RESUMO. A utilização unicamente odo instrumento da execução fiscal na consecução do objetivo da recuperação dos créditos públicos tem-se mostrado ineficaz, além de ser custoso para a administração Pública. Assim, mostra-se necessário encontrar meios alternativos para o aumento da recuperação destes créditos e o presto de certidões da dívida ativa demonstrou que vale a pena fomentar a utilização deste meios.
Palavras-Chave. Execução Fiscal. Meios alternativos de cobrança. Arrecadação. Protesto de Certidões de Dívida Ativa.
1. INTRODUÇÃO
O Protesto está previsto na Lei nº 9.492/97, que ampliou o poder dos cartórios que, anteriormente, somente podiam protestar títulos de natureza cambial, permitindo-os protestar títulos e outros documentos de dívida, inclusive, aqueles originados unilateralmente pela Fazenda Pública (Certidão de Dívida Ativa).
A Lei nº 9.492/97 assim prevê:
Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.
Art. 2º Os serviços concernentes ao protesto, garantidores da autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei.
Art. 3º Compete privativamente ao Tabelião de Protesto de Títulos, na tutela dos interesses públicos e privados, a protocolização, a intimação, o acolhimento da devolução ou do aceite, o recebimento do pagamento, do título e de outros documentos de dívida, bem como lavrar e registrar o protesto ou acatar a desistência do credor em relação ao mesmo, proceder às averbações, prestar informações e fornecer certidões relativas a todos os atos praticados, na forma desta Lei.
[...]
Art. 9º Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade.
Parágrafo único. Qualquer irregularidade formal observada pelo Tabelião obstará o registro do protesto.
O protesto é um meio eficiente e capaz de coibir o descumprimento da obrigação. Sua utilidade também é de estimular o devedor a saldar a dívida.
Além disso, há um clamor pela redução da judicialização das demandas. Busca-se, dentro da evolução social e jurídica, novas alternativas para redução de demandas judiciais.
Segundo Silvio de Salvo Venosa:
"De há muito o sentido social e jurídico do protesto, mormente aquele denominado facultativo, deixou de ter o sentido unicamente histórico para o qual foi criado. Sabemos nós, juristas ou não, que o protesto funciona como fator psicológico para que a obrigação seja cumprida. Desse modo, a estratégia do protesto se insere no iter do credor para receber seu crédito, independentemente do sentido original consuetudinário do instituto. Trata-se, no mais das vezes, de mais uma tentativa extrajudicial em prol do recebimento do crédito. Ora, por rebuços ou não, o fato é que os juristas tradicionais nunca se preocuparam com esse aspecto do protesto, como se isso transmitisse uma capitis deminutio ao instituto do protesto e a sua Ciência. Não pode, porém, o cultor do direito e o magistrado ignorar a realidade social. Esse aspecto não passa desapercebido na atualidade" [1]
Atende-se, com esta medida, ao interesse público de pacificação social, respondendo mais imediatamente à sociedade, diminuindo a sensação de impunidade com relação à inadimplência do crédito público.
Viabiliza-se também o atendimento na via extrajudicial do recebimento da obrigação, sem que sejam necessárias outras providências legais, tais como um processo executivo, o que em última análise é o objetivo do credor público ou privado com o protesto.
Com tais medidas, repita-se, há a redução das demandas executivas fiscais, desafogando o Poder Judiciário e em consequência, melhorando também a prestação jurisdicional. Preserva-se a garantia constitucional de acesso à justiça e unicidade de jurisdição.
2. DESENVOLVIMENTO
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu, em 13/04/2010, recomendar aos tribunais estaduais a edição de ato normativo para regulamentar a possibilidade de protesto de certidão de dívida ativa (CDA). Ao analisar um pedido de providência da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o Plenário do CNJ considerou legal a polêmica forma de cobrança, questionada pelos contribuintes em recurso repetitivo no Superior Tribunal de Justiça (STJ). E foi mais além, definindo que as custas cartorárias devem ser pagas pelo devedor, quando for quitado o débito.
