Orientadora: Tatiana Stroppa: Mestre em Direito Constitucional, Docente de Direito Constitucional e Advogada.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO;2 DIREITOS FUNDAMENTAIS; 3 DIREITO À VIDA; 4 DIREITO Á SAÚDE; 4.1 Prestação Farmacêutica como concretização do direito à saúde ( lei 8080/60); 5 QUESTÕES RELEVANTES APONTADAS PELA DOUTRINA E PELA JURISPRUDÊCIA; 5.1 Críticas à Judicialização Excessiva; 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS.
Resumo: O presente estudo abordará como o judiciário tem efetivado a norma constitucional a respeito dos medicamentos essenciais a saúde e que medidas devem ser tomadas para garantir políticas sociais e econômicas que visem atender a racionalização e a universalização do atendimento da população, bem como a efetividade desse mecanismo, à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
PALAVRAS CHAVE: Direito à saúde. Direito à vida. Fornecimento de medicamentos.
1. Introdução
O presente estudo abordará como o judiciário tem efetivado a norma constitucional a respeito dos medicamentos essenciais a saúde e que medidas devem ser tomadas para garantir políticas sociais e econômicas que visem atender a racionalização e a universalização do atendimento da população, bem como a efetividade desse mecanismo, à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
2. Direitos Fundamentais
Os direitos fundamentais que conhecemos hoje não surgiram de elucubrações dos legisladores, mas por estes são reconhecidos e constitucionalizados.
Para entendermos melhor, será necessário revermos o contexto histórico[1].
Pautado por uma evolução do ordenamento jurídico, que, anteponde-se a agressões variadas à dignidade do ser humano (escravidão, tortura, imposições religiosas, miséria, etc), foi respondendo com a criação de novas instâncias de alforria do cidadão, com novos círculos de proteção, que a toda evidência, em relação de interação e de tensão dialética, vieram a ressignificar o próprio quadro das relações econômicas e sociais.
Em outras palavras, esses níveis de proteção do indivíduo constituem produto de conquistas humanitárias que, passo a passo, foram sendo reconhecidas pelo ordenamento jurídicos dos diversos países.
A Constituição Federal 1988, conhecida como a constituição cidadã, consagrou-se como direito de todos e dever do Estado, Esta declaração de acesso universal e igualitário foi uma grande conquista, que teve influência direta de um movimento da década de 1970 conhecido como Reforma Sanitária[2].Formado por lideranças populares, sindicais, médicos e sanitaristas, discutia os caminhos da saúde no País e brigava pelo atendimento integral e igualitário, além da descentralização do sistema. O constituinte foi sensível a estes pleitos e, além de estender a proteção a todos, indistintamente, estabeleceu no artigo 198, que “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único.”
Longe da hegemonia de um soberano, cuja vontade era a lei, concebeu-se um Estado em que às funções do poder fossem atribuídas a órgãos distintos, impedindo a concentração de poderes e o arbítrio de uma ou de um grupo de pessoas.
Com a idéia de Estado de Direito surgiram esses direito fundamentais.
Os direitos de primeira geração[3], também denominados direitos civis, ou individuais, e políticos. São os direitos de defesa do indivíduo perante o Estado. Sua preocupação é a de definir uma área de domínio do Poder Público, simultaneamente a outra de domínio individual, na qual estaria forjado um território absolutamente inóspito a qualquer inserção estatal. Em regras, são integrados pelos direitos civis e políticos, dos quais são exemplo o direito à vida, à intimidade, à inviolabilidade de domicílio etc. Trata-se de diretos que representam uma ideologia de afastamento do Estado das relações individuais e sociais. O Estado deveria ser apenas o guardião das liberdades, permanecendo longe de qualquer interferência no relacionamento social. São as chamadas “liberdades públicas negativas” ou “direitos negativos”, pois exigem do Estado um comportamento de abstenção. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, apresenta, por exemplo, o direito de propriedade, sem qualquer limitação (ainda não havia a concepção do cumprimento da função social da propriedade).
Esses direitos traduzem uma etapa de evolução na proteção da dignidade humana. Sua essência é a preocupação com as necessidades do ser humano. Se os direitos fundamentais de primeira geração tinham como preocupação limitar o arbítrio do poder estatal, os de segunda geração partem de um : o homem, liberto do jugo do Poder Público, reclama agora uma nova forma de proteção da sua dignidade, como seja, a satisfação das necessidades mínimas para que se tenha dignidade e sentido na vida humana. A posição inicial (Estado apenas como policial das liberdades negativas) recebe novo enfoque. Essa nova forma de alforria coloca o Estado em uma posição diametralmente oposta àquela que foi posicionada em relação aos direitos fundamentais de primeira geração. Se o objetivo dos direitos aqui estudados é o de dotar o ser humano das condições materiais minimamente necessárias ao exercício de uma vida digna, o Estado, em vez de se abster, deve fazer-se presente, mediante prestações que venham a garantir a satisfação das necessidades mínimas que refletem a dignidade de sua vida.
Por isso, os direitos fundamentais de segunda geração[4] são aqueles que exigem uma atividade prestacional do Estado, no sentido de buscar a superação das carências individuais e sociais. Então, em contraposição aos direitos fundamentais de primeira geração – chamados de direitos negativos - , os direitos fundamentais de segunda geração costumam ser denominados direitos positivos, pois, como se disse, reclamam não a abstenção, mas a presença do Estado em ação voltadas à minoração dos problemas sociais. Constituem os direitos fundamentais de segunda geração os direitos sociais, os econômicos e os culturais, quer em sua perspectiva individual, quer em sua perspectiva coletiva.
