Resumo: Analisando os direitos sociais e a sua natureza de direitos fundamentais, de índole prestacional, o presente trabalho busca, de uma forma sintética, discutir os instrumentos garantidores postos à concretização constitucional de tais direitos.
Palavras-Chaves: Direitos Sociais – Direitos Fundamentais- Garantias Constitucionais.
Abstract: Analyzing social rights and the nature of fundamental rights, provides nature, the present work, a synthetic form, discuss the constitutional guaranty instruments available to achieve these rights.
Key Words: Social Rights - Fundamental Rights-Constitutional Guarantees.
1. INTRODUÇÃO
Os direitos sociais são os direitos de segunda geração ou dimensão e abrangem a liberdades positivas, ou seja, aquelas que impõem ao Estado uma obrigação de fazer, de implementar políticas públicas e viabilizar prestações sociais.
José Afonso da Silva[1] (2004, p. 285) conceitua os direitos sociais como:
[...] dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que ligam ao direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporciona condição mais compatíveis com o exercício efetivo da liberdade.
O Capítulo II da Constituição Federal dispõe acerca dos direitos sociais, direitos estes inseridos no Título de Direitos e Garantias Fundamentais.
São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (art. 6º da CF/88).
Como direitos fundamentais, os direitos sociais merecem a proteção das garantias fundamentais e dos instrumentos postos a sua concretização.
2. OS DIREITOS SOCIAIS COMO DIREITOS FUNDAMENTAIS
Os direitos sociais são direitos fundamentais e conforme ensinam Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino[2] (2007, p. 94):
[...] Os direitos fundamentais são os bens em si mesmo considerados, declarados como tais nos textos constitucionais.
As garantias fundamentais são estabelecidas pelo texto constitucional como instrumentos de proteção dos direitos fundamentais. As garantias possibilitam que os indivíduos façam valer, frente ao Estado, os seus direitos fundamentais. Assim, ao direito à vida, corresponde a garantia a vedação à pena de morte; ao direito à liberdade de locomoção, corresponde a garantia do habeas corpus; ao direito de liberdade de manifestação do pensamento, a garantia da proibição da censura etc.
Pode-se dizer que os direitos sociais trata-se de uma matéria reservada ao Executivo ou Legislativo. O primeiro quanto à decisão política acerca da implementação de tais direitos e o segundo quanto aos aspectos regulamentares para a efetividade as normas constitucionais relativas aos direitos sociais.
Os direitos sociais são considerados direitos de índole prestacional, cabendo ao Estado a obrigação de disponibilizar os meios necessários para o seu pleno exercício.
Além disso, os direitos sociais são direitos juridicamente vinculantes, na medida em que desloca a competência do legislador em implementá-los para o Judiciário através sua jurisdição constitucional.
3. DIREITOS SOCIAIS E OS INSTRUMENTOS POSTOS À CONCRETIZAÇÃO CONSTITUCIONAL
Aos direitos sociais são concedidas garantias de natureza material -constitucional, como a inclusão no manto assecuratório das clausulas pétreas (entendimento este ainda não expressamente reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal) e também garantias de natureza processual – constitucional, como o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção.
O mandado de segurança trata-se de garantia constitucional que visa proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerçam (art. 5º, LXIX, da Constituição Federal).
O habeas data trata-se de garantia fundamental que visa assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público (art. 5º. LXXII, da Constituição Federal).
O mandado de injunção também é considerado uma garantia fundamental que deve ser utilizado sempre “que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania” (art. 5º, LXXI, da Constituição Federal)
Especificamente quanto ao mandado de injunção, leciona Paulo Bonavides[3] (2004, p. 551) que:
[...] o mandado de injunção serve, pois, para remover inconstitucionalidades por omissão em matéria de direitos subjetivos constitucionais exarados na Carta Magna, ocorrendo sempre em casos concretos ou incidentalmente numa lide.
Aliás, fundamentado na necessidade da utilização do mandado de injunção como garantia constitucional de natureza processual para viabilizar o exercício do direito social de greve, o Pretório Excelso, no MI 712/PA, julgou procedente o pedido do mandado de injunção para remover o obstáculo decorrente da omissão legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do direito consagrado no artigo 37, VII, da Constituição do Brasil:
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO. PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. INCUMBE AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR VIÁVEL O EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS, CONSAGRADO NO ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. O acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
2. A Constituição do Brasil reconhece expressamente possam os servidores públicos civis exercer o direito de greve --- artigo 37, inciso VII. A Lei n. 7.783/89 dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores em geral, afirmado pelo artigo 9º da Constituição do Brasil. Ato normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis.
3. O preceito veiculado pelo artigo 37, inciso VII, da CB/88 exige a edição de ato normativo que integre sua eficácia. Reclama-se, para fins de plena incidência do preceito, atuação legislativa que dê concreção ao comando positivado no texto da Constituição.
4. Reconhecimento, por esta Corte, em diversas oportunidades, de omissão do Congresso Nacional no que respeita ao dever, que lhe incumbe, de dar concreção ao preceito constitucional. Precedentes.
