Rudolf Von Ihering, jurista alemão, em sua inescusável e difundida obra intitulada “A Luta pelo Direito¹” defende a ideia de que lutar pelo direito é um dever para com a sociedade e consigo mesmo, e filosofa sobre a atitude de lutar pelo que é justo, exarando que “cada qual é um lutador nato pelo direito” e arrematando ainda com o seguinte pensamento: “(…) É um dever resistir à injustiça ultrajante que chega a provocar a própria pessoa, isto é, à lesão ao direito que, em consequência da maneira porque é cometida, contém o caráter de um desprezo pelo direito, de uma lesão pessoal. Ë um dever do interessado para consigo próprio; é um dever para com a sociedade, porque esta resistência é necessária para o direito se realize”.
Superados os prolegômenos, recorro à ideia de Ihering para tecer alguns comentários acerca da postura do consumidor em relação aos estabelecimentos que discretamente afrontam o direito destes sem pudor algum no momento em que passam o troco em desacordo com o que seria devido.
É habitual no comércio estabelecido verificar a imprudência em relação aos centavos pertencentes aos clientes em seu troco. Muitos não se atentam ao fato de que estão sendo ludibriados e, literalmente, roubados quando deixam de exigir 1, 2, 3 ou 4 centavos de troco, que por direito lhe pertencem.
Com fulcro nos arts. 30, 39 do CDC e no direito consuetudinário, o consumidor não pode ficar em posição de desvantagem ao receber seu troco. O estabelecimento é obrigado, no caso de não ter a moeda de 1 centavo ou a soma de 2, 3 ou 4 centavos, a dar o troco em valor superior a este, com a moeda ou cédula que tiver em caixa. Explicando: Se o seu troco é de R$0,02 (dois centavos) e o estabelecimento/fornecedor não possuir essa quantia exata, deve lhe pagar R$0,05 (cinco centavos), ou R$0,10 (dez centavos) e assim em diante, até chegar a uma quantia que tenha em caixa, não podendo este valor ser superior a 20 (vinte) vezes o valor da compra ou do serviço².
Muitas vezes, sem o consumidor atentar, o fornecedor em nota fiscal computa como se o valor do troco pago fosse “x”, quando na verdade devolve somente “y” ao consumidor. Explico: Ao fazer uma compra no valor de R$4,88 (quatro reais e oitenta e oito centavos), no caso do consumidor pagar com uma nota de R$5,00 (cinco reais), deveria receber R$0,12 (doze centavos) de troco, quando na verdade o estabelecimento devolve somente R$0,10 (dez centavos) e, descaradamente, na nota fiscal computa como se houvesse devolvido os R$0,12 (doze centavos). Tal prática é criminosa e quem a opera incorre no crime de enriquecimento ilícito.
Ora, façamos as contas: Imagina-se uma empresa de grande porte, a qual tem filiais em diversos estados, abrangendo diversas cidades, totalizando, aproximadamente, 465 (quatrocentas e sessenta e cinco lojas) em todo o país, onde a média de consumidores diários de cada loja seja de 1.000 (mil) compradores, e que cada um deixe de exigir o troco de R$0,01 (um centavo). Ao final do dia, essa empresa terá o lucro não declarado de R$4.650,00 (quatro mil seiscentos e cinquenta reais). Ao final do ano somará o montante de, (pasmem), R$1.697,250 (um milhão seiscentos e noventa e sete mil duzentos e cinquenta reais), lucro oriundo de moedinhas de 1 centavo que você, consumidor, deixou de cobrar!
Faça o seguinte questionamento: A empresa se acha no direito de deixar de lhe pagar R$0,01 (um centavo) por não ter troco, mas será que deixaria você levar o produto se não tivesse o centavo em questão? O comerciante tem todo o direito de quantificar o valor de seu produto e impor nele a quantia que acha justa, cabendo ao consumidor comprá-lo ou não, entretanto, se o fornecedor anuncia certo produto por R$1,99, não pode, por lei, cobrar R$2,00.
Tais práticas só perduram porque o consumidor permite. Devemos exercer nosso direito e lutar por ele, como incitava Ihering, abordado no introito deste texto. Lute pelo seu direito, exerça seu papel de cidadão, consumidor e defenda os interesses da sociedade, não deixando que práticas abusivas como esta continuem a perdurar. Guardem esta frase na memória: O troco tem que ser sempre favorável ao consumidor!
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