RESUMO[1]: Este artigo objetiva esclarecer quanto à legalidade da instituição, cobrança e arrecadação da CSR – Contribuição Sindical Rural, especialmente no que concerne à capacidade ativa atribuída pela União à CNA – Confederação Nacional da Agricultura para arrecadação e aplicação do tributo, não obstante ser a CNA – Confederação Nacional da Agricultura ente privado, e a base de incidência da referida contribuição ser aparentemente idêntica à base de cálculo do ITR – Imposto Territorial Rural, cuja competência de instituição, cobrança e arrecadação pertence também à União. Neste sentido, caberá elucidar quanto à existência de “bis in idem” no que diz respeito à base de cálculo do ITR – Imposto Territorial Rural, bem como enfatizar o posicionamento divergente da jurisprudência nas ações de cobrança da CSR – Contribuição Sindical Rural, especialmente no que tange à constitucionalidade da súmula 396 do STJ. Será evidenciado ainda, a natureza jurídica dos órgãos parafiscais e seu posicionamento dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Isto devido à amplitude da arrecadação do tributo dentre os proprietários de terra, inclusive pequenos produtores, já que a maioria se enquadra nos requisitos de cobrança estabelecidos no artigo 1º do Decreto-lei 1.166/71. Este instrumento foi elaborado com base no Direito Positivo, pesquisa jurisprudencial e doutrinária, com o objetivo de explicar (i)legalidade da referida contribuição, bem como de sua cobrança e arrecadação.
Palavras chave: Contribuição Sindical Rural.Confederação Nacional da Agricultura.Capacidade Ativa.
Introdução
Há muito vem se discutindo sobre a legalidade de instituição, cobrança e arrecadação da CSR – Contribuição Sindical Rural, prevista no rol das contribuições sociais, elencadas no artigo 149 da Constituição Federal.
Todavia, pouco tem se estudado sobre o tema, o que vem acarretando em uma gama de entendimentos jurisprudenciais cada vez mais divergentes e prejudiciais tanto para o proprietário sujeito ao pagamento, quanto para o ente que se aproveita da arrecadação.
A CSR – Contribuição Sindical Rural é contribuição de competência da União, cuja delegação de cobrança e arrecadação foi delegada à CNA – Confederação Nacional da Agricultura, apesar de esta, ser ente privado, o que em tese seria de plano inconstitucional.
Tal contribuição possui base de cálculo com incidência na propriedade rural, ou seja, aparentemente a mesma base de cálculo do ITR – Imposto Territorial Rural, o que poderia ser considerado como “bis in idem”, já que a União também é o sujeito ativo do ITR – Imposto Territorial Rural, seria então o mesmo ente tributando duplamente sobre a mesma base de cálculo.
Neste sentido, torna-se essencial esclarecer sobre a legalidade do tributo, a capacidade ativa da CNA – Confederação Nacional da Agricultura, bem como sua natureza jurídica de órgão parafiscal, diferenciando as bases de cálculo de cada tributo e a existência ou não de “bis in idem” nas espécies.
A importância desse estudo se dá devido à ampla arrecadação da contribuição dentre os proprietários de terra, inclusive os pequenos produtores, uma vez que a grande maioria se enquadra nos requisitos de cobrança estabelecidos no artigo 1º do Decreto-lei 1.166/71, e não compreendem a imposição da referida contribuição já que efetuam o pagamento do ITR – Imposto Territorial Rural.
Cumpre ressaltar que apesar de muitos proprietários tratarem a CSR – Contribuição Sindical Rural como tributo novo, tal cobrança compulsória já era realizada, todavia conjuntamente com o ITR – Imposto Territorial Rural.
Contudo, somente após o desmembramento da contribuição do ITR – Imposto Territorial Rural e delegação de cobrança, arrecadação e aplicação à CNA – Confederação Nacional da Agricultura é que se passou a questionar a instituição da CSR – Contribuição Sindical Rural.
Mesmo após o posicionamento do STJ sobre o tema, com a edição da súmula 396, ainda não é pacífico na jurisprudência a legalidade da contribuição nem tampouco sua arrecadação por ente privado, quando esta deveria teoricamente ser atribuída a ente público.
Assim sendo, faz-se indispensável uma análise do tema, vez que sustenta enormes controvérsias jurisprudenciais, rara exposição doutrinária e enorme repercussão social.
