Orientador: Pedro Luis Próspero Sanchez·
Palavras-chaves: perícia, perito, direito administrativo, common law, direito romanista, direito comparado.
Gilissen (1995) divide os sistemas jurídicos em dois: os direitos romanistas e a common law. O primeiro, assim chamado, devido a influência sofrida pelo direito romano em sua formação, desenvolvido nas universidades dos países latinos e também nos países germânicos. O segundo nasceu na Inglaterra por ação dos tribunais reais na Baixa Idade Média sendo, portanto, um direito elaborado pelos juízes, tendo assim como sua principal fonte, a jurisprudência.
Conforme Dantas (2000), o objetivo principal do Direito Comparado é estudar comparando sistemas jurídicos, utilizando-se de uma perspectiva de macro ou microcomparação. Aqui adotaremos a microcomparação, ou seja, não do sistema jurídico como um todo, mas a um setor do sistema: o administrativo.
Vale assinalar que o direito administrativo encontra diversas dificuldades em se tratando de direito comparado, já que a própria definição de direito administrativo não possui valor universal, variando quase que totalmente de país para país iniciando-se, por exemplo, com a delimitação exata de seu objeto de pesquisa, o que de acordo com a concepção francesa do direito administrativo, dois traços característicos se evidenciam: a unidade e a autonomia (RIVERO, 2004).
Na França o direito administrativo se enquadra em dois grupos distintos: o do direito administrativo puramente descritivo e aquele outro que determina as relações jurídicas nascentes da ação da Administração.
O primeiro delineia o estatuto dos órgãos públicos administrativos do Estado, a estrutura dos serviços públicos e os mecanismos dos procedimentos relativos a determinadas atividades, enquanto o segundo trata das prerrogativas e obrigações, regendo também as garantias dos particulares contra possíveis arbitrariedades, constituindo a jurisprudência, fonte de direito (RIVERO, 2004).
Quanto ao seu conteúdo, é um direito autônomo, fundado em princípios próprios, e em relação ao chamado “direito comum”, é derrogatório, utilizando-se de conceitos não propostos em direito privado, como o da utilidade pública ou potestade pública, assim como quando soluciona problemas que surgem no direito privado, tais como contratos, ou responsabilidade, solucionando estes de maneira diferente, sendo sua característica primordial a autonomia. Esta concepção de direito administrativo autônomo não é universalmente aceita (RIVERO, 2004).
Enquanto alguns países da Europa continental admitem essa concepção francesa, no mundo anglo-saxão a situação é diferente. Os ingleses não acreditam existir um direito administrativo e negam o reconhecimento de um campo tão extenso. Os americanos ainda o criticam por ser pouco “administrativo”, concluindo que tudo que diz respeito à organização administrativa, é considerado estranho ao Administrative Law, fato que resulta em uma predominância da ciência política na Administração (RIVERO, 2004).
A Common Law foi aplicada a todos os países com dominação britânica. Na América do Norte fundamentou o Direito do Canadá e dos Estados Unidos da América, que por possuir uma estrutura federativa, se diferencia do modelo britânico, principalmente quanto ao Direito Público (LOSANO, 1993).
Farnsworth (19XX), explica que o campo de Direito Administrativo compreende a competência e o funcionamento dos órgãos governamentais que, além das legislaturas e dos Tribunais, afetam os interesses privados por normas ou decisões. Este tipo de órgão é chamado normalmente de agência (agency).
Continua ainda que este campo é predominantemente processual, não incluindo o direito substantivo criado pelos departamentos administrativos, tratando-se do desempenho pelos funcionários públicos de funções normativas ou judiciais, sendo que seu desempenho em funções não relacionadas com elaboração de regulamentos ou prestação de serviços inclui-se na matéria de administração pública, ramo da Ciência Política e que não é lecionada em escolas de Direito. O controle da Administração se centraliza nos Tribunais.
Os diversos departamentos federais são os que têm maior influência, como por exemplo, o Departamento Nacional de Defesa.
O Direito Administrativo então é composto pelo Direito Constitucional, leis, jurisprudência, normas e decisões de caráter administrativo, sendo o efeito da cláusula do processo regular sobre o processo administrativo, no plano constitucional, de grande importância. A lei de americana de 1946 sobre processo administrativo foi altamente relevante, pois regulou o processo administrativo e esclareceu o alcance judicial da ação administrativa (FARNSWORTH, 19XX).