5. Diante de mora legislativa, cumpre ao Supremo Tribunal Federal decidir no sentido de suprir omissão dessa ordem. Esta Corte não se presta, quando se trate da apreciação de mandados de injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia.
6. A greve, poder de fato, é a arma mais eficaz de que dispõem os trabalhadores visando à conquista de melhores condições de vida. Sua auto-aplicabilidade é inquestionável; trata-se de direito fundamental de caráter instrumental.
7. A Constituição, ao dispor sobre os trabalhadores em geral, não prevê limitação do direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dela defender. Por isso a lei não pode restringi-lo, senão protegê-lo, sendo constitucionalmente admissíveis todos os tipos de greve.
8. Na relação estatutária do emprego público não se manifesta tensão entre trabalho e capital, tal como se realiza no campo da exploração da atividade econômica pelos particulares. Neste, o exercício do poder de fato, a greve, coloca em risco os interesses egoísticos do sujeito detentor de capital --- indivíduo ou empresa --- que, em face dela, suporta, em tese, potencial ou efetivamente redução de sua capacidade de acumulação de capital. Verifica-se, então, oposição direta entre os interesses dos trabalhadores e os interesses dos capitalistas. Como a greve pode conduzir à diminuição de ganhos do titular de capital, os trabalhadores podem em tese vir a obter, efetiva ou potencialmente, algumas vantagens mercê do seu exercício. O mesmo não se dá na relação estatutária, no âmbito da qual, em tese, aos interesses dos trabalhadores não correspondem, antagonicamente, interesses individuais, senão o interesse social. A greve no serviço público não compromete, diretamente, interesses egoísticos do detentor de capital, mas sim os interesses dos cidadãos que necessitam da prestação do serviço público.
9. A norma veiculada pelo artigo 37, VII, da Constituição do Brasil reclama regulamentação, a fim de que seja adequadamente assegurada a coesão social.
10. A regulamentação do exercício do direito de greve pelos servidores públicos há de ser peculiar, mesmo porque "serviços ou atividades essenciais" e "necessidades inadiáveis da coletividade" não se superpõem a "serviços públicos"; e vice-versa.
11. Daí porque não deve ser aplicado ao exercício do direito de greve no âmbito da Administração tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89. A esta Corte impõe-se traçar os parâmetros atinentes a esse exercício.
12. O que deve ser regulado, na hipótese dos autos, é a coerência entre o exercício do direito de greve pelo servidor público e as condições necessárias à coesão e interdependência social, que a prestação continuada dos serviços públicos assegura.
13. O argumento de que a Corte estaria então a legislar --- o que se afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] --- é insubsistente.
14. O Poder Judiciário está vinculado pelo dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora de que carece o ordenamento jurídico. 15. No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito de greve dos servidores públicos.
16. Mandado de injunção julgado procedente, para remover o obstáculo decorrente da omissão legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do direito consagrado no artigo 37, VII, da Constituição do Brasil. (MI 712, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-03 PP-00384)
A ação direita de inconstitucionalidade por omissão também é considerada uma garantia constitucional, que tem por “objeto a chamada omissão inconstitucional, que ocorre quando uma norma constitucional deixa de ser efetivamente aplicada pela falta da atuação normativa dos órgãos dos poderes constituído” (Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino[4], 2007, p.309).
4. CONCLUSÃO
Os direitos sociais reclamam a atuação do Poder Público, que possibilitem o efetivo exercício de tais liberdades fundamentais, inclusive por força normativa vinculante das garantias constitucionais dispostas na Lei Maior para a sua concretização.
Assim, não restam dúvidas que aos direitos sociais são concedidas garantias de natureza material-constitucional, como a inclusão no manto assecuratório das clausulas pétreas (e também garantias de natureza processual – constitucional, como o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BONAVIDES, PAULO. Curso de Direito Constitucional. 14ª Edição. 2004. São Paulo: Malheiros Editores.
DA SILVA, JOSÉ AFONSO. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª Edição. 2004. São Paulo: Malheiros Editores.
PAULO, VICENTE E ALEXANDRINO, MARCELO. 2007. Direito Constitucional Descomplicado. Rio de Janeiro: Impetus.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília/DF.
[1] Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores.
[2] Direito Constitucional Descomplicado. Rio de Janeiro: Impetus.
[3] Curso de Direito Constitucional. 14ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores.
[4] Direito Constitucional Descomplicado. 2007. Rio de Janeiro: Impetus.
Procuradora Federal junto ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, Chefe do Serviço de Gerenciamento Estratégico, pós graduada em Direito Processual pela AVM Faculdade Integrada e pós-graduanda em Direito Administrativo. Fui analista judiciária do Superior Tribunal de Justiça, com exercício nos Gabinetes dos Ministros Maria Thereza de Assis Moura e Nilson Naves. Fui também advogada da Embrapa, com exercício na Embrapa-Sede.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Agueda Cristina Galvão Paes de. Direitos sociais e os instrumentos postos à concretização constitucional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jul 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40134/direitos-sociais-e-os-instrumentos-postos-a-concretizacao-constitucional. Acesso em: 22 nov 2024.
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