A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul decidiu, por meio do julgamento do Agravo de Instrumento n° 70042608943, o direito da Empresa América Móveis e Eletrodomésticos de quitar seus débitos relativos ao ICMS, pelos precatórios gerados pelo próprio Estado.
O contribuinte, nos autos da execução fiscal, ofereceu a penhora precatórios do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul para a garantia da dívida, porém, o juiz de 1ª grau declarou ineficaz a nomeação de precatórios à penhora, tendo em vista a recusa do exequente.
Inconformada com esta decisão, a empresa interpôs Recurso de Agravo de Instrumento perante o TJRS, o qual foi distribuído para julgamento da 1ª Câmara Cível, onde participaram do julgamento os Desembargadores, Jorge Maraschin dos Santos (relator do caso), Irineu Mariani e Luiz Felipi Silveira Delfini.
Em seu voto vencido, o Relator, Desembargador, Jorge Maraschin dos Santos, resolveu seguir uma posição conservadora e votou conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, afirmando que, apesar dos precatórios serem considerados penhoráveis, a Fazenda Pública pode recusar a penhora desses créditos, por ofensa a ordem legal dos bens penhoráveis, de acordo com o artigo 656 do CPC e artigo 11 da Lei das Execuções Fiscais.
Já o Desembargador Irineu Mariani, presidente da 1ª Câmara Cível, discordou do voto de seu colega e disse que a Fazenda Pública não pode simplesmente recusar a penhora dos precatórios, que equivale a crédito, sem ao menos justificar fundamentadamente o porquê desta recusa.
Lembrou, ainda, que a ordem legal dos bens penhoráveis não tem caráter absoluto nas execuções civis comuns, conforme a Súmula 417 do STJ que determina que “Na execução civil, a penhora de dinheiro na ordem de nomeação de bens não tem caráter absoluto”, logo não há porque também não aplicar à referida súmula as execuções fiscais, sob pena de consagrar odioso privilégio.
Afirma ainda que “não faria sentido algum o STJ por um lado reconhecer que o crédito de precatório é penhorável, e, por outro, entregar ao inteiro arbítrio do poder público aceitar ou não, sendo por demais sabido que o responsável pelo fato de ser chamado de “crédito podre” é ele mesmo. Isso seria dar com uma mão e tirar com a outra.”
O magistrado advertiu que também não é caso de argumentação da suposta baixa liquidez dos precatórios: “O estado recusar a penhora de crédito precatório, em última análise, devido por ele mesmo, porque tem pouca liquidez, é querer tirar proveito da própria torpeza, visto ser o causador disso”.
Para finalizar sua decisão, o Desembargor Presidente afirmou que o caso trata-se de sub-rogação e, mesmo que os precatórios sejam recusados pelo Estado, a execução fiscal deverá ficar suspensa até que o Poder Público pague o precatório, conforme preconiza o artigo 673 do CPC: “Feita a penhora em direito e ação do devedor, e não tendo este oferecido embargos, ou sendo estes rejeitados, o credor fica sub-rogado nos direitos do devedor até a concorrencia do seu crédito”. Com esta fundamentação, o voto do Desembargador Irineu Mariani visou prover o Recurso interposto pela empresa, deferindo a penhora do crédito de precatório.
Por último, para desempatar a questão, o Desembargador Luiz Felipe Silveira Difini resolveu acompanhar o seu colega Desembargador Irineu Mariani em sua decisão, reconhecendo que a ordem estabelecida no artigo 11 da Lei 6830/80 não é absoluta, podendo ser alterado no caso concreto, quando trouxer menor onerosidade ao devedor e garantir a satisfação do crédito ao exequente. Assim, o voto do Desembargador seguiu na mesma linha de seu colega Irineu Mariani, autorizando a penhora dos precatórios na execução fiscal.
Por maioria de votos (2x1), os Desembargadores da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul reconheceram o direito do contribuinte em pagar seus débitos relativos de ICMS, com precatórios gerados pelo próprio Estado.
Com esta decisão, os Desembargadores deram apenas duas opções ao Estado do Rio Grande do Sul: ou o Estado aceita os precatórios como pagamento de dívidas tributárias das empresas ou o Estado deverá suspender imediatamente qualquer cobrança relativos a esses débitos, até que o próprio Estado pague o valor dos precatórios que deve a empresa. Em outras palavras, os magistrados disseram que “ou o Estado compensa os precatórios ou ele somente receberá seus créditos quando ele pagar sua própria dívida”.
Esta decisão da 1ª Câmara Cível do TJRS está unida à sentença proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário n. 550.400-0, o qual, por meio do Ministro Eros Grau, permitiu que uma indústria de móveis compensasse seus débitos de ICMS com precatórios do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul, que havia adquirido de terceiros.
O Ministro afirmou que o fato do devedor ser diverso do credor não é relevante, uma vez que ambos integram a Fazenda Pública do mesmo ente federado (Lei n. 6.830/80). Além disso, a Constituição do Brasil não impôs limitações aos institutos da cessão e da compensação e o poder liberatório de precatórios para pagamento de tributo resulta da própria lei.
O ministro Eros Grau derrubou todos os argumentos contrários à compensação que ainda existiam. O argumento de que precatório emitido por suas autarquias, como o Instituto de Previdência do Rio Grande do Sul (Ipergs), não se prestava para compensação, ficou totalmente fulminado nos seguintes termos: "O fato de o devedor ser diverso do credor é irrelevante, vez que ambos integram a Fazenda pública do mesmo ente federado", afirmou. Em seguida, o Ministro derrubou outros dois óbices à operação: "A Constituição do Brasil não impôs limitações aos institutos da cessão e da compensação e o poder liberatório para pagamento de tributo resulta da própria Constituição".
Deste modo, com a decisão proferida pela 1ª Câmara Cível, comprova-se que, tanto o STF como o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, seguem a tendência de permitir um acerto de contas entre o contribuinte e o fisco, sobretudo a compensação de precatórios com débitos tributários do ICMS, pacificando a matéria no âmbito estadual.
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