SUMÁRIO. Introdução. 2. Requisitos indispensáveis para concessão da remissão prevista na Medida Provisória nº. 449/2008 e na Lei nº. 11.941/2009. 3. Da necessidade de ouvir previamente a Fazenda Nacional antes de extinguir a execução fiscal com fundamento na remissão em obediência aos princípios da legalidade, do contraditório e da ampla defesa. 4. Considerações Finais. 5. Referências bibliográficas.
RESUMO
Analisa os requisitos legais para o reconhecimento da remissão prevista na MP nº. 449/2008 e na Lei nº. 11.941/2009. Explica a necessidade de considerar o valor consolidado dos débitos por devedor e a impossibilidade de reconhecimento de ofício da remissão e sem ouvir previamente a Fazenda Nacional.
1. INTRODUÇÃO
A Medida Provisória nº. 449/2008 remitiu os débitos com a Fazenda Nacional que em 31 de dezembro de 2007 estivessem vencidos há mais de cinco anos e cujo valor consolidado fosse igual ou inferior a R$ 10.000,00, considerando o limite de valor por devedor ou sujeito passivo.
A referida Medida Provisória foi convertida na Lei nº. 11.941 de 27/05/2009, sendo mantida a remissão, com pequenas alterações pontuais.
A remissão é um instituto de direito tributário que extingue o crédito tributário, nos termos do art. 156 do CTN.
Ocorre que, apesar de os citados diplomas legais concederem remissão dos débitos cujo valor consolidado por devedor for inferior a R$ 10.000,00, alguns juízes têm extinguido, de ofício e sem ouvir a Fazenda Nacional, Execuções Fiscais com valor abaixo de R$10.000,00, sem considerar o valor consolidado dos débitos do devedor.
O presente trabalho pretende explicar porque são equivocadas tais decisões, tanto por considerarem remitidos débitos inferiores a R$ 10.000,00 sem levar em consideração outros débitos do devedor, quanto por extinguirem Execuções Fiscais por tal fundamento de ofício e sem ouvir antes a Fazenda Nacional.
2. REQUISITOS INDISPENSÁVEIS PARA CONCESSÃO DA REMISSÃO PREVISTA NA MEDIDA PROVISÓRIA Nº. 449/2008 E NA LEI Nº. 11.941/2009.
Em dezembro de 2008 foi publicada a Medida Provisória nº. 449, concedendo remissão dos débitos com a Fazenda Nacional que atendessem aos requisitos nele constantes.
A remissão é um instituto jurídico que extingue o crédito tributário, nos termos do art. 156 do CTN[1]:
O Código Tributário Nacional não tece muitas considerações sobre o referido instituto, limitando-se a tratá-lo no seu art. 172.
Paulo de Barros Carvalho (1991: 310) explica que com a remissão o Estado dispensa o devedor do pagamento do crédito tributário:
Remitindo, o Estado dispensa o pagamento do crédito relativo ao tributo e, pela anistia, dá-se o perdão correspondente ao ato ilícito ou à penalidade pecuniária. As duas realidades são parecidas, mas estão subordinadas a regimes jurídicos bem distintos. A remissão se processa no contexto de um vínculo de índole obrigacional tributária, enquanto a anistia diz respeito a liame de natureza sancionatória, podendo desconstituir a antijuricidade da própria infração.
Para Antônio Roque Carrazza (2001: 747), a remissão faz desaparecer o tributo já nascido:
Já, a remissão é o perdão legal do débito tributário. É na terminologia do Código Tributário nacional, uma causa extintiva do crédito tributário (art. 156, IV). Faz desaparecer o tributo já nascido e só pode ser concedida por lei da pessoa jurídica tributante. Fazemos essa última proclamação baseados no princípio da indisponibilidade do interesse público, de largo trânsito no Direito Tributário brasileiro. A Fazenda Pública não é “dona” do tributo. Ela o lança e arrecada, nos estritos termos da lei. Não lhe é dado abrir mão, sponte própria, de seu recolhimento. Pelo contrário, só poderá deixar de arrecadá-lo em cumprimento a uma lei autorizadora (praticará, pois, também neste caso, um ato administrativo vinculado).