Continua ainda que graças às diversas diretivas constitucionais e legais, a jurisprudência desempenha importante papel, pois não existem tribunais especificamente administrativos, sendo os princípios de elaboração judicial comuns aos outros campos.
Quanto às suas características, o processo pode ser formal ou informal, sendo que a grande maioria das decisões é lavrada em processo informal, não se assemelhando com a audiência formal.
Apesar de haver uma lei federal sobre processo administrativo (faz parte do chamado United States Code) que prescreve regras gerais com pontos comuns entre os diversos departamentos, não existe um código processual específico e detalhado, dominando a processualística administrativa. O tema fundamental da cláusula de processo regular da Constituição Federal, cujos principais requisitos são a notificação e o direito de defesa, predominam.
As audiências são geralmente realizadas perante funcionários do departamento, chamados auditores, cujas conclusões preliminares estão sujeitas à decisão final do departamento. A parte que se considerar afetada por decisões normativas pode também defender seu direito, não, porém, ordinariamente em audiência de julgamento.
Em resumo, existem três modelos: o Sistema contencioso-administrativo, cuja origem é francesa e como característica possui a vedação da Justiça Comum em conhecer e julgar os atos da Administração, tendo o Conselho de Estado como último grau de jurisdição em matéria administrativa, sendo exemplos de países que adotaram o sistema a França, Espanha, Itália, Alemanha e Uruguai.
O Sistema de Jurisdição Única anglo-saxão tem sua origem na Inglaterra, que pelo seu Judicial Control todos os litígios devem ser resolvidos pelo Judiciário, e como exemplo de países que adotaram o sistema, tem-se a Inglaterra, Estados Unidos, México e Romênia.
Por último, o Sistema Misto, que foi adotado pelo Brasil, onde se mantém a acessibilidade ao Judiciário, independentemente do esgotamento da instância administrativa, sendo, a nosso ver, uma forma mais democrática.
No Brasil, o Sistema de Jurisdição Única prevaleceu desde o período republicano, quando Rui Barbosa se inspirou na Constituição dos Estados Unidos para redigir o que mais tarde seria a Constituição de 1891.
A Emenda Constitucional 7/77, por uma questão de concentração do poder durante o regime militar em 1964, tentou introduzir o Sistema Contencioso Administrativo, porém o dispositivo constitucional não produziu efeitos.
A Constituição de 1988 reestabeleceu o Sistema do Controle Judiciário em seu art. 5º, LV, tendo o princípio da Inércia da Jurisdição dado significativa importância às funções essenciais da Justiça.
No Brasil, a lei 8.666/93 que trata das contratações públicas, no capítulo “Dos Serviços Técnicos Especializados” em seu artigo 13, prevê:
Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:
I - estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;
II - pareceres, perícias e avaliações em geral;
III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)
IV - fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;
V - patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;
VI - treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;
VII - restauração de obras de arte e bens de valor histórico.
VIII - (Vetado). (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994)
§ 1o Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração.
§ 2o Aos serviços técnicos previstos neste artigo aplica-se, no que couber, o disposto no art. 111 desta Lei.
§ 3o A empresa de prestação de serviços técnicos especializados que apresente relação de integrantes de seu corpo técnico em procedimento licitatório ou como elemento de justificação de dispensa ou inexigibilidade de licitação, ficará obrigada a garantir que os referidos integrantes realizem pessoal e diretamente os serviços objeto do contrato.
Quanto ao caráter da norma, as regras contidas no artigo 13 e seus respectivos incisos, são de caráter geral porque discriminam os serviços especializados, caracterizando pelos seus artigos 24 e 25 as hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação (PEREIRA JUNIOR, 2009).
Conforme Motta (2005), a questão dos serviços técnicos especializados mudou de orientação a partir de seu paradigma, o art. 12 do Decreto-lei 2.300/86, que tratava das licitações e contratos do Governo Federal e que foi revogado pela lei 8.666/93, chegando o substitutivo do Senado a eliminar a tese da inexigibilidade nestes casos, assim como o de notória especialização, mantida no art. 25, parágrafo 1º.
