Sumário: 1. Introdução. 2. Os direitos fundamentais e suas bases teóricas. 2. Características essenciais dos direitos fundamentais.
1. INTRODUÇÃO
Como é sabido, a Constituição da República Federativa do Brasil encerra em seu texto um vasto elenco de direitos e garantias fundamentais. Tal elenco engloba evidentemente os direitos fundamentais clássicos (aos quais se convencionou chamar de primeira geração), que correspondem àqueles referentes às liberdades públicas individuais, como a liberdade de expressão, a liberdade de culto, o direito de livre associação etc (vide o art. 5º da CRFB). Caracterizam-se, via de regra, por exigirem do Estado um dever de abstenção em relação à esfera de atuação do indivíduo. Mas nossa Carta Magna também consagra os denominados direitos fundamentais de segunda geração, que são aqueles que, contrariamente aos direitos de primeira geração, demandam do Estado uma prestação positiva direcionada ao cidadão, como são notadamente os direitos à saúde, à educação e à previdência social (vide os arts. 196 e 205 da CRFB). E não é só: o constituinte também estabeleceu os direitos fundamentais de terceira geração, representados por aqueles bens que não são passíveis de serem titularizados por apenas um indivíduo, surgindo como direitos de que é titular toda a coletividade. O exemplo mais notório é o direito a um meio ambiente sadio, estampado no art. 225 da nossa Constituição.
Sendo os direitos fundamentais hoje tão amplamente prestigiados pelos textos constitucionais mundo afora, mostra-se de todo pertinente tecer algumas considerações sobre seus fundamentos teóricos e, ainda, sobre suas características essenciais.
2. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SUAS BASES TEÓRICAS
A primeira corrente que procura explicar o fundamento teórico dos direitos fundamentais da pessoa humana é a corrente positivista, defendida por autores do quilate de Hans Kelsen, Herbert Hart e Marx Weber. De acordo com esse grupo, os direitos fundamentais encontram sua fonte e autoridade no próprio ordenamento jurídico do Estado, tal como posto pelo legislador. Entendem eles que os direitos fundamentais apenas existem – e como tais são reconhecidos – por obra e vontade do próprio Estado, que, através do Poder Legislativo – garante e empresta força coercitiva a esses direitos. Kelsen baseava esse entendimento na impossibilidade de se apoiarem os direitos fundamentais em valores axiológicos abstratos, não positivados, tendo em vista o grau de pluralismo atingido pela sociedade moderna. Com efeito, dizia que, diante da inexistência de uma concepção filosófico-axiológica unânime ou consensual no seio do sociedade, não haveria como impor a priori valores universais: logo, a fonte única do direito só poderá ser a lei posta, o ordenamento jurídico.
De um modo geral, o argumento positivista tem por base o relativismo ético. O melhor exemplo desse relativismo ético é extraído do próprio Kelsen que, em sua obra “A Democracia”, sustenta que, não possuindo os indivíduos as mesmas ideias, não partilhando eles a mesma visão de mundo, não se torna possível falar-se em um fundamento ético comum para os direitos fundamentais, de forma que, segundo afirma, melhor é fiar-se no direito positivo, e tanto melhor se esse direito for produzido democraticamente.
Vale ressaltar que a concepção positivista entrou em crise e enfrentou muitos questionamentos com a Segunda Guerra Mundial, quando se verificou que o ordenamento positivo de países como Alemanha e Itália não garantiam direitos fundamentais: pelo contrário, viu-se que o próprio ordenamento poderia ser usado para violar esses direitos (as leis raciais da Alemanha Nazista etc).
Outra importante corrente é a corrente jusnaturalista. De acordo com seus adeptos, existem valores superiores emanados da própria natureza humana, em razão da qual é possível vislumbrar um mínimo de direitos, independentemente de previsão no ordenamento positivo. Alicerçam os direitos humanos no chamado Direito Natural, que, segundo afirmam, precede o próprio direito positivado pelo Estado.
Reconhecem-se duas grandes ramificações do jusnaturalismo, sendo que uma delas, historicamente, foi contrária aos direitos humanos: o jusnaturalismo religioso. Costuma-se afirmar que a Igreja Católica contribuiu para a consagração dos direitos humanos, em especial sob o prisma dos direitos sociais, o que não é de todo correto. O discurso pontifical tradicionalmente revelou-se contrário aos direitos humanos, uma vez que diversas encíclicas foram escritas para negar a ideia de direitos humanos, afirmando que essa ideia era antropocêntrica e que o centro do universo não era o homem, mas sim Deus. Apenas recentemente é que a Igreja passou a traduzir o que antes chamava de “direitos naturais” e começou a utilizar a linguagem dos direitos fundamentais.
