econômica não imediata a exemplo de furto para posterior revenda também estão abrangidos pelo dispositivo excluindo desse rol apenas os crimes que não assumem nenhuma conotação econômica, a exemplo dos crimes contra a honra.
Um fator importante que deve ser ressaltado é a necessidade da condenação transitada em julgado imputando o crime a determinado devedor, pois o Art. 5º, LXII estabelece que: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
O inciso em questão refere-se apenas a crime, mas deve aplicar-se por analogia quando o bem é adquirido através de atividade contravencional.
A segunda hipótese inclui a impenhorabilidade do bem de família no caso de execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
Nesse caso, não é necessário que os crimes tenham resultados econômicos, pois a indenização pode ser proveniente tanto de um dano moral quanto patrimonial, a exemplo dos crimes contra a honra.
3- PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR
3.1 Origem da Fiança
A fiança teve sua origem no Direito Romano, nessa época a fiança era conhecida na forma de stipulatio, que era dividido em 3 tipos: a fidepromissio, a fideiussio e a sponsio. A principal diferença entre esses tipos de fiança é que a fiança decorrente do sponsor e do fidepromissor extinguia-se com a morte do co-obrigado, não atingindo assim os seus herdeiros. E a fiança decorrente da fideiussio poderia passar para os herdeiros caso o titular da obrigação não cumprisse com a mesma.
Com o surgimento da fiança, surgiu também o entendimento que o credor primeiramente deve acionar o devedor principal e posteriormente caso o devedor não pague a sua divida é que deverá acionar o fiador.
Concluindo, portanto, que desde o surgimento da fiança entende-se que a mesma deverá ser executada subsidiariamente.
3.2 Conceito e Natureza Jurídica da Fiança
O ilustre doutrinador Silvio Rodrigues (2004, p. 357) refere-se ao conceito dado a fiança por Clóvis Beviláqua:
A fiança, como ensina Beviláqua, é uma espécie do gênero garantia. A garantia pode ser real, e ela o é quando o devedor fornece um bem móvel ou imóvel para responder, preferencialmente, pelo resgate da dívida, como na hipótese do penhor ou da hipoteca, ou pode ser pessoal, como quando terceira pessoa se propõe a pagar a divida do devedor, se este não fizer.
Como dito pelo autor no parágrafo anterior a fiança é uma garantia pessoal, fidejussória, decorrente da confiança depositada no fiador, que irá garantir o cumprimento da obrigação caso o devedor não tenha meios para cumpri-la. Aumentando assim, as possibilidades de adimplemento da dívida.
Importante ressaltar que a responsabilidade do fiador é subsidiária a do devedor, devendo primeiramente ser atingido o patrimônio do devedor e apenas no caso de insuficiência deste é que a cobrança passará para o fiador.
O Código Civil, no art. 818 define o contrato de fiança, “Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra”.
Quanto à natureza jurídica, a fiança é um contrato acessório, unilateral, formal e em regra gratuito.
É considerado contato acessório porque a sua existência depende da existência do contrato principal, pois a fiança é garantidora de tal obrigação.
É contrato unilateral, pelo fato de gerar obrigações apenas para o fiador. Alguns doutrinadores o consideram como bilateral imperfeito, mas é uma corrente minoritária.
É contrato solene, ou seja, formal, porque é obrigatória a forma escrita, não permite que a fiança seja fixada verbalmente. O art. 819 do Código Civil prevê que a fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva.
A fiança em regra é contrato gratuito, pois o fiador a presta pela confiança que deposita no devedor de forma desinteressada, não devendo receber nada em troca. Entretanto existe casos de fiança remunerada, a exemplo da fiança bancária e da fiança mercantil.
3.3 Requisitos da Fiança
Com relação a capacidade para prestar fiança aplica-se a regra geral de capacidade para os atos da vida civil. Não poderão prestá-la os menores de 18 anos, os absolutamente incapazes e os pródigos sem assistência do curador.