Continua ainda que, o Anteprojeto do TCU, outro texto anterior à Lei de Licitação, extinguia também as duas figuras, exigindo a licitação em ambos os casos, mas essa tendência acabou por ser vencida pelo parágrafo 1º do artigo 13, que além de ressalvar a inexigibilidade, propõe a solução para a realização de licitação, conciliando as fundamentadas críticas feitas quanto ao abuso das hipóteses de inexigibilidade, especificamente, quanto às alegações de notoriedade.
Fernandes (2009) reforça que alguns procedimentos ainda têm esvaziado o art. 13, caput e seu §1º, como a adoção de inexigibilidade de licitação por notória especialização ou ainda utilizando-se de concorrência do tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço” que mesmo com a prescrição legal para que seja dada preferência ao concurso como modalidade de licitação, por uma questão de falta de controle, esta não vem sendo seguida.
Mukai (2010) acha que o legislador foi feliz na caracterização dada pelo art. 25, pois deixou clara a hipótese, equacionando adequadamente ponderação e moderação, evitando assim, problemas que poderiam ocorrer em termos de aplicação prática.
Araújo (2007) explica que os serviços técnicos relacionados nos incisos I a VII do art. 13, não obstante estarem relacionados taxativamente podem ser considerados trabalhos técnicos profissionais genéricos quando demandam apenas habilitação profissional respectiva, ou especializados, em sentido estrito, quando, além da habilitação profissional, exijam especialização, cursos e outros estudos especiais.
A lei 8.666/93 trata a modalidade de licitação concurso em seu Capítulo II (Da Licitação), Seção I (Das Modalidades, Limites e Dispensa), artigo 22, IV e §4º:
Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias.
Complementa ainda, quanto aos regramentos da modalidade, o artigo 52:
Art. 52. O concurso a que se refere o § 4º do art. 22 desta Lei deve ser precedido de regulamento próprio, a ser obtido pelos interessados no local indicado no edital.
§ 1º O regulamento deverá indicar:
I - a qualificação exigida dos participantes;
II - as diretrizes e a forma de apresentação do trabalho;
III - as condições de realização do concurso e os prêmios a serem concedidos.
§ 2º Em se tratando de projeto, o vencedor deverá autorizar a Administração a executá-lo quando julgar conveniente.
Quanto ao julgamento, prevê o artigo 51, §5º:
Art. 51. A habilitação preliminar, a inscrição em registro cadastral, a sua alteração ou cancelamento, e as propostas serão processadas e julgadas por comissão permanente ou especial de, no mínimo, 3 (três) membros, sendo pelo menos 2 (dois) deles servidores qualificados pertencentes aos quadros permanentes dos órgãos da Administração responsáveis pela licitação.
...
§ 5º No caso de concurso, o julgamento será feito por uma comissão especial integrada por pessoas de reputação ilibada e reconhecido conhecimento da matéria em exame, servidores públicos ou não.
O artigo 25 informa que será inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial, conforme o inciso II, para a contratação de serviço técnicos enumerados no artigo 13, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação.
A justificativa para a não realização da licitação, nesta hipótese, é a natureza do serviço, a capacidade técnica do prestador do serviço a ser selecionado e as peculiaridades do serviço que está a exigir a contratação da referida empresa ou profissional, e não a singularidade, entendida como a existência de um único interessado, do prestador de serviço, que justifica a não realização de licitação. A peculiaridade mencionada no dispositivo é a do serviço a ser executado, e não quanto ao número de empresas em condições de prestar o serviço (FURTADO, 2010).
Se o profissional ou empresa de notória especialização fosse único, não seria possível dizer que seria o mais adequado e se a lei se refere ao mais adequado, pressupõe-se que há pelo menos dois, dentre os quais a Administração escolhe um. A Administração tem o poder discricionário de determinar qual desses na sua visão aplicada ao caso concreto é o mais adequado (AMARAL, 2006).
Passemos então à distinção entre esta modalidade de licitação “concurso” e o “concurso” para ocupação de cargo ou emprego público.
A previsão constitucional para recrutamento de pessoal prevista no artigo 37, inciso II, possui poucas semelhanças com a modalidade licitatória aqui analisada, ficando como pontos em comum a obrigatoriedade para a Administração Pública direta, indireta e fundacional dos três Poderes e de todas as esferas governamentais e o objetivo de concretizar o princípio da isonomia, podendo este ser de provas e títulos, permitindo na modalidade licitatória outros meios de julgamento (FERNANDES, 2009).
Enquanto o primeiro tem por objetivo preencher cargo ou emprego da administração pública, visando a satisfação de necessidade perene da Administração, passando seus selecionados a regerem-se por legislação própria (o Estatuto do Servidor Público, ou pela CLT), a receberem vencimentos ou salários mensais, e exercerem um trabalho contínuo, a modalidade licitatória não visa esta continuidade.
Esta tem como pretensão um resultado concreto do trabalho preponderantemente intelectual, técnico, científico ou artístico, e daí a regra do prêmio que é pago de uma só vez. Enquanto no primeiro o início do trabalho se dá após a contratação, no segundo, quando julgado, este já foi realizado, ficando apenas a premiação.
Fernades (2009) no traz como uma inovação da lei 8.666/93 a admissão de “remuneração” como forma de pagamento e explica que a noção do termo “prêmio”, coincide parcialmente com a ideia do sentido coloquial do termo, que diz respeito a “recompensa” e que esta ideia é muitas vezes desenvolvida na Administração Pública quando institui um determinado trabalho não só com o objetivo de utilizá-lo, mas também de incentivar o meio acadêmico a despertar interesse pelo tema.
Conforme apontado no artigo 51, §5º, outra particularidade é quanto ao julgamento, que no caso em análise deve ser efetuado por uma comissão especial composta por pessoas de reputação ilibada e reconhecido conhecimento sobre o objeto ou trabalho em análise, podendo compor servidores ou não. Outras peculiaridades estão prescritas no artigo 52.
O artigo 21, §2º, I, prevê um prazo de no mínimo 45 dias contados entre a publicação do edital e o recebimento das propostas. Este período poderá ser maior para que os concorrentes realizem o objeto solicitado ou desenvolvam a proposta técnica, sendo inválido o concurso que, graças a prazo reduzido, inviabilize a ampla participação dos interessados. Como regra não deverá executar a atividade o vencedor do concurso.
Ainda quanto ao prazo, Justen Filho (2005), diz que há possibilidade de estabelecimento de prazos médios compatíveis com os padrões normais de conduta, não cabendo a argumentação de impossibilidade de estabelecer prazos mínimos, ou que este prazo é variável individualmente.
O concurso deve ser regulamentado individualmente, sendo este disponibilizado aos interessados no local previsto pelo respectivo edital, conforme prescrito pelo art. 52, caput, devendo mencionar: a qualificação exigida dos participantes, as diretrizes e a forma de apresentação do trabalho, as condições de realização do concurso e os prêmios aos vencedores (MEDAUAR, 2012).
O vencedor deve autorizar a Administração, em caso de projeto, a executá-lo quando julgar conveniente, devendo o julgamento ser realizado por comissão especial composta por pessoas de reputação ilibada e reconhecido conhecimento da matéria, servidores públicos ou não, conforme prescrito pelo artigo 51.
O caput do artigo 111, também prescreve que a Administração só poderá contratar, pagar, premiar ou receber projeto ou serviço técnico especializado quando houver a cessão dos direitos patrimoniais a ele relativos, podendo a Administração utilizá-lo conforme previsto no edital do concurso, o que segundo Meirelles (2010), há condicionamento para o pagamento do prêmio ou remuneração ao autor com a cessão dos direitos a ele relativos para que possa a Administração utilizá-lo conforme previsto no regulamento ou ajuste para sua elaboração.
Se o autor do projeto ou serviço técnico especializado retivesse ou transmitisse a seus sucessores os direitos patrimoniais decorrentes de sua obra criada, contratada pela Administração, poderia cobrá-los enquanto esta dela fizesse uso e até que caísse em domínio público, conforme previsto pela lei de Direitos Autorais (5.988/73) em seu artigo 42.
A Administração, ao contratar, faz corresponder o valor do contrato ao exercício financeiro e está impedida de fazê-lo por prazo indeterminado, o que ocorreria na hipótese de não haver a cessão dos direitos (PEREIRA JUNIOR, 2009).
Outra questão é a necessidade de flexibilidade pela Administração para fazer os ajustes necessários para a execução do contrato convenientes ao interesse público, que mesmo depois de executado, para atender necessidades posteriores que possam surgir no decorrer do tempo não estaria autorizada a modificar o projeto sem o consentimento do autor, graças ao caráter personalíssimo da obra artística ou intelectual.
Um caso polêmico foi a questão entre a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro e o autor do projeto arquitetônico do sambódromo que invocando os direitos do autor, se opunha a realização de alterações na concepção original pretendidas pela Administração por meio de ação popular (PEREIRA JUNIOR, 2009).
Outra questão trata da construção de Brasília, que por concurso foi escolhido o projeto de Lúcio Costa para o Plano Piloto, tornando assim injustificável a seleção reiterada dos serviços previstos no artigo 13 por notória especialização.
O Governo do Distrito Federal para a execução do projeto “Nova Brasília” contratou o arquiteto Oscar Niemayer em detrimento de qualquer outro arquiteto que poderia executar obras similares mantendo o estilo inovador de seu criador, contrariando assim o entendimento já cristalizado pelo Tribunal de Contas da União (Processo nº TC-015.327/96-5. Decisão nº 161/97 – Plenário. Relator: Ministro Humberto Guimarães Souto. DOU 22/04/1997. Seção I, p.7973 a 7974) de que é irregular a contratação fundamentada no artigo 25, II, se ausentes a singularidade do objeto e a inviabilidade de competição (FERNANDES, 2009).
Na hipótese de obra imaterial de caráter tecnológico, insuscetível de privilégio, essa cessão de direitos incluirá apenas o fornecimento de dados indispensáveis à tecnologia de concepção, desenvolvimento e aplicação da obra, o que a lei 5.194 de 1996, à qual disciplinava o exercício das profissões de engenheiro, arquiteto e agrônomo, vedava a concorrência de preço, admitindo apenas o concurso em seu artigo 83, porém este foi revogado expressamente pela lei 8.883 de 1994 (MEIRELLES, 2010).
Nesta modalidade é comum que a habilitação seja feita em momento posterior ao julgamento e para evitar constrangimento dos participantes não premiados, ou até mesmo influência sobre o os juízes, o ato convocatório pode prever formas de anonimato para participação.
Após a seleção do vencedor, é então violado o sigilo pela Administração, revelando-se apenas sua identidade. Existem casos onde é impossível o anonimato, como nas hipóteses de trabalhos técnicos ou artísticos personalíssimos que necessitam desempenho físico ou intelectual pessoal dos interessados, como por exemplo, na seleção de melhor obra musical (JUSTEN FILHO, 2005).
Esteve em análise na Câmara o Projeto de Lei 4.405/12, do deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), que permitiria o uso da modalidade convite em caso de contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados.
O projeto ainda altera um dispositivo da lei 8.666/93 que define o convite, retirando do texto a obrigatoriedade deste ser feito somente entre interessados do ramo pertinente, acrescentando que convite é a modalidade de licitação entre interessados, cadastrados ou não, para prestação dos serviços técnicos especializados mencionados na lei e para bens de complexidade técnica. O autor afirma que a proposta tem o objetivo de ajustar a definição da modalidade de licitação convite, com vistas a promover segurança jurídica à Administração.
O relator da Comissão de Finanças e Tributação, Deputado Lúcio Vieira Lima, manifestou-se, no mérito, pela sua rejeição.
A rejeição se deu porque, de acordo com a análise do relator, no concurso, a Administração determina previamente quanto poderá gastar e as empresas dispostas a participar do certame apresentam suas propostas, sendo possível selecionar a proposta de melhor técnica. Na modalidade convite, entretanto, a seu ver, seria inviável que a Administração pudesse analisar as propostas previamente, sobretudo pela celeridade dos prazos nos certames desta modalidade.
A proposta retornou para reexame em 12 de junho de 2013.
Para a contratação de peritos para atuação judicial ou extrajudicial pela Administração devem ser observados alguns pontos, já que esta não se enquadra nas hipóteses de concurso apontadas, já que o próprio procedimento inviabilizaria a contratação pelo decurso de tempo necessário.
As perícias, preferencialmente, ficarão a cargo de entidades ou órgãos públicos, conforme preconiza o Manual de Processo Administrativo Disciplinar da Controladoria Geral da União (2013), na hipótese de haver o preenchimento do requisito legal para a produção de prova pericial, ou seja, a necessidade específica de conhecimento técnico ou científico no determinado procedimento.
A aplicação é válida não somente em Processos Administrativos Disciplinares, mas também para outras hipóteses dentro da Administração Pública. Assim, não havendo na Administração profissional com expertise para realizar a tarefa, ou mesmo existindo, mas que por motivo de excesso de trabalho ou outro qualquer que dificulte ou impeça a atuação naquele momento, é necessário que se faça a contratação de profissional fora dos quadros da Administração.
Deve-se levar em consideração a preservação da prova pericial, o que indica o nível de urgência da contratação do profissional expert.
Desta forma, não havendo urgência, deve-se aguardar o deslocamento do profissional da Administração, porém, havendo urgência ou não havendo na Administração profissional com a expertise necessária, se faz premente a contratação de quem esteja capacitado a realizar a tarefa dentro do prazo necessário.
Neste diapasão, a contratação deverá ser realizada de acordo com o artigo 25, II da lei 8.666/93, uma vez que estarão preenchidos os três requisitos específicos: serviço técnico especializado, natureza singular do serviço e notória especialização do contratado.
A partir de 1º de abril de 1984, tornou-se efetivo o sistema “FAR” (Federal Acquisition Regulation), que trata das regras gerais de aquisições e regulamentos para o governo federal e suas agências para aquisições de serviços, suprimentos e obras.
O Escritório de Política de Compras Federais (OFPP – Office of Federal Procurement Policy) coordena o sistema federal de compras, abrangendo todas as aquisições feitas pelas agências executivas, englobando Departamentos Executivos (composto por: Departamentos de Estado, do Tesouro, Defesa, Justiça, Interior, Agricultura, Comércio, Trabalho, Saúde, Habitação e Desenvolvimento Urbano, Transporte, Energia, Educação e de Veteranos) e Militares, empresas públicas e demais órgãos do Poder Executivo que não estejam na estrutura dos Departamentos, acompanhando algumas aquisições selecionadas em toda a fase do processo.
Os estados e municípios, quando se utilizam de verbas federais, devem também se utilizar de algumas regras do FAR, não obstante também legislarem sobre o assunto. O objetivo é a coordenação e uniformidade do processo de compras federais, sendo permitido aos órgãos definir normas internas, contanto que sejam preservados os princípios gerais previstos na lei e que não afetem os procedimentos dos demais órgãos da administração (FAR, seção 1.101).
Desta forma, de acordo com a legislação, os órgãos podem emitir regulamentos próprios e implementar “políticas adicionais, procedimentos, prescrições sobre editais ou cláusulas de contratação que suplementem a FAR para atender a necessidades específicas da agência” (FAR, seção 1.302).
A parte 37, que trata das contratações de serviços, e a subparte 37.1., que trata dos serviços em geral, traz em seu item 37.101, como definição de "contrato de serviço", um contrato que envolve tempo e esforço de um contratante cujo principal objetivo é a realização de uma tarefa identificável, um serviço, e não um produto final. Um contrato de serviço pode ser um contrato impessoal ou pessoal, podendo ser prestado por qualquer pessoa, profissional ou não profissional, individualmente ou por uma empresa.
São previstas as seguintes áreas para a prestação de serviços, segundo o FAR:
1) Manutenção, revisão, reparo, reabilitação, modernização ou modificação de materiais, sistemas ou equipamentos.
2) Rotina de manutenção periódica de bens imóveis.
3) Serviço de limpeza e serviço de base.
4) Serviços de consultoria e assistência.
5) Operação de equipamentos de propriedade do Governo, imóveis, e sistemas.
6) Serviços de comunicação.
7) Arquitetura e engenharia.
8) Transporte e serviços relacionados
9) Pesquisa e desenvolvimento
São considerados requisitos de aquisições especiais, os contratos para serviços que exijam que o empreiteiro aconselhe, emita opiniões, recomendações, ideias, gerem relatórios, análises ou outros produtos de trabalho que tenham o potencial de influenciar a autoridade, que possuam responsabilidade geral, ou ainda responsabilidades de prestação de contas dos funcionários governamentais (accountability).
Estes contratos exigem atenção especial para garantir que não resultem em desempenho de funções inerentemente governamentais pelo contratante, ou seja, para que não desenvolvam a atividade finalística governamental, fazendo com que os funcionários do governo exerçam adequadamente sua autoridade.
As agências devem assegurar que:
a) Um número suficiente de funcionários públicos qualificados seja designado para supervisionar as atividades do contratante, especialmente aquelas que envolvem apoio à política do Governo ou a tomada de decisões. Durante a execução dos contratos de serviços, as funções que estão sendo executadas não devem ser alteradas ou ampliadas para que estas não se tornem inerentemente governamentais.
b) Um controle reforçado e adequado de supervisão da gestão deve ser exercido na contratação para funções que não podem ser inerentemente governamentais, mas apenas de apoio a estas atividades.
c) Os funcionários contratados, quando em funções que possam ser confundidas com atividades inerentes ao governo (atendimento telefônico, participação em reuniões e outras situações que possam causar impressão que estes funcionários são do próprio governo), devem ser identificados como terceirizados, a menos que, na opinião da agência, estas funções sejam de menor importância e não possam causar dano a Administração. Também devem se assegurar de que os relatórios produzidos pelos empreiteiros estejam devidamente identificados como produto da prestação de serviços, ou ainda que tenham participado de sua produção.
Quanto ao perito ou a expert witness, no sistema jurídico americano, este não é escolhido pelo juiz, mas sim pelas partes litigantes, o que, na hipótese de um litígio entre um particular e a Administração, é natural que se contrate o profissional mais adequado para auxiliar na resolução do litígio pela própria Administração.
Na mesma linha adotada para outras contratações de serviços especializados, estes seguem a mesma forma e as mesmas regras impostas aos demais serviços.
É importante apontar que o sistema possui previsão de diversas formas de solucionar conflitos entre a Administração e seus contratantes, estando boa parte delas previstas na subpart 3.7. Voiding and Rescinding Contracts, havendo um esforço para que a questão não chegue até o judiciário.
Os diferentes sistemas adotados pelos dois países divergem em suas formalidades: enquanto nos Estados Unidos, não obstante existirem leis administrativas que tratem da contratação de serviços técnicos especializados, os procedimentos são muito mais simples e menos formais do que os adotados pelo Brasil.
Diferentemente do sistema misto aqui adotado, a legislação norte-americana preza mais os atos informais do que os formais, até mesmo quanto a sua forma de organização, que apresenta uma estrutura de departamentos e agências.
A lei 8.666/93 que trata das contratações pelo setor público no Brasil, aborda a questão das contratações técnicas especializadas mais profundamente, trazendo uma ritualística específica para este tipo de contratação, utilizando-se de uma forma predeterminada.
O poder discricionário conferido pela legislação geral americana permite a adoção de um procedimento padrão geral, exigindo para este caso apenas um critério maior para a fiscalização do contrato, diferente da questão aqui no Brasil, onde o legislador se preocupa mais com a primeira fase, ou seja, a contratação.
A flexibilidade da forma adotada pelo sistema da common law, permite que, independentemente da complexidade do serviço, as contratações aconteçam de forma equânime entre os licitantes, sendo o judiciário seu garantidor, assim como a própria hierarquia administrativa.
Não é possível afirmar qual é o “melhor” sistema, mas é possível observar que há preocupações diferentes em cada um deles. Ambos possuem peculiaridades às quais podem ser melhoradas em nível procedimental.
Diante do fato dos sistemas jurídicos serem diferentes, não é possível uma adequação de todo o procedimento adotado pelos Estados Unidos pela nossa legislação, assim como nossa lei 8.666/93 não poderia ser recepcionada de maneira integral pela legislação americana.
O que, em nosso caso, poderia ser utilizado, é a forma mais livre de contratação, ficando o agente público sujeito a uma fiscalização posterior mais rígida.
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RIVERO, Jean. Curso de Direito Administrativo Comparado. São Paulo: Ed. RT, 2004.
· Pedro Luís Próspero Sanchez é engenheiro eletricista, doutor e livre-docente em Engenharia Elétrica pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. É bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. É professor livre-docente do Departamento de Engenharia de Sistemas Eletrônicos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, onde é coordenador do Grupo de Engenharia Legal, Ciência e Tecnologia Forense da Universidade de São Paulo.
Doutorando em Engenharia Elétrica pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. É advogado, auditor da Universidade Federal do ABC e responsável pelos assuntos jurídicos da Agência de Inovação da Universidade Federal do ABC.
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