A segunda ramificação é o jusnaturalismo de matriz racionalista, que possui, este sim, uma íntima ligação com a ideia dos direitos humanos tal como hoje os concebemos. Foi a partir dessa visão que surgiu a moderna concepção dos direitos humanos. É a vertente contratualista, segundo a qual existem certos direitos anteriores a qualquer comunidade política e que derivariam da própria natureza humana, sendo possível descobri-los através da razão. Esses direitos preexistentes seriam impostos aos Estados e seus ordenamentos jurídicos.
Uma terceira visão que pode ser invocada é a corrente culturalista. Visão ligada à sociologia, busca na cultura, na própria sociedade, o fundamento dos direitos humanos fundamentais. A concepção pós-moderna dos direitos humanos, o multiculturalismo, está mais próximo disso. Os direitos humanos possuem uma raiz cultural e são resultado da história vivida, não resultando de valores superiores abstratamente considerados, mas da experiência concreta de cada grupo social.
Sem embargo, é forçoso reconhecer que a adoção isolada de cada uma dessas correntes pode nos levar a grandes distorções. Por exemplo, a visão sociológica (culturalista) muito defendida por uma linha de autores comunitaristas americanos, sustenta que uma determinada sociedade, a partir de seus valores internos, possa praticar atos considerados atrozes por outros outros grupos e culturas. Tome-se o caso da extirpação de clitóris praticada em muitas sociedades africanas. Entendem muitos culturalistas que essa prática é legítima quando vista do interior do grupo social que a pratica. Já a adoção pura e simples da corrente positivista, como vimos, também é capaz de gerar os efeitos mais nefastos: veja-se o caso já citado da Alemanha Nazista. A Constituição de Weimar não possuía cláusula pétrea, o que possibilitou ao partido nacional-socialista, que detinha maioria no parlamento alemão, suprimir todos os direitos de nacionalidade e cidadania das minorias étnicas e religiosas. E tudo feito conforme as regras do jogo então vigente! E a visão jusnaturalista também pode suscitar problemas sérios, a começar pela própria definição do Direito Natural. Basta lembrar que Aristóteles fundamentava a escravidão no que ele chamava Direito Natural...
Dentro dessa discussão, surgiu uma quarta corrente, que poderíamos denominar de moralidade crítica, que hoje conta com a adesão da maioria dos autores. Essa ideia de moralidade crítica comporta leituras muito diversas, desde leituras processualistas até leituras mais substancialistas. Afirma que o direito tem uma ligação com a moral, sendo que essa moral não é a moral específica de uma sociedade determinada em um momento determinado. Cuida-se da moralidade que se pode extrair racionalmente das tradições, em uma discussão racional na qual se parte da premissa de que os interlocutores são seres livres e iguais, em que cada um tem o direito de ser diferente e em que todos terão seus argumentos considerados para, a partir daí, construir-se uma moralidade jurídica para fundamentar os direitos humanos.
Essa moralidade crítica pode ser processualista, afirmando que não se pode construir o direito a partir de consensos substantivos e que só se busca o consenso a partir de regras que garantam uma comunicação livre. Pode ser ainda uma moral substantiva, em que se pressupõe haver um fundamento, que não é a cultura em um dado contexto (o que não quer dizer que os direitos estejam subtraídos da cultura), mas também não é metafísica (não é uma abstração incorpórea que sobrepaira o mundo da vida, como afirmam os jusnaturalistas), ou seja, abre-se a possibilidade de refletir criticamente sobre as suas tradições em um determinado momento.
Dentro dessa concepção, existem três linhas que merecem ser mencionadas: uma é a fundamentação a partir da ideia da liberdade e da autonomia moral do agente; outra, é a fundamentação a partir da ideia da democracia; e outra, é a fundamentação a partir do reconhecimento das necessidades humanas.