Uma questão de grande relevância é o fato de um cônjuge só poder prestar a fiança com a concordância do outro, os doutrinadores chamam esse requisito de outorga uxória.
De acordo com o Código Civil de 1916 o fiador necessitava do consentimento do cônjuge, independente do regime de bens. O Código Civil de 2002 recepcionou essa norma, excetuando apenas quando o regime de bens for o da separação absoluta. Essa lei objetiva prevenir que um dos cônjuges dilapide o patrimônio do casal.
Portanto, caso o fiador garanta uma obrigação sem a outorga uxória do cônjuge essa será anulável. O Código Civil a esse respeito dispõe no art. 1649 que, “a falta de autorização não suprida pelo juiz, quando necessária, tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal”.
3.4 Espécies de Fiança
A fiança pode ser:
Convencional: é aquela decorrente da vontade das partes, estabelecida por contrato escrito.
Legal: é a fiança imposta pela lei para realização de alguns atos.
Judicial: é a fiança determinada pelo juiz.
3.5 Extensão e Efeitos da Fiança
Para que um fiador estabeleça um contrato de fiança é necessário apenas que ele tenha capacidade para a realização de tal ato, e sendo ele casado faz-se necessário também à anuência do cônjuge. Não é imprescindível para a realização desse contrato o consentimento do devedor, visto que esse pode ser firmado mesmo contra a sua vontade.
O art.820 do Código Civil atual dispõe que: “Pode-se estipular a fiança, ainda sem consentimento do devedor ou contra a sua vontade”.
Outra questão importante está relacionada ao limite da fiança, como a fiança é um contrato acessório do contrato principal, esta limita-se a obrigação principal. Seu limite pode ser inferior à obrigação principal se assim for convencionado, mais nunca poderá ser superior à obrigação. O art.823 do Código Civil diz que se a fiança for mais onerosa que a obrigação principal valerá até o limite desta.
No que diz respeito aos efeitos da fiança iremos analisar primeiramente o benefício de ordem e em seguida a solidariedade dos co-fiadores.
O beneficio de ordem consiste em um direito do fiador de exigir que a execução recaia de início no patrimônio do devedor principal, e apenas quando este for insuficiente para o cumprimento da obrigação é que o fiador deverá ser acionado. Pois como já foi mencionado anteriormente a obrigação do fiador é subsidiária.
Ressalta-se que essa exceção deve ser apresentada até a contestação da demanda.
Quando o fiador alegar esse benefício ele deverá informar que o devedor possui bens e nomeá-los, sendo necessário que determinados bens estejam situados no mesmo município e deveram estar livres e desembaraçados.
A solidariedade dos co-fiadores existe quando a obrigação for garantida por mais de um fiador e não ficar estabelecido a obrigação de cada um, assim a lei determina que todos os fiadores serão responsáveis solidariamente.
3.6 Extinção da Fiança
A extinção da fiança se dá normalmente com extinção do contrato principal, pelo fato de ser uma obrigação acessória.
O art. 838 do Código Civil prevê as hipóteses de exoneração da obrigação do fiador:
O fiador, ainda que solidário, ficara desobrigado:
I – se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor.
II – se, por fato do credor, foi possível a sub-rogação nos seus direitos e preferências.
III – se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha perdê-lo por evicção.
Importante observar que no caso de evicção do objeto a obrigação anterior voltará a existir, mas a fiança não.
3.7 A Fiança nos Contratos de Locação e o Art. 3º, Inciso VII da Lei 8.009/90.
O art. 3º, inciso VII da lei 8.009/90 prevê a última exceção ao benefício da impenhorabilidade do bem de família. Esse dispositivo foi acrescentado pela lei 8.245 de 18 de outubro de 1991, conhecida como Lei do Inquilinato que em seu art.82 dispôs que:
Art.82. O art.3º da Lei n.º 8.009, de 29 de março de 1990, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso VII:
Art.3º - a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Existe muitas controvérsias acerca desse dispositivo, por esse motivo ele está sendo analisado em capítulo específico e não juntamente com as outras exceções do art. 3º.
