Resumo: A finalidade do presente artigo é abordar, de maneira prática e objetiva, os principais requisitos e características do redirecionamento da execução fiscal aos responsáveis tributários da sociedade executada, à luz das Súmulas 430 e 435 e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e da doutrina pátria.
Abstract: The purpose of this article is to address, in a practical and objective way, the main requirements and characteristics of the redirection of tax enforcement to charge the tax implemented in light of Precedents 430 and 435 and the jurisprudence of the Superior Court of Justice and Homeland doctrine society.
1. Introdução
De início, é importante destacar que a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.101.728/SP, sob o rito dos recursos repetitivos, consolidou o entendimento segundo o qual o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente da empresa é cabível apenas quando demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou ao estatuto, ou no caso de dissolução irregular da empresa.
O supramencionado julgado encontra parte do fundamento na Súmula 435 da Corte Especial, cujo enunciado segue adiante: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de
funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos
competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.”
Nas outras hipóteses explicitadas, quando o sócio-gerente ou administrador agiu com excesso de poderes, infração à lei ou ao estatuto, o fundamento jurídico para o redirecionamento está previsto no artigo 135 do Código Tributário Nacional: “Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”
Nessa linha, a desconsideração da personalidade jurídica, com a consequente invasão no patrimônio dos sócios para fins de satisfação de débitos da empresa, segundo inúmeros julgados do Superior Tribunal de Justiça, é medida de caráter excepcional, somente admitida nas hipóteses expressamente previstas no art. 135 do Código Tributário Nacional ou nos casos de dissolução irregular da empresa, que nada mais é que infração à lei.
Portanto, não comprovada a dissolução irregular da empresa nem a ocorrência das hipóteses constantes do art. 135 do Código Tributário Nacional, não cabe falar em redirecionamento da execução fiscal contra os sócios-gerentes ou administradores, conforme entendimento pacífico da Corte Especial.
Ademais, para a adequada interpretação das situações que permitem o redirecionamento da execução fiscal, também é imprescindível ressaltar o enunciado da Súmula 430 do mesmo Tribunal: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.”
Assim, o mero inadimplemento da obrigação tributária não possibilita o redirecionamento da execução fiscal aos sócios-gerentes ou administradores. É necessária a ocorrência das hipóteses constantes do art. 135 do Código Tributário Nacional ou de dissolução irregular da sociedade.
Todavia, para aprofundar o tema, é preciso adentrar na questão sobre o que é considerado dissolução irregular pela jurisprudência. Além disso, é necessário abordar o momento de sua caracterização no curso da ação de execução fiscal.
Além disso, no tocante à responsabilidade dos sócios-gerentes ou administradores, há contravérsias sobre o redirecionamento do feito executivo em face dos que geriam a sociedade na época dos fatos geradores dos tributos ou aos que administravam a empresa no momento da configuração da dissolução irregular.
2. Da Dissolução Irregular da Sociedade
Também é relavante mencionar que será tratada, especialmente, a hipótese da dissolução irregular, por sua constante recorrência nas milhares de execuções fiscais em trâmite no Brasil.
Logo, no curso do processo executivo o credor normalmente constata, a partir do advento da dissolução irregular, a possibilidade de redirecionar o processo executivo às pessoas físicas responsáveis pela sociedade (sócios gerentes ou administradores). Estas pessoas, por sua vez, passam a integrar o pólo passivo da ação a partir da decisão judicial que determinar suas inclusões na execução fiscal.
No passado era comum considerar a dissolução irregular da sociedade, e as Fazendas Públicas redirecionarem as execuções fiscais aos administradores da sociedade, com o mero retorno negativo da Carta com Aviso de Recebimento direcionado ao endereço da pessoa jurídica, confirmando, deste modo, a frustração da citação e a presunção de não funcionamento da executada.
Entretanto, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que mera devolução da citação por Aviso de Recebimento pelos Correios não é indício suficiente para caracterizar a dissolução irregular da sociedade (AgRg no REsp 1075130 / SP).