Os autores da moralidade crítica que se aproximam mais da tradição jusnaturalista normalmente seguem a fundamentação pela liberdade e autonomia moral do agente. Assim, os direitos fundamentais seriam direitos que existem para propiciar a liberdade, a autonomia moral do agente, a capacidade de traçar os rumos da sua própria existência, de eleger planos de vida e de se comportar de acordo com eles. A fundamentação de inspiração democrática afirma que os direitos são pré-requisitos para que uma democracia plena e, em um contexto de pluralismo axiológico, não sendo possível definir de antemão quais os valores substantivos corretos, estes serão aqueles que resultam de um diálogo entre as pessoas que se reconheçam como livres e iguais, servindo os direitos para garantir esse diálogo. Assim, o fim último do direito seria a democracia. Já a terceira vertente, que á a teoria das necessidades, sustenta que o ser humano possui necessidades, dentre as quais situam-se a liberdade e o fato de ser partícipe da formação da vontade da sua coletividade. Os direitos humanos seriam imperativos para o atendimento das necessidades humanas mais básicas. Quanto mais importante for uma necessidade humana, mais se justificaria a sua proteção pelo direito, devendo até mesmo ser subtraída do espaço público e posta a salvo da vontade das maiorias circunstanciais.
Assim, os autores da vertente autonomista afirmam que os direitos sociais são importantes na medida em que propiciam a liberdade. Para a segunda vertente, seriam relevantes na media em que propiciam a democracia. E, para a terceira vertente, os direitos fundamentais não seriam um meio para o atendimento de um fim, uma vez que já atenderiam uma necessidade humana relevante, isto é, não possuiriam eles um papel instrumental em relação a uma outra necessidade. Nesse ponto, eles não seriam nem mais, nem menos que a liberdade e a democracia.
3. CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Uma vez abordada a questão dos fundamentos teóricos dos direitos humanos fundamentais, neste ponto cabe mencionar algumas características intrínsecas a esses direitos, tal como reconhecidas pela maioria dos autores contemporâneos. Trata-se de características ou qualidades a eles essenciais, na ausência das quais não se pode concluir estarmos na presença de um direito ou garantia fundamental.
Fala-se em universalidade como qualidade essencial relacionada à titularidade dos direitos fundamentais. Qualquer pessoa, pelo simples fato de sê-lo, é titular de direitos humanos. Via de regra, esses direitos não são estamentais e nem pertencem a um grupo exclusivo. Eles decorrem da concepção da dignidade da pessoa humana, segundo a qual a mera condição humana já confere direitos que devem ser reconhecidos.
Aliás, essa característica é a razão da crítica dirigida contra a redação do caput do art. 5o da Constituição da República, cujo texto estabelece que “os brasileiros e os estrangeiros residentes no país” são titulares dos direitos ali elencados. Ora, será que o estrangeiro não residente não tem direito à vida ou à integridade física, nos termos da lei? É claro que tem! Por essa razão, deve-se interpretar esse dispositivo de modo extensivo, sob pena de negação dos mais basilares postulados civilizatórios.
No entanto, cumpre assinalar que a universalidade não significa que não se possa levar em consideração certas particularidades de categorias humanas, Por exemplo, nem todo direito reconhecido às mulheres devem ser necessariamente reconhecidos aos homens; certas minorias possuem certos direitos que grupos mais fortes não tem. Há direitos específicos que estão submetidos a um regime diferenciado. Hoje verifica-se uma tendência geral, em matéria de direitos humanos, à proteção reforçada de grupos mais frágeis e vulneráveis, o que é chamado de processo de especificação do titular do direito.
Outra importante característica dos direitos fundamentais é a sua relatividade. Esses direitos integram um sistema e devem conviver entre si, mas muitas vezes entram em atrito. O exemplo clássico é o da liberdade de imprensa e o direito à intimidade/privacidade, ambos assegurados expressamente pelas constituição modernas. A relatividade significa que não se pode atribuir uma dimensão absoluta a um determinado direito, pois, se assim se faz, acaba-se negando outros que com ele devem conviver (ou até mesmo outros interesses coletivos). Tome-se o caso da proteção à propriedade privada: se se concebesse o direito de propriedade como absoluto, não seria possível tutelar o meio ambiente. Logo, a própria multiplicidade dos direitos integrantes de um mesmo sistema e o fato de que eles convivem em uma sociedade pluralista impõe uma concepção relativa de cada um deles.
Existiriam direitos absolutos? Segundo a ONU existem dois direitos absolutos: o direito de não ser submetido à tortura e o direito de não ser reduzido à condição de escravo ou condição análoga.
