Resumo: O presente trabalho analisa a possibilidade de existirem normas constitucionais inconstitucionais. Vale dizer, normas que se encontram presentes no texto da Constituição Federal, mas que, quanto à matéria, violam valores fundamentais de justiça, configurando-se o conflito entre normas pertencentes à Carta Magna. O estudo não passará ao largo dessa discussão, examinando-se a possibilidade de se fazer o controle de constitucionalidade sobre emendas constitucionais, a fim de se compreender a existência, ou não, de limites ao poder de reforma constitucional. Ademais, será estudado o impacto das mudanças advindas com a Emenda Constitucional nº 62/2009 sobre o ordenamento jurídico e a sociedade como um todo. A Constituição Federal, após a promulgação da mencionada Emenda, passou a dispor de novo regime de precatórios, sendo alterados a forma, o prazo e a ordem cronológica de pagamento. O Supremo Tribunal Federal foi instado a se manifestar sobre o assunto, diante de controle abstrato de constitucionalidade suscitado por diversas entidades. O julgamento proferido acerca da matéria, em que pese não restar finalizado, é indispensável para se compreender o contexto em que se encontra o pagamento dos débitos da Fazenda Pública, cujo exame cuidadoso acerca dos seus fundamentos compõe o objeto do presente estudo.
Palavras-chave: Poder Constituinte; Controle de Constitucionalidade; Precatório.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA REFORMA CONSTITUCIONAL; 3 FUNDAMENTOS DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EC No 62/2009; 4 O JULGAMENTO DO STF SOBRE A REFORMA INTRODUZIDA PELA EC Nº 62/2009; 5 CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
As emendas constitucionais, previstas no art. 59 da CF, são espécies normativas que visam adequar a Constituição à realidade, conferindo-lhe plasticidade diante de novas demandas sociais. Entretanto, a possibilidade de introduzir novas regras ou preceitos ao texto da Constituição não significa que a sua identidade, bem como os seus valores, sejam modificados.
Conforme anota José Afonso da Silva (2007, p. 55),
uma constituição, porém, já é o sistema normativo de grau mais elevado na ordenação jurídica do país. Situa-se no vértice das fontes formais do Direito. Regula a produção das demais normas da ordem jurídica. Informa e confere validade a todo o ordenamento normativo nacional, cuja unidade, coesão e conexão de sentido encontram nela seu fundamento. As demais normas jurídicas que dela discordarem ou divergirem são ilegítimas, inválidas, inconstitucionais, e devem ser ineficazes juridicamente, em princípio.
Por mais que seja permitido alterar as disposições constitucionais, conforme preleciona Alexandre de Moraes (2007, p. 636), sempre se conservará um valor integrativo, no sentido de que deve deixar substancialmente idêntico o sistema originário da Constituição. Nas palavras do professor, “a revisão serve, pois, para alterar a constituição mas não para mudá-la, uma vez que não será uma reforma constitucional o meio propício para fazer revoluções constitucionais.”
O poder constituinte originário, cuja natureza é autônoma, ilimitada e incondicionada, prestou-se a instituir uma nova ordem jurídica, estabelecendo limites para se reformar o texto constitucional. As manifestações de tais reformas podem ser vistas através das emendas à Constituição, que revelam a sua adaptação a novos ambientes políticos e sociais, de maneira que sejam preservados a sua força normativa, a sua essência e o seu espírito. Isso se deve ao fato de o poder de reforma constitucional, também conhecido como poder constituinte derivado, encontrar fundamento na CF e ser por ela disciplinado.
Esse poder reformador, nas palavras de Luís Roberto Barroso (2009, p. 148), “é um poder de direito, e não um poder soberano. Por via de consequência, somente poderá rever a obra materializada na Constituição originária observando as formas e parâmetros nela estabelecidos.”
Da mesma forma entende Paulo Bonavides (2006, p. 208), ao afirmar que
toda a Constituição pode ser emendada, salvo a matéria constante de exclusão em virtude dos limites expressos e tácitos postos à ação inovadora do constituinte de segundo grau, aquele dotado apenas de competência constituinte constituída ou derivada, isto é, que procede da vontade absoluta e soberana do constituinte originário.
O poder de reforma constitucional é um poder limitado, de exercício normal, pois está vinculado a um processo legislativo especial e mais dificultoso que o ordinário, não podendo se sobrepor ao texto constitucional. A reforma da Constituição far-se-á segundo os moldes estabelecidos por ela própria e submeter-se-á a limitações constitucionais. Estas podem ser classificadas, de acordo com Alexandre de Moraes, em limitações temporais, circunstanciais, formais ou materiais.
As primeiras, em que pesem não terem sido consagradas por nossa CF, consistem na vedação, por determinado período de tempo, de alterabilidade das normas constitucionais. Por sua vez, as limitações circunstanciais visam evitar modificações no texto constitucional em certas ocasiões excepcionais e anormais, como na vigência de estado de defesa, intervenção federal ou estado de sítio. Já as limitações formais referem-se ao procedimento do processo legislativo. As emendas constitucionais seguem um rito próprio, cuja proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. O art. 60 da CF disciplina a matéria, estabelecendo todas essas restrições às propostas de emenda à Constituição, exceto, por conseguinte, quanto às limitações implícitas.
Quanto às limitações materiais, verifica-se que o poder constituinte originário excluiu determinadas matérias e conteúdos da incidência de emendas constitucionais. Segundo José Afonso da Silva (2008, p. 66), as constituições brasileiras republicanas sempre contiveram um núcleo imodificável. Do ponto de vista material, a CF de 1988 conferiu uma amplitude ao espaço reservado às vedações absolutas, sendo previstas no art. 60, §4º, as suas limitações[1].
O mencionado professor observa que
é claro que o texto não proíbe apenas emendas que expressamente declarem: “fica abolida a Federação ou a forma federativa de Estado”, “fica abolido o voto direto...”, “passa a vigorar a concentração de Poderes”, ou ainda “fica extinta a liberdade religiosa, ou de comunicação..., ou o habeas corpus, o mandado de segurança...”. A vedação atinge a pretensão de modificar qualquer elemento conceitual da Federação, ou do voto direto, ou indiretamente restringir a liberdade religiosa, ou de comunicação ou outro direito e garantia individual; basta que a proposta de emenda se encaminhe ainda que remotamente, “tenda” (emendas tendentes, diz o texto) para a sua abolição. (SILVA, 2008, p. 67) (grifos nossos).