Para o desenvolvimento desse estudo, serão abordados os seguintes temas:
1. Da Contribuição Sindical Rural: instituição, cobrança e arrecadação;
2. Da existência de “bis in idem” entre o ITR e a CSR;
3. Dos órgãos parafiscais no ordenamento jurídico brasileiro;
4. Da (in)constitucionalidade da súmula 396 do STJ e da (in)capacidade ativa da CNA.
1. Da Contribuição Sindical Rural: instituição, cobrança e arrecadação.
A CSR – Contribuição Sindical Rural, prevista no artigo 149 da Constituição Federal, elencada no rol das contribuições sociais, foi disciplinada pelos artigos 578 e 579 da CLT, com regulamentação dada pelo Decreto-lei 1.166/71.
O artigo 149 da Constituição Federal institui a cobrança, destacando para tanto a competência ativa da União no que concerne às contribuições sociais, conforme segue.
Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º., relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. (original sem grifo. Constituição Federal de 1988)
Já a CLT, em seus artigos 578 e 579, disciplina a matéria, inclusive evidenciando como legítima a cobrança pela CNA – Confederação Nacional da Agricultura.
Art. 578. As contribuições devidas aos Sindicatos pelos que participem das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de “contribuição sindical”, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo.
Art. 579. A contribuição sindical é devida por todos aqueles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do Sindicato representativo da mesma categoria ou profissão, ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 (original sem grifo).
No que diz respeito ao caráter compulsório das referidas contribuições, apesar de o Brasil não ser signatário da Convenção 87 da OIT, o artigo 8º da Constituição da República, evidencia a liberdade da filiação sindical, todavia, com ressalva no que diz respeito às contribuições sociais instituídas por lei, destacando assim o caráter compulsório, face à sua natureza tributária.
Art. 8. É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
[...]
IV – a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei.
[…] (original sem grifo).
O Decreto-lei 1.166/71 que regulamenta a matéria atribuía a competência de lançamento e cobrança da CSR ao INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, em seu artigo 9º.
Todavia, com o advento da Lei 8.022/90, a competência para a cobrança da contribuição foi transferida para a Secretaria da Receita Federal, onde a cobrança era feita conjuntamente com o ITR – Imposto Territorial Rural.
Não obstante, a Lei 8.847/94 alterou mais uma vez a competência para a cobrança das supramencionadas contribuições, transferindo-a, dessa vez, para a CNA – Confederação Nacional da Agricultura.
Com a edição da referida Lei a Secretaria da Receita federal estabeleceu o prazo de 31/12/1996 para o recolhimento das contribuições em favor da CNA – Confederação Nacional da Agricultura, desvencilhando-se da cobrança do ITR – Imposto Territorial Rural e reafirmando a legitimidade da Confederação.
Art. 24. A competência de administração das seguintes receitas, atualmente arrecadadas pela Secretaria da Receita Federal por força do artigo 1° da Lei n° 8.022, de 12 de abril de 1990, cessará em 31 de dezembro de 1996:
I - Contribuição Sindical Rural, devida à Confederação Nacional da Agricultura e à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, de acordo com o artigo 4° do Decreto-lei n° 1.166, de 15 de abril de 1971, e artigo 580 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. (original sem grifo).
A partir de então, foi editada a Lei 9.393/96 que permite a celebração de convênios entre a Secretaria da Receita Federal e a CNA – Confederação Nacional da Agricultura, no intuito de fornecimento de dados cadastrais de imóveis rurais, para o possível enquadramento do contribuinte e posterior cobrança do tributo.
Art. 17. A Secretaria da Receita Federal poderá, também, celebrar convênios com:
(...)
II - a Confederação Nacional da Agricultura - CNA e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, com a finalidade de fornecer dados cadastrais de imóveis rurais que possibilitem a cobrança das contribuições sindicais devidas àquelas entidades. (original sem grifo, Lei 9.393/96).
O enquadramento sindical do contribuinte é previsto no artigo 1º, do Decreto-Lei 1.166/71, com redação dada pelo artigo 5º, da Lei 9.701/98 que estabelece os sujeitos passivos da obrigação tributária.
Art. 1º - Para efeito da cobrança da contribuição sindical rural prevista nos arts. 149 da Constituição Federal e 578 a 591 da Consolidação das Leis do Trabalho, considera-se:
I - trabalhador rural:
a) a pessoa física que presta serviço a empregador rural mediante remuneração de qualquer espécie;
b) quem, proprietário ou não, trabalhe individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, ainda que com ajuda eventual de terceiros;
II - empresário ou empregador rural:
a) a pessoa física ou jurídica que, tendo empregado, empreende, a qualquer título, atividade econômica rural;
b) quem, proprietário ou não, e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área superior a dois módulos rurais da respectiva região;
c) os proprietários de mais de um imóvel rural, desde que a soma de suas áreas seja superior a dois módulos rurais da respectiva região.