Referindo-se aos hoje chamamos Direitos fundamentais de segunda geração, que são os direitos sociais, econômicos e culturais, Themistocles Brandão Cavalcanti[5] manifestou da seguinte forma:
“o começo do nosso século viu a inclusão de uma nova categoria de direitos as declarações e, ainda mais recentemente, nos princípios garantidores da liberdade das nações e das normas da convivência internacional. Entre os direitos chamados sociais, incluem-se aqueles relacionados com o trabalho, o seguro social, a subsistência,o amparo à doença, à velhice, etc”
Como conclui Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “a primeira geração seria dos direitos de liberdade, a segunda, dos direitos de igualdade, a terceira, assim, complementaria o lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade”. (Direitos humanos fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1995. p.57)
A tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste, pois em “superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social” (Silva ,1995, p.123).
Ao analisarmos o contexto histórico do Brasil, o quanto progride no sentido que existiram mudanças significativas. No nosso Estado de Direito. Tanto que temos através da magna carta um Estado-garantidor.
3.Direito à Vida
Por que foi importante para nós a manifestação de nossa carta magna mencionar o direito a vida? Mais, do que uma lei, nossa carta magna nos trouxe uma expectativa de um Estado Democrático de Direito e preocupado com o social e fica para trás a visão que tínhamos de um Estado inerte sem regulamentações nem normas .
A Constituição Federal garante no “caput” do artigo 5º que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo–se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. O direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré–requisito à existência e exercício de todos os demais direitos.
A Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência.
Anote-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), em que seu art.7º afirma que “a criança e o adolescente têm a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”, E o art. 8º complementa esta garantia, afirmando que “incumbe ao Poder Público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem”.
O início de mais preciosa garantia individual deverá ser dado pelo biólogo, cabendo ao jurista, tão –somente, dar-lhe o enquadramento legal, pois do ponto de vista biológico a vida se inicia com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, resultando um ovo ou zigoto. Assim a vida viável, portanto, começa com a nidação, quando se inicia a gravidez. Conforme adverte o biólogo Botella Lluzirá, o embrião ou feto representa um ser individualizado, com uma carga genética própria, que não se confunde nem com a do pai, nem com a da mãe, sendo inexato afirmar que a vida do embrião ou do feto está englobada pela vida da mãe. A Constituição é importante ressaltar, protege a vida de forma geral, inclusive uterina.
4.Direito à saúde.
A República Federativa do Brasil consagrou o direito à saúde como um direito de todos e dever do Estado (Art. 196), precisando este, então, desenvolver atividades que possam realmente assegurar aos indivíduos o completo desenvolvimento físico, mental e social, conforme conceito adotado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Neste contexto, o fornecimento de medicamentos passa a ser uma política essencial para dar efetividade ao direito à saúde.
Assim, o presente trabalho analisa o direito à saúde a partir da proteção dada pela Constituição Federal de 1.988 e, após, enfoca a Lei 8.080/90 como o intuito de ressaltar que não basta somente a garantia mas que são necessárias ações governamentais e o engajamento social para que tal direito seja concretizado.
Finalmente, surgi o direito a saúde, o que trouxe um rouxinol de oportunidades a pessoas e a uma sociedade, que precisa não somente da vida, mas da manutenção dessa vida.
O que adiantava viver? Se não tínhamos bem definido que caso ficasse doente, o Estado esquecia do cidadão. E só lembrava dele, no ano de eleição. Será que só o que devemos esperar das pessoas?
O direito à saúde é um desdobramento do direito à vida. Sem este direito elementar os demais não podem aflorar e se efetivar no plano da realidade. A saúde é o estado de completo bem-estar social físico, mental e espiritual do homem, e não apenas, a ausência de infecções e doenças, conforme definiu a Organização Mundial de Saúde. A Constituição Federal de 1988 reconhece o direito à saúde como sendo fundamental. Isso revela a preocupação do Constituinte com a vida humana, que é o bem supremo e que merece amparo na Lei Maior. O intuito do texto constitucional é formidável. Todavia não se realiza na prática, pois a integral saúde física e mental do homem é algo, até o momento, inalcançável. O exemplo brasileiro é esclarecedor nesse sentido, porque a incolumidade do indivíduo, nos casos de doença ou mal –estar, não tem sido, do ponto de vista da efetividade, direito de todos, muito embora seja dever do Estado.
Infelizmente quando se fala em Estado, muitas vezes, nos decepcionamos por falta de atitudes de líderes federais, estaduais e municipais, que parecem esquecer a realidade social e a determinação constitucional de proteção à saúde e à vida.
Será que a saúde pode ser incluída como direito fundamental? O que a Constituição aborda sobre o assunto? O que é o conceito de direito a saúde? Quais medidas podem ser esperadas num Estado de Direito, em relação à saúde? O que tem previsto a lei 8080/90, sobre medicamentos? Além dessas, outras questões intrigantes será abordado no decorrer do presente trabalho.
Quando se fala em saúde ou mesmo em políticas relativas à saúde, torna-se necessário compreender o que é saúde, para isso traremos as definições de vários doutrinadores.
Para Celso Ribeiro Bastos[6],
A Saúde é um direito de todos e um dever do estado (Art 196) na sua prestação desempenha papel importantíssimo. O sistema único o que se refere o Art 198. Ele consiste numa integração das ações e serviços públicos de saúde, tendo por diretrizes o princípio da descentralização, no nível de cada esfera de governo, o atendimento integral e a participação da comunidade.