De acordo com a redação desse inciso, o fiador que garantir o cumprimento de contrato de locação de imóveis não poderá se valer da impenhorabilidade do bem de família. Caso o locatário não cumpra com suas obrigações o fiador será demandado e poderá ter seu único imóvel residencial penhorado.
Segundo Álvaro Villaça (2002, p. 198): “Assistimos, nesse caso, a execução do patrimônio do fiador, sem possibilidade de exercer o benefício de ordem; a execução do acessório sem a possibilidade de executar-se o principal”
Severas críticas são atribuídas com relação ao direito de regresso que o fiador tem para reaver a quantia paga, nessa hipótese o devedor (locatário) poderá argüir a impenhorabilidade do seu bem de família, mesmo que o fiador tenha perdido seu único imóvel destinado à moradia de sua família. Esse posicionamento é considerado injusto e discriminatório para a maioria dos doutrinadores.
Nesse passo, é importante salientar que o caso previsto nesse dispositivo legal refere-se estritamente a fiança concedida em contrato de locação. Não admitindo a extensão a outras hipóteses de contrato.
O ilustre doutrinador Rainer Czajkowski (1997, p. 122) defende que para o fiador proteger o imóvel que reside com sua família ele deverá utilizar-se da instituição voluntária do bem de família, desde que essa instituição seja feita antes da inadimplência do locatário.
3.7.1 Visão constitucionalista da penhorabilidade do bem de família do fiador
Atualmente a constitucionalidade do art. 3º, VII da lei 8.009/90 é entendimento majoritário na jurisprudência, ou seja, a penhora do bem de família do fiador decorrente de contrato de locação é plenamente legal.
O Supremo Tribunal Federal em 08 de fevereiro de 2006 julgou o Recurso Extraordinário n.º 407.688, decidindo por maioria dos votos, em que foi relator o Ministro Cezar Peluso, a possibilidade de penhora do bem de família do fiador.
O ministro Cezar Peluso (Revista consultor jurídico, 8-02-2006), tecendo comentários a sua decisão justifica que: “Castar essa técnica legislativa, que não pré-exclui ações estatais concorrentes doutra ordem, romperia o equilíbrio do mercado, despertando exigência sistemática de garantias mais custosas para as locações residências”.
Alguns juristas alegam que essa lei fere o Princípio da Isonomia, mas a parte da doutrina que defende a constitucionalidade entende que o fiador e locatário possuem natureza jurídica diversa e por isso não há que se falar em igualdade.
A professora Maria Helena Diniz (2003, p. 339) posicionou-se pela constitucionalidade do dispositivo, e defendeu o seguinte argumento:
Assim sendo, perante esta disposição normativa, o fiador de contrato de locação não poderá opor a impenhorabilidade do imóvel que lhe serve de moradia, no processo de execução contra ele movido, em razão fiança prestada (AASP, 1.810:6, 1.733:3). Se o inquilino não cumprir seus deveres locativos, abrir-se-á execução contra o seu fiador, e seu imóvel onde este reside não estará coberto pela garantia de insuscetibilidade de penhora.
3.7.2 Visão inconstitucionalista da penhorabilidade do bem de família do fiador
A jurisprudência minoritária defende a inconstitucionalidade do art. 3°, inciso VII da lei 8.009/90, pois entende que esse dispositivo viola o Princípio da Isonomia previsto no art. 5°, caput, da Constituição Federal de 1988, e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
O Ministro Carlos Velloso defendeu intensamente esse posicionamento, em decisão monocrática de recurso extraordinário no Supremo Tribunal Federal. Para melhor entendimento faz-se necessário a transcrição de um trecho da brilhante decisão do Ministro:
Em trabalho doutrinário que escrevi 'Dos Direitos Sociais na Constituição do Brasil', texto básico de palestra que proferi na Universidade de Carlos III, em Madri, Espanha, no Congresso Internacional de Direito do Trabalho, sob o patrocínio da Universidade Carlos III e da ANAMATRA, em 10.3.2003, registrei que o direito à moradia, estabelecido no artigo 6º, C.F., é um direito fundamental de 2ª geração — direito social que veio a ser reconhecido pela EC 26, de 2000.