Assim, todo o trabalhador rural, ou empresário rural que explore ou não atividade rural, está obrigado ao pagamento da contribuição.
Cumpre ressaltar que quanto à arrecadação, preceitua o artigo 589 da CLT que 60% da arrecadação é destinada ao sindicato da base territorial da cobrança, 20% ao MTE – Ministério do Trabalho e Emprego (conta especial emprego e salário), 15% para a Federação e os outros 5% vão para a Confederação correspondente.
A aplicação da receita é revertida em benefício do contribuinte, em forma de fomento à agricultura e pecuária, com promoções de cursos, palestras, assistência técnica e demais forças de aperfeiçoamento da atividade rural.
2. Da existência de “bis in idem” entre o ITR e a CSR
A maior discussão em torno da legalidade de cobrança da CSR – Contribuição Sindical Rural gira em torno da existência ou não de “bis in idem” entre as espécies tributárias ITR e CSR. Isto, devido apresentarem bases de cálculo idênticas em ambos os casos.
Cumpre ressaltar que, apesar de muitos levantarem a ideia de também haver bitributação, esta desde logo deve ser afastada tendo em vista de que nesse caso haveria dois entes distintos tributando sobre a mesma hipótese de incidência, o que não tem nada haver com o caso em apreço.
Tanto o ITR quanto a CSR são de competência da União, apesar de o lançamento e cobrança terem sido delegados à CNA, mas não tendo esta competência para instituí-la, fenômeno que damos o nome de parafiscalidade, como será abordado adiante.
A Constituição Federal veda a existência de “bis in idem”, no que se refere aos impostos e taxas, entretanto nada manifesta no que diz respeito às contribuições sociais.
Art. 154. A União poderá instituir:
I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição;
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
§ 2º - As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos (original sem grifo)
Neste passo, temos que CSR não se enquadra nas vedações constitucionais além de possuir natureza e finalidade distintas do ITR, uma vez que destinada a custear as entidades sindicais.
A jurisprudência majoritária também é adepta de tal posicionamento, conforme se extrai das ementas dos tribunais superiores.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. BITRIBUTAÇÃO. Aparente divergência jurisprudencial, nos moldes do art. 896, 'a', da CLT, a ensejar o provimento do agravo de instrumento, nos termos do artigo 3º da Resolução Administrativa nº 928/2003. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. BITRIBUTAÇÃO. A Corte de origem negou provimento ao recurso ordinário da autora ao fundamento de que a contribuição sindical rural que é objeto de cobrança tem a mesma base de cálculo do imposto territorial rural-, em afronta ao art. 154, I, da Constituição da República, porquanto a vedação nele insculpida não incide na hipótese de contribuições sociais. Recurso de revista conhecida e provido (TST, RR - 56640-64.2006.5.02.0088, Relatora Ministra: Rosa Maria Weber, Data de Julgamento: 28/04/2010, 3ª Turma, Data de Publicação: 14/05/2010).
RECURSO DE REVISTA - CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL - CONSTITUCIONALIDADE - AUSÊNCIA DE BITRIBUTAÇÃO A contribuição sindical rural, por se tratar de contribuição social, não está sujeita à regra da vedação à bitributação. Precedentes do Excelso STF. Recurso de Revista conhecido e provido (TST, RR - 190700-90.2007.5.09.0072, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 18/11/2009, 8ª Turma, Data de Publicação: 20/11/2009).
O STF também firmou entendimento no sentido de não haver bitributação, apesar da infelicidade na aplicação do termo, quando o correto seria ausência de “bis in idem”.
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. 1. RECEPÇÃO DO DECRETO-LEI N. 1.166/71. 2. ALEGAÇÃO DE BITRIBUTAÇÃO: INAPLICABILIDADE DO ART. 154 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 3. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS PARA COBRANÇA DA CONTRIBUIÇÃO: AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA CONSTITUCIONAL (SÚMULAS 282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL). IMPOSSIBILIDADE DA ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(AI 765246 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 24/08/2010, DJe-179 DIVULG 23-09-2010 PUBLIC 24-09-2010 EMENT VOL-02416-09 PP-01919)
Nessa esteira não haveria que se falar em bitributação, nem tampouco em “bis in idem”, vez que não se aplica às contribuições sociais o disposto nos artigos 154, inciso I e 145, § 2º da Constituição Federal.
Entretanto, fazendo um estudo mais aprofundado, abordamos a questão do “bis in idem” sob um novo enfoque, ainda não explorado.