Existe também a participação da iniciativa privada. À iniciativa privada é dada complementar a situação do Sistema Único, sendo certo, no entendo, que preferência deve ser dada a entidades filantrópicas é as sem fins lucrativos. Na mesma linha de idéia proíbe-se destinação de fundos públicos para auxilio ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. Da mesma sorte veda-se a participação do capital estrangeiro na assistência à saúde no País.
Quanto ao Serviço de Saúde, goza ele de inúmeras competências elencadas no Art 200, que vão desde o controle e a fiscalização até a colaboração na proteção do meio ambiente – As Leis nº 8,080, de 19/09/1990 e 8.142, de 28/12/1990 desempenham a matéria.
Neste mesmo diapasão, Alexandre de Moraes[7] entende que
A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário a ações e serviços para a sua promoção proteção e recuperação (CF, art. 196.) sendo de relevância pública as ações e serviços de saúde cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei,sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou por meio de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.( CF, art.197).
Importante, também, trazer definição de Manoel Gonçalves Ferreira Filho[8].”
Esta é afirmada com direito de todos e dever do Estado. As ações serviços de saúde são consideradas de relevância pública, devendo essas ações e serviços públicos de saúde ser integrados numa rede regionalizada e hierarquizada, constituindo um sistema único. Entretanto, a assistência à saúde é livre de iniciativa privada.
André Ramos Tavares[9] diz que
O direito à saúde é um direito de todos, constituindo um dever do Estado sua efetivação. (art.196 da CF/88). Consvante Marcus Orcone Correia e Érica
Paula Correia, a compreensão do que seja saúde:” implica sua conceituação a partir da ótica de uma política destinada à prevenção e do tratamento dos males que afligem o corpo e a mente humana, com a criação inclusive de um sistema organizado que atenda aos doentes.”.
Com muita pertinência observa Julio César de Sá Rocha
A conceituação da saúde deve ser entendida como algo presente: a concretização da sadia qualidade de vida.Uma vida com dignidade. Algo a ser continuamente afirmado diante da profunda miséria por que atravessa a maioria da nossa população. Conseqüentemente a discussão e a compreensão da saúde passa pela afirmação da cidadania plena e pela aplicabilidade dos dispositivos garantidores do direito sociais da Constituição Federal.
Por fim, importante colacionar as palavras de Luiz Alberto David Araújo[10]
O art. 6º da Constituição Federal indicou a saúde como um direito social, incluindo –o, portanto, no rol dos chamados Direitos Fundamentais. Na verdade, o direito à saúde constitui um desdobramento do próprio direito à vida. Logo, por evidente, não poderia deixar de ser considerado como um direito fundamental do indivíduo. Nesse sentido, o art. 196 prescreve que à saúde é um direito de todos e um dever do Estado, criando, por assim dizer, um direito subjetivo público de atenção à saúde, cuja tutela tanto pode dar-se pela via coletiva como pela universal.
Realmente, o Estado deve promover políticas sociais e econômicas destinadas a possibilitar o acesso universal igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde. Ademais, deve preocupar-se igualmente com a prevenção de doenças e outros agravos, mediante a redução dos riscos (arts.166 e 198, II). Por fim, o tema relaciona-se diretamente com a dignidade da pessoa humana e o direito à igualdade, que pressupõem o Estado–garantidor, cujo dever é assegurar o mínimo de condições básicas para o indivíduo viver e desenvolver-se.
Diante da conceituação da saúde, fica claro que num Estado de Direito Democrático, o direito à saúde deve ser acompanhando por um Estado, que manifeste e preocupa-se com seu povo. Tal desiderato deve ser aplicado no plano concreto, com efetividade não podendo permanecer no plano abstrato.
Sobre esse tema, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:
“O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica da República (art.196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular -e implementar –políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência médico-hospitalar. O caráter programático da regra inscrita no art.196 da Carta Política –que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado Brasileiro – não pode converter-se e promessa institucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever por um gesto de infidelidade governamental ao que determina a própria determina a própria Lei fundamental do Estado” (RE 267.612 –RS , DJU 23/08/2000, Rel. min. Celso de Mello).
Interessante é ainda trazer à colocação o constante no V. Acórdão, oriundo do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos territórios (Relator Waldir Leôncio Júnior), citando a r. sentença analisada e o mestre José Afonso da Silva:
“A saúde é um direito social conforme entende o art. 6º da Constituição e como direito fundamental do cidadão não é norma programática, não encerra somente uma promessa de atuação do Estado, mas tem aplicação imediata. Na lição do insigne constitucionalista José Afonso da Silva ‘os direitos sociais, como dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas estatais, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se conexionam com o direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propicias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade’ Não é despiciendo registrar ainda que se insere entre os objetivos fundamentais da República Brasileira ‘estabelecer uma”. sociedade livre,justa e solidária’, tendo-se em vista a realização da justiça social, ou seja, busca a nação a promoção do ‘bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.””.
A Constituição protege, portanto, a cura e a prevenção de doenças através de medidas que asseguram a integridade física e psíquica do ser humano como conseqüência direta do fundamento da dignidade da pessoa humana.
