O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, nos termos do art. 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988. Impõe-se, portanto, como valor pré-constituinte e de hierarquia acima da constituição, revelando-se, sem dúvida, como valor maior do Estado Democrático brasileiro.
Segundo Paulo Bonavides: “nenhum princípio é mais valioso para compendiar a unidade material da Constituição que o princípio da dignidade da pessoa humana” ¹
No âmbito internacional, além da Constituição de outros países, a dignidade humana também foi o valor que mais inspirou a Declaração Universal de Direitos Humanos.
Cumpre observar, entretanto, que apesar do valor de inconteste magnitude, a dignidade da pessoa humana não pode ser considerada como um princípio absoluto que sempre prevalecerá sobre qualquer outro.
Os limites para direitos de tamanha importância são determinados por outros também protegidos pela Constituição e de igual hierarquia. Em caso de conflitos entre esses direitos, somente poderá ser definido o valor preponderante no caso concreto, analisando-se as peculiaridades de uma determinada situação.
Para exemplificar a relatividade do princípio da dignidade da pessoa humana, podemos imaginar um caso em que exista um conflito atinente à dignidade de mais de uma pessoa ou, até mesmo, um conflito entre a dignidade de uma pessoa e a vida, direito esse de igual importância. Nestes casos, qual valor deverá preponderar? Deverá ser mantida a vida de uma pessoa em estado vegetativo, sem chances de reversão de sua situação clínica e até mesmo com grande sofrimento ou deverá ser autorizada sua morte dignamente?
Como se vê, somente com a análise do caso concreto será possível decidir qual destes valores terá que ser relativizado.
Já decidiu o STF “Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do principio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição.”²
Nesse sentido, Gilmar Mendes cita em seu Curso de Direito Constitucional que, nas palavras de Robert Alexy “o princípio da dignidade da pessoa comporta graus de realização, e o fato de que, sob determinadas condições, com um alto grau de certeza, preceda a todos os outros princípios, isso não lhe confere caráter absoluto, significando apenas que quase não existem razões jurídico-constitucionais que não se deixem comover para uma relação de preferência em favor da dignidade da pessoa sob determinadas condições.”³
Em recente decisão, o plenário do STF discutiu novamente sobre a relatividade do princípio em comento, ao julgar a ADPF 54 ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, quando decidiu por oito votos a dois, pela possibilidade de interrupção da gravidez de fetos anencéfalos. Nela, foi discutido qual princípio ou valor deveria preponderar: a dignidade da pessoa humana da gestante ou o direito à vida e à dignidade do feto humano. Prevaleceu o direito à dignidade da gestante.
Para o relator, Ministro Marco Aurélio, voto vencedor na ADPF, obrigar a mulher a manter esse tipo de gestação significa colocá-la em uma espécie de “cárcere privado em seu próprio corpo”, deixando-a desprovida do mínimo essencial de autodeterminação, o que se assemelha à tortura. Acrescentou ainda que é inadmissível que o direito à vida de um feto sem chances de sobreviver prepondere em detrimento das garantias à dignidade da pessoa humana, à liberdade no campo sexual, à autonomia, à privacidade, à saúde e à integridade física, psicológica e moral da mãe.
Dessa forma, conclui-se que, apesar da importância indiscutível da dignidade da pessoa humana, prevalecendo na maioria dos casos como o valor maior a ser concretizado, é um princípio relativo que se sujeita a ponderações em relação a princípios de mesma natureza ou importância equivalente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MENDES, Gilmar Ferreira, Curso de Direito Constitucional. Brasília: Saraiva, 2009.
ALEXY Robert, Teoria de los derechos fundamentales, Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales, 1993.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RJT 173/807-808, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal ADPF 54?DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Pleno, julgamento em 12.04.2012, publicado no DJ de 20.04.2012.
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