As matérias retratadas no mencionado dispositivo constitucional consistem em cláusulas de intangibilidade, ou cláusulas pétreas, sendo meio de proteção da democracia e instituídas em prol do sistema constitucional. Do mesmo modo, elas funcionam como princípios fundamentais que irão orientar a interpretação constitucional, dando unidade e harmonia ao sistema. Os limites materiais trazidos pela nossa CF têm por finalidade, conforme observação de Luís Roberto Barroso (2009, p. 162), “retirar do poder de disposição das maiorias parlamentares elementos tidos como pressupostos ou condições indispensáveis ao funcionamento do Estado constitucional democrático”.
A imutabilidade de determinadas matérias do seu conteúdo, conferida pela própria CF, tem de ser observada quando do exercício do poder reformador, qual seja, na atuação dos legitimados pelo art. 60 da CF[2] a elaborar emendas[3].
As limitações ao poder reformador que as emendas devem se atentar não se restringem somente às materiais, formais e circunstanciais, expressas no art. 60 da CF, mas também a diversas vedações implícitas disseminadas na CF.
Por ser um poder sujeito a limitações expressas, é também um poder circunscrito a limitações tácitas, que decorrem dos princípios e valores albergados na CF. Essas limitações materiais implícitas visam proteger a identidade da CF e os pressupostos democráticos sobre os quais se assentam. Para Luís Roberto Barroso (2009, p. 165), o reconhecimento da existência de limites tácitos afigura-se logicamente inafastável, sendo irrelevante a presença ou não de cláusulas pétreas no texto constitucional.
[...] Há quatro categorias de normas que a doutrina, classicamente, situa fora do alcance do poder revisor, independentemente de previsão expressa. São elas as relativas:
1ª) aos direitos fundamentais, que no caso brasileiro já se encontram, ao menos em parte, protegidos por disposição expressa (CF, art. 60, §4º);
2ª) ao titular do poder constituinte originário, haja vista que a soberania popular é pressuposto do regime constitucional democrático e, como tal, inderrogável;
3ª) ao titular do poder reformador, que não pode renunciar à sua competência nem, menos ainda, delegá-la, embora nesse particular existam precedentes históricos, alguns deles bastante problemáticos;
4ª) ao procedimento que disciplina o poder de reforma, pois este, como um poder delegado pelo constituinte originário, não pode alterar as condições da própria delegação. (BARROSO, 2009, p. 165-166).
Desse modo, a emenda à Constituição é produzida segundo uma forma e versando sobre conteúdo anteriormente limitado pelo constituinte originário. Sendo aprovada em consonância com os preceitos formais e materiais, a emenda ingressa no ordenamento jurídico possuindo mesma hierarquia das normas constitucionais originárias.
2 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA REFORMA CONSTITUCIONAL
As reformas constitucionais, realizadas por meio de emendas à Constituição, têm de ser feitas com observância aos preceitos fixados pelo art. 60 da CF. Não havendo respeito a qualquer das limitações impostas pelo mencionado artigo, seja de ordem procedimental ou material, a emenda padecerá de vício de inconstitucionalidade, ficando sujeita ao controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário.
A violação dos limites materiais do poder constituinte derivado sujeita a reforma constitucional ao controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário.
É possível, conforme jurisprudência assentada, a incidência do controle de constitucionalidade, difuso ou concentrado, sobre emendas constitucionais, a fim de se verificar sua constitucionalidade ou não. “[...] O Congresso Nacional, no exercício do poder constituinte derivado reformador, submete-se às limitações constitucionais” (MORAES, 2007, p. 637). Vale ressaltar que tal controle de constitucionalidade é exercido, inclusive, sobre a correção formal do procedimento de aprovação de emenda à Constituição, sendo decidido pelo STF que a tramitação do projeto de emenda não diz respeito a mera questão procedimental, visto que é tema manifestamente constitucional[4].
Conforme entendimento do Ministro Celso de Mello, em voto proferido no julgamento da ADI 466/DF, DJU, 09/05/1991:
Convém ressaltar, neste ponto, por necessário, que mesmo as emendas à Constituição Federal não estão excluídas da possibilidade de virem a constituir objeto de controle, abstrato ou concreto, de constitucionalidade. O Congresso Nacional, no desempenho de sua atividade constituinte derivada e no desempenho de sua função reformadora, está juridicamente subordinado à decisão do poder constituinte originário que, a par de restrições de ordem circunstancial, inibitórias do poder reformador (CF, art. 60, §1º), identificou, em nosso sistema constitucional, um núcleo temático intangível e imune à ação revisora da instituição parlamentar. As limitações materiais explícitas, definidas no §4º do art. 60 da Constituição da República, incidem diretamente sobre o poder de reforma conferido ao Poder Legislativo da União, inibindo-lhe o exercício nos pontos ali discriminados. A irreformabilidade desse núcleo temático, acaso desrespeitada, pode legitimar o controle normativo abstrato, e mesmo a fiscalização jurisdicional concreta, de constitucionalidade. Emendas à Constituição – que não soa normas constitucionais originárias – podem, assim, incidir, elas próprias, no vício de inconstitucionalidade, configurado pela inobservância de limitações jurídicas superiormente estabelecidas no texto constitucional por deliberação do órgão exercente das funções constituintes primárias ou originárias.
Essa posição é corroborada pela jurisprudência do STF, como a decisão que ora trazemos à colação: "Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivado, incidindo em violação originária, pode ser declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua é a guarda da Constituição (art. 102, a, da CF)" (RDA, 198:123, 1994, ADI 939-7-DF, rel. Min. Sydney Sanchez).
Por seu turno, as normas constitucionais instituídas pelo poder constituinte originário não poderão sofrer a incidência do controle de constitucionalidade, sendo sempre constitucionais. Consoante as lições de Pedro Lenza (2009, p. 198), “os aparentes conflitos devem ser harmonizados através da atividade interpretativa, de forma sistêmica.”
Nesse sentido, a jurisprudência do STF, cuja ementa se transcreve abaixo:
Ação direta de inconstitucionalidade. ADI. Inadmissibilidade. Art. 14, §4º, da CF. Norma constitucional originária. Objeto nomológico insuscetível de controle de constitucionalidade. Princípio da unidade hierárquico-normativa e caráter rígido da Constituição brasileira. Doutrina. Precedentes. Carência de ação. Inépcia reconhecida. Indeferimento da petição inicial. Agravo improvido. Não se admite controle concentrado ou difuso de constitucionalidade de normas produzidas pelo poder constituinte originário. (ADI 4.097-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 08.10.2008, DJE de 07.11.2008).