José Cretella Júnior, na obra “Comentários à Constituição de 1988”, vol. III,pág.4331, citando Zanobini asseverou que:
“nenhum bem da vida apresenta tão claramente unidos o interesse individual e o interesse social, como o da saúde, ou seja, do bem - estar físico que provém da perfeita harmonia de todos os elementos que constituem o seu organismo e de seu perfeito funcionamento. Para o indivíduo saúde é pressuposto e condição indispensável de toda atividade econômica e especulativa, de todo prazer material ou intelectual. O estado de doença não só constitui a negação de todos estes bens, como também representa perigo, mais ou menos próximo, para a própria existência d indivíduo e, nos casos mais graves, a causa determinante da morte. Para a corpo social a saúde de seus componentes é condição indispensável de sua conservação, da defesa interna e externa, do bem-estar geral, de todo progresso material, moral e político.”
Destaca-se aqui a fundamentalidade do direito à saúde, o qual será especificamente analisado em tópico posterior.
O direito à saúde é um direito fundamental do homem (Silva,1995), forte na Declaração Universal dos Direitos do Homem e com base na sistemática adotada pela Constituição Brasileira e em constitucionalismo “comunitário” brasileiro (Cittadino,1999), em que, utilizando –se de uma validade derivada de todos os atores que influem no processo de concretização de uma constituição –quaisquer que sejam eles (comunidade, política, direito,...) – e tendo como norte a idéia de uma constituição aberta, os direitos fundamentais positivados são legitimados justamente por esse grupo de intérpretes, visto que tais direitos “ fazem parte da consciência ética-jurídica de uma determinada comunidade histórica” (Cittadino,1999.p.18)
Para Sueli Dallari(1988 (a)), o fato de a saúde ser direito fundamental do homem é indiscutível, pois:
“ninguém tem dúvidas de que o artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, da Organização das Nações Unidas, assinada pelo Brasil, quando enumera a saúde como uma das condições necessárias à vida digna, está reconhecendo o direito humano fundamental à saúde”. (p.57)
Por ser o direito fundamental do homem à saúde um direito auto-aplicável (vide art.5º, §1º,CF/88), essa compreensão passa a ser um dos pilares da efetivação de tal direito, como se demonstrará, destacando, assim, ao Poder Judiciário um papel decisivo nesse sentido.
4.1-Prestação Farmacêutica como concretização à saúde (Lei 8080/90)
Oportunamente ocorrem algumas mudanças significativas, em nosso Estado de direito com as leis infraconstitucionais, abordando o que a magna carta já havia permitido que mais do que um direito a vida, a preservação dessa vida, deveria ser supervisionada pelo Estado.
Nossa Constituição Federal incumbiu ao Estado, através do Sistema Único de Saúde, o fornecimento de medicamento ao cidadão, no caso o requerente. Assim aduz o seu artigo 6º:
“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”(grifo nosso).
A Lei Maior, como já dito, garante o direito social à saúde como um direito fundamental (além da inviolabilidade do direito à vida e da dignidade da pessoa humana). Ora, se o Estado não fornece medicamentos ao cidadão e essa falta de medicamento compromete a saúde dele de maneira direta, está desrespeitando os preceitos fundamentais da inviolabilidade do direito à vida e à dignidade da pessoa humana.
Mister fazermos menção ao doutrinador Alexandre de Morais, que afirma: “Direitos Sociais são fundamentais ao homem caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória do Estado Social de Direito”.(in Direito Constitucional, 6º Ed.Saraiva-São Paulo,1999, p.186-grifo nosso).
Nessa mesma linha, vale ressaltar o artigo 196 de nossa Constituição:
“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.” (grifo nosso).
Nossa legislação infraconstitucional também coloca a saúde como uma das condições essenciais à dignidade humana, assegurando o direito à saúde como um direito público subjetivo. É o que faz a lei Complementar nº 791, de 09/03/1995, em artigo 2º, parágrafos 1º e 2º, no qual há imposição legal ao Poder Público para prover condições e garantias para o exercício do direito individual à saúde.
Não há como olvidar que a Lei 8080/90, regulamentadora do S.U.S, prevê expressamente como uma de suas obrigações o fornecimento de medicamentos:
“Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):
d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica:” grifo nosso.
Indubitável, portanto, que é obrigação do Poder Público garantir o direito à saúde a todo indivíduo. Esse direito é regido pelos princípios da universalidade e da igualdade de acesso ás ações e serviços que promovam, protejam e recuperem a saúde.
É de bom alvitre, a titulo ilustrativo, trazer a decisão do Min. Celso de Mello, proferida no RE 393.175, de 1/02/06 (transcrita no Informativo 414, do STF), que vem ao encontro de nossos dizeres, além de demonstrar como nossa mais alta corte vem reconhecendo o direito à saúde.
5. Questões relevantes apontadas pela Doutrina e pela Jurisprudência
A saúde foi tratada com um direito social fundamental de todo e qualquer ser humano. Mas, como ensina Noberto Bobbio em sua obra “A Era dos Direitos”, o momento histórico não é discutir as declarações dos direitos, mas sim sua efetivação!
É interessante observar quando se fala em Direito à saúde, imediatamente somos remetidos à idéia de tratamentos, medicamentos e hospitais, Estamos, na verdade condicionando a pensar em doenças e não em saúde. Talvez em razão disso, o que atualmente mais afligem governantes e governados, é a doença instalada, e não as formas de evitá-la.
Nos últimos anos, o que vem provocando certa discussão é a respeito da distribuição gratuita de medicamentos especiais não constantes da Portaria GM 2577/2006,do Ministério da Saúde.