Analisando o art. 14 da MP nº 449/2008, verifica-se que para o reconhecimento da remissão devem ser preenchidos alguns requisitos, senão vejamos:
DA REMISSÃO
Art. 14. Ficam remitidos os débitos com a Fazenda Nacional, inclusive aqueles com exigibilidade suspensa que, em 31 de dezembro de 2007, estejam vencidos há cinco anos ou mais e cujo valor total consolidado, nessa mesma data, seja igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).
§ 1o O limite previsto no caput deve ser considerado por sujeito passivo, e, separadamente, em relação:
I - aos débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional;
II - aos débitos decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas “a”, “b” e “c” do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil; e
III - aos demais débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.
§ 2o Na hipótese do IPI, o valor de que trata este artigo será apurado considerando a totalidade dos estabelecimentos da pessoa jurídica.
§ 3o O disposto neste artigo não implica restituição de quantias pagas.
O primeiro requisito a ser observado é que os débitos sejam de titularidade da Fazenda Nacional.
O segundo requisito diz respeito ao marco temporal do débito, no sentido de que os referidos débitos devem estar vencidos há cinco anos ou mais em 31 de dezembro de 2002, ou seja, os débitos devem ter data de vencimento anterior ou igual a 31/12/2002.
O terceiro requisito é o pequeno valor do débito, que deve ser inferior a R$ 10.000,00. O dispositivo fala que o valor de R$10.000,00 deve ser aferido “nessa mesma data”, trazendo certa dúvida se é 31/12/2002 (vencimento do débito) ou 31/12/2007 (data referenciada no artigo). A despeito de tal celeuma, a Procuradoria da Fazenda Nacional tem adotado a data de 31/12/2007 para apurar o valor do débito.
Por fim, deve-se atentar que o valor de R$ 10.000,00 deve ser considerado em relação a cada devedor ou sujeito passivo, conforme dispõe o §1º. Assim, para efetiva remissão devem ser analisados todos os débitos constantes no sistema da Dívida da Fazenda Nacional por CPF ou CNPJ e não apenas um débito isolado cobrado em uma Execução Fiscal qualquer.
Assim, o valor consolidado (todos os débitos, encargo legal, juros e multa) deve ser obtido pelo agrupamento dos débitos “por sujeito passivo”.
Ademais, o valor consolidado de R$ 10.000,00 deve ser considerado separadamente para os débitos: I - inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional; II - aos débitos decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas “a”, “b” e “c” do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil; e III - aos demais débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Ressalte-se que como a MP previa em um único artigo as dívidas inscritas em DAU, na aferição do valor de R$ 10.000,00, aglutinavam-se tanto os débitos não previdenciários, quanto os próprios débitos previdenciários, e ainda os débitos de salário-educação destinados ao FNDE e as contribuições da Lei Complementar nº 110/2001, o que só foi modificado pela Lei nº. 11.941/2009 que separou os grupos.
A Medida Provisória nº. 449/2008 foi convertida na Lei nº. 11.941, de 27 de maio de 2009, que praticamente manteve a redação anterior, in verbis:
DA REMISSÃO
Art. 14. Ficam remitidos os débitos com a Fazenda Nacional, inclusive aqueles com exigibilidade suspensa que, em 31 de dezembro de 2007, estejam vencidos há 5 (cinco) anos ou mais e cujo valor total consolidado, nessa mesma data, seja igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).
§ 1o O limite previsto no caput deste artigo deve ser considerado por sujeito passivo e, separadamente, em relação:
I – aos débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas a, b e c do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos;
II – aos demais débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional;
III – aos débitos decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas a, b e c do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil; e
IV – aos demais débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.
§ 2o Na hipótese do IPI, o valor de que trata este artigo será apurado considerando a totalidade dos estabelecimentos da pessoa jurídica.
§ 3o O disposto neste artigo não implica restituição de quantias pagas.
§ 4o Aplica-se o disposto neste artigo aos débitos originários de operações de crédito rural e do Programa Especial de Crédito para a Reforma Agrária – PROCERA transferidas ao Tesouro Nacional, renegociadas ou não com amparo em legislação específica, inscritas na dívida ativa da União, inclusive aquelas adquiridas ou desoneradas de risco pela União por força da Medida Provisória no 2.196-3, de 24 de agosto de 2001.
A alteração mais notória foi a separação dos débitos inscritos em Dívida Ativa da União em dois grupos distintos: I – débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas a, b e c do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos; e II – aos demais débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
Assim, houve um alargamento da possibilidade de remissão, pois para cada um dos grupos de débitos poderá ser considerado o valor de R$ 10.000,00.