O bem de família — a moradia do homem e sua família — justifica a existência de sua impenhorabilidade: Lei 8.009/90, artigo 1º. Essa impenhorabilidade decorre de constituir a moradia um direito fundamental.
Posto isso, veja-se a contradição: a Lei 8.245, de 1991, excepcionando o bem de família do fiador, sujeitou o seu imóvel residencial, imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, à penhora. Não há dúvida que ressalva trazida pela Lei 8.245, de 1991, inciso VII do artigo 3º feriu de morte o princípio isonômico, tratando desigualmente situações iguais, esquecendo-se do velho brocardo latino: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, ou em vernáculo: onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de Direito. Isto quer dizer que, tendo em vista o princípio isonômico, o citado dispositivo inciso VII do artigo 3º, acrescentado pela Lei 8.245/91, não foi recebido pela EC 26, de 2000 (STF, Recurso Extraordinário, RECORRENTES: ERNESTO GRADELLA NETO E OUTRA. RECORRIDA :TERESA CANDIDA DOS SANTOS SILVA. EMENTA: CONSTITUCIONAL. CIVIL. FIADOR: BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL RESIDENCIAL DO CASAL OU DE ENTIDADE FAMILIAR. IMPENHORABILIDADE).
Com relação ao Princípio da Isonomia, citado na decisão transcrita acima, alega-se que a lei trata de forma desigual o fiador e o locatário, permitindo a penhora do único imóvel residencial do fiador para cumprir uma obrigação adquirida pelo locatário.
A Emenda Constitucional n° 26 de 2000, inclui a moradia no rol dos direitos sociais ao alterar o art. 6° da Constituição Federal. Portanto, conclui-se que o art. 6° da Constituição Federal não recepcionou o art. 3°, inciso VII, da lei 8.009/90, por entender que a moradia está incluída no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
4- CONCLUSÃO
O presente artigo teve a finalidade de analisar a respeito dos bens de família excluídos da impenhorabilidade atribuída a este instituto, previsto na lei 8.009/90. Sabemos que ao elaborar essa lei, o legislador teve a intenção de solucionar um grave problema social, ocorre que a mesma não teve a amplitude desejada.
Foi feito uma análise a respeito da problemática causada pela lei n° 8.245 de 1991, que acrescentou o inciso VII, no artigo 3° da lei 8.009/90. De acordo com essa lei o benefício da impenhorabilidade do bem de família não poderá ser utilizado pelo fiador de contrato de locação. Caso o devedor não cumpra com a sua obrigação a mesma atingirá o patrimônio do fiador, e se ele não tiver bens que possa garantir o débito o mesmo recairá sobre o bem de família do fiador. O acréscimo de tal proposição normativa revela-se injusto para com o fiador, pois este é tratado com inferioridade com relação ao locatário.
Diante do exposto no presente trabalho, conclui-se que com a alteração sofrida pela lei 8.009/90 é expressamente incompatível com os direito fundamentais estabelecido pela Constituição Federal de 1988.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MACHADO, Fernanda Tenório Ribeiro. Bens de família excluídos da impenhorabilidade e penhorabilidade do bem de família do fiador Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 nov 2010, 06:08. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/22094/bens-de-familia-excluidos-da-impenhorabilidade-e-penhorabilidade-do-bem-de-familia-do-fiador. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
Por: Jaqueline Lopes Ribeiro
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