Trazer a tona, alguns julgados sobre esses litígios, porque os Tribunais dos Estados tem concedido mandados de segurança interpostos por cidadão doentes que necessitem destes medicamentos. Estas decisões têm atingido Estados, Municípios, Distrito Federal e União, que se vêem obrigados a fornecê-los por ordem judicial.
Nesse diapasão, a título de ilustração, em percentuais de quanto do orçamento é comprometido com essas decisões judiciais, o parecer da Procuradora do Estado do Rio Grande do Sul- Doutora Janaína Barbier Gonçalves[11] :
É importante observar que a Procuradoria –Geral do Estado do Rio Grande do Sul não contesta as ações em que são demandados medicamentos excepcionais prescritos em acordo com os protocolos do Ministério da Saúde.Ocorre que, atualmente, na maioria das decisões judiciais do Brasil,não são observados os protocolos. È possível constatar, com base nos dados fornecidos pela Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul, que, em que pese o crescimento na aquisição dos medicamentos na esfera administrativa, as despesas oriundas de decisões judiciais continuam a ter um crescimento vertiginoso. Para ilustrar, excelentíssimo Presidente, senhoras e senhores, atualmente, no Rio Grande do Sul, 41% do orçamento da Secretaria Estadual da Saúde são gastos com políticas de assistência farmacêutica, sendo que 87.966 pacientes são atendidos pela via administrativa, e 20.497 pacientes, pela via judicial. Portanto, afere-se que hoje 18,92% do orçamento da assistência farmacêutica do estado estão sendo administrados pelo Judiciário. No ano de 2008, houve, no Rio Grande do Sul, um acréscimo de 40% no valor destinado à aquisição de medicamentos na via administrativa. Todavia, na prática verifica-se que o esforço empregado pelo Estado não diminuiu o número de ações judiciais, pois, no ano de 2008, houve um aumento de 16% em relação ao ano 2007.É importante ressalvar que, na via judicial, apenas 14,31%da demanda é relativa a medicamentos especiais e 9,4% é relativo a medicamentos excepcionais prescritos de acordo com os protocolos do Ministério da Saúde, medicamentos cujo fornecimento compete ao Estado, enquanto 76,23% das demandas judiciais em que o Estado é réu abrangem medicamentos que não são da sua competência, sendo que 18,25% são relativos a medicamentos excepcionais prescritos em desacordo com os protocolos clínicos e 46,84% referentes a medicamentos que não fornecidos pelo SUS,entre eles medicamentos importados e sem registros na ANVISA.Ainda, constata-se que 66% dos medicamentos do elenco dos excepcionais, fornecidos através da via judicial, não atendem aos protocolos de diretrizes clínicas e terapêuticas do Ministério da Saúde.
Em razão das decisões judiciais, o Estado hoje tem de distribuir aproximadamente 3.300 apresentações farmacêuticas, sendo que apenas cerca de 500 fazem parte dos elencos fornecidos administrativamente e 2.800 são fornecidos por força de determinações judiciais, em antecipação de tutela, para fornecimento em 48 ou 72 horas, sob pena de bloqueio de verbas públicas. Esses números revelam, que em sua maioria, as ações judiciais no Estado do Rio Grande do Sul não decorrem de descontinuidade dos estoques; por outro lado, também revelam que os protocolos existentes precisam ser revisados com maior freqüência pelo Ministério da Saúde, o que não vem ocorrendo.
Em decorrência destas decisões surgiram inúmeros pedidos de conta cautela, pelos quais o ente estatal vai ao Supremo Tribunal Federal pleitear a suspensão da medida judicial em vigor. Estes pedidos são decididos pelo Presidente do Tribunal,no caso presente,a ministra Ellen Gracie.
A cada decisão da ministra, tenta-se estabelecer um padrão de conduta do tribunal. No entanto o fato de se decidir, vezes pela obrigatoriedade de distribuição de remédios, ainda que caríssimos e fora da lista, vezes pela prevalência do direito coletivo a saúde em detrimento do direito individual, tem dificultado o estabelecimento de parâmetros seguros.Cobra-se do Tribunal maior clareza e coerência. Busquei, com este estudo, extrair algumas conclusões sobre a posição do STF.
Para tanto, ao pesquisar encontrei uma tabela de todas as decisões sobre a questão proferidas pela Presidência em 2007. [12]
Analisando as decisões, podemos perguntar a respeito qual a interpretação do direito à saúde, qual seja, se é um direito individual ou coletivo?[13]
A responda é Depende. Porque, o que está em jogo na decisão. Apesar de restar clara uma associação direta entre vida e saúde, está associação não abrange todos os aspectos constitucionais do direito a vida, mas somente àqueles ligados a existência biológica. Explico. Vida, no contexto constitucional, não é considerada apenas no seu sentido biológico de incessante auto-atividade funcional, engloba elementos materiais (físicos e psíquicos) e imateriais (espirituais). O conceito envolve o direito à dignidade da pessoa humana, o direito à privacidade, o direito à integridade físico-corporal, o direito à integridade moral e, especialmente, o direito à existência. Da análise das decisões pode-se, em princípio, afirmar que nos casos que implicam risco de vida do cidadão, o direito assume caráter individual. Em outras palavras, sempre que o fornecimento de medicamento significar manutenção da vida biológica, o Estado tem a obrigação de atender a demanda, seja qual for. Os fundamentos das decisões lidos individualmente não permitem esta afirmação, no entanto, analisando -as em conjunto, é o que se verifica.