3. DA NECESSIDADE DE OUVIR PREVIAMENTE A FAZENDA NACIONAL ANTES DE EXTINGUIR A EXECUÇÃO FISCAL COM FUNDAMENTO NA REMISSÃO EM OBEDIÊNCIA AOS PRINCIPIOS DA LEGALIDADE, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
A despeito do expresso teor da lei, alguns juízes insistem em aplicar a remissão a alguns débitos com valor inferior a R$ 10.000,00 cobrados em Execuções Fiscais isoladas, sem considerar os demais débitos do sujeito passivo e sem ouvir previamente a Fazenda Nacional.
Tem sido corriqueiro os Tribunais Regionais Federais e Tribunais Regionais do Trabalho, ao se depararem com apelações e agravos de petição da Fazenda Nacional, reconhecerem de ofício a remissão e julgarem prejudicados os argumentos levantados pelo recorrente.
Tais decisões, além de contrariar a própria lei instituidora da remissão, atentando contra o princípio da legalidade, violam o princípio do contraditório e da ampla defesa, ao impedir que a Fazenda Nacional se pronuncie previamente sobre o instituto.
Não se olvide que a remissão está adstrita aos estreitos limites legais. Nesse sentido, pronuncia Marcelino Alves Alcântara (2008: 01):
Desde já, é importante ressaltar que, a validade de concessão de remissão, encontra-se umbilicalmente vinculada ao respeito ao princípio da legalidade. Tal assertiva decorre tanto de previsão constitucional (art. 150, § 6º da Constituição da República Federativa de 1988 [03]), quanto legal (art. 172 do Código Tributário Nacional [04]).
Dessa forma, não pode o Poder Judiciário conceder remissão aos débitos que não satisfaçam os requisitos exigidos por lei, no caso, o valor consolidado por devedor inferior a R$ 10.000,00. Como visto, é equivocado considerar remitido um débito isolado do devedor, sem considerar todos os débitos existentes nos Sistemas de Dívida da União.
Além disso, a remissão não pode ser reconhecida de ofício pelo magistrado, por não se tratar de matéria de ordem pública, tendo em vista que não se encontra listada no art. 267, §3º do CPC:
Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (Redação dada pela Lei nº 11.232, de 2005)
(…)
IV - quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;
V - quando o juiz acolher a alegação de perempção, litispendência ou de coisa julgada;
Vl - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual;
(…)
§ 3º O juiz conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e Vl; todavia, o réu que a não alegar, na primeira oportunidade em que Ihe caiba falar nos autos, responderá pelas custas de retardamento.
Por sua vez, o reconhecimento da remissão é de competência exclusiva da autoridade administrativa, não cabendo ao juiz decretá-la sem ouvir a exequente, nos termos do art. 172 do CTN:
Art. 172. A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo:
I - à situação econômica do sujeito passivo;
II - ao erro ou ignorância excusáveis do sujeito passivo, quanto a matéria de fato;
III - à diminuta importância do crédito tributário;
IV - a considerações de eqüidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso;
V - a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante.
Parágrafo único. O despacho referido neste artigo não gera direito adquirido, aplicando-se, quando cabível, o disposto no artigo 155.
Ademais, mesmo que se considerasse que se trata de matéria de ordem pública, podendo ser conhecida de ofício pelo julgador, não poderia este decidir antes de ouvir as partes.
A expressão “conhecer de ofício” significa que o juiz pode analisar determinada matéria não suscitada pelas partes. Contudo, conhecer de ofício não significa suprimir das partes a oportunidade de se manifestar previamente. Assim, deparando-se o magistrado com a questão, deve intimar as partes para se manifestarem antes de proferir julgamento.
A simples não intimação da Fazenda Nacional para se manifestar previamente sobre questão não debatida nas instâncias inferiores, nem levantada no recurso, é apta a ensejar a nulidade do julgado, por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, previstos no art. 5º, incs. LIV e LV da CF:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
É patente a violação aos princípios supra, posto que se retira da parte adversa a possibilidade de explicitar fatores capazes de impedir o reconhecimento da remissão, como, por exemplo, a existência de outros débitos que ultrapassem o limite fixado pela Lei nº. 11.941/09.