Não há que se falar em norma constitucional inconstitucional quando esta foi introduzida pelo poder constituinte originário. Por outro lado, sendo a norma introduzida por emenda, poderá esta ser inconstitucional, posição que o STF vem admitindo em ações diretas de inconstitucionalidade contra emendas à Constituição[5].
Passadas essas premissas, verifica-se a possibilidade de se examinar as emendas constitucionais sob os seus aspectos formal e material, decidindo-se pela sua constitucionalidade ou não. Em face da existência de normas constitucionais inconstitucionais em nosso ordenamento, advindas do poder constituinte derivado, faz-se necessária a ponderação acerca da EC no 62/2009, que alterou a sistemática do pagamento de precatórios.
3 FUNDAMENTOS DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EC No 62/2009
A EC no 62/2009 alterou substancialmente o art. 100 da CF, estabelecendo uma nova disciplina para o pagamento de precatórios, inclusive ao inserir o art. 97 ao ADCT. Tais mudanças trazem reflexos tanto na atividade administrativa dos entes fazendários, quanto na atividade do Poder Judiciário e, por conseguinte, no recebimento, pelos seus credores, dos valores devidos e judicialmente reconhecidos.
As repercussões provenientes da nova sistemática introduzida pela mencionada Emenda atingem as esferas pública e privada. Os particulares poderão ter os seus precatórios adimplidos por meio de leilão, por acordos formalizados nas juntas de conciliação, ou através de pagamento à vista, obedecendo-se a ordem única e crescente de valor por precatório. Quando não forem estas as soluções, o credor poderá esperar pelo prazo de 15 anos para ter o seu crédito satisfeito, após a sua compensação com débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa, atentando-se, dessa forma, à ordem cronológica de apresentação dos precatórios.
Nada obstante, o Poder Judiciário, na figura do Presidente do Tribunal local, administrará a conta especial criada com o escopo de receber os percentuais incidentes sobre as receitas correntes líquidas dos entes federativos, de modo a gerir o pagamento dos precatórios expedidos pelos tribunais. Ademais, submete-se aquele à responsabilização perante o Conselho Nacional de Justiça, podendo incorrer em crime de responsabilidade caso venha a retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatórios. Ainda na esfera pública, ressalte-se a possibilidade de o Poder Executivo responder na forma da legislação de responsabilidade fiscal e de improbidade administrativa, bem como a proibição das entidades devedoras de contraírem empréstimo externo ou interno e de receberem transferências voluntárias, caso não liberem tempestivamente os recursos destinados ao pagamento.
Os exemplos supra citados visam demonstrar, nesta oportunidade, a abrangência da EC no 62/2009 e sua consequente interferência em questões concernentes aos direitos fundamentais, ao Estado Democrático de Direito e aos princípios constitucionais. Enfim, às normas criadas pelo poder constituinte originário, quando do advento da nossa CF.
O precatório passou a ser previsto constitucionalmente a partir da CF de 1934, que orientou a sistemática do pagamento das dívidas da Fazenda Pública à luz dos princípios da isonomia e da impessoalidade. A consagração da ordem cronológica de apresentação pelo constituinte da época representou o resguardo desses princípios, com vistas a proteger a moralidade administrativa.
As constituições seguintes mantiveram o sistema de precatório em seus textos, ao passo que a CF de 1988 foi mais além e previu, em seu art. 100, os precatórios referentes aos créditos de natureza alimentícia. Restaram consolidadas a relevância e a distinção de certas dívidas judiciais, com atenção à dignidade humana e às garantias individuais, mas também se demonstrou que a dificuldade já existia no pagamento dos precatórios pela Fazenda Pública. Juntamente à CF, surgiu o art. 33 do ADCT, que estipulava o primeiro prazo para pagamento dos precatórios judiciais, em prestações anuais, iguais e sucessivas no tempo de oito anos.
Em que pesem disposições constitucionais como esta, a qual adveio do poder constituinte originário, assim como a dilatação deste prazo de pagamento para 10 anos através do art. 78 do ADCT, introduzido por força do poder derivado – EC no 30/2000 -, não resta dúvida quanto à consagração de um Estado de Direito pela CF.
A CF impõe a submissão do Estado ao Direito, conforme se verifica em diversos dispositivos ao longo do seu texto, subordinando a validade dos atos estatais a preceitos constitucionais, como também assegurando ao indivíduo direitos e garantias fundamentais, que são exercidos em face do Estado e dos demais cidadãos.
O art. 1º, parágrafo único, previu a soberania popular, ao passo que o art. 2º contemplou a separação dos Poderes. O constituinte de 1988 submeteu o Estado ao Direito e à observância dos direitos fundamentais, conforme se depreende da leitura do seu art. 5º.
Feita essa consideração, passa-se à análise do regime especial criado pela EC no 62/2009, mediante acréscimo do art. 97 ao ADCT. Este regime consiste na alocação de depósitos mensais ou anuais em conta especial, opção esta que será feita por meio de ato do Poder Executivo, cuja observância à ordem cronológica de apresentação, à obrigatoriedade do pagamento integral da dívida, conforme está disposto na decisão judicial, e à duração razoável do processo restarão mitigadas.
O regime especial, ao prever a destinação de percentuais sobre a receita corrente líquida das entidades federativas, de forma prévia e abstrata, demonstra o descompasso que esta medida pode ter frente à realidade concreta de cada ente federado. Além disso, o pagamento total da dívida distancia-se mais ainda do credor, visto que sob este recai a certeza de que não serão mais 10 anos para ter o seu crédito satisfeito, mas 15 anos divididos em vagarosos depósitos anuais, quando ele não optar pela forma de quitação por leilão.
A destinação de pelo menos 50% dos recursos depositados na conta especial para o pagamento de precatórios em ordem cronológica de apresentação, sendo os recursos restantes aplicados na realização de leilões, acordos na Junta de conciliação ou pagamento à vista em ordem crescente de valor, indica a possibilidade de se desrespeitar as decisões judiciais que fixam determinada obrigação ao Estado. A modificação da forma de pagamento dos precatórios, com o objetivo de se respeitar a ordem cronológica apenas em relação a 50% dos valores depositados, abranda a força normativa das decisões do Poder Judiciário.