Para embasar essa idéia vamos comparar duas Ações de Suspensão n.3193 e a Ação de Suspensão de Segurança n.3274. Ambas interpostas por Estados membros contra decisões dos respectivos Tribunais de Justiça, que decidiram pela obrigatoriedade do fornecimento de medicação especial, não constante da listagem do Ministério da Saúde.
No caso da Ação de Suspensão n.3193 o Estado do Rio Grande do Norte, requereu a suspensão da liminar com os seguintes argumentos:
1.Ocorrência de grave lesão à ordem e economia pública, porquanto a decisão impugnada afronta o principio da legalidade orçamentária, pois “o Estado não tem previsão orçamentária para suprir a população com todos os medicamentos que esta demande, não podendo arcar com o provisionamento integral de fármacos de que necessite cada cidadão residente no território estadual”.
2.A existência de lesão à ordem administrativa, dado que os medicamentos solicitados não estão relacionados pela lista do Ministério da Saúde, o que “engessa a Administração Pública, impedindo-a de oferecer um medicamento similar”.
3.Que os artigos 196 e 198, II da Constituição Federal são normas programáticas que “não sinalizam no sentido do fornecimento de medicamentos”.
A ministra Ellen Gracie indeferiu a suspensão por que:
1.A paciente é comprovadamente hipossuficiente.
2.A enfermidade em questão é muito grave (carcinoma inflamatório de mama com metástase óssea e pulmonar).
3.Há urgência na utilização do medicamento.
Já no caso da Ação de Suspensão de Segurança 3274, o Estado de Goiás que,da mesma forma que o Estado do Rio Grande do Norte, também foi condenado ao fornecimento de medicamento não constantes do programa do SUS, argumentou que:
1.A grave lesão à ordem pública, considerada em termos de ordem administrativa, dado que a determinação do fornecimento desses medicamentos de alto custo financeiro, por não integrarem a Portaria GM 2577/2006 do Ministério da Saúde, encontra-se à margem do programa estatal de fornecimento de medicamentos e, por conseguinte, da própria programação orçamentária do Poder Público.
2. Há grave lesão à saúde pública, porquanto a determinação de entrega de medicamentos não previstos em portarias do Ministério da Saúde compromete a racionalização do sistema para o fornecimento de medicamentos básicos à população.
3. Há grave lesão à economia pública, diante da necessidade de realocação das verbas orçamentárias para a aquisição de medicamentos de alto custo, para atender uma pequena parcela da população.
4. A possibilidade de ocorrência do denominado “efeito multiplicador”, já verificado pelo incremento do número de demandas judiciais da mesma natureza.
Desta vez, a ministra deferiu a suspensão com os seguintes argumentos:
1.A paciente está submetida a tratamento de infertilidade, cujos medicamentos prescritos, em sua maioria, não estão albergados pela Portaria GM 2577/2006 do Ministério de Saúde e, por força do acórdão, o Estado de Goiás está sendo obrigado a custear tais medicamentos, “ o que configura lesão à ordem pública,considerada em termos de ordem administrativa, porquanto a execução de decisões como a ora impugnada afeta o já abalado sistema público de saúde.
2.A gestão da política nacional de saúde, que se realiza de forma regionalizada, busca uma maior racionalização entre o custo e o benefício dos tratamentos que devem ser fornecidos gratuitamente, a fim de atingir o maior número possível de benefícios.
3.” Entendo que a norma do artigo 196 da Constituição da República, que assegura o direito à saúde,refere-se, em princípio, à efetivação de políticas públicas que alcancem a população como um todo, assegurando-lhe acesso universal e igualitário, e não a situações individualizadas. A responsabilidade do Estado em fornecer os recursos necessários à reabilitação da saúde de seus cidadãos não pode vir a inviabilizar o sistema público de saúde.”
Comparando as duas decisões, houve divergência, o que diferenciou uma da outra? Foi o fator manutenção da vida biológica seria o mote para determinar a responsabilidade do Estado no atendimento de um direito individual à saúde.
O saudoso professor André Franco Montoro gostava de lembrar em suas aulas que a palavra “sentença” vem do verbo “sentir”. Que no fundo, o magistrado “sente” qual a decisão justa e, então, busca os argumentos lógicos-jurídicos para embasar sua decisão. Lendo as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria, fica claro, que só podemos concordar.
5.1 Críticas à Judicialização Excessiva
O papel do Poder Judiciário , em um Estado Constitucional democrático, é o de interpretar a Constituição e as leis, resguardando direitos e assegurando o respeito ao ordenamento jurídico, Em muitas situações, caberá a juízes e tribunais o papel de construção do sentido das normas jurídicas indeterminados e de princípios. Em inúmeros outros casos, será necessário efetuar a ponderação entre direitos fundamentais e princípios constitucionais que entram em rota de colisão, hipóteses em que os órgãos judiciais precisam proceder a concessões recíprocas entre as normas ou fazer escolhas fundamentadas.
O tema versado resultam de duas conseqüências relevantes[14]. A primeira: como cláusulas gerais que são, comportam uma multiplicidade de sentidos possíveis e podem ser realizados por meio de diferentes atos de concretização. Em segundo lugar, podem eles entrar em rota de colisão entre si. A extração de deveres jurídicos a partir de normas dessa natureza e estrutura deve ter como cenário principal as hipóteses de omissão dos Poderes Públicos ou de ação que contravenha a Constituição. Ou, ainda, de não atendimento do mínimo existencial.
Em suma, onde não haja lei ou ação administrativa implementando a Constituição, deve o Judiciário agir. Havendo lei e atos administrativos, e não sendo devidamente cumpridos, devem os juízes e tribunais igualmente intervir. Porém, havendo lei e atos administrativos implementados a Constituição e sendo regularmente aplicada, eventual interferência judicial deve ter a marca da autocontenção.