Os direitos fundamentais também são marcados pela característica da complementariedade, ligada ao fato de que os direitos individuais e políticos reforçam os direitos sociais e econômicos, que, por sua vez, são pressupostos para a fruição efetiva dos direitos individuais. Significa dizer que não devemos ver essa relação como uma antinomia: a liberdade não se contrapõe à igualdade material, pois ambos podem ser atingidos. Existe uma expressão que bem traduz bem essa característica, que é a “tensão sinérgica” ou “sinergia tensa”, ou seja, os direitos se retroalimentam e se potencializam, embora sempre exista uma certa tensão entre os mesmos.
Fala-se em não exaustividade ou inexauribilidade para traduzir o fato de que o elenco de direitos fundamentais presente na Constituição não é de natureza taxativa, pois é possível descobrir outros além daqueles expressamente previstos. Esta ideia está patente na redação do artigo 5º, § 2º, da nossa Carta Constitucional. Eles são inexauríveis, pois Estado nenhum, legislador nenhum, pode afirmar ter alcançado a previsão e proteção integrais de todos os direitos, pois é certo que novas demandas irão sempre surgir.
Os direitos fundamentais, via de regra, são dotados de aplicabilidade imediata, valendo dizer que não possuem sua eficácia submetida a condicionamentos passíveis de serem impostos pelo legislador ou qualquer outra autoridade estatal. Neste particular, surge a tormentosa questão relacionada aos direitos prestacionais de caráter social. Mas a ideia é a de não ver os direitos como proclamações retóricas, cabendo extrair deles o máximo de eficácia possível.
Também são dotados de eficácia erga omnes, uma vez que os direitos fundamentais vinculam não apenas o Estado (eficácia vertical), como também os particulares (eficácia horizontal).
O tema da eficácia horizontal dos direitos fundamentais tem suscitado, de forma crescente, a atenção e o interesse da doutrina. Tradicionalmente os direitos humanos foram concebidos como limite imposto à atuação do Estado. Com o tempo, todavia, foi-se percebendo que a opressão também parte muitas vezes de atores privados, e não do Estado. Mesmo aqueles direitos que, pelo sua natureza, acreditava estarem mais ligados ao Estado, também penetram e se irradiam no âmbito das relações privadas. Mas será que os direitos fundamentais podem ser aplicados com a mesma intensidade nas relações privadas e nas relações estatais (isto é, nas relações do cidadão com o Estado)? A resposta só pode ser negativa. E a razão é que, nas relações entre cidadão e Estado, temos, de um lado, um titular de direitos fundamentais (cidadão) e uma parte que não é titular de direitos fundamentais (Estado), sendo certo que, nas relações privadas, existem dois titulares de direitos fundamentais.
Com efeito, o particular é investido de uma autonomia (a autonomia privada, decorrente da ideia de liberdade), ao passo que ao Estado não é reconhecida autonomia alguma. O Estado é uma realidade instrumental. O Estado existe para defender e para promover os direitos do cidadão, não existe por si. O ser humano deve ser tratado como um ser intrinsecamente livre a ele deve ser reconhecida a capacidade de fazer escolhas sobre sua própria vida, sem interferências heterônomas coercitivas, e o direito de se comportar de acordo com essas escolhas. A autonomia privada é uma dimensão muito importante da dignidade da pessoa humana e é também um direito fundamental. Existem ainda outras razão que reduzem o grau de incidência dos direitos fundamentais nas relação privadas. A democracia pode ser indicada como um desses obstáculos, já que, ao aplicar um direito vago da constituição, como a liberdade de expressão, em uma relação privada, muitas vezes se estará passando por cima do legislador ordinário, e a aplicação no campo das relações privadas de direitos fundamentais implica, na prática, subtrair uma certa liberdade de conformação do legislador eleito pelo povo. Ou seja, o discurso de aplicação indiscriminada dos direitos fundamentais ao campo privado é um discurso que conduz a um ativismo judicial, alçando o juiz ao maior aplicador da constituição em detrimento da lei. Outro argumento historicamente utilizado diz com a segurança jurídica. De fato, ao se utilizarem conceitos como liberdade, igualdade, dignidade humana (que são conceitos vagos) para resolver conflitos privados, surge um grau maior de imprevisibilidade quanto ao desfecho dessa utilização.