A questão deve ser analisada caso a caso, ou melhor a análise deve ser feita tomando-se por base cada um dos incisos e alíneas do artigo 1º do decreto-lei 1.166/71, uma vez que de acordo com o referido artigo não é em todos os casos que a base de cálculo é a mesma explorada pelo ITR. Senão, vejamos:
Art. 1º - Para efeito da cobrança da contribuição sindical rural prevista nos arts. 149 da Constituição Federal e 578 a 591 da Consolidação das Leis do Trabalho, considera-se:
I - trabalhador rural:
a) a pessoa física que presta serviço a empregador rural mediante remuneração de qualquer espécie;
b) quem, proprietário ou não, trabalhe individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, ainda que com ajuda eventual de terceiros;
II - empresário ou empregador rural:
a) a pessoa física ou jurídica que, tendo empregado, empreende, a qualquer título, atividade econômica rural;
b) quem, proprietário ou não, e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área superior a dois módulos rurais da respectiva região;
c) os proprietários de mais de um imóvel rural, desde que a soma de suas áreas seja superior a dois módulos rurais da respectiva região.
Importante salientar que somente no inciso II, alínea “c”, conseguimos identificar a possibilidade de “bis in idem”, pois trata-se de incidência da contribuição sobre a terra nua, bastando somente ser proprietário de área superior a dois módulos rurais para tornar-se sujeito passivo da obrigação.
Nos demais casos, não basta ser proprietário ou empregado, é necessário que explore atividade rural.
Ademais, outro argumento que faria cair por terra a existência de “bis in idem”, inclusive no exposto na alínea “c”, é que para o lançamento da CSR leva-se em consideração o tamanho do módulo rural e não do módulo fiscal como é o caso do ITR.
O módulo fiscal é a quantidade equivalente de hectares em determinada região, levando-se em conta a terra nua.
Já o módulo rural, é a quantidade equivalente de hectares em determinada região, mas levando-se em consideração a produção, a capacidade produtiva da área e o tipo de produção da propriedade, conforme informações prestadas pelo próprio contribuinte à Receita Federal quando da declaração de ITR.
3. Dos órgãos parafiscais no ordenamento jurídico brasileiro
Conforme tratado anteriormente, a CNA detém capacidade ativa para o lançamento e cobrança da CSR, sendo que a capacidade de instituição do tributo continua a pertencer à União.
Isto porque o artigo 149 da Constituição da República determinou como competência da União a instituição de contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas.
Nesse diapasão, elegeu-se o nome de parafiscalidade para designar este novo tipo de tributo, que possui natureza diversa dos demais, onde órgãos privados, que não são o próprio Estado, possuem capacidade para arrecadação do tributo em benefício das suas próprias finalidades.
Parafiscalidade, no entendimento doutrinário, significa o emprego de finanças públicas com objetivos não tributários, ou seja, quando o objetivo do tributo é arrecadação para atividades que não integram funções próprias do Estado.
Em suma, importante ressaltar o entendimento de Alfredo Augusto Becker, que enfatiza a finalidade dos tributos parafiscais dentro de um ordenamento jurídico.
Os tributos ditos parafiscais são instituídos, não para obtenção de Receita, mas para regular ou modificar a distribuição da riqueza nacional, para equilibrar os níveis de preços de utilidades ou de salários, e para outras finalidades econômicas ou sociais semelhantes (BECKER, 2010, p.409).
Assim, o que acontece no caso sob espeque é a delegação da competência tributária para cobrança e arrecadação de tais contribuições e não da capacidade tributária ativa, capacidade para instituir tributos, exclusiva da União.
4. Do (in)constitucionalidade da súmula 396 do STJ e da (in)capacidade ativa da CNA
Ao se posicionar sobre o tema, o STJ editou a súmula 396, na qual reconheceu a legitimidade ativa da CNA para a cobrança da CSR.
“A Confederação Nacional da Agricultura tem legitimidade ativa para a cobrança da contribuição sindical rural. (Súmula 396, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 07/10/2009)
Segundo o posicionamento de alguns doutrinadores, como Kiyoshi Harada, a edição da referida súmula implicou na recriação de um tributo já extinto.
Entende o emérito doutrinador, que após a edição da Lei 8.847/94, quando a competência arrecadatória passou do INCRA para a Secretaria da Receita Federal, houve expressa disposição no artigo 24, inciso I da referida lei, que tal competência cessaria me 31 de dezembro de 1.996. Momento em que a competência seria transferida à CNA.
Contudo, não houve edição de nova lei instituindo a CNA como competente para arrecadação do tributo após cessada a cobrança pela Secretaria da Receita Federal.