A Corte Especial possui o entendimento de que os indícios que atestem ter a empresa encerrado irregularmente suas atividades, como certidão do oficial de justiça, são considerados suficientes para o redirecionamento da execução fiscal, com fundamento na aplicação do princípio da presunção de legitimidade dos atos do agente público e veracidade do registro empresarial.
Assim sendo, pacificou-se o entendimento jurisprudencial de que não se pode considerar indício suficiente para se presumir o encerramento irregular da sociedade a carta citatória devolvida pelos correios. Faz-se necessária a certidão do oficial de justiça atestando o não funcionamento da pessoa jurídica no endereço do registro empresarial para configuração da dissolução irregular.
Além disso, conforme explicitado, a imputação da responsabilidade prevista no artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, não está vinculada apenas ao inadimplemento da obrigação tributária, mas à configuração das demais condutas nele descritas: práticas de atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos" (REsp 820481/PR).
O entendimento acima relatado está em harmonia com o disposto na Súmula 430 do Superior Tribunal de Justiça, cuja orientação é no sentido de que o inadimplemento da obrigação tributária não enquadra o sócio-gerente nas hipóteses de responsabilidade solidária dispostas no artigo 135, III, do Código Tributário Nacional.
De tal modo, ao ler o enunciado da Súmula 435 do Superior Tribunal de Justiça o operador do Direito deve se atentar ao seguinte: a certificação de que a empresa deixou de funcionar deve ser realizada por agente público (no curso da execução fiscal, por oficial de justiça); a diligência precisa ser efetuada no endereço indicado no registro empresarial; o redirecionamento do executivo fiscal pode ser feito em face do administrador ou sócio-gerente da sociedade, não contra sócios que não possuem poderes de gestão (salvo se comprovada a gestão de fato).
3. A Dissolução da Pessoa Jurídica por Falência
No tocante à decretação de falência, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de ser forma de dissolução regular da empresa, pois há expressa previsão legal para tal hipótese (Lei n. 11.101/2005).
Não obstante a falência seja forma de dissolução regular da sociedade, o encerramento do processo falimentar não implica exclusão de eventuais irregularidades que possam ter sido praticadas pelo sócio responsável e que tenham relação com o não pagamento do tributo devido. Assim, o fato de haver dissolução regular da sociedade, por si só, não impede o redirecionamento da execução fiscal.
Portanto, é obrigação dos gestores das empresas manter atualizados os respectivos cadastros, incluindo os atos relativos à mudança de endereço dos estabelecimentos e, especialmente, referentes à dissolução da sociedade. A regularidade desses registros é exigida para que se demonstre que a sociedade dissolveu-se de forma regular, em obediência aos ritos e formalidades previstas nos arts. 1.033 à 1.038 e arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil de 2002 - onde é prevista a liquidação da sociedade com o pagamento dos credores em sua ordem de preferência - ou na forma da Lei n. 11.101/2005, no caso de falência. A desobediência a tais ritos caracteriza infração à lei (REsp 1371128 / RS).
Além disso, ainda que regular a dissolução da pessoa jurídica por falência, é admissível o prosseguimento da execução fiscal contra os sócios cujos nomes constam da Certidão de Dívida Ativa.
Assim, o redirecionamento deve ser resolvido conforme a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça: a) se o nome dos co-responsáveis não estiver incluído na Certidão de Dívida Ativa, cabe ao ente público credor a prova da ocorrência de uma das hipóteses listadas no art. 135 do Código Tributário Nacional; b) constando o nome na Certidão de Dívida Ativa, prevalece a presunção de legitimidade de que esta goza, invertendo-se o ônus probatório (orientação reafirmada no julgamento do REsp 1.104.900/ES, sob o rito dos recursos repetitivos).
No caso de constar o nome do co-responsável na Certidão de Dívida Ativa baseado exclusivamente no artigo 13 da Lei 8.620 de 1993, é imprescindível ressaltar que tal dipostivo foi declarado inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral (RE 562.276/PR). Consequentemente, seu nome deve ser excluído da Certidão de Dívida Ativa e do pólo passivo da execução fiscal.
4. Responsabilidade do Sócio-Gerente da Época dos Fatos Geradores ou da Dissolução Irregular
Ao analisar as hipóteses previstas no art. 135 do Código Tributário Nacional, é possível concluir que o sócio-gerente da época dos fatos geradores da obrigação tributária deve ser responsabilizado solidariamente pelos débitos da pessoa jurídica.