Conforme anota Marçal Justen Filho (2010, p. 172),
A sistemática prevista suprime o dever de o Estado alocar o montante de recursos necessários à liquidação das suas dívidas, eis que o montante a ser previsto na lei orçamentária para tanto será desvinculado das importâncias contempladas em decisão judicial.
Ou seja, tornar-se-á irrelevante a existência de uma decisão judicial condenatória, tal como será inócua a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de uma importância determinada.
Haja vista a opção por um dos dois regimes especiais se realizar por meio de ato do Poder Executivo, de acordo com o § 1º do art. 97[6], a eficácia da decisão judicial passará a ser subordinada a um juízo político externo à função jurisdicional. Segundo o entendimento de Marçal Justen Filho (2010, p. 174), ao qual nos filiamos, o montante de recursos a ser destinado para a liquidação das dívidas será fixado segundo uma avaliação de conveniência e oportunidade.
[...] essa decisão equivale à eliminação da separação de poderes, eis que a eficácia da decisão jurisdicional será vinculada a um juízo de conveniência política a ser exercitado pelo Poder Legislativo.
Ainda que a competência de natureza cognitiva do Poder Judiciário não seja afetada, há a desnaturação da função jurisdicional de cunho executório. (JUSTEN FILHO, 2010, p. 174).
O enfraquecimento das decisões do Poder Judiciário, de modo a torná-las insuficientes para que as partes possam ter satisfeitas as suas pretensões, revela a afronta à separação dos Poderes e à coisa julgada. Estes são alicerces do Estado Democrático de Direito, expressamente previsto pela CF em seu art. 37, caput, que preconiza a subordinação da atividade administrativa à legalidade, à moralidade, à impessoalidade, à eficiência e à publicidade.
Há vários dispositivos da CF que evidenciam que o Estado brasileiro é um Estado de Direito, a exemplo da soberania popular, separação de poderes, direitos fundamentais como limite ao poder do Estado e responsabilidade do Estado pelos danos causados a terceiros. O princípio do Estado de Direito encontra-se intimamente relacionado com a responsabilidade patrimonial do Estado, de modo que Celso Antônio Bandeira de Mello faz a seguinte observação:
Segundo entendemos, a idéia de responsabilidade do Estado é uma consequência lógica inevitável da noção de Estado de Direito [...] Deveras, a partir do instante em que se reconhece que todas as pessoas, sejam elas de Direito Privado, sejam de Direito Público, encontram-se, por igual, assujeitadas à ordenação jurídica, ter-se-ia que aceitar, a bem de coerência lógica, o dever de uma e outras, sem distinção – responderem pelos comportamentos violadores do direito alheio em que incorressem.
Ademais, como o Estado Moderno acolhe, outrossim, o princípio da igualdade de todos perante a lei, forçosamente haver-se-á de aceitar que é injurídico o comportamento estatal que agrave desigualmente a alguém, a exercer atividades no interesse de todos, sem ressarcir ao lesado. (MELLO, 2009, p. 989).
De mais a mais, a flexibilização da ordem cronológica, verificada na prática de leilões para o pagamento de precatórios, denota a substituição desta pela ordem crescente de valor. A preferência de pagamento passou a ser fundada não mais na data da apresentação do precatório, mas no valor inscrito. Vale dizer que quanto menor o valor, mais breve será o seu pagamento.
A isonomia significa, na sistemática dos precatórios, “a eliminação de preferências ou vantagens não fundadas em critérios objetivos. Adotou-se a ordem cronológica das requisições como critério de preferência para o pagamento.” (JUSTEN FILHO, 2010, p. 179).
Como dito anteriormente, a sistemática do pagamento das dívidas da Fazenda Pública mediante precatório foi orientada essencialmente pelo princípio da isonomia. Este é aplicado na medida em que credores de precatórios de naturezas distintas obedecem à fila disciplinada pelo art. 100 da CF, resguardando-se a impessoalidade entre os mesmos. Dessa maneira, configura direito fundamental do indivíduo o recebimento do seu crédito, perante a Fazenda Pública, mediante ordem preestabelecida. Somente assim interferências pessoais e preferências quanto ao menor valor podem ser excluídas, visto que todos os créditos merecem a tutela jurídica, no sentido da garantia de sua liquidação pelo valor integral. Não nos parece razoável que a liquidação integral do montante devido, reconhecido pelo Poder Judiciário, apenas ocorra quando for de pequeno valor[7].
Conforme jurisprudência do STF,
[...] O regime constitucional de execução por quantia certa contra o Poder Público, qualquer que seja a natureza do crédito exeqüendo (RTJ 150/337) – ressalvadas as obrigações definidas em lei como de pequeno valor – impõe a necessária extração de precatório, cujo pagamento deve observar, em obséquio aos princípios ético-jurídicos da moralidade, da impessoalidade e da igualdade, a regra fundamental que outorga preferência apenas a quem dispuser de precedência cronológica (prior in tempore, potior in jure). A exigência constitucional pertinente à expedição de precatório – com a consequente obrigação imposta ao Estado de estrita observância da ordem cronológica de apresentação desse instrumento de requisição judicial de pagamento – tem por finalidade (a) assegurar a igualdade entre os credores e proclamar a inafastabilidade do dever estatal de solver os débitos judicialmente reconhecidos em decisão transitada em julgado (RTJ 108/463), (b) impedir favorecimentos pessoais indevidos e (c) frustrar tratamentos discriminatórios, evitando injustas perseguições ou preterições motivadas por razões destituídas de legitimidade jurídica. (RCl 2.143 AgR, rel. Min. Celso de Mello, j. 12/03/2003, DJ de 6/6/2003, p. 30). (grifos nossos)
A essência do precatório é evitar privilégios ou vantagens indevidas para o pagamento de condenações judiciais, fazendo-se respeitar a ordem cronológica de inscrição dos respectivos créditos.
No mesmo sentido, o STF assentou que “a norma consubstanciada no art. 100 da Carta Política traduz um dos mais expressivos postulados realizadores do princípio da igualdade, pois busca conferir, na concreção do seu alcance, efetividade à exigência constitucional de tratamento isonômico dos credores do Estado.” (ADI 584/PR, Rel. Min. Celso de Mello, j. 26/03/1992, DJ de 02/04/1992).
Restou consolidado na AC-QO 254 que
o sentido teleológico da norma inscrita no caput do art. 100 da Carta Política – cuja gênese reside, no que concerne aos seus aspectos essenciais, na CF de 1934 (art. 182) – objetiva viabilizar, na concreção do seu alcance, a submissão incondicional do Poder Público ao dever de respeitar o princípio que confere preferência jurídica a quem dispuser de precedência cronológica (prior in tempore, potior in jure)[8].