A questão já chegou aos Tribunais Superiores os quais têm dado provimento aos recursos da Fazenda Nacional, concluindo pela impossibilidade de o juiz reconhecer a remissão de oficio e sem consultar previamente a exequente sobre a existência de outros débitos do sujeito passivo.
O Superior Tribunal de Justiça possuía entendimentos divergentes em suas Turmas. Contudo, a divergência foi suplantada com o julgamento do Recurso Especial nº 1.208.935 - AM (2010/0115732-7), sob o rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil. Segue a ementa:
TRIBUTÁRIO. Recurso Especial representativo de controvérsia (art. 543-C, § 1º, do CPC). ART. 14, DA LEI 11.941/09. REMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE DE PRONUNCIAMENTO DE OFÍCIO PELO MAGISTRADO. LIMITE DE R$ 10.000,00 CONSIDERADO POR SUJEITO PASSIVO, E NÃO POR DÉBITO ISOLADO.
1. A Lei 11.941/2008 remite os débitos para com a Fazenda Nacional vencidos há cinco anos ou mais cujo valor total consolidado seja igual ou inferior a 10 mil reais.
2. O valor-limite acima referido deve ser considerado por sujeito passivo, e separadamente apenas em relação à natureza dos créditos, nos termos dos incisos I a IV do art. 14. Traduzindo de forma didática, foram concedidas quatro remissões distintas que ficaram assim estabelecidas: 2.1 Remissão para todos os débitos de um mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente quando o somatório de todos atinja valor igual ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se apenas os débitos decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, inscritos em Dívida Ativa da União no âmbito da PGFN;
2.2 Remissão para todos os débitos de um mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente quando o somatório de todos atinja valor igual ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se apenas os débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da PGFN que não aqueles elencados em "2.1";
2.3 Remissão para todos os débitos de um mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente quando o somatório de todos atinja valor igual ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se apenas os débitos decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8.212, de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil;
2.4 Remissão para todos os débitos de um mesmo sujeito passivo, vencidos a cinco anos ou mais em 31 de dezembro de 2007, somente quando o somatório de todos atinja valor igual ou inferior a R$ 10.000,00, considerando-se apenas os demais débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil que não aqueles elencados em "2.3".
3. Não pode o magistrado, de ofício, pronunciar a remissão, analisando isoladamente o valor cobrado em uma Execução Fiscal, sem questionar a Fazenda sobre a existência de outros débitos que somados impediriam o contribuinte de gozar do benefício. Precedente: REsp. Nº 1.207.095 - MG, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18.11.2010.
4. Superado o precedente em sentido contrário REsp 1.179.872/MT, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 22.6.2010.
5. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008.
(REsp 1208935/AM, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/04/2011, DJe 02/05/2011).
O Tribunal Superior do Trabalho também tem entendido pela impossibilidade de reconhecimento de ofício da remissão, conforme se verifica dos arestos abaixo:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO FISCAL. REMISSÃO DO DÉBITO IGUAL OU INFERIOR A R$10.000,00. IMPOSSIBILIDADE DE PRONUNCIAMENTO DE OFÍCIO PELO MAGISTRADO E DE SE CONSIDERAR O DÉBITO ISOLADADAMENTE. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE OUTRAS DÍVIDAS, EM NOME DO MESMO SUJEITO PASSIVO, PERANTE A FAZENDA NACIONAL, NOS TERMOS DO ART. 14, §1º, DA LEI 11.941/09. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento para melhor análise da arguição de violação ao art. 14, §1º, da Lei 11.941/09. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO FISCAL. REMISSÃO DO DÉBITO IGUAL OU INFERIOR A R$10.000,00. IMPOSSIBILIDADE DE PRONUNCIAMENTO DE OFÍCIO PELO MAGISTRADO E DE SE CONSIDERAR O DÉBITO ISOLADAMENTE. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE OUTRAS DÍVIDAS, EM NOME DO MESMO SUJEITO PASSIVO, PERANTE A FAZENDA NACIONAL, NOS TERMOS DO ART. 14, §1º, DA LEI 11.941/09. A remissão de débitos fiscais, concedida em caráter geral, nos termos do art. 14, §1º, da Lei 11.941/09, somente pode ocorrer se os valores devidos por determinado contribuinte não ultrapassarem a quantia de R$10.000,00 e desde que a dívida esteja vencida há mais de 05 anos. Não basta, entretanto, que tal valor seja analisado de forma isolada, por execução fiscal, mas sim, por sujeito passivo e dentro de qualquer dos grupos especificados no próprio art. 14 da Lei 11.941/09. São quatro as hipóteses de remissão concedidas pela referida lei, quais sejam: 1) remissão, a um mesmo sujeito passivo, de débitos vencidos há cinco anos ou mais, na data de 31 de dezembro de 2007, cujo montante seja igual ou inferior a R$10.000,00, considerando-se somente os decorrentes: das contribuições sociais previstas no art. 11, parágrafo único, -a-, -b-, e -c-, da Lei 8.212/91; das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos; 2) remissão, a um mesmo sujeito passivo, de débitos vencidos há cinco anos ou mais, na data de 31 de dezembro de 2007, cujo montante seja igual ou inferior a R$10.000,00, considerando-se somente os inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional; 3) remissão, a um mesmo sujeito passivo, de débitos vencidos há cinco anos ou mais, na data de 31 de dezembro de 2007, cujo montante seja igual ou inferior a R$10.000,00, considerando-se somente os decorrentes: das contribuições sociais previstas no art. 11, parágrafo único, -a-, -b-, e -c-, da Lei 8.212/91; das contribuições instituídas a título de substituição; e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos e administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil; e 4) remissão, a um mesmo sujeito passivo, de débitos vencidos há cinco anos ou mais, na data de 31 de dezembro de 2007, cujo montante seja igual ou inferior a R$10.000,00, considerando-se os demais débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil. Frisa-se que o limite de R$10.000,00 deve ser considerado por sujeito passivo (§1º do art. 14 da Lei nº 11.941/09) englobando, desse modo, todas as suas dívidas perante a União, separadamente apenas em correspondência aos quatro blocos de dívidas antes referidos, em conformidade com os incisos I, II, III e IV, do §1º do art. 14 da Lei 11.941/09. Naturalmente que o ônus probatório do fato impeditivo de demonstrar que se posiciona dentro dos requisitos para a outorga da grande vantagem jurídica (remissão da dívida) é do devedor. Não pode o magistrado, portanto, de ofício, analisando tão somente o débito discutido em uma única execução fiscal, pronunciar a remissão, sem investigar ou questionar primeiramente a Fazenda sobre a existência de outros débitos que, somados, obstariam o contribuinte de usufruir o benefício legal (ou melhor, sem que o executado tenha feito a prova do fato impeditivo excepcional). Não demonstrada na Instância ordinária, apta a examinar matéria fática, o atendimento dos requisitos estritos da Lei 11.941/09, em seu art. 14, não cabe estender ao devedor executado a excepcional vantagem da remissão. Precedentes do STJ. Recurso de revista conhecido e provido.
(RR - 168700-54.2006.5.18.0081 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 09/11/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: 18/11/2011)
RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO FISCAL. REMISSÃO TRIBUTÁRIA. APLICAÇÃO DO ART. 14 DA LEI 11.491/2009. OBJETIVO DA NORMA. VALOR TOTAL DA DÍVIDA. DEVEDOR INDIVIDUALMENTE CONSIDERADO. ÔNUS DA PROVA. A remissão tributária permite que se atribua o perdão da dívida total (não por débito isolado) àquele sujeito passivo (individualmente considerado), que tenha débitos vencidos há mais de cinco anos e em valor inferior a dez mil reais, nos termos do art. 174 do CTN c/c art. 14 da Lei 11.491/2009. Objetiva a norma legal a aplicação do princípio da eficiência da administração, com o fim de não inviabilizar a máquina em relação a valores de pequena monta, considerados individualmente, por devedor passivo, e devidos há muito tempo. A remissão, conforme dispõe o art. 172 do CTN, pode ser concedida por intermédio de despacho fundamentado, ou seja, deve ser buscada pela parte, pois inviável sua concessão de ofício. Desse modo, compete ao devedor, que é o sujeito passivo da obrigação, demonstrar que a totalidade da dívida que possui para com a Fazenda Pública está dentro das balizas legais para a concessão da remissão. Não o fazendo, não há como se reputar beneficiário do perdão da dívida. Recurso de revista conhecido e desprovido.