Os autores buscaram dar algumas respostas ao se depararem com essa problemática, devendo ser ressaltadas duas delas. Nos Estados Unidos, prevalece a Teoria do “State Action Doctrine”, segundo a qual a constituição não vincula o particular, pois se assim o fizesse, ela diminuiria muito a liberdade do particular. Assim, em princípio, os direitos fundamentais só vinculam o Estado. Mas, com o tempo, essa visão foi atenuada, passando a prevalecer a Teoria da “Public Function Doctrine”, sustentando que, quando a entidade não estatal age no exercício de uma atividade de natureza estatal, na qual ela se assemelha ao Estado, deverá obediência aos direitos fundamentais. Cita-se o caso Marsh x Alabama, julgado pela Suprema Corte em 1946, que analisou o caso de uma empresa proprietária de uma enorme área de terras, onde se construiu uma pequena cidade. A empresa proibiu testemunhas de Jeová de lá fazerem suas pregações. A Suprema Corte afirmou que, equiparando-se ao Estado ao manter uma cidade, cabia à empresa respeitar os direitos fundamentais. Já na Alemanha (e esse modelo influenciou muito a doutrina brasileira), discute-se essa questão sob o rótulo do “Drittwirkung”, ou seja, a eficácia em relação a terceiros. O particular é considerado um terceiro, uma vez que se entende que a relação de direito fundamental ocorre originariamente entre o cidadão e o Estado. O leading case foi o seguinte: um cineasta simpático ao nazismo produziu um filme, que suscitou um boicote organizado por um indivíduo (com placas, panfletos etc). O cineasta ajuizou ação de perdas e danos e o réu defendeu-se com o argumento de que sua ação, embora tenha causado dano, estava amparada pelos direitos fundamentais e que o boicote era expressão da sua liberdade de expressão. A Corte Constitucional Alemã reconheceu que, mesmo em questão de responsabilidade civil, os direitos humanos penetram e se irradiam (muitos chamam de força irradiante dos direitos fundamentais). Decidiu-se que a decisão anterior não havia protegido adequadamente a liberdade de expressão porque os direitos fundamentais não são só direitos subjetivos, são também valores, possuem uma dimensão objetiva, consagram valores que se irradiam no ordenamento e condicionam a interpretação e aplicação das outras normas.
Outra importante característica dos direitos fundamentais é a indisponibilidade. Não significa que o exercício de determinado direito seja obrigatório, mas sim que a capacidade para ser titular de direitos humanos fundamentais não pode ser alienada. Trata-se de matéria externa ao poder de disponibilidade do indivíduo. O ser humano possui direitos que decorrem de sua mera natureza humana. É até mesmo possível que uma pessoa decida abrir mão temporariamente de determino direito. Veja-se o exemplo dos participantes de um “reality show” televisivo, que aceitam expressamente abdicar – sempre de maneira temporário, é importante que se diga – de seu direito à privacidade. É necessário assinalar que essa disponibilidade deve ser sempre expressa e jamais poderá ser permanente.
Por fim, há que se mencionar a característica da imprescritibilidade dos direitos fundamentais, segundo a qual a titularidade do direito fundamental não é perdida pela inércia associada ao decurso do tempo. Como se disse acima, a existência desses direitos decorre da própria natureza humana e, por essa razão, enquanto houver o indivíduo, haverá o direito. O que não quer dizer que certas manifestações concretas do exercício de um direito fundamental não possam prescrever. Cite-se como exemplo o direito à honra e à imagem, expressamente garantidos pela Constituição: havendo uma lesão a esse direitos, assegura-se à vítima a faculdade de ingressar com uma ação para ressarcimento de danos (patrimoniais ou extrapatrimoniais), mas esse direito é prescritível nos termos da lei; o que é imprescritível é a honra e o direito à imagem.
BONAVIDES, Paulo. Direito Constitucional, 8ª edição. São Paulo: Malheiros, 1999
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Procurador Federal. Coordenador da Coordenação para Assuntos de Consultoria da Procuradoria Federal na Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOSQUEIRA, Bruno Alves. Alguns apontamentos sobre as bases teóricas e as características essenciais dos direitos fundamentais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 mar 2014, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38541/alguns-apontamentos-sobre-as-bases-teoricas-e-as-caracteristicas-essenciais-dos-direitos-fundamentais. Acesso em: 22 nov 2024.
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