Neste diapasão, há ainda jurisprudência administrativa da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, que diz o seguinte :
“Que o intérprete não se deixe obnubilar por considerações sobre as origens do protesto, que o vinculam ao direito cambiário. Não se nega a história do instituto, que inclusive faz compreensível, por amor à tradição e para distingui-lo do protesto judicial, denominá-lo, eventualmente, protesto cambial, mesmo após o advento de diploma especial de regência que não adota tal nomenclatura, qual seja a Lei nº 9.492/97. Mas falta base para pretender que dito instituto permaneça eternamente agrilhoado ao berço, sem horizonte algum. Não será a primeira vez que uma figura jurídica originalmente concebida para viger num universo mais apertado terá seu espectro expandido com vistas ao atendimento de outras situações compatíveis com sua natureza, por força de necessidades ditadas pelo desenvolvimento das relações jurídicas e pelo próprio interesse social.
Assim sendo, em agosto de 2010 assinou-se um convênio entre a Procuradoria-Geral Federal (PGF), órgão da Advocacia-Geral da União que representa judicial e extrajudicialmente 154 (cento e cinquenta e quatro) Autarquias e Fundações Públicas Federais e o Instituto de Estudos de Títulos e Protestos do Brasil (IEPTB), entidade que representa a grande maioria dos Tabelionatos de Protesto no país. Através deste instrumento, permitiu-se a PGF encaminhar a protesto as certidões de dívida ativa das Autarquias e Fundações Públicas Federais sem o pagamento dos emolumentos prévios, que são cobrados dos devedores estas entidades.
O projeto-piloto do protesto de Certidões de Dívida Ativa foi lançado no mês de outubro de 2010 em duas unidades das PGF, em São Paulo e no Rio de Janeiro, com créditos de duas entidades, INMETRO e ANP e até junho daquele ano foram atingidos resultados relevantes.
Foram recuperados R$ 1.485.943,74 (um milhão, quatrocentos e oitenta e cinco mil, novecentos e quarenta e três reais e setenta e quatro centavos), aos cofres das entidades credoras, atingindo-se o percentual de 32,44% (trinta e dois virgula quarenta e quatro por cento) dos valores efetivamente processados pelos Tabelionatos.
Convém ressalvar que 90% (noventa por cento) destes valores foram percebidos em três dias, ou seja, no tríduo anterior ao protesto.
Se tratarmos somente dos números de 2011, os resultados são ainda mais expressivos:
a) 2.442 CDAs foram protestadas;
b) 1.071 foram pagas, atingindo-se um percentual superior a 43% de recuperação referente ao total de títulos protestados;
c) Em valores, R$ 5.929.790,88 foram efetivamente protestados e R$ 3.195.734,30 foram pagos, atingindo-se um percentual superior a 53% sobre o total protestado;
No primeiro semestre de 2012, da mesma forma que nos anos anteriores, resultados expressivos foram alcançados.
Foram 3479 (três mil, quatrocentos e setenta e nove) CDAs encaminhadas a protesto, cujos valores atingiram a quantia de R$ 7.827.372,26 (sete milhões, oitocentos e vinte e sete mil, trezentos e setenta e dois reais e vinte e seis centavos). Foram recuperados R$ 3.424.767,65, (três milhões, quatrocentos e vinte e quatro mil, setecentos e sessenta e sete reais e sessenta e cinco centavos) atingindo-se o percentual de 46,59% (quarenta e seis virgula cinquenta e nove por cento) de recuperação. Destes, 92% (noventa e dois por cento), ou R$ 2.885.192,74 (dois milhões, oitocentos e oitenta e cinco mil, cento e noventa e dois reais e setenta e quatro centavos), foram recuperados em três dias, ou seja, no tríduo anterior ao protesto ser efetivado.
No mês de fevereiro de 2012, na unidade da PGF em São Paulo, 85% (oitenta e cinco por cento) dos valores encaminhados a protesto foram recuperados, superando R$ 90.000,00 (noventa mil reais), em três dias!
No mês de agosto deste ano, na unidade da PGF no Rio de Janeiro, foram recebidos em três dias R$ 1.348.338,63 (um milhão, trezentos e quarenta e oito mil, trezentos e trinta e oito reais e sessenta e três centavos), atingindo 71,09% sobre o valor total efetivo, (setenta e um vírgula nove por cento), um recorde de arrecadação num único mês.
No quadro geral, reunindo todas as CDAs enviadas a protesto desde outubro de 2010 até junho de 2012, da mesma forma os números são muito relevantes:
a) 8.174 CDAs enviadas a protesto;
b) 5.084 efetivamente protestadas;
c) 2.257 pagas, das quais 2.013 em três dias;
d) Em valores, R$ 20.078.663,56 enviados a protesto;
e) Recuperados R$ 7.086.201,32, 37,89% dos valores;
f) R$ 6.484,065,99, 96,80% em três dias.