O princípio da isonomia, ainda assim, resta malferido mesmo quando visto por outro ângulo, qual seja, o índice a ser aplicado na correção monetária ao se efetuar o pagamento do precatório. Isto porque a EC no 62/2009 acrescentou o §12 ao art. 100 da CF, dispondo que os precatórios, independentemente de sua natureza, passarão a ter os seus valores corrigidos, após a sua expedição, com base no índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança. Quanto aos juros de mora, estes seguirão a mesma sorte, tendo percentual igual ao dos juros incidentes sobre a caderneta de poupança.
Isso configura uma violação ao direito de propriedade, bem como resta maculado o princípio da igualdade, porquanto os débitos do Estado estarão sendo corrigidos por índice inferior ao que os seus créditos estão submetidos, beneficiando-o economicamente.
O atual índice de correção incidente sobre a caderneta de poupança, a Taxa Referencial (TR), não reflete a variação do poder aquisitivo da moeda, sendo inferior ao IPCA. A aplicação de um índice que não corresponda à variação efetiva do poder aquisitivo da moeda representa uma forma de diminuir o patrimônio do credor. Essa alteração interferirá no seu direito de propriedade, acarretando uma redução significativa do valor do crédito, que restará corroído pela inflação.
Resta evidente que o crédito do contribuinte será corrigido de maneira ínfima, enquanto que o crédito da Fazenda será corrigido amplamente. O princípio da isonomia, mais uma vez, mostra-se desprezado na mudança advinda com o novo regime de pagamento dos precatórios, demonstrando ser injusta a alteração da atualização de valores de precatórios.
Verifica-se que está sendo instituído um sistema com dois pesos e duas medidas, o que afronta a moralidade administrativa e a eficiência. A autonomia, a liberdade e a autoridade do Poder Judiciário estão sendo privadas, bem assim a eficácia de suas decisões na fixação de critérios para atualização da condenação judicial. Em virtude da aplicação cogente do índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, resta violado o postulado da separação dos poderes, manifestando flagrante inconstitucionalidade de tal dispositivo.
O princípio da moralidade está contido na CF em diversos dispositivos, permeando todo o seu texto, de modo a atribuir-lhe grande relevância. De maneira expressa, o art. 37 da nossa CF[9] declara-se seguidora do mencionado princípio, submetendo toda a atividade estatal à sua observância. A moralidade é posta como sendo um dos princípios fundamentais da atividade administrativa, revelando a sua preocupação com padrões de conduta de vários modos.
Nas palavras de Humberto Ávila (2004, p. 77),
[...] O princípio da moralidade exige condutas sérias, leais, motivadas e esclarecedoras, mesmo que não previstas na lei. Constituem, pois, violação ao princípio da moralidade a conduta adotada sem parâmetros objetivos e baseada na vontade individual do agente e o ato praticado sem a consideração da expectativa criada pela Administração.
Desse modo, o princípio da moralidade significa a impossibilidade de o Estado atuar de modo eticamente reprovável, desrespeitando-se, por conseguinte, os direitos do cidadão. A moralidade se traduz em condutas pautadas por boa-fé e confiança, e a violação dos valores éticos sujeita o controle jurisdicional de todos os atos da Administração Pública.
Em virtude do princípio constitucional da moralidade ter sido instituído pelo poder constituinte originário, não será permitida a violação deste postulado como padrão de conduta administrativa do Estado. Entretanto, a EC no 62/2009 instituiu a modalidade de leilão como forma de pagamento de precatórios, legitimando a barganha do crédito judicialmente reconhecido como alternativa mais célere para se obter o pagamento.
O Estado, através do leilão, obrigou a sociedade, como um todo, a vender por pouco o que era devido anteriormente. O credor não oferecerá algum desconto de modo voluntário e espontâneo - não se está tratando de liberalidade do credor, no sentido de transferir vantagens de seu patrimônio para o Estado. Tal oferta será compulsória e o precatório que tinha o seu valor previsto em sentença judicial não será liquidado integralmente. Segundo observação de Marçal Justen Filho (2010, p. 187),
A hipótese de subordinar o pagamento à obrigatoriedade de um desconto equivale à determinação pura e simples de que as dívidas serão liquidadas por valor inferior ao requisitado. [...] Em suma, oferece-se a seguinte alternativa ao credor: ou renunciar a valor substancial do crédito ou não receber nunca. Isso equivale a confisco e infringe a Constituição.
Isso configura, a nosso ver, a instituição da imoralidade no regime de pagamento dos precatórios. Vale dizer, a opção escolhida pelo nosso poder originário, ao prever o sistema de precatórios na CF, não está sendo respeitada diante de duas constatações: primeiro, os Estados e Municípios não cumprem com as suas obrigações, multiplicando-se o débito de precatórios a cada ano, e, segundo, o legislador não mais observa os princípios inerentes a tal sistema, imprimindo na CF alternativas atentatórias aos direitos e garantias individuais.
Nesse contexto, as significativas mudanças trazidas pela EC no 62/2009 têm como objetivo principal fazer a fila de precatórios andar, admitindo-se uma flexibilização na referida ordem cronológica, na isonomia entre os credores e na liquidação integral da dívida, conforme decisão transitada em julgado. A justificativa para a legalização dos leilões pauta-se no fato de que no mercado informal tal prática tornou-se comum, em decorrência da morosidade da Fazenda Pública em pagar os seus débitos. Logo, se o credor poderá receber antes parte do valor a que tem direito, pois o pagamento com deságio autoriza a quebra da ordem cronológica, porque não institucionalizá-la e emendar a CF, retirando-se a necessidade de rigorosa observância à ordem cronológica, que termina por travar a fila.
Para uma visão atual da moralidade administrativa, ficamos com as palavras do Min. Celso de Mello:
Esse postulado fundamental, que rege a atuação do Poder Público, confere substância e dá expressão a uma pauta de valores éticos em que se funda a ordem positiva do Estado. É por essa razão que o princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limitações ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Público que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos órgãos e agentes governamentais. (ADI 2661/MA, Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, j. 05.06.2002, DJ 23.08.2002).
Aplicando-se tal princípio ao contexto do novo regime de pagamento de precatórios, poderemos perceber que, após anos e anos de batalhas judiciais, o credor trilhou um longo caminho e obteve uma sentença judicial condenatória do Estado. No entanto, o valor determinado pelo juiz, irrecorrível em face do trânsito em julgado da decisão judicial, não será liquidado, porque o Estado passou a dispor de outros instrumentos para diminuir os efeitos da sua condenação.