Nesse contexto, o posicionamento de Kiyoshi Harada, que define como inexistente a Contribuição Sindical Rural, bem como inconstitucional o posicionamento adotado pelo STJ.
Ora, se a lei deixou de designar o novo titular da imposição tributária, a contribuição sindical patronal rural deixou de ter existência no mundo jurídico. Nem a doutrina, nem a jurisprudência podem ressuscitá-la. Somente a lei tem esse poder. [...] No caso sob exame falta um dos elementos do fato gerador, qual seja, o elemento subjetivo ativo, representado por uma das entidades políticas tributantes ou suas autarquias. Nenhum ente privado pode ser sujeito ativo de tributo. A súmula em questão implicou recriação de um tributo extinto pelo decurso de prazo legalmente previsto... (HARADA, 2013).
Portanto, compreende-se que não houve edição de lei específica delegando competência tributária ativa à CNA, apesar de o STJ e a jurisprudência dominante dos tribunais posicionar-se de maneira diversa, reconhecendo a competência da CNA para cobrança e arrecadação do tributo, ainda que destinatária da própria receita.
Conclusão
Apesar da ausência de lei específica disciplinando a competência ativa da CNA para a cobrança e arrecadação do tributo, têm-se que esta é pertinente, por força da Lei 8.847/94 que a determina como destinatária da contribuição, bem como por força da súmula 396 do STJ que reafirma tal competência.
No que tange a existência de “bis in idem” nas espécies ITR e CSR, têm-se que esta não procede, já que as bases de cálculo apesar de aparentemente idênticas não são iguais e as finalidades dos tributos possuem naturezas diversas.
A CSR intitula-se ainda como contribuição parafiscal, onde a arrecadação da receita é feita por órgão privado em seu próprio benefício, sendo classificada na doutrina como sui generis, uma nova espécie de tributo que não possui semelhança nem com a natureza jurídica dos impostos e nem tampouco com a das taxas.
Diante de todas as controvérsias existentes acerca do tema, percebe-se cada vez mais, na prática, decisões mal fundamentadas, bem como ausência de contestação em várias ações de cobrança promovidas pela CNA, na maioria das vezes por falta de conhecimento.
Muitos contribuintes alegam não saberem do que se trata a referida contribuição e confirmam a orientação de seus contadores a não procederam ao recolhimentos da CSR.
Todavia, cumpre ressaltar que até o momento a CSR continua possuindo caráter compulsório e sendo devida e obrigatória por todos aqueles que se enquadrarem nas hipóteses do artigo 1º, do Decreto-Lei 1.166/71.
Assim sendo, para abrandarmos a discussão, necessária se faz a edição de legislação específica sobre o tema, reafirmando a competência ativa da CNA para a cobrança da CSR, bem como determinando outras questões que ainda continuam controversas, face ao emaranhado de leis que disciplinam a CSR, como por exemplo a questão dos juros aplicados nas execuções das ações de cobrança, que não vieram previstos na lei 8.847/96, ficando este ao bel prazer do magistrado.
Referências Bibliográficas
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 5ª ed. São Paulo: Noeses, 2010.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 2012.
Canal do produtor. Disponível em: http://www.canaldoprodutor.com.br. Acesso em: 05 de maio de 2013.
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11ª.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
HARADA, Kiyoshi. Contribuição Sindical Patronal Rural: exame da súmula 396 do STJ. Harada Advogados. São Paulo, 19 mar. 2012. Disponível em: http://www.haradaadvogados.com.br. Acesso em: 30 de maio de 2013.
MARZAGÃO, Luís Felipe Bretas. A legalidade da contribuição sindical rural e sua cobrança pela Confederação Nacional da Agricultura. Jus Navigandi. Teresina, ano 7, n. 56, 01 abr. 2002. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/2840. Acesso em: 28 de maio de 2013.
ROCHA, Marcelo Hugo da. Contribuições parafiscais. Jus Navigandi. Teresina, ano 4, n. 37, 01 dez. 1999. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/1420. Acesso em: 30 de maio de 2013.
STF, Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 10 de maio de 2013.
STJ, Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: http://www.stj.jus.br. Acesso em: 10 de maio de 2013.
TST, Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: http://www.tst.jus.br. Acesso em: 10 de maio de 2013.
Nota:
[1] Orientador: Prof. Ms. Douglas Luis Oliveira
Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Heloine Pereira dos. Contribuição Sindical Rural: (I)legalidade e (In)capacidade ativa da CNA - Confederação Nacional da Agricultura Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 set 2013, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36470/contribuicao-sindical-rural-i-legalidade-e-in-capacidade-ativa-da-cna-confederacao-nacional-da-agricultura. Acesso em: 22 nov 2024.
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