Comparando esse percentual aos índices apresentados pelo Instituto de Pesquisas e Economia Aplicada (IPEA)[2] no estudo sobre o custo unitário do processo de execução fiscal, em que se conclui que um processo de execução fiscal dura, em média, oito anos e dois meses para ser concluído, além de ter um custo individual de aproximadamente de R$ 4.400,00 (quatro mil e quatrocentos reais) somente para o poder judiciário, revela-se a opção pela via extrajudicial expressiva e extremamente célere, menos onerosa para os cofres públicos, fortalecendo-se o princípio da desjudicialização dos processos quando se tem outros meios mais eficazes para a recuperação dos créditos.
Em 2011, ainda foi possível incluir no projeto as unidades da primeira região (PRF1) e da quinta (PRF5), bem como duas importantes entidades representadas pela PGF, a ANTT e a ANATEL.
Em 2012 já foram incluídas outras unidades estaduais da PGF, tais quais, a PF/MG, PF/TO, PF/SC, PF/AM, PF/PB, PF/RR e PF/MA,PF/AC e PF/ES, além do IBAMA.
As próximas metas para este exitoso projeto serão incluir todas as unidades estaduais da PGF em que haja a autorização administrava, do Tribunal de Justiça local, ou lei estadual autorizando os cartórios a não cobrarem os emolumentos prévios da União, bem como outras autarquias e fundações públicas federais representadas.
Em consonância com os argumentos acima expendidos, é ainda imperioso trazer à baila importante precedente do Tribunal de Justiça de São Paulo que abordou todos os aspectos desta questão:
Tribunal de Justiça de São Paulo
Apelação Com Revisão 4474975500
Relator(a): Eutálio Porto
Comarca: Araraquara
Órgão julgador: 15ª Câmara de Direito Público
Data do julgamento: 30/10/2008
Data de registro: 23/06/2009
APELAÇÃO - Ação Anulatória - ISS - Auto de infração - Protesto - Possibilidade de protesto - Inteligência do art. 1º, da Lei 9.492/97, que amplia a competência dos cartórios para protestarem outros títulos de dívida que não sejam apenas cambiais - Existência de Lei Municipal autorizando a Fazenda Pública a enviar a protesto certidões de dívida ativa - Competência do Município para regular os mecanismos extrajudiciais para satisfação do crédito - Sentença reformada - Recurso provido
[...]
A questão sobre a possibilidade de a Fazenda Pública protestar certidões de dívida ativa é controvertida, porém há sustentação legal que torna viável a consecução do ato.
O inciso II do art. 5º da Constituição Federal diz que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei e, por isso, para que os atos administrativos tenham validade, torna-se imprescindível a existência de norma, pois vige a máxima segundo a qual enquanto o administrador público somente pode fazer o que a lei permite, o privado pode fazer tudo que a lei não proíbe.
No caso em tela, existe tanto lei autorizando os cartórios a protestar certidão de dívida ativa, quanto lei autorizando a Fazenda Pública a enviar a protesto certidões de seus créditos tributários.
Diz o art. 1º da Lei 9.492/97 que "protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplênciae o descumprimento de obrigações originadas em títulos e outros documentos de dívida".
Essa norma ampliou o poder dos cartórios que, anteriormente, somente podiam protestar títulos de natureza cambial, permitindo-se agora protestar títulos e outros documentos de dívida, inserindo, inclusive, aqueles originados unilateralmente pela Fazenda Pública.
[...]
Com efeito, inscrito o débito na forma do art. 202 do Código Tributário Nacional, nada impede que a Fazenda Pública utilize meios judiciais e extrajudiciais para obter a satisfação do seu crédito, podendo, para tanto, notificar o devedor, efetivar cobrança amigável, promover acordos extrajudiciais e até o protesto do título, bastando que exista lei do ente federativo tributante para assim proceder.
[...]
É sabido que na esfera judicial a regra a ser seguida é a que consta da Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/80), mas, extrajudicialmente, não há dispositivo próprio, tendo o legislador constituinte deixado ao livre arbítrio do legislador infraconstitucional a regulamentação da matéria.
[...]