Algumas críticas são tecidas ao Judiciário, a primeira e mais frequentemente crítica oposta à jurisprudência brasileira se apóia na circunstância de a norma constitucional aplicável estar positivada na forma de norma programática[15] . O artigo 196 da Constituição Federal deixa claro que a garantia do direito á saúde se dará por meio de políticas sociais e econômicas, não através de decisões judiciais. A possibilidade de o Poder Judiciário concretizar, independentemente de mediação legislativa, o direito à saúde encontra forte obstáculo no modo de positivação do artigo 196,que claramente defere a tarefa aos órgãos executores de políticas públicas.
Uma outra vertente crítica enfatiza a impropriedade de se conceber o problema como de mera interpretação de preceitos da Constituição. Atribui-se ou não ao Judiciário a prerrogativa de aplicar de maneira direta e imediata o preceito que positiva o direito à saúde seria, antes um problema de desenho institucional[16]. Pode-se entender que a melhor forma de otimizar a eficiência dos gastos públicos com saúde é conferir a competência para tomar decisões nesse campo ao Poder Executivo, que possui visão global tanto dos recursos disponíveis quanto das necessidades a serem supridas. Esta teria sido a opção do constituinte originário, ao determinar que o direito á saúde fosse garantido através de políticas sociais e econômicas. As decisões judiciais que determinam a entrega gratuita de medicamentos pelo Poder Público levariam, portanto , á alteração do arranjo institucional concebido pela Constituição de 1988.
Uma terceira impugnação á atuação judicial na matéria, repetidamente formulada, diz respeito à intrigada questão da legitimidade democrática. Não são poucos os que sustentam a impropriedade de se retirar dos poderes legitimados pelo voto popular a prerrogativa de decidir de que modo os recursos públicos devem ser gastos. Tais recursos são obtidos através da cobrança de impostos. É próprio povo – que paga os impostos – quem deve decidir de que modo os recursos públicos devem ser gastos[17]. E o povo pode, por exemplo, preferir priorizar medidas preventivas de proteção da saúde , ou concentrar a maior parte dos recursos públicos na educação das novas gerações. Essas decisões são razoáveis, e caberia ao povo tomá-las, diretamente ou por meio de seus representantes eleitos. [18]
Essas foram apenas algumas críticas tecidas pelo Professor Luiz Barroso,que no meu entender, com a demanda de litígios, merecem considerações. Afinal a sociedade é a maior interessada, que seus direitos sejam reservados e garantidos à todos e não a uma classe específica.
6. Considerações finais:
As normas constitucionais garantem o direito à saúde e, consequentemente, o fornecimento de medicamentos. Portanto, o Poder Público deve observar respeitar e agir para a concretização do direito à saúde, a fim de que os princípios garantidos pela Constituição surtam efeito na sociedade principalmente as normas programáticas, que visam esse objetivo, serem implantas no mundo do “ser” e não somente do “dever ser”.
Fica claro, que o Estado fica numa situação de “choque” está sujeito a fiscalização orçamentária e a garantir que as normas do caso em estudo são as normas programáticas sejam cumpridas.
O que vai prevalecer num caso concreto: Será que a efetividade dos Direitos sociais frente à real capacidade do Estado? O Judiciário tem tentando modular esses efeitos perante a sociedade, de maneira a não prejudicar nem a coletividade nem o individuo, o que responde essa indagação é a interpretação do constituinte originário pretendia, ou seja, a busca efetiva da Constituição, por meio da plena eficácia de suas normas. Nem sempre é o que ocorre em fatos concretos, muitas vezes o ritmo dessas possibilidades materiais, não se adéquam a realidade, por isso o Judiciário age, quando se trata de questão urgente, é que certamente são casos excepcionais que não dá para esperar, a elaboração de uma norma ser aprovada até mover a máquina do Estado, talvez seja tarde demais, para o individuo que aguarda a decisão.
Diante dessa inércia legislativa que o judiciário faz, “cruza os braços e espera”? Não, atua! Pois, então surge comentários que o Judiciário está legislando, não está cumprindo art. 60 § 4,III da Constituição Federal de 1988 na divisão dos poderes.
Porém a de concordar que o Judiciário atua por causa da inércia, senão os outros poderes freariam. Que é o objetivo de Estado Democrático de Direito.
Importante salientar que nossa intenção não foi exaurir o tema do direito à saúde e sim ampliar as discussões sobre o assunto. Nosso desejo é que o texto apresentado possa enriquecer futuros debates sobre o assunto e lembrar que a Constituição Federal garante o direito à saúde e que cabe a todos lutar por sua efetivação, em atendimento à vontade constitucional e para busca do bem comum.
Referências:
BASTOS, Celso Ribeiro.Curso de Direito Constitucional.São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002. 1º ed.p.768 e 769.
MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23º ed. Editora Atlas.S.A. São Paulo: Athas, 2008. p. 808.
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de Direito Constitucional. Ed. Saraiva. 3º ed.ver.e atual.São Paulo: Saraiva 2003.p.368
TAVARES, André Ramos.Curso de Direito Constitucional. 6.ed.ver.e atual.São Paulo: Saraiva, 2008 p.786.
ARAÚJO, Luiz Alberto David/Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. 12.ed.revisão e atual.São Paulo: Saraiva, 2008 p. 111 e 485/486.