Essa solução foge aos padrões éticos e demonstra-se incompatível com a moral, norteadora das relações entre o Estado e os cidadãos. Além disso, infringe a coisa julgada, enquanto decisão do Poder Judiciário, pondo em risco o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a razoável duração do processo, à medida que o prazo de pagamento prorroga-se para 15 anos.
Vale questionar, nesse ponto, a existência do interesse público no mecanismo do leilão. Diante da oferta realizada por titular de crédito inscrito em precatório, onde quem oferece menos leva parte do que tinha direito, sem precisar esperar por longos anos, Marçal Justen Filho (2010, p. 190) faz a seguinte observação:
Interesse público é apenas o primário. Significa que a Administração não pode agir como um particular, no sentido de que condutas válidas no âmbito privado nem sempre podem ser assumidas por aquele que exerce função pública.
Ou seja, a circunstância de uma ação produzir benesses para os cofres públicos não significa ser ela compatível com os interesses coletivos. Assim se passa precisamente por força do princípio da moralidade, que exclui a possibilidade de uma conduta eticamente reprovável ser legitimada por meio da avaliação exclusiva de seus resultados. Afinal, a ética exclui o cabimento da máxima de que “o fim justifica os meios”.
A moralidade exige que os meios adotados pelo Estado e a sua conduta se harmonizem com a boa-fé, com a honestidade, com o respeito aos valores protegidos constitucionalmente.
Para que se atenda à boa-fé e à confiança, garantido-se um mínimo de conduta ética e de estabilização nas relações jurídicas, é preciso que se continue a conferir primazia à coisa julgada, afastando-se qualquer instabilidade ou desconfiança nas decisões proferidas pelo Judiciário, cuja função e atividade devem ser fonte de segurança, respeito e confiabilidade por parte dos jurisdicionados. (CUNHA, 2010, p. 359).
A EC no 62/2009 prevê a aplicação do novo regime de pagamento também aos precatórios já vencidos na data de sua publicação. Ocorre que o precatório não deixa de ser um efeito jurídico de determinada ordem judicial, decorrente de atos processuais pretéritos que levaram à sua expedição. Segundo Marçal Justen Filho (2010, p. 199), a expedição pressupõe a configuração de atos judiciais como perfeitos, por isso que se “uma lei posterior à emissão dos precatórios determinar a alteração do regime de sua liquidação, estará dispondo sobre os efeitos de atos processuais perfeitos e acabados, consumados e exauridos no passado.”
O STJ adota expressamente esse posicionamento, conforme se depreende da ementa abaixo:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. JUROS MORATÓRIOS. INCIDÊNCIA CONFIGURADA. VIOLAÇÃO DO ART. 6º DA LICC. DIREITO ADQUIRIDO. ATO JURÍDICO PERFEITO. POSICIONAMENTO DO EG. STF. EC 37.
É sabido que as regras constitucionais têm efeito imediato e comandam todo o ordenamento jurídico. Não obstante, o ato de expedição de precatório constitui-se perfeito juridicamente, devendo ser preservado nos termos do comando constitucional. A Constituição Federal não apresenta definição para ato jurídico perfeito, deixando tal tarefa para a legislação infraconstitucional. O artigo 6º, §1º, da LICC, dispõe, verbis: “reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que efetuou”. Deveras, em nome do princípio da segurança jurídica, deve respeitar-se o ato expedido em consonância com a ordem constitucional e legal da época em que proferido. Recurso provido. (STJ, REsp nº 640.771/CE. Órgão julgador: 5ª Turma. Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca. DJ, 18 abr. 2005).
Entendemos que as mudanças advindas da EC no 62/2009 encontram-se eivadas de vícios de inconstitucionalidade, porquanto admitem a supressão de princípios constitucionais.
Recentemente, este entendimento foi abraçado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, numa ação de intervenção estadual. O relator do acórdão, desembargador Ivan Sartori, entendeu ser inconstitucional a retroatividade prevista pela EC no 62/2009, havendo ofensa à cláusula pétrea e aos princípios constitucionais, como os da proporcionalidade e razoabilidade.
Segundo o relator,
[...] e, realmente, na parte que alcança precatórios a ela anteriores, a emenda atual está fadada ao mesmo destino meritório, justamente porque essa retroação fere garantias constitucionais básicas, mormente aquelas previstas no art. 5º, inciso XXXVI, da Lei Maior (direito adquirido e coisa julgada), a decorrerem de cláusula pétrea imutável pelo poder constituinte derivado, a teor do art. 60, § 4º, inciso IV. Manifesto, ainda, o abuso no poder de legislar, como arguido em uma das ações diretas, considerado que se trata da terceira moratória em favor do Poder Público (houve antes as dos arts. 33 e 78 do ADCT, o último advindo por força da EC 30/00), sucedendo ser patente o maltrato aos princípios da moralidade e da razoabilidade (art. 37 da Carta da República), sem falar que, ferindo a coisa julgada, porque já estabelecidos por decisão judicial definitiva o crédito e a forma de pagamento, segundo o regramento então vigente, a emenda também afronta a independência que deve haver entre os Poderes (art. 2º da Lei Maior).[10]
Essa decisão revela as diversas implicações que a EC nº 62/2009 trouxe para o ordenamento jurídico pátrio, porquanto dispôs sobre regras atinentes ao recebimento de créditos determinados pelo Poder Judiciário, após um longo processo de execução contra a Fazenda Pública. Os princípios constitucionais são retratados como limitações implícitas que devem ser observados pelo poder reformador, quando da alteração das normas constitucionais originárias e inserção de novas.
O descumprimento aos princípios ensejou, como visto, a intervenção estadual, sob o argumento de ser inconstitucional a retroatividade das normas introduzidas pela EC nº 62/2009, além de restar patente a afronta à moralidade e à coisa julgada.
Com efeito, vale fazer a transcrição de trecho da obra de Celso Antônio Bandeira de Mello, em estudo sobre a força e importância dos princípios:
[...] Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. (MELLO, 2007, p. 53).
Na tentativa de se equacionar o volume das dívidas públicas dos entes federativos, a EC nº 62/2009 extrapolou os seus limites, indo de encontro a direitos e garantias fundamentais, além de violar os princípios da moralidade administrativa, isonomia, coisa julgada, direito adquirido, duração razoável do processo, devido processo legal e segurança jurídica.