O ex-Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Luiz Elias Tombara, em outubro de 2005, suspendeu liminar a pedido da Procuradoria Geral da Justiça do Estado, que impedia o protesto de certidões de dívidas ativas não pagas à Fazenda Estadual. Sustentou o eminente Desembargador a existência de plausibilidade na tese sustentada pela Fazenda Pública, especialmente porque este ato visa estimular o pagamento, proporcionando "maior arrecadação tributária" e, ao mesmo tempo, evitar a propositura de execução fiscal (processo n° 126.917.0/4-00).
A liminar concedida foi objeto de agravo regimental, ao qual foi negado provimento em plenária do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ocorrida no dia 22 de março de 2006.
De forma que o uso de meios extrajudiciais para que o Município obtenha a satisfação do seu crédito encontra-se em simetria com o moderno processo administrativo, que tem autorizado, com certos limites, o uso de meios céleres para a perseguição de valores diversos antes mesmo do ajuizamento de ação, bem como o uso de mecanismos que garantam maior segurança à Fazenda Pública, tais como o arrolamento de bens previsto na Lei n° 10.522/2002, a quebra de sigilo bancário autorizada pela Lei Complementar 105/01, além de outros procedimentos admitidos quando do processo fiscal.
Senão por isso, recentemente foi promulgada a Lei n° 11.232/05, que objetiva dar maior celeridade às execuções, sendo certo, ainda, que a lei de responsabilidade fiscal (Lei Complementar n° 101/01) dispôs no art. 11 que constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a efetiva arrecadação de todos os tributos de competência do ente da Federação, devendo, com isto, o gestor da coisa pública utilizar mecanismos não só para lançar o tributo, que é ato vinculado, mas também para exigir o seu pagamento.
Com efeito, a possibilidade de protesto da certidão de dívida ativa da Fazenda Pública, se por um lado é uma medida legal, por outro não deixa de contribuir para o princípio da economia processual, pois não raro diversas execuções de valor antieconômico são ajuizadas, acabando por abarrotar o Judiciário de processos, cujo gasto para a execução acaba sendo maior do que o próprio débito perseguido, mas que deve o Judiciário absorver a demanda quando proposta, em cumprimento ao princípio do devido processo legal, e, ademais, não se pode proibir que a Fazenda Pública utilize outros meios que visam acelerar o recebimento de seu crédito.
Há, ainda, informação que a medida tem surtido efeitos concretos, pois a Fazenda Pública estadual promoveu o protesto de algumas certidões de dívida ativa, tendo recuperado, com isso, cerca de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), ou seja, 36% dos contribuintes protestados pagaram ou parcelaram seus débitos, havendo ainda informação que igual medida foi adotada com sucesso no Município de Campinas.
Por derradeiro, é de se observar que não há qualquer vilipendio ao direito do cidadão, de sua intimidade, vida privada e honra, com o envio de seu nome ao cartório de protesto quando verificada a existência de débito, pois tal medida, antes de ser contra o contribuinte que não cumpre seu compromisso com a Fazenda Pública, é a favor da sociedade.
3. CONCLUSÃO
Por todo o exposto, com base nos princípios da legalidade (Lei nº 9.492/97), da publicidade, da economia processual, da eficiência, da menor onerosidade ao devedor e da utilidade do processo de execução, entende-se que existe possibilidade de protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA) pela Fazenda Pública, por falta de pagamento do crédito exequendo.
Com os resultados alcançados, justifica-se, portanto, a priorização na utilização dos meios alternativos de cobrança visando a recuperação dos créditos das Autarquias e Fundações Públicas Federais, tais como o protesto, que atualmente mostra-se a ferramenta mais célere e eficaz na recuperação dos valores devidos a tais entidades.
Referências
1 - Silvio de Salvo Venosa. Direito Civil, 3ª ed., Atlas, São Paulo, 2003, págs. 470/471.
2 - Custo Unitário do processo de execução fiscal. IPEA. Disponível em <http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/comunicado/110331_comunicadoipea83.pdf>
Procurador Federal. Coordenador-Geral de Cobrança e Recuperação de Créditos da Procuradoria-Geral Federal. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC Campinas e Especialista em Direito Público pela Universidade Federal de Brasília.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MUNHOZ, Fabio. O Protesto de Certidões de Dívida Ativa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 nov 2012, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/32588/o-protesto-de-certidoes-de-divida-ativa. Acesso em: 22 nov 2024.
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