Como exemplo, destaca-se o sócio-gerente que deixa de recolher a contribuição previdência dos empregados da sociedade durante a sua gestão. No caso exposto, este incorrerá em crime de apropriação indébita previdenciária (artigo 168-A, do Código Penal, adiante transcrito) e, deste modo, será solidariamente responsável pelos valores não recolhidos aos cofre públicos.
Apropriação indébita previdenciária (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
"Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
I - recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
II - recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 2o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 3o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
I - tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)"
Na situação descrita, é comum os sócios-gerentes ou administradores constarem como co-devedores juntamente com o devedor principal pessoa jurídica na Certidão de Dívida Ativa que instrui a petição inicial da execução fiscal. Nesta situação todos devem estar apontados no respectivo Termo de Inscrição.
Isso ocorre porque a autoridade fiscal, em sede administrativa, verifica que a hipótese enquadra-se no artigo 135 do Código Tributário Nacional, pois foi cometida infração à lei, ou seja, o crime de apropriação indébita previdenciária, conforme o exemplo explicitado.
De outro modo, como a Súmula 430 do Superior Tribunal de Justiça orienta no sentido de que o inadimplemento da obrigação tributária não enquadra o sócio-gerente nas hipóteses de responsabilidade solidária dispostas no artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, em regra, o redirecionamento é realizado em face dos gestores da sociedade da época em que constatou-se a dissolução irregular.
Portanto, se não for comprovada má-fé ou fraude do gestor da sociedade da época do fato gerador da obrigação tributária, o redirecionamento será feito contra os sócios-gerentes ou administradores do momento em que for certificada a dissolução irregular da pessoa jurídica.
Contudo, também há entedimento no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que não é possível o redirecionamento da execução fiscal em relação ao sócio-gerente que não integrava a sociedade à época dos fatos geradores e no momento da dissolução irregular da empresa executada, ou seja, há necessidade de ser o mesmo administrador no período da ocorrência de ambos os fatos para que este responda solidariamente pelo débito (AgRg no AREsp 556735/MG).
5. Conclusão
Posto isso, de acordo com diversos julgados do Superior Tribunal de Justiça, o redirecionamento da execução fiscal ao patrimônio do sócio-gerente para fins de satisfação de débitos da empresa após a desconsideração da personalidade jurídica, é medida de caráter excepcional, apenas admitida nas situações expressamente previstas no art. 135 do Código Tributário Nacional ou nos casos de dissolução irregular da empresa, também considerada infração à lei.
Todavia, conforme supramencionado, há inúmeras peculiaridades que envolvem o redirecionamento da execução fiscal aos gestores da pessoa jurídica. Desde a adequada leitura das Súmulas 430 e 435 do Superior Tribunal de Justiça como as especifidades da dissolução da sociedade pela falência, considerada regular.
Por fim, o tema também possui controvérsias em relação a quais sócios-gerentes ou administradores seriam responsáveis pelo débito: os que geriam a sociedade na época dos fatos geradores dos tributos ou os que administravam a empresa no momento da configuração da dissolução irregular.
Referências Bibliográficas
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MELO FILHO, João Aurino de, Execução Fiscal Aplicada: análise pragmática
do processo de execução fiscal, 3a.ed., Editora Jus Podivm, 2014
SILVA, Leonardo Toledo da, Abuso da desconsideração da personalidade jurídica, 1ª. ed., São Paulo: Saraiva, 2014
Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie em 1998 e pós-graduou-se em Administração de Marketing na Fundação Armando Alvares Penteado em 2002. Atuou como advogado na área de Direito Imobiliário e Crédito Imobiliário em instituições financeiras na Capital paulista até ser aprovado em provas de concurso público. Exerce o cargo de Procurador da Fazenda Nacional desde 2008.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SAADE, Omar Nami Haddad. Abordagem Prática do Redirecionamento na Execução Fiscal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42053/abordagem-pratica-do-redirecionamento-na-execucao-fiscal. Acesso em: 22 nov 2024.
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