Restaram mitigados o direito do credor de receber o seu precatório na ordem cronológica de apresentação, bem como de ter integralmente liquidado o valor nele inscrito. Ademais, a espera pelo seu pagamento prolongou-se em até 15 anos, o que põe em dúvida a existência, em nosso ordenamento jurídico, do principio da razoável duração do processo.
4 O JULGAMENTO DO STF SOBRE A REFORMA INTRODUZIDA PELA EC Nº 62/2009
Em razão das alterações promovidas pela referida Emenda, principalmente a que institui o regime especial de pagamento, cujo prazo foi dilatado para quinze anos, é que foi proposta a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.357, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, juntamente com a Associação dos Magistrados Brasileiros, Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, Associação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário, Confederação Nacional dos Servidores Públicos e Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho.
No início do ano de 2010, foram ajuizadas mais três Ações Diretas de Inconstitucionalidade questionando a EC no 62/2009, dessa vez pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), pela Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (ANAMAGES) e pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA). É alegada a incompatibilidade das alterações constitucionais produzidas pela mencionada Emenda com as garantias constitucionais da tutela jurisdicional e da coisa julgada, e com os direitos fundamentais à segurança jurídica e à igualdade de tratamento, direitos e garantias assegurados no art. 5º da CF.
O parecer da Procuradoria Geral da República, emitido nos autos da ADI nº 4.357, foi pela procedência do pedido, em face da inconstitucionalidade formal relativa ao modo como se deu a votação da proposta que veio a resultar na EC nº 62/2009. No caso de ser superada essa questão, o parecer entendeu pela procedência parcial, a fim de que fosse declarada a inconstitucionalidade do art. 97 do ADCT, haja vista a ofensa direta ao próprio Estado de Direito – “ideia-força que subjaz a todo sistema de direitos fundamentais, e que, portanto, também goza de proteção diante do poder constituinte derivado”, nas palavras do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
O quadro de inadimplência por parte das Fazendas Públicas estaduais, municipais e distritais acima detalhado, somado à falta de utilização dos mecanismos constitucionais previstos para forçá-las ao pagamento, já é, em si, dado suficientemente comprometedor do Estado de Direito.
E este mais se agrava com a solução apresentada pelo art. 97 do ADCT: os precatórios, com pagamentos já alongados no tempo em 8 anos e, depois, mais 10, têm agora o prazo elastecido para mais 15 anos ou para quando o permitirem as receitas líquidas dos Estados, Municípios e Distrito Federal. Ao fim e ao cabo, dívidas cujo pagamento se estende a eternidade. (Parecer da Procuradoria Geral da República).
As quatro ações (ADIs nos 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425) foram chamadas para julgamento em conjunto no dia 16 de junho de 2011 e, após o voto do Ministro Carlos Ayres Britto, relator, rejeitando as preliminares e conhecendo parcialmente da ADI 4.372, o julgamento dos feitos foi suspenso por um pedido de vista do Ministro Luiz Fux. Em seu voto, o Ministro Relator destaca a afronta direta a princípios constitucionais e a instituição do calote público. Segundo o relator,
[...] Com a devida vênia daqueles que entendem diversamente, penso adequada a referência dos autores à Emenda Constitucional nº 62/2009 como a “emenda do calote”. Calote que termina por ferir o princípio da moralidade administrativa, que se lê no caput do art. 37 da Constituição Federal, na medida em que se reconheça - como pessoalmente reconheço - o adimplemento das próprias dívidas como um dos necessários conteúdos do princípio da moralidade administrativa. (ADI 4372/DF, Pleno, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, j. 16.06.2011, DJ 01.08.2011).
Ainda em seu voto, o entendimento diante da mencionada Emenda é de que o Estado se colocou muito acima da lei e da Constituição, chamando essa situação de “caricato surrealismo jurídico”, onde
o que se tem é dolorosamente isso: todo o regime especial veiculado pelo art. 97 do ADCT é reverente à lógica hedonista de que as dívidas do Estado em face de terceiros hão de ser pagas, em acentuada medida, quando e se o Poder Público desejar. É um segundo passo da caminhada que se iniciou com a Emenda Constitucional nº 30/2000 e que não terá fim enquanto este Supremo Tribunal Federal sucumbir às tão antigas quanto deletérias “razões de Estado”. Razões artificializadas ou indisfarçavelmente falsas [...].
Concluindo o seu voto, o relator analisa as informações relativas aos últimos dez anos que pediu às Secretarias de Fazenda dos Estados e das suas capitais, bem como as solicitadas aos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais do Trabalho de todo o Brasil, e percebe que o colapso financeiro do Estado não é verdadeiro, ao menos na extensão em que se alardeia. O que existe, segundo o relator, é a falta de compromisso quanto ao cumprimento das decisões judiciais. Não falta dinheiro para o pagamento de precatórios, na medida em que ele compara as elevadas receitas destinadas à publicidade com as ínfimas direcionadas ao adimplemento dos débitos judiciais – isso quando estas existem.
O mencionado julgamento teve prosseguimento no dia 14 de março de 2013, quando o Plenário do STF, por maioria, julgou parcialmente procedentes as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nos 4.357 e 4.425 para declarar a inconstitucionalidade de parte da EC nº 62/2009. Com a decisão, foram declarados integralmente inconstitucionais os §§ 9º, 10, 15 do art. 100 da Constituição Federal, como também o art. 97 do ADCT, que criou o regime especial de pagamento, e o art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97.
Por sua vez, foram declarados parcialmente inconstitucionais os §§ 2º e 12 do art. 100 da Constituição Federal. Quanto ao § 2º do art. 100 da CF/88, foi declarada inconstitucional a seguinte expressão: “na data de expedição do precatório”. No que se refere ao § 12 do art. 100, foram declaradas inconstitucionais as seguintes expressões: “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” e “independentemente de sua natureza”.
Há de se reconhecer que a presente decisão é complexa e enseja muitos questionamentos sobre a sua aplicação. O Ministro Luiz Fux, redator para o acórdão da ADI nº 4.357, proferiu decisão monocrática determinando a continuidade dos pagamentos de precatórios na forma como vinham sendo realizados anteriormente. Ou seja, os Tribunais de Justiça de todos os Estados e do Distrito Federal devem continuar realizando o pagamento de precatórios do mesmo modo em que estavam fazendo antes da decisão proferida pelo STF no dia 14 de março de 2013, “segundo a sistemática vigente à época, respeitando-se a vinculação de receitas para fins de quitação da dívida pública, sob pena de sequestro”.