SCHWARTZ, Germano André Doederlein. Direito à saúde: efetivação em uma perspectiva sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001 p.50,51
DALLARI, Sueli Gandolfi. Os Estados brasileiros e o direito à saúde. Editora Kucitec kumanismo, Ciências e Tecnologia. São Paulo: 1995. p.19.
Cavalcanti, Themistocles Brandão. Princípios gerais do direito privado.3.ed. Rio de janeiro: Borsoi ,1966. p.202.
BRANCO, Luciana Temer Castelo . Abrangência do Direito à Saúde : Fornecimento de medicamento especiais é Dever do Estado? Disponível em: www.cepam.sp.gov.br/arquivos/artigos/lt_saude.pdf , Acesso em :22/03/2010
GONÇALVES, Janaína Barbier. Parecer ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes. Disponível em: www.stf.jus.br/cms/processoAudienciaPublicaSaude/.../PGERS.pdf, Acesso em: 22/03/2010
BARROSO, Luiz Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para atuação judicial, Disponível em:http://www.lrbarroso.com.br/pt/noticias/medicamentos.pdf , Acesso em 22/03/2010.
[1] ARAÚJO, Luiz Alberto David/Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. 12.ed.revisão e atual.São Paulo: Saraiva, 2008 –Pg.111
[2] BRANCO, Luciana Temer Castelo . Abrangência do Direito à Saúde : Fornecimento de medicamento especiais é Dever do Estado? Acesso em 22/03/2010 disponível: :www.cepam.sp.gov.br/arquivos/artigos/lt_saude.pdf
[3] ARAÚJO, Luiz Alberto David/Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. 12.ed.revisão e atual.São Paulo: Saraiva, 2008 pg.116-117
[4] Idem ao anterior
[5] CAVALCANTI,Themistocles Brandão. Princípios gerais do direito privado.3.ed. Rio de Janeiro: Borsoi ,1966. p.202.
[6] BASTOS, Celso Ribeiro.Curso de Direito Constitucional.São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002. 1º ed.p.768 e 769.
[7] MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 23º ed. Editora Atlas.S.A. São Paulo: Athas, 2008. p. 808.
[8] FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de Direito Constitucional. Ed. Saraiva. 3º ed.ver.e atual.São Paulo: Saraiva 2003.p.368
[9] TAVARES, André Ramos.Curso de Direito Constitucional. 6.ed.ver.e atual.São Paulo: Saraiva, 2008 p.786
[10] ARAÚJO, Luiz Alberto David/Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. 12.ed.revisão e atual.São Paulo: Saraiva, 2008 p.485-486.
[11] Gonçalves, Janaína Barbier – Parecer ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, Acesso em : 22/03/2010 –disponível: www.stf.jus.br/arquivo/cms/processoAudienciaPublicaSaude/.../PGERS.pdf
[12] Anexo : Tabela de Julgados efetuados durante o período de 2007.
[13] BRANCO, Luciana Temer Castelo – Doutora em Direito Constitucional, coordenadora de Assistência Jurídica do Cepam, em artigo–Abrangência do Direito à Saúde: Fornecimento de Medicamentos especiais é dever do Estado? Disponível em: www.cepam.sp.gov.br/arquivos/artigos/lt_saude.pdf, Acessado em: 22/03/2010
[14] BARROSO, Luiz Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para atuação judicial, Disponível em: http://www.lrbarroso.com.br/pt/noticias/medicamentos.pdf , Acesso em 22/03/2010. pg.21
[15] Segundo José Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, 1999, pp.83-4. “A saúde é (...) dever do Estado...’], aí, não impõe propriamente uma obrigação jurídica, mas traduz um princípio, segundo o qual a saúde e o desporto para todos e cada um se incluem entre os fins estatais, e deve ser atendido. Sente-se, por isso, que as preocupações tem eficácia reduzida...”V.também: TJRJ,j. 17 dez. 1998, MS 220/98, Rel.Des. Antonio Lindberg Montenegro: “ Mandado de Segurança. Impetrantes portadores de insuficiência renal crônica. Fornecimento de remédio (CELLCEPT), pelo Estado. As normas programáticas estabelecidas na Constituição Federal não conferem ao cidadão o direito subjetivo de exigir do Estado o fornecimento de remédios de alto-custo.em detrimento de outros doentes, igualmente carentes. Na execução de sua obrigação de saúde pública a administração há que atender aos interesses mais imediatos da população. Impropriedade da via mandamental para atendimento do direito reclamado”.
[16] Sobre noção de desenho institucional, v. F. Schauer, Playing by the Rules: a philosophical examination of rule-based decision-making in law and in life, 1998;Noel Struchiner, Para falar de regras. O positivismo conceitual como cenário para uma investigação filosófica acerca dos casos difíceis do direito. Tese de doutorado apresentada à PUC-Rio,2005.
[17] O argumento é assim sintetizado por Ingo Wolfgang Sarlet, Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia e efetividade do direito à saúde na Constituição de 1988, Interesse Público 12:102,2001.
[18] TJRJ, j,20 set. 1994, Apelação Cível 1994.001.01749, Rel.Des. Carpena Amorim.
Acadêmica de Direito no Insituto Toledo de Ensino - Botucatu (SP)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Cristina Aparecida da. O fornecimento de medicamentos: política essencial para a efetivação do direito à saúde Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 mar 2011, 08:59. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/23811/o-fornecimento-de-medicamentos-politica-essencial-para-a-efetivacao-do-direito-a-saude. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: JAQUELINA LEITE DA SILVA MITRE
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