Para os que militam na área é um termo conhecido, óbvio e não suscita nenhuma indagação, entretanto, para aqueles que são novos na batalha processual penal do cotidiano ou para os interessados no tema, a fiança pode apresentar algumas particularidades, até então, desconhecidas.
Sendo uma garantia patrimonial, podemos afirmar que a fiança é uma caução real que serve, incialmente, para o pagamento de multa, despesas processuais e indenização caso o imputado seja condenado.
O que pouca gente percebe é que a fiança, também, é um fator inibidor de fuga. É ela que, em muitas ocasiões, inibe o agente imputado de pensar em uma fuga, pois se o valor arbitrado da fiança for elevado, certamente, vai desestimular a sua fuga e, consequentemente, garantir a aplicação da lei caso venha a ser condenado.
Dessa forma, podemos visualizar o binômio “gravidade do crime” e “condição econômica do imputado” como pilares de aplicação da fiança.
Como o assunto em tela é bem complexo, permito-me, aqui, fazer breves considerações acerca do instituto para que aqueles que não possuem o conhecimento técnico tenham um pouco mais de conhecimento além do que ouvem, de forma muitas vezes equivocada, o que realmente é, e para que serve, a fiança.
Quem pode conceder a fiança? Com o advento da Lei 12.403/2011, os crimes apenados com pena privativa de liberdade que não excederem 4 (quatro) anos, a autoridade policial poderá concedê-la. Nos demais casos (como veremos o artigo 322 do Código de Processo Penal, abaixo) a fiança será requerida ao juiz que terá 48 horas para decidir se concede ou não.
“Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).”
Quando o imputado não tiver condições econômicas de arcar com a fiança arbitrada, o juiz poderá conceder a liberdade provisória com previsão expressa do artigo 350 do Código de Processo Penal (observando-se as condições dos artigos 327 e 328 do CPP).
Vale salientar que além dos artigos 327 e 328 do Código de Processo Penal, o juiz poderá, também, aplicar outras medidas cautelares diversas (artigo 319, CPP) conforme a situação exigir.
Sobre o valor da fiança, fixado em salários mínimos, quem for aplicá-la deve observar a gravidade do delito e a situação econômica do imputado, observando os termos dos artigos 325 e 326 do Código de Processo Penal.
Dessa forma, o valor varia de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos quando o delito tiver pena privativa de liberdade não superior a 4 (quatro) anos e de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos quando a pena privativa de liberdade for superior a 4 (quatro) anos.
Importante ressaltar que o artigo 325 do Código de Processo Penal estabelece, entre outras disposições que merecem a leitura, que o valor da fiança, dependendo do caso concreto, pode ser dispensada (ver artigo 350 do CPP) ou aumentada em até 1000 (mil) vezes.
Uma curiosidade, para os leigos, que permito-me citar aqui e, para muitos, quebrar um tabú de que a fiança deve ser paga somente em espécie (dinheiro), ela poderá, também, consistir em pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar (artigo 330 do CPP).
O valor da fiança não é absoluto, podendo ser “reforçado” quando observadas as hipóteses do artigo 340 do Código de Processo Penal.
Quanto ao destino da fiança, acredito ser este o ponto mais surpreendente para aqueles que não conhecem o processo penal. Para que fique clara a explicação, vou reproduzir, abaixo, os artigos 336 e 337 do Código de Processo Penal para, depois, fazer algumas observações:
Art. 336. O dinheiro ou objetos dados como fiança servirão ao pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, se o réu for condenado. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Parágrafo único. Este dispositivo terá aplicação ainda no caso da prescrição depois da sentença condenatória (art. 110 do Código Penal). (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Art. 337. Se a fiança for declarada sem efeito ou passar em julgado sentença que houver absolvido o acusado ou declarada extinta a ação penal, o valor que a constituir, atualizado, será restituído sem desconto, salvo o disposto no parágrafo único do art. 336 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Com o exposto acima, se o réu for condenado e a pena imposta for cumprida, o valor dado como garantia (fiança) será devolvido devidamente com as custas, multa e indenização (fixada na sentença penal) abatidas.
Em caso de absolvição, a fiança é devolvida ao imputado na sua integralidade.
Importante destacar a citação do notório Aury Lopes Junior – Direito Processual Penal; 10ª edição; Página 906 – Saraiva – em relação ao parágrafo único do artigo 336 do Código de Processo Penal:
“...se o réu for condenado, mas tiver declarada extinta a punibilidade pela prescrição, a fiança prestada continuará respondendo pelas custas processuais e indenização pelo dano”.
Quando arbitrada a fiança e esta “quebrada” por algum dos motivos descritos no artigo 341 do Código de Processo Penal (ver também o artigo 343 do mesmo diploma), acarretará perda da metade do valor arbitrado e o juiz, analisando o caso concreto, decidirá sobre aplicação de outra(s) medida(s) cautelar(es) e, em último caso, pela prisão preventiva.
Existe, também, a perda total da fiança que se dá quando o condenado não se apresenta para o cumprimento da pena definitivamente imposta (artigo 344 do Código de Processo Penal).
De acordo com o breve exposto sobre a fiança, podemos, então, concluir que:
-é uma garantia patrimonial do Estado para que o imputado responda pelo delito cometido em liberdade;
-é aplicada (ou não) de acordo com a gravidade do delito e condição econômica do imputado.
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