Aguarda-se, desse modo, o prosseguimento do julgamento da mencionada ADI, que teve suspensa a sua sessão devido ao pedido de vista feito pelo Ministro Luís Roberto Barroso. Somente assim a decisão poderá ter os seus efeitos modulados, conforme proposto pelo Ministro Luiz Fux em voto apresentado à época.
5 CONCLUSÃO
Em face do desrespeito a normas constitucionais cujo núcleo é irreformável, por se tratarem de cláusulas pétreas ou limitações materiais implícitas, o controle jurisdicional de constitucionalidade, seja ele abstrato ou concreto, torna-se o meio legítimo para afastar tais normas da Constituição. Estas não são normas constitucionais originárias, justamente pelo fato de terem sido criadas pelo poder reformador, e podem incidir, portanto, em vícios de inconstitucionalidade.
O art. 60, §4º, inciso IV, da CF, proíbe a proposta de emenda constitucional que venha a abolir os direitos e garantias individuais. Em que pese a existência de limitações materiais ao poder de reforma da Constituição, cuja intangibilidade visa resguardar a democracia e os princípios constitucionais, a fim de que se confira harmonia e unidade ao sistema constitucional, a EC nº 62/2009 extrapolou os seus limites e foi além, em busca do equacionamento e redução das dívidas públicas, em detrimento dos direitos fundamentais do titular do precatório.
Isso revela uma afronta a toda a unidade constitucional e ao ordenamento jurídico brasileiro, na medida em que se passou a admitir a flexibilização de direitos e garantias individuais, em prol do melhor interesse da Administração. Mais do que isso, a moralidade administrativa deixou de ser um dos princípios norteadores da atividade do Estado, passando a ser letra morta na atuação da Administração Pública, cuja inobservância à boa-fé e confiança permite a realização do controle jurisdicional de todos os seus atos.
Sem embargo de a EC nº 62/2009 ter introduzido mudanças que visaram à efetividade do sistema de precatórios, a exemplo da previsão de titular portador de doença grave ou idoso, da ampliação das possibilidades de sequestro, compensação de precatórios com débitos líquidos e certos e a sua cessão, o STF entendeu que muitas das mudanças introduzidas por esta reforma constitucional violaram, em diversos pontos, os princípios inerentes à CF, bem como os direitos e garantias individuais previstos em seu art. 5º.
REFERÊNCIAS
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LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. A noção jurídica de interesse público. Grandes Temas de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 181-191.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 21 ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2007.
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7 ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
_________. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2008.
[1] “Art. 60 – A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: [...] §4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais.”
[2] Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. [...]
[3] Sobre a matéria, o STF afirmou que os limites materiais visam à proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos abrigados pelas cláusulas pétreas: “Reitero de logo que a meu ver as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, §4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege. Convém olvidar que, no ponto, uma interpretação radical e expansiva das normas de intangibilidade da Constituição, antes de assegurar a estabilidade institucional, é a que arrisca legítimas rupturas revolucionárias ou dar pretexto fácil à tentação de golpes de Estado”. Rel. Min. Sepúlveda Pertence, STF, DJU, 14 nov. 2003, p. 14, MS 23.047/DF.
[4] STF, DJU, 6 dez. 2002, ADI 2.666/DF, Rel. Min. Ellen Gracie: “Impertinência da preliminar suscitada pelo Advogado-Geral da União, de que a matéria controvertida tem caráter interna corporis do Congresso Nacional, por dizer respeito à interpretação de normas regimentais, matéria imune à crítica judiciária. Questão que diz respeito ao processo legislativo previsto na Constituição Federal, em especial às regras atinentes ao trâmite de emenda constitucional (art. 60), tendo clara estatura constitucional”.
[5] ADI 830-7, DJU, 16 set. 1994, Rel. Min. Moreira Alves: “Não há dúvida de que, em face do novo sistema constitucional, é o STF competente para, em controle difuso ou concentrado, examinar a constitucionalidade, ou não, de emenda constitucional – no caso a n.2, de 25 de agosto de 1992 – impugnada por violadora de cláusulas pétreas explícitas ou implícitas”.
[6] Art. 97, §1º: [...] “Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios sujeitos ao regime especial de que trata este artigo optarão, por meio de ato do Poder Executivo: [...]”.
[7] Art. 97, §8º: “A aplicação dos recursos restantes dependerá de opção a ser exercida por Estado, Distrito Federal e Municípios devedores, por ato do Poder Executivo, obedecendo à seguinte forma, que poderá ser aplicada isoladamente ou simultaneamente: I – destinados ao pagamento dos precatórios por meio do leilão; II – destinados a pagamento a vista de precatórios não quitados na forma do §6º e do inciso I, em ordem única e crescente de valor por precatório; III – destinados a pagamento por acordo direto com os credores, na forma estabelecida por lei própria da entidade devedora, que poderá prever criação e forma de funcionamento de câmara de conciliação.”
[8] AC-QO 254, Rel. Min. Celso de Mello. DJ 18/12/2009.
[9] Art. 37, CF: “A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]”.
[10] Ementa: Constitucional – Intervenção estadual no Município de Osasco – Descumprimento de precatório alimentar da Justiça do Trabalho. Legitimação ativa do credor – Precedentes desta Corte. Inaplicabilidade da EC 62/09, dada a inconstitucionalidade da retroatividade ali prevista – Ofensa a cláusula pétrea (art. 5º, inciso XXXVI, c/ o art. 60, § 4º, inciso 4º). Inobservância do prazo previsto no parágrafo 1º do art. 100 da CF – Justificativa da requerida inconsistente – Obrigatoriedade do administrador de manter o equilíbrio das contas públicas – Incidência dos arts. 35, inciso IV, da Constituição Federal e 149, inciso IV, da Constituição Bandeirante – Intervenção deferida. (Intervenção Estadual nº 994.09.229278-6, julgado em 30.06.2010)
Advogado, Pós-graduado em Direito do Estado pelo Instituto Excelência (PODIVM), Graduado em Direito pela Universidade Salvador - UNIFACS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Ricardo Barreto Prata. O controle de constitucionalidade da reforma constitucional e a posição do STF sobre o atual regime de precatórios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 mar 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38828/o-controle-de-constitucionalidade-da-reforma-constitucional-e-a-posicao-do-stf-sobre-o-atual-regime-de-precatorios. Acesso em: 25 nov 2024.
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