(RR - 4038-30.2010.5.02.0000, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 29/11/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: 09/12/2011)
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, são equivocadas, por violarem o princípio da legalidade, as decisões judiciais que extinguem as Execuções Fiscais ajuizadas pela Fazenda Nacional com fundamento na remissão prevista na MP nº. 449/2008 e Lei nº. 11.941/2009, levando em consideração o valor cobrado apenas no processo, sem observar a existência de outros débitos do sujeito passivo. Os referidos diplomas legais são claros em exigir que o valor do débito a ser remitido tome por base o débito consolidado do sujeito passivo e não apenas o débito cobrado na execução. A intenção da lei é a remissão de pequenos devedores e não apenas de pequenos débitos.
Ademais, devem ser anuladas as decisões que reconhecem a remissão de ofício e sem ouvir o credor do débito, no caso a Fazenda Nacional, pois tais condutas violam os princípios do contraditório e da ampla defesa, uma vez que não se oportuniza à parte interessada informar a existência de outros débitos que impeçam o reconhecimento da benesse legal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALCÂNTARA, Marcelino Alves de. Breve análise da remissão concedida pela Medida Provisória nº 449, de 3 de dezembro de 2008. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2066, 26 fev. 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12365>. Acesso em: 9 dez. 2011.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.208.935 - AM (2010/0115732-7). Recorrente: Fazenda Nacional. Recorrido: Warella Navegação LTDA. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&processo=1208935&b=ACOR#>. Acesso em: 09 dez. 2011a.
_______. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista nº 168700-54.2006.5.18.0081. Recorrente: União/Fazenda Nacional. Recorridos: Cleuza Maria Marcório e Vigilância e Segurança LTDA - VIGSEG. Relator: Ministro Mauricio Godinho Delgado. Disponível em: <http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/inteiroTeor.do?action=printInteiroTeor&format=html&highlight=true&numeroFormatado=RR - 168700-54.2006.5.18.0081&base=acordao&rowid=AAANGhABIAAAD5WAAT&dataPublicacao=18/11/2011&query=REMISSAO E LEI 11.941>. Acesso em: 09 dez. 2011b.
_______. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista nº 4038-30.2010.5.02.0000. Recorrente: Ar Industrial Equipamentos Aerodinâmicos Ltda. Recorrido: União/Fazenda Nacional. Relator: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga. Disponível em: <http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/inteiroTeor.do?action=printInteiroTeor&format=html&highlight=true&numeroFormatado=RR - 4038-30.2010.5.02.0000&base=acordao&rowid=AAANGhABIAAAERaAAT&dataPublicacao=09/12/2011&query=REMISSAO E LEI 11.941>. Acesso em: 09 dez. 2011c.
CARRAZZA, Antônio Roque. Curso de Direito Constitucional Tributário. 16 ed. São Paulo: Malheiros, 2001.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1991.
[1] CAPÍTULO IV - Extinção do Crédito Tributário
SEÇÃO I - Modalidades de Extinção
Art. 156. Extinguem o crédito tributário:
I - o pagamento;
III - a transação;
IV - remissão;
V - a prescrição e a decadência;
VI - a conversão de depósito em renda;
VII - o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no artigo 150 e seus §§ 1º e 4º;
VIII - a consignação em pagamento, nos termos do disposto no § 2º do artigo 164;
IX - a decisão administrativa irreformável, assim entendida a definitiva na órbita administrativa, que não mais possa ser objeto de ação anulatória;
X - a decisão judicial passada em julgado.
XI – a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e condições estabelecidas em lei. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
Procuradora da Fazenda Nacional na PFN/PA. Bacharela em Direito pela UFMA. Especialista em Direito Processual pela UNAMA. Especialista em Direito Tributário pela UNIDERP. Exerceu o cargo de Analista Judiciário no TJMA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PASSOS, Danielle de Paula Maciel dos. Análise da remissão prevista na MP Nº. 449/2008 e na Lei Nº. 11.941/2009: Necessidade de considerar o valor consolidado dos débitos por devedor e impossibilidade de declaração de ofício pelo magistrado sem oitiva prévia da Fazenda Nacional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 dez 2011, 06:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27478/analise-da-remissao-prevista-na-mp-no-449-2008-e-na-lei-no-11-941-2009-necessidade-de-considerar-o-valor-consolidado-dos-debitos-por-devedor-e-impossibilidade-de-declaracao-de-oficio-pelo-magistrado-sem-oitiva-previa-da-fazenda-nacional. Acesso em: 22 nov 2024.
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