1- INTRODUÇÃO
Com a Emenda Constitucional nº 45, de 8.12.04, foi criado o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com competência para o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, conforme prevê a Constituição Federal, no artigo 103-B, § 4º.
O Conselho Nacional de Justiça é um órgão integrante do Poder Judiciário, presidido por um Ministro do Supremo Tribunal Federal e composto por quinze membros, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha por maioria absoluta do Senado Federal (CF, art. 103-B e § 2º). Ao Ministro do Superior Tribunal de Justiça cabe exerce a função de Ministro-Corregedor. Dentre os conselheiros, nove são magistrados de diferentes níveis de jurisdição, indicados por tribunais, e seis são externos à magistratura: dois membros do Ministério Público, dois advogados e dois cidadãos.
A criação de um órgão de controle do funcionamento da Justiça causou grande repercussão no âmbito jurídico. A discussão pautou-se acerca da constitucionalidade ou não do Conselho Nacional de Justiça em face dos princípios da separação de poderes e da forma federativa de Estado (CF, art. 60, § 4º, I e III). A questão foi enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal, em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn nº 3.367-DF) proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros.
De acordo com o princípio da separação de poderes, as funções estatais devem ser divididas e atribuídas a órgãos diversos e devem existir mecanismos de controle recíproco entre eles, de modo a proteger os indivíduos contra o abuso potencial de um poder absoluto.
A teoria da separação dos poderes foi consagrada com a obra clássica de Montesquieu. Entretanto, a idéia de que a concentração do poder político nas mãos de um só homem era inconveniente surgiu com Aristóteles, que distinguia as funções do estado em deliberante, executiva e judiciária. No Brasil, o princípio da separação dos poderes está previsto no art. 60, § 4º, III, da Constituição Federal de 1988, constituindo cláusula pétrea.
Dentre os fundamentos jurídicos de que a criação do Conselho Nacional de Justiça viola o princípio da separação dos poderes e o pacto federativo, destaca-se:
-os órgãos do Poder Judiciário dos Estados estarão submetidos a um controle externo, a uma supervisão administrativa, orçamentária, financeira e disciplinar por órgão da União Federal. ( Sustenta-se, aqui, que o referido Conselho é órgão da União Federal, ainda que inserido dentro do Poder Judiciário Federal.)
-o CNJ tem na sua composição membros não integrantes da magistratura, dois dos quais indicados pelo Legislativo, o que representa uma violação da independência do Judiciário.
-a transferência de atribuições fiscalizatórias e correicionais dos Tribunais para o Conselho, bem como a possibilidade de o órgão avocar processos administrativos, viola tal princípio, pois o autogoverno dos Tribunais é da essência da separação de Poderes.
Contrariando tais afirmações, afirma-se, inicialmente, que o Conselho Nacional de Justiça é estruturado como órgão do Poder Judiciário Nacional e não da União, pois, embora o seu orçamento seja da União, isso não transmuda a natureza do órgão. Assim, não há que se falar em subordinação das estruturas estaduais do Judiciário a um órgão do ente central.
As atribuições conferidas pela EC 45/04 ao CNJ - controle administrativo e financeiro do judiciário e controle ético-disciplinar de seus membros - não atingem o autogoverno do Poder Judiciário. A competência privativa dos Tribunais elencadas no artigo 96, da Constituição Federal permanece. No mesmo sentido, o art. 103-B, § 4º, III estabelece que as atribuições do Conselho não prejudicam a competência disciplinar e correicional dos Tribunais.
Nas palavras de Luís Roberto Barroso (2005):
A garantia contra interferências externas é conferida pelo princípio constitucional ao Poder Judiciário em face do Executivo e do Legislativo, não a órgãos do Judiciário em face de outros órgãos do próprio Judiciário, nem de instâncias judiciais superiores em face de instâncias inferiores.
Ademais, cabe frisar que a Constituição Federal não prevê a exclusividade de magistrados de carreira na composição de órgãos do Judiciário. Saliente-se, também, que os conselheiros não representam os órgãos de origem e nem estão subordinados a eles. As suas funções são autônomas e independentes.
Os dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da OAB, e dois representantes do Ministério Público, um da União e outro dos Estados, escolhidos pelo Procurador-Geral da República, não integram o Poder Executivo e foram enquadrados pela Constituição na categoria de funções essenciais à Justiça. Cabe lembrar que o Chefe do Poder Executivo não tem qualquer participação na escolha de tais nomes, cabendo-lhe apenas nomear os indivíduos escolhidos segundo a sistemática do art. 103-B, da Constituição Federal.
O Conselho Nacional de Justiça é órgão nacional e do próprio Judiciário, com atribuições que não se relacionam à atividade privativa do Judiciário e, sim, à fiscalização e à supervisão administrativa. O princípio da separação de poderes não se refere à organização interna de cada Poder e nem a partilha de atribuições entre órgãos de um mesmo Poder. O princípio da forma federativa de Estado, por sua vez, relaciona-se com a autonomia dos entes federados, o que não é atingido pela criação do Conselho Nacional de Justiça.
Portanto, conforme entendimento exposto pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de controle concentrado - Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.367-1/DF, o Conselho Nacional de Justiça além de estar em conformidade com a Constituição, reafirma o princípio federativo, pois tem a função de planejar políticas, de identificar problemas visando o aprimoramento da organização judiciária e da atividade jurisdicional.
BARROSO, Luís Roberto. Constitucionalidade e legitimidade da criação do Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: http://www.migalhas.com.br/arquivo_artigo/luis_roberto1.htm. Acesso em: 14 de fevereiro de 2012, às 23:00 hs.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Dispõe sobre a instituição do Estado Democrático de Direito Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 de janeiro de 2012, às 9h01.
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Método, 2011.
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