Os princípios, assim como as regras, são normas jurídicas. A doutrina contemporânea distingue as regras dos princípios e é segura em conferir também a estes últimos a existência de força normativa.
Hodiernamente, a Constituição, além de expressão do Poder Constituinte Originário e criador de um novo Estado e Sociedade, é o instrumento jurídico-positivo orientador e conformador de todo o ordenamento jurídico subjacente.
Nesse contexto, revela-se essencialmente necessária a compreensão dos princípios estabelecidos pela Magna Carta a fim de reger e disciplinar cada setor da sociedade e do Estado, no exercício de seus direitos e atividades.
Os atos administrativos e a atuação do Estado receberam tratamento direto e específico na Constituição Federal de 1988. Com efeito, o artigo 37 traz diversas normas, sendo que foram estabelecidos expressamente 05 (cinco) princípios: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Com maestria, o ilustre Celso Antonio Bandeira de Mello (2008, página 192) ensina que os princípios expressos constantes do artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1988, decorrem de outro (grande) princípio, como, por exemplo, a supremacia do interesse público sobre o privado, que inspira e direciona toda a atividade administrativa executada pelos agentes públicos do Estado, bem como os particulares que com ele se relacionam.
Em diversos pontos, a Constituição Federal de 1988 assegura o direito à privacidade e à intimidade para todos os indivíduos. Esta é a regra em se tratando de direitos individuais e privados, pois cada cidadão tem o direito de não tornar público o que somente lhe interesse, aquilo que entende ser somente de seu íntimo interesse.
Contudo, em se tratando de atos praticados pela Administração Pública, a lógica é inversa: a regra é a publicidade, pois os atos não são praticados em nome próprio ou ainda pessoalmente, mas sim impessoalmente, ou seja, o Estado pratica atos, através de agentes públicos no exercício de funções também públicas.
Assim, verifica-se de plano que o princípio da publicidade se relaciona com a necessidade de conferir transparência àquilo que é feito pela Administração Pública, a fim de que todos os indivíduos e interessados possam ter conhecimento do que se realizada no cotidiano estatal.
Somente em casos excepcionais, quando o exija o interesse público ou em caso de necessidade extrema de defesa da intimidade (artigo 5º, inciso LX, da CF/88) e haja previsão legal, é que se poderá afastar a regra da publicidade ampla, mantendo-se o sigilo dos atos e processos administrativos, que, neste caso, somente serão acessíveis àqueles que atuam diretamente no caso concreto.
Nesse sentido, Alexandre de Moraes (2006, página 30) traz as seguintes considerações:
“A publicidade se faz pela inserção do ato no Diário Oficial ou por edital afixado no lugar próprio para divulgação de atos públicos, para conhecimento do público em geral e, conseqüentemente, início da produção de seus efeitos, pois somente a publicidade evita os dissabores existentes em processos arbitrariamente sigilosos, permitindo-se os competentes recursos administrativos e as ações judiciais próprias.
A regra, pois, é que a publicidade somente poderá ser excepcionada quando o interesse público assim determinar, prevalecendo esse em detrimento do princípio da publicidade.”
destaques acrescentados
Os atos administrativos para serem válidos e aptos a produzir efeitos devem ser públicos, mediante publicação em órgão oficial (salvo casos de sigilo, expressamente previstos na legislação).
Além disso, o princípio da publicidade possibilita o controle dos atos administrativos pela população e pelos órgãos de controle. Com efeito, o cidadão tem o direito fundamental de saber o que ocorre no Estado, seja por interesse próprio ou em caso de interesse coletivo. Veja-se o artigo 5º, incisos XXXIII e XXXIV, da CF/88, verbis:
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;
Interessante a observação de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, página 81), no sentido de que se mostra ainda mais importante para o Direito Administrativo o papel dos princípios na medida em que sua origem não foi codificada e sua evolução sofreu forte contribuição da jurisprudência, o que permanece até os dias atuais.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que houve ofensa ao princípio da publicidade no caso abaixo, trazendo novo paradigma ao exigir maior eficiência na concretização da publicidade. Com efeito, o tribunal não se contentou com a formal publicidade, mas sim com a efetiva (material) publicidade. Veja-se o julgado:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CONVOCAÇÃO PARA POSSE APENAS MEDIANTE PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO OFICIAL. LAPSO DE QUATRO ANOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS.
1. Apesar de as disposições editalícias preverem que as comunicações com os candidatos ocorrerão unicamente por meio da Imprensa Oficial, não é razoável exigir que o recorrente acompanhe o DOE, diariamente, durante a vigência do concurso (no caso, quatro anos), até verificar a referência a seu nome.
2. Tal exigência, além de desproporcional, fere o princípio da publicidade, que deve ser interpretado de forma mais ampla do que entende a Administração no caso concreto. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no RMS 27.060/RN, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 19/09/2013, DJe 01/10/2013)
destaques acrescentados
Como visto, o tribunal entendeu que a publicidade deve ser a mais ampla possível, de modo a não prejudicar o administrado (no caso, candidato em concurso público), criando situação praticamente impossível de ser observada (acompanhamento diário oficial durante quatro anos a fim de ver se houve ou não nomeação para o cargo público).
Assim, o principio constitucional da publicidade é de extrema importância no ordenamento jurídico brasileiro, servindo como importante mecanismo que possibilita o controle dos atos administrativos pela população e pelos órgãos de controle, além de permitir que os interessados possam ter conhecimento de atos que lhes digam respeito.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 19ª Edição. São Paulo. Atlas, 2006.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26ª Edição Revista e Atualizada. São Paulo. Malheiros, 2009.
MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 20ª Edição. São Paulo: Editora Atlas, 2006.
STJ – AgRg no RMS 27.060/RN – Relator Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 19/09/2013, DJe 